Uma nova Maria Gadú surge em Guelã, terceiro disco de inéditas da cantora. Autoral e diferente de tudo o que ela já lançou, o trabalho, produzido pela própria Gadú, em parceria com Federico Puppi, nasceu na casa da cantora paulista, nos Jardins, após diversas viagens internacionais e sai depois de quatro anos desde o último disco, Mais Uma Página, de 2011.
Gravado e mixado na Toca do Bandido por Rodrigo Vidal e com banda formada pela própria Gadú, tocando guitarra e violão, junto aos músicos Lancaster Pinto no baixo, Federico Puppi no cello, Tomaz Lenz na bateria e Doga na percussão, Guelã é minimalista e autobiográfico, e separa de vez a jovem cantora que surgiu para o mundo com uma voz linda e o refrão de “Shimbalaiê”, da Maria Gadú de hoje em dia, mais segura, mais experiente e mais consciente de sua música.
A voz deixa de ser o ponto alto de cada interpretação e dá lugar ao uso de novos instrumentos, como a bateria eletrônica, o violino e a guitarra. Há muito mais partes instrumentais, inclusive abrindo e fechando a sequência de 10 músicas que compõem o disco, com “suspiro” em que a interprete insere algumas palavras apenas no final da música e em “aquária”, em que a mesma estratégia encerra o disco com os versos: “Dois pontos negros no céu / Focam seus olhos no mar / Prendo o silêncio no peito / Prendo o silêncio com os olhos / Faço silêncio de mim” .
A experiência instrumental também aparece em outras músicas do trabalho, como em “Sakédu”, em que a voz de Gadú só aparece para repetir uma onomatopeia e marcar as palmas que acompanham a harmonia da canção de quase 3 minutos.
“obloco”, a primeira música disponibilizada ao público, é claramente feita para ser single, mas já apresenta uma nova forma de ver a música de Gadú. É assim que o disco segue, quase irreconhecível para quem não acompanhou a cantora depois de 2009 e uma continuação que faz sentido para quem já vinha vendo mudanças em sua sonoridade, desde seu último trabalho.
A única música do álbum que não foi composta por Gadú ganhou uma interpretação que pode entrar facilmente para aquela lista de regravações que combinam com o novo intérprete, tanto ou mais que com o próprio cantor original. “Trovoa”, de Maurício Pereira presente no álbum Pra Marte, de 2007, foi retrabalhada por Maria Gadú como quem lapida um diamante para lhe dar mais brilho. A música ganhou uma viola dedilhada, um violino e a voz da cantora, em uma narrativa que já era uma declaração de amor intensa e que se transformou em uma grande ode à pessoa amada.
Como a própria Gadú disse em entrevista exclusiva ao TMDQA! no lançamento oficial do disco, viagens, novas descobertas musicais, nossos temas e experiências guiaram a criação de Guelã (leia a entrevista completa aqui), desde a utilização de novos instrumentos à variedade autoral. As canções em que essas novidades ficam mais evidentes são “Semi-Voz”, sem refrão e com pouco apelo radiofônico, mas interessante pela mistura de elementos, que vão da MPB ao indie-pop, “Ela”, que narra a importância da parceria da pessoa amada, homenageada por existir e “cantar” a vida e “Vaga”, que encaminha o ouvinte para o final do disco, narrando a solidão de noite de insônia e a variedade de pensamentos que ela pode produzir.
Guelã, do começo ao fim, é obra de uma nova Maria Gadú. Sintonizada em seu tempo e sem medo de mudar, como ela mesma cantou na própria “obloco”, a cantora inclui seu nome entre os destaques autorais de um 2015 que aparentemente ainda tem muita coisa boa para mostrar. Lance seu bloco, Gadú! Com certeza ainda há muito o que se ver vindo de você!