Resenha: Black Sabbath – 13

Apesar das referências a si mesmo, o Black Sabbath evita o autoplagiarismo em 13, que marca o retorno de Ozzy Osbourne ao grupo.

Black Sabbath 13

Em janeiro de 2012, dois meses após o anúncio do retorno da formação clássica do Black Sabbath – e da gravação do primeiro álbum com Ozzy Osbourne nos vocais desde Never Say Die, de 1978 – Tony Iommi revelou ao mundo sua batalha contra um linfoma, tipo raro de câncer que ataca o sistema imunológico. “Não é exatamente o que eu queria de presente de Natal”, brincou o compositor de alguns dos riffs mais importantes da história do rock. “Mas é bom que os caras estão vindo para cá para que a gente continue a trabalhar no álbum, pois as coisas estão indo muito bem no estúdio”. Iommi falava sobre 13, o 19º álbum de estúdio assinado pelo Black Sabbath, mas apenas o oitavo com Ozzy nos vocais. Na última terça-feira (28), o Tenho Mais Discos Que Amigos! ouviu 13 na íntegra a convite da Universal Music Brasil, e mesmo em uma única passagem pelas canções mais aguardadas do rock pesado na última década, preparou uma resenha completa e detalhada do álbum.

Com a urgência imposta pelo câncer, Iommi decidiu não esperar a resolução dos entraves burocráticos que impediram a participação do baterista Bill Ward no disco, e acatou a sugestão do produtor Rick Rubin, que convocou Brad Wilk (Rage Against The Machine) para criar e gravar as baterias do disco. Rubin não foi uma opção surpreendente para produzir 13; o barbudo havia assumido a mesma posição em 2001, na primeira tentativa de reunir os quatro originais do Sabbath. O produtor é reconhecido por fazer ressurgir a carreira de grandes ícones fora de forma musicalmente, como Johnny Cash – com a espetacular série American Recordings -, Metallica e ZZ Top, e geralmente consegue isso ao incentivar o artista a se inspirar no auge da própria carreira. Mas seu estilo ausente e relaxado, recentemente criticado por Corey Taylor do Slipknot, às vezes faz os artistas soarem comos covers deles mesmos, como ocorreu com Weezer em álbuns mais recentes produzidos por Rubin. Será que em 13 ouviríamos um Black Sabbath genérico, apesar de assinado pela própria banda (ou três quartos dela)?

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13 começa com “The End of The Beginning”, faixa divulgada em um episódio recente da série policial CSI (ainda não exibido no Brasil). O riff inicial lembra imediatamente o de “Black Sabbath”, faixa-título do homônimo álbum de estreia do quarteto – e mais tarde entenderemos porquê. Após uma caída lenta conduzida pelo baixo de Geezer Butler, um dos destaques do álbum, ouvimos pela primeira vez os vocais de Ozzy, que soam firmes como poucas vezes nos últimos anos. Lá pelos dois minutos e meio, a música é dominada por um riff mais rápido, que antecipa um interlúdio grandioso e dois solos espetaculares de Iommi. Se “The End of the Beggining” fosse tudo o que a nova versão do Sabbath tem a nos oferecer, talvez ficássemos levemente decepcionados. Mas a performance fantástica de Iommi na primeira faixa do disco chega a surpreender, e explica a urgência em gravar sem Ward: ao ver a vida ameaçada pelo câncer, Iommi deu tudo de si neste álbum, talvez receoso de não ter outra chance de gravar com pelo menos parte dos antigos companheiros.

A segunda faixa, “God Is Dead?”, é o primeiro single de 13, e a única música lançada oficialmente até agora. A exemplo da música anterior, “God Is Dead?” é longa, com estrutura diversa e clima sombrio, com novo destaque ao baixo de Butler. Também como “The End is the Beggining”, “God Is Dead?” é uma música primorosa, mas agrega pouco ao exigente legado do Sabbath. Eis que chega a potente “Loner”, e 13 finalmente começa a tomar forma. O riff inicial é Iommi puro, e o Sabbath atmosférico e sombrio das canções anteriores fica de lado, privilegiando o potencial de sacudir arenas e estádios do grupo mais pesado de todos os tempos. As melodias de Ozzy lembram bons momentos de sua carreira solo, e Brad Wilk mostra-se um pouco mais à vontade aqui, com viradas quase suingadas que a retidão característica de Bill Ward jamais permitiriam. Apesar das liberdades tomadas em alguns momentos do álbum – afinal não há ser humano capaz de copiar perfeitamente outro – a performance do baterista ao longo de 13 é louvável, e merece elogios até dos fãs mais rigorosos.

“Zeitgeist”, a quarta música do álbum, é a primeira e única balada propriamente dita do disco. O solo jazzístico de Iommi e os vocais psicodélicos cheios de reverb de Ozzy são os pontos fortes da música, que infelizmente é o momento menos inspirado do álbum. Com violões e bongôs, “Zeitgeist” é praticamente uma parte dois de “Planet Caravan”, mas nessa comparação a clássica faixa três de Paranoid fica anos-luz à frente. Depois de tantos graves e solos de guitarra, a esta altura 13 pedia uma música mais lenta, mas “Zeitgeist” infelizmente deixa a desejar. O grupo volta a mostrar força na excepcional “Age of Reason”, esta sim digna de integrar a discografia dos ingleses. A exemplo de “Loner”, “Age of Reason” também começa com um riff clássico de Tony Iommi, naquele andamento nem-muito-lento-nem-muito-rápido que só o Black Sabbath sabe fazer. A música é praticamente duas em uma, e ganha corpo e velocidade depois de um interlúdio digno de trilha sonoras de terror, com um solo veloz e virtuoso do grande nome do álbum, Tony Iommi.

Se até aqui relembramos o Sabbath soturno, pesado, lento e furioso, em “Live Forever” entendemos porque, entre outros tantos títulos, o Black Sabbath também é considerado o grupo pioneiro do stoner rock. A diferença aqui é que, em vez de soar como um grupo de cabeludos californianos tentando emular o Black Sabbath, “Live Forever” traz uma sonoridade legítima, e dá contemporaneidade a 13. Aqui, Ozzy soa reflexivo em um verso raso mas de significado profundo, especialmente após a descoberta do câncer de Iommi: “I don’t wanna live forever, but I don’t wanna die”.

A penúltima faixa de 13 é também uma das melhores do disco: “Damaged Soul”, um blues arrastado e sombrio. A música tem três solos de guitarra, com um trecho lento entre os dois primeiros onde, mais uma vez, os holofotes se voltam para o baixo de Geezer Butler. O final, com “Dear Father”, traz o quarteto ainda mais pesado, com riffs graves e a banda colada nos vocais de Ozzy. “Dear Father” tem um final longo e grandioso, e nos segundos finais da música, um som familiar sai das caixas de som: é o mesmo som de chuvas, trovões e sinos de igreja que abrem Black Sabbath (1970), o álbum de estreia do grupo – o que, colado ao riff inicial de “The End Is The Beggining”, ganha um significado completamente diferente.

A citação ao primeiro álbum pode ser apenas uma brincadeira bem-humorada, mas também pode representar algo muito maior. Estariam Ozzy, Tony e Geezer fechando um ciclo que permaneceu aberto por 35 anos, dando aos fãs a despedida honesta pela qual clamam há tanto tempo? Se considerarmos o violento tratamento do qual Iommi ficará dependente o resto da vida, é difícil imaginar que o trio tenha forças para se unir novamente no futuro, e 13 pode ser o último álbum de inéditas do Black Sabbath. Só o tempo vai dizer, e todos nós torcemos sinceramente para que não. Mas caso o destino siga por um outro caminho, não teremos do que reclamar; nem da ausência de Bill Ward, nem da produção cristalina de Rubin, nem da nostalgia descarada de 13. Se não vimos a formação clássica reunida, pelo menos ganhamos de presente o que pode ser o testamento final de parte essencial dela, e um dos melhores álbuns de rock pesado dos últimos anos.

Nota: 8/10

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