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Resenha: ruído/mm - Rasura

Em "Rasura", o quarto álbum do ruído/mm, o sexteto curitibano vai além dos clichês do post-rock para criar o melhor trabalho da carreira até aqui.

ruído mm - Rasura

ruído mm - Rasura

Mais de vinte anos após a consolidação do post-rock como subgênero do rock, o estilo segue firme em seus contrastes: é ao mesmo tempo morada para clichês de grupos pouco inventivos e abrigo de alguns dos artistas mais criativos da atualidade. No Brasil, o post-rock nunca teve uma cena grande, apesar de alguns excelentes representantes – no país do sambalanço, fazer rock experimental é só para quem realmente acredita no propósito de fazê-lo no subsolo do grande mercado nacional. E justo nesse balaio surgiu Rasura, o quarto álbum do ruído/mm, lançado em outubro.

Distribuído pelo selo Sinewave, responsável por alguns dos lançamentos mais interessantes da música experimental feita no Brasil, Rasura é a obra-prima – até aqui – do sexteto curitibano. Firmado no post-rock mas não limitado a ele, o ruído/mm consegue fazer referência a baluartes do post-rock sem cair nas armadilhas dos vícios do estilo. Com atenção, ouve-se um Mogwai ali, outro acolá, balanceado por momentos à la Tortoise ou Godspeed You! Black Emperor espalhados pelos 50 minutos do álbum, mas Rasura vai além. Há um tanto de jazz, de ambient e até de rock clássico distribuídos nas 8 faixas do disco, perfeitamente ordenadas para construir uma narrativa convidativa à apreciação imersa do ouvinte.

Uma das maiores qualidades do ruído/mm é a forma como o grupo trabalha a dinâmica das composições, todas complexas. O primeiro quarto do álbum, com “Bandon” e “Eletrostática”, exemplifica bem isso: entre altos e baixos, porradas e delicadezas, o grupo faz mais que apenas mudar o volume ou ligar e desligar os pedais de distorção. Em Rasura, o ruído/mm tem o controle total do ambiente e do humor de quem se entrega à experiência de ouvir o álbum.

“Cromaqui”, a faixa três e o single lançado antes de Rasura, investe em um aspecto mais roqueiro da sonoridade da banda, e talvez seja a música mais destoante das oito. A catarse a partir dos 1:35 é de impressionar, mas talvez por ser a canção mais objetiva do disco ela deixe uma sensação estranha ao fim relativamente rápido. “Transibéria” é outra faixa mais curta, e responde à intensidade de “Cromaqui” com um anticlímax parcimonioso, talvez um jeito de esfriar os motores antes da ótima “Inconstantina”, que mostra um lado mais “krautrock” do grupo.

“Filete” mantém o clima de “Inconstantina” sem grandes revoluções, e abre caminho para a melhor faixa do álbum: “Requiem For a Western Manga”, uma avalanche que, em 10 minutos consegue encapsular todas as qualidades listadas neste texto sobre o grupo. Entre trechos de tensão e expectativa, surgem conclusões heroicas, de fato dignas de um mangá situado no velho-oeste, até a nota suspensa que encerra a faixa. E “Penhascos, Desfiladeiros e Outros Sonhos de Fuga” fecha o álbum com um tom mais leve, otimista, mas igualmente bem desenhado.

A natureza contemplativa do post-rock tornou o subgênero um clichê das trilhas sonoras de filmes, séries e demais produtos audiovisuais por aí. Mas álbuns como Rasura conseguem ultrapassar esse maneirismo e não dependem de imagens, falas ou roteiros para transportar o ouvinte para além da música instrumental como música de fundo; é um disco que cativa a atenção sutil e espontaneamente, sem intenção de ir embora tão cedo.

Nota: 8,5/10