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Resenha: Skank - Velocia

Depois de seis anos sem lançar álbum de inéditas, banda retorna com mais pop e reggae do que há muito não se via.

Velocia_Skank

Velocia_Skank

Depois de passar mais seis anos sem lançar um disco de inéditas, o Skank volta, em mês de Copa do Mundo, com Velocia, nono disco de estúdio da carreira de 23 anos, completos agora, no último dia 5 de junho, aniversário do primeiro show da banda, no Aeroanta, em São Paulo.

O que esse disco pode ter a ver com aqueles primeiros trabalhos, relembrados em 2012 com o lançamento do Skank 91 e no lançamento de três inéditas durante as gravações do Skank no Mineirão?  Muita coisa, se você pensar em uma banda que retorna ao dub e ao reggae de seus primeiros trabalhos, sem deixar que a experiência de seus lançamentos posteriores seja esquecida. A produção de Dudu Marote (com Renato Cipriano), que também assinou com o quarteto os clássicos Calango O Samba Poconé, além do mais recente Estandarte e a masterização no Abbey Road (onde o Siderado também foi masterizado) contribuem ainda mais para a impressão de retorno ao passado que o disco produz.

Abrindo o disco, Samuel Rosa e Nando Reis voltam a falar de futebol na faixa “Alexia”, que presta homenagem à jogadora do Barcelona Alexia Putellas e mostra Nando dando uma palhinha no final. Melodia que pede assobio, a música está pronta para fazer você reviver um Skank futebolístico, e convida a cantar com os versos grudentos que citam artistas, tão espanhóis quanto a própria homenageada: “Vai co-me-çar mais um jogo! / Menina mulher da pele branca/ Com a classe de quem sabe a arte de jogar bem um futebol / A bela da tarde com charme encanta / Filme de Buñuel / Obra de Gaudi ou tela de Miró”, além de sutilmente homenagear Tom Jobim Jorge Ben Jor ao mesmo tempo, citando “Samba do Avião” “Chove Chuva”, não exatamente nesta ordem.

“Multidão”, em que Samuel divide os vocais com BNegão, é a filha mais nova e menos experiente de “In(dig)nação”, dos primórdios do Skank, com a atual falando das manifestações de rua de Junho do ano passado e a mais antiga do impeachment de Fernando Collor. O reggae vivo que canta a indignação do povo só não vai ser hino de novas manifestações porque precisou da força extra do músico carioca para ganhar alguma vibração, e fica sendo a música de protesto menos impactante de um Skank que já fez “Esmola”, “Os Homens das Cavernas”, “Sem Terra” e “Rebelião” tocarem muito mais fundo no cerne dos problemas da nossa sociedade. 

Seguindo a linha das parcerias, “Do Mesmo Jeito” de Lucas Silveira, vocalista e principal compositor da Fresno, surpreende. É nela que se reconhece o Skank festivo, de grandes versos e melodia ajustada, o que configura uma grande aposta para single nos versos mais que ritmados “Então vai…/ É tudo o que eu posso pedir / Olhe pra trás / Eu ainda estarei aqui / Do mesmo jeito / Que você deixou / Vou te esperar / Mais certo que o nascer do dia / Só pra dizer / Que não acabou / Quero você / Pra encher minha casa vazia”.

Outra novidade do trabalho é a parceria com a cantora paulista Lia Paris que assina e divide com Samuel Rosa os vocais de “Aniversário”. Electropop sem ser apelativa, a canção mostra que os temas cósmicos tão presentes nas faixas do Cosmotron de 2003, voltaram a fazer parte do repertório da banda. “Ela Me Deixou”, primeiro single do trabalho, fica bem em sua posição no disco, mas não retém grande atenção: é um reggae que fala de amor e até lembra um pouco as antigas “Estivador” “Os Exilados”, coincidência ou não, do Calango e do O Samba Poconé, respectivamente.

Até “Esquecimento” aparecer, você fica se perguntando onde está o hitmaker Nando Reis, que compôs boa parte das canções do disco e até esteve em estúdio com a banda. Mas aí ela chega, folk, pop, com os belos arranjos de violão e violino que tanto nos remetem à “Sutilmente”, do Estandarte, mas ao mesmo tempo soam completamente novos nos versos desesperados em que Samuel quase grita, docemente: “No banco sem guitarra elétrica / Com violão escrevo esse lamento / Pois como molha a água a pedra / Meu canto encerra o seu esquecimento / Não sei porque você / Insiste em demorar / Eu quero que você / Diga já!”. É um brinde aos ouvidos aflitos de quem estava esperando reconhecer uma nova balada do Skank e um troféu ao compositor ruivo, que combina tão bem suas criações com Samuel.

A dançante “Périplo”, uma viagem pelo olhar de quem aprecia o mar sem se conformar com sua imensidão, abre caminho para o descanso de outra forte candidata a single: “Rio Beautiful”, surpresa muito bem vinda em parceria com o rapper Emicida, que fez seu primeiro trabalho com a banda inserindo um rap no reggae de “Presença”, uma das faixas inéditas do álbum ao vivo, lançado em 2010.  Dançante, swingada e cheia de fortes rimas, como “Teu abraço guia é / Sol da Bahia de toda a fé / Benção de pajé, brilho de igarapé / Sorte arruda da Guiné” a música ganhou uma roupagem especial com sintetizadores, enquanto “Galápagos”, outra em que Samuel divide os vocais com Nando Reis, homenageia as ilhas do Equador, retomando as velhas menções da banda à América Latina.

Quase no final do disco, outra grata surpresa:  “A Noite” a primeira e única canção de Chico Amaral no disco. Compositor de clássicos como “Jackie Tequila”, “Tão Seu”, “Mandrake e Os Cubanos”, “Três Lados”, “Vou Deixar”, “Mil Acasos” e outras, Chico assina com Samuel uma nova “Garota Nacional”  para VelociaCom a força dos naipe de metais e da guitarra rock dançante, o refrão “Lá em cima rola animação / Alguém mantendo a pulsação / Não importa o que vem depois / Quarto de hotel / Baião de dois” tem tudo para ganhar dancinhas da galera nos shows e nas baladas por aí. 

Para fechar, a também dançante “Tudo Isso”, outra letra de Emicida, anuncia o fim do trabalho com outro refrão que vai grudar na cabeça do pessoal: “Que eu vi tudo isso olhando / Nos seus olhos pensando / Nas palavras certas pra essa canção / Se haveria espaço / Um cantinho, um pedaço / Que ainda possa ser meu no seu coração”. O garoto da Zona Leste de São Paulo marca presença na trajetória dos mineiros e é com certeza uma parceria que precisa se estender na carreira dos músicos de Belo Horizonte.

Depois de uma audição cuidadosa, só é possível concluir que Velocia é um nome certo para o disco. A forma como o álbum foi produzido, o tempo que a banda demorou para voltar ao estúdio, as canções em que o “tic tac” do relógio está inserido de forma tão direta que há pontos em que se é necessário “entortar os ponteiros com a mão” e em outros há “ponteiros parados” e é claro, a experiência de uma banda com tantos anos de carreira que nunca se separou, estão todos aí, incutidos nessas onze faixas. O álbum remete ao Skank que cansamos de conhecer, dos saudosos anos 90, numa reconciliação definitiva com o público fã de pop e de reggae que havia se afastado da banda durante o período da trilogia Maquinarama, Cosmotron e Carrossel, mas não deixa para trás esse período do começo dos anos 2000, em que as experimentações e as influências do britrock foram mais fortes e em que os quatro se permitiram ousar mais.

Os temas comuns à carreira da banda, os grandes sucessos prontos para acontecer, reggae, pop, um rock honesto, futebol, mulher, música pra pular e o jeito mineiro de ser, além da assinatura precisa de Dudu Marote, está tudo aí. A conclusão a que se chega é que Velocia é um álbum coerente, em que o Skank volta a traduzir sua história usando novas canções, mas não é um disco que impressiona. Talvez um pouco mais de ousadia fosse bem vinda aqui, mas isso, com certeza só o tempo nos dirá.

  1. Alexia
  2. Multidão
  3. Do Mesmo Jeito
  4. Aniversário
  5. Ela me Deixou
  6. Esquecimento
  7. Périplo
  8. Rio Beautiful
  9. Galápagos
  10. A noite
  11. Tudo Isso

Nota: 6,5 / 10