Quando você ouve um disco novo de uma banda, é inevitável procurar reconhecer nesse trabalho o que você já está acostumado a ouvir daqueles já “velhos conhecidos”, ainda que se deseje acompanhar a evolução, o que mudou entre um e outro disco. O “conforto” desta semelhança, para alguns, é parte da essência de conhecer o trabalho de alguém. Com 15 anos de carreira e 6 discos lançados, a Cachorro Grande apresenta, em seu sétimo trabalho, a sensação de estranheza, o desconforto total, a sensação de que há algo novo no ar.
Costa do Marfim se inicia com a faixa título, uma série de sons que remetem ao país africano que deu origem ao nome do disco, depois de uma viagem da banda pelo lugar. Todo o trabalho carrega essa questão da mistura de ritmos, que talvez a África tenha inspirado, talvez a experiência tenha inspirado, talvez o produtor Edu K tenha inspirado (nunca saberemos). Há também uma mistura de sintetizadores marcando várias canções, elemento que pela primeira vez aparece com tanta força nos trabalhos do grupo, formando músicas que misturam indie-pop com garage rock, psicodelia, com música eletrônica, com, com, com…
Em “Nós Vamos Fazer Você se Ligar”, faixa que quase não mostra a voz de Beto Bruno, elementos eletrônicos e guitarras fazem as vezes de colocar a canção em um espaço que vamos perceber que será comum do disco: o da experimentação. “Nuvens de Fumaça”, é destaque por ser um rock simples e direto, em que a Cachorro Grande retorna ao lugar no espaço / tempo que estamos acostumados a vê-los, com bateria, guitarra e um refrão bem colocado, misturados a sintetizadores, que se encaixam bem à canção. Para não dar saudade dos teclados setentistas, “Eu Não Vou Mudar” traz as influencias mais básicas da banda.
“Crispian Mills” traz a mistura do sitar indiano com o sintetizador e dá a impressão de que a viagem da banda foi para a Índia e não para a África. A música poderia ser tema de um sci-fi americano dos anos 70 e, talvez por isso seja, ao lado de “Nuvens de Fumaça”, grande candidata a single. A frase “Use o Assento para Flutuar” ganhou nome de música no novo disco da Cachorro Grande, depois de ser nome do disco de Marcelo Gross, lançado no ano passado, além de ter a marcação de música de pista, para as baladas indie-rock que a banda é acostumada a frequentar, nos barzinhos da Rua Augusta.
Outro destaque do disco é “Como Era Bom”, que também tem um quê de reconhecimento, apesar dos sintetizadores marcando toda a música. “Torpor Partes 2 & 5” é a história de uma alucinação, que musicada, tem cara de um easter egg do disco, com a diferença de que está bem à mostra entre as canções do trabalho enquanto “O Que Vai Ser” lembra os primeiros sucessos do The Killers misturados com Foster The People, só que cantados em português, o que não combinou com a banda. Para finalizar o disco, “Fizinhur” é uma vinheta que poderia continuar “Costa do Marfim”, ou complementá-la.
Um disco cheio de novidades e pronto para entregar uma banda madura, sem medo de inovar. É esse o lugar que Costa do Marfim merece dentro da discografia da banda de Beto Bruno (vocal), Marcelo Gross (guitarra), Rodolfo Krieger (baixo), Pedro Pelotas (teclados) e Gabriel Azambuja (bateria). Apesar de ter 58 minutos de duração, o trabalho parece curto, dados todos os elementos que foram inseridos nas canções e sua extensa utilização.
Ao final das contas o ouvinte se encontra esperando, já no fim da audição do trabalho, por um sentido que o faça encaixar as peças desse quebra cabeças. Depois de algum tempo, é duro perceber que há sim algumas peças faltando e que elas não estão na discografia anterior da Cachorro Grande nem no próprio Costa do Marfim. Quem sabe no próximo disco?
Nota: 5,5 / 10