Por causa de alguns compromissos pessoais, eu temia não conseguir cuidar do Vazou! desta semana (para quem não sabe, a coluna sobe sempre às sextas–feiras). Mas os deuses do download ilegal ouviram minhas preces e soltaram não um, mas três álbuns muito aguardados em maio na segunda-feira (14) de manhã, e coincidentemente, todos com as guitarras no papel principal.
Slash – Apocalyptic Love
A primeira surpresa da segunda-feira foi a edição especial do segundo álbum solo do Slash – se excluirmos os discos do Slash’s Snakepit, claro – chamado Apocalyptic Love. Gostei razoavelmente do primeiro dele, lançado em 2010, que tinha um vocalista convidado por faixa e uma instrumental avassaladora, a porrada “Watch This”. Desta vez o guitarrista escalou Myles Kennedy, do Alter Bridge, para cantar em todas as músicas, e eu tinha a expectativa de que essa tática funcionaria melhor, principalmente se comparada ao excesso de participações no disco anterior.
Sem dúvida Apocalyptic Love é mais coerente que Slash, mas por dois motivos não funciona tão bem. O primeiro deles é justamente o vocal de Kennedy, que em vários momentos soa como uma cópia descarada de Axl Rose. No interlúdio da faixa bônus “Crazy Life”, por exemplo, a semelhança chega a ser assustadora. Se foi intencional ou não, não sei. Mas sem dúvidas Myles tem técnica e presença para desenvolver uma identidade própria mais bem definida, e faria bem a Slash se descolar do passado no Guns n’Roses, dada a insistência de Axl em seguir em frente com a esquizofrênica formação atual do grupo.
O outro problema é a falta de grandes canções. Há faixas muito boas, como “Halo” e “Hard & Fast”, mas nenhuma traz algo realmente novo à história de Slash, nem passam aquele desejo que às vezes temos de ouvir uma música ou outra repetidas vezes. Slash criou alguns riffs e solos interessantes e bem executados, mas por outro lado “We Will Roam” e “Anastasia” beiram a cafonice e diminuem o crédito de um dos maiores amantes das Gibson Les Paul no planeta.
Apocalyptic Love é um bom disco de rock e um ótimo estímulo para quem é fã, viciado em Guitar Hero ou guitarristas em geral, mas tem valor e relevância artística questionáveis. Slash soa melhor quando bem acompanhado: o Gn’R ou o Velvet Revolver são provas disso.
Nota: 3/5
John Mayer – Born and Raised
Outro disco muito aguardado que escapou nesta segunda foi Born and Raised, o quinto do John Mayer. Após a recepção mediana que o antecessor Battle Studies recebeu em 2009 – até Mayer se disse insatisfeito com o resultado final – o cantor e guitarrista se propôs a explorar uma sonoridade mais folk no novo trabalho, com foco em faixas acústicas com influências country.
Quando soube dessa intenção, pensei que poderia gostar da nova direção de John. Acredito que, quando se dispõe a sair da zona de conforto das baladas-pop-para-derreter-menininhas, ele consegue surpreender e provar que tem talento para ser um grande artista. Mas por mais que Born and Raised apresente uma nova faceta do galã, o resultado não é exatamente o que esperei.
Antes de tudo, Born and Raised é um álbum difícil. É injusto resenhá-lo tão cedo, tendo ouvido o disco tão poucas vezes. Mas de cara é nítido que o álbum é muito mais intimista e leve que qualquer outro da carreira de John, e por isso mesmo, é único. Como nos trabalhos anteriores, o pop é abundante, mas desta vez as influências de artistas como Fletwood Mac e Neil Young, antes implícitas, agora são evidentes. Todas as canções foram milimetricamente arranjadas, com belíssimos timbres de violão, piano e, claro, guitarras. Mas quando o disco chega ao fim, não fica claro o que John quis expressar com este novo trabalho.
Não é como se ele tivesse surtado e, do dia para a noite, tivesse adotado a sonoridade de grupos considerados “alternativos” como Bon Iver, Fleet Foxes, The Decemberists ou afins. Dificilmente isso daria certo, mas sinceramente, talvez fosse melhor para a carreira de John Mayer a longo prazo; pelo menos ficaria claro que ele não teve medo de arriscar.
Na maior parte do tempo Born and Raised soa como um disco de quem quis pular no escuro para ver o que encontrava, mas que na última hora preferiu soltar o paraquedas – ou no caso de John Mayer, as canções pop e as guitarras adocicadas – para evitar ferimentos mais graves. Os fãs vão amar, os críticos vão odiar, e a vida segue em frente. Talvez seja realmente precipitado analisar o álbum tão cedo, mas após algumas tentativas é improvável que eu tenha vontade espontânea de ouvir Born and Raised novamente. Preferi pular para o próximo da lista.
Nota: 3/5
Tedeschi Trucks Band – Everybody’s Talkin’
É uma injustiça ouvir esse álbum logo após (tentar) digerir o novo do John Mayer. Não é de hoje que Derek Trucks é considerado um dos maiores guitarristas do planeta, e ao montar a Tedeschi Trucks Band com a esposa Susan Tedeschi, Derek ganhou o centro que faltava em sua dispersa e prolífica carreira solo. Mesmo sem essa intenção, é impossível ignorar a tentação de comparar o Trucks e Mayer, ainda mais quando os dois usam e abusam da influência do blues. Mas se os meios são parecidos, os fins são praticamente opostos.
A banda estreou no ano passado com o maravilhoso, excepcional, incrível, Revelator, um primeiro álbum que dificilmente será superado pelos próximos. Do processo de composição à pós-produção do álbum, tudo é digno de aplauso. A única falha era a falta de liberdade para longos e afiadíssmos solos e improvisos dos shows da TTB (quem os viu por aqui no SWU do ano passado sabe do que estou falando), e é aí que entra Everybody’s Talkin’.
O álbum ao vivo reúne faixas gravadas durante várias datas em outubro do ano passado. Além de algumas das melhores músicas de Revelator, há covers de Stevie Wonder, Joe Cocker e Muddy Waters, entre outros. E em todas elas fica evidente que o grupo sabe ser virtuoso sem ser prolixo, e aprendeu a fazer música popular sem se tornarem redundantes. A excelente “Midnight In Harlem”, a mais bonita da banda, é a amostra perfeita: é tecnicamente corajosa, mas ao mesmo tempo é pop, é memorável, e é simples.
Seria mais interessante se houvesse menos covers e mais versões das faixas de Revelator, como “Until You Remember” e “Shelter”, pois a TTB ainda brilha mais nas próprias composições do que nas releituras. Mas a proposta era passar o feeling das excelentes performances ao vivo da banda, e o objetivo foi cumprido com louvor.
Nota: 4,5/5