Resenha por Guilherme Guedes
Fotos por Samyr Aissami
“Ah, é um cara que toca violino, guitarra e mais umas coisas, e faz uns loops ao vivo. E assobia, também”. Ouvi essa descrição preguiçosa – apesar de tecnicamente correta – algumas vezes antes do show do multi-instrumentista, cantor e compositor americano Andrew Bird em São Paulo, no último sábado (23).
Idolotrado e desconhecido em proporção equivalente, Bird é um dos artistas mais completos de sua geração. Prolífico como poucos, sua maior virtude é a habilidade de fazer uma simples canção folk encaixar perfeitamente em arranjos que misturam o erudito e o eletrônico, com um saldo pop surpreendentemente eficaz. Além de, claro, cantar, tocar e assobiar (!) com uma precisão técnica invejável.
Em dez anos de carreira solo, Andrew coleciona sete álbuns de estúdio, desconsiderando trilhas sonoras, EPs e os três discos lançados com o The Bowl Of Fire, grupo que liderou até o início dos anos 2000. Só em 2012 foram dois, Break It Yourself e Hands Of Glory, e um repertório vasto assim, vindo de um artista como Bird, resulta em uma coleção extremamente eclética, mas que em conjunto surpreende e conversa muito bem. A questão principal da noite era se Andrew seria capaz de traduzir isso para o palco, e a resposta, apesar de não ter sido imediata, foi certeira.
Não foi imediata porque no começo do show, logo no início da bela “Hole In The Ocean Floor”– de Break It Yourself – a captação do violino de Andrew falhou. Sem captação, sem loops; e aí metade do show dele estaria arruinado. Enquanto assobios e notas de xilofone se repetiam incessantemente, Bird e o técnico de som pareciam discutir o problema, e enquanto o segundo tornou a fazer o possível para remediar a situação, o primeiro nos brindou com uma breve e impressionante performance acapella. Instantes depois, o instrumento estava pronto, e voilá! A noite estava pronta para começar.
Foi um show longo, com cerca de duas horas de duração – incluindo aí duas voltas para o bis – mas foi o ideal para que Bird pudesse mostrar boa parte do catálogo, com destaque para faixas de Break It Yourself e The Mysterious Production Of Eggs, de 2005, um dos álbuns mais populares do cantor.
Apesar do som equalizado quase perfeitamente, o Cine Jóia não é um ambiente convidativo para a apreciação silenciosa, e em vários momentos o falatório duelava com os insistentes “shhhhhh!” para ver o que incomodava mais. Mas nem os problemas técnicos nem o barulho tiraram o brilho da performance.
Bird é cenográfico. Em vários momentos, como no monólogo de “Why?”, dá para se sentir como em uma peça de teatro, protagonizada e musicada pela mesma pessoa. Usando a voz e os assobios, Andrew foi virtuoso e preciso, e chegou a causar desconfianças de playback naqueles que olhavam à distância. Os arranjos instrumentais, divididos com um power trio extremamente dinâmico, também foram impecáveis, mesmo nos momentos em que a banda se dividia ao redor de um único microfone, como na gravação de Hands Of Glory, o LP mais recente do violinista, gravado em um único canal.
Aplaudido com vigor ao fim da apresentação, Andrew Bird pareceu agradar unanimamente o público paulista, apesar dos óbvios “faltou essa, essa e aquela, as minhas preferidas”. A verdade é que, a exemplo de aclamadas peças de teatro, o show de Andrew Bird é ideal para longas temporadas, e dada a resposta desta passagem do rapaz pelo Brasil, público não faltaria.
Setlist de Andrew Bird em SP
- Belles
- Hole in the Ocean Floor
- Why?
- A Nervous Tic Motion of the Head to the Left
- Desperation Breeds…
- Headsoak
- Orpheo
- Imitosis
- Darkmatter
- Give It Away
- MX Missiles
- Professor Socks (TV Show Theme)
- Three White Horses
- Skin Is, My
- Tenuousness
- Plasticities
- Fatal Shore
- Tables and Chairs
Bis 1:
- Fake Palindromes
- Don’t Be Scared (The Handsome Family cover)
Bis 2:
- If I Needed You (Townes Van Zandt cover)
- Desconhecida
Fonte: Setlist.fm
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