Música

10 discos que mudaram a vida de Guilherme Guedes

Colaborador do TMDQA! desde 2010, Guilherme Guedes hoje apresentador do Multishow e Canal BIS fala sobre álbuns que marcaram sua vida. Leia.

10 discos que mudaram a vida de Guilherme Guedes

Estamos estreando hoje uma nova seção do Tenho Mais Discos Que Amigos! onde pessoas ligadas à música irão nos contar quais são os discos que mudaram as suas vidas.

Não são necessariamente obras primas conceituadas, nem precisam de reconhecimento global de venda/público/crítica, mas são álbuns que por algum motivo impactaram as vidas de cada uma dessas pessoas.

É justamente nesses motivos que iremos embarcar para descobrir como certos sons mudam as vidas das pessoas e entram para as suas histórias particulares das maneiras mais distintas.

Para a primeira edição, convidamos o nosso Guilherme Guedes, colaborador do TMDQA! desde 2010 e hoje apresentador dos canais Multishow e BIS.

Divirta-se!

 

Miles Davis – Bitches Brew (1969)

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Eu ainda lembro da primeira vez em que ouvi esse disco. De me sentir hipnotizado pela linha de baixo da faixa-título, de uma simplicidade circular absurda. Bitches Brew foi o responsável por expandir minha consciência e meu gosto musical – eu nunca mais ouvi música da mesma forma, e passei a valorizar cada vez mais as dissonâncias, a música enquanto arte, distante de fórmulas e obviedades. Valeu, Miles. E um salve pro Airto Moreira, baterista e percussionista genial, brasileiro, que aparece em uma das faixas.

 

Explosions in the Sky – The Earth is not a Cold Dead Place (2003)

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Desde pequeno tive dificuldades de decorar letras de músicas, e acho que por isso acabei desenvolvendo a habilidade de decorar melodias, levadas e harmonias, e nessa me encantei pela música instrumental. E esse disco veio em plena adolescência, num momento melancólico qualquer de quando a gente tem energia de sobra e razão de menos. Esse disco foi terapia, desabafo e completude. Ele conversou melhor comigo que qualquer verso ou letra. Maior amigão.

https://www.youtube.com/watch?v=kKyrULAfvq8

 

Björk – Homogenic (1997)

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Eu e Björk nos conhecemos numa tarde de um dia (in)útil qualquer, quando eu tinha 17 anos. Num rompante virtual, baixei toda a discografia de estúdio dela, e a onda bateu forte. Ela foi trilha de inúmeros trabalhos escolares, de tardes e noites em que eu fingia estudar enquanto minha cabeça imaginava o que raios havia na água da Islândia, esse lugar de gente maravilhosamente linda e louca. Eu quis casar com a Björk, e acho que em algum universo paralelo isso rolou, e vivemos tranquilamente no inverno glacial do país mais bonito da Terra (mal aê, Brasilzão).

 

The Smashing Pumpkins – Siamese Dream (1993)

Smashing Pumpkins - Siamese Dream

O primeiro gênero musical que me conquistou foi o metal. Black Sabbath, Metallica, Sepultura. Acho que meu primeiro CD foi o Best of the Beast, coletânea do Iron Maiden. Mas sempre me incomodei com os clichês do metal, com o lado meio conservador, quadradão da coisa. Aí conheci esse disco, que não é metal, mas absorveu muito desse universo enquanto fugia de tudo isso, simultaneamente.

É agressivo sem medo de ser sensível, furiosamente delicado. Uma obra-prima. Queria aprender a tocar guitarra só pra tirar o solo de “Soma”, mas não aprendo pra manter o sonho vivo. Gosto tanto desse disco que gosto até de todos os erros do Billy Corgan desde então. Saldo positivo vitalício.

 

Little Quail and the Mad Birds – Lírou Quêiol en de Méd Bârds (1994)

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Nascer e crescer em Brasília foi bem massa. É uma cidade grande enfiada num interior, então você cresce com o melhor e o pior de cada universo. É um lugar muito doido e muito mágico, só quem viveu pra saber. E desde pequeno, era só eu viajar pra qualquer buraco do país que alguém vinha com aquele papo de “ah, você é da capital do rock”. Ao mesmo tempo em que rolava um orgulho estranho de algo que não vivi, eu sentia uma frustração inquietante de ver o tal “rock de Brasília” sempre associado às mesmas bandas, à mesma cena, àquele clichê todo que não vale a pena nem repetir, enquanto tinha tanta coisa boa rolando por baixo do radar.

Esse disco simboliza tudo isso pra mim, é a cereja desse bolo de bairrismo, dessa felicidade inexplicável de se sentir em casa num lugar muito maior que você. É o maior e melhor disco de Brasília, é punk, é caótico, é irresponsável, é cretino, é tão hilário que é poético. Uma influência gigantesca na cena que vi surgir, da qual também fiz (uma pequena) parte. Vida longa ao Little Quail, mesmo morto.

https://www.youtube.com/watch?v=qw_f-bqz2v4

 

The Velvet Underground – The Velvet Underground (1969)

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O primeiro disco do Velvet que ouvi foi o Loaded, que vem depois desse. É o mais acessível, uma boa porta de entrada pra quem não conhece nada. E o impacto artístico dos dois antecessores a esse foi muito maior e muito mais significativo. Mas há algo na simplicidade crua das composições desse álbum homônimo que me pegou pelo pescoço, algo que não sei nem dizer direito o que é. Ele tem um clima meio agridoce, um troço de aplicar a fórmula pop de um jeito sempre meio torto, esquisito. Parece que ele gruda na cabeça enquanto te dá uma coceira eterna no cérebro. Não sei explicar, como ficou claro.

https://www.youtube.com/watch?v=L2VjZGd8sDQ

 

Death Cab for Cutie – The Photo Album (2001)

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Eu tinha uns 19 anos quando escapei de enfiar minha cara nos fundilhos de um caminhão. Vi o caminhão parado em cima da hora, o freio levou uma rasteira da pista recém-molhada por uma chuva de fim de tarde, e tive que jogar o carro pro meio-fio. Perdi o controle e escapei não sei como de virar recheio de uma árvore que tava no caminho. Não rolou nada comigo. Nessa hora eu tava ouvindo “Coney Island”, desse disco. É o meu disco preferido do Death Cab For Cutie, mas sempre revivo a cena quando chega nela, é muito louco. Morrer num acidente de carro ouvindo “Death Cab” seria melodramático demais, quero não.

 

Herbie Hancock – Head Hunters (1973)

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Esse disco é perfeito, só isso. Um groove sem igual, uma produção inigualável, dinâmica deliciosamente controlada para te descontrolar. Uma das maiores viagens da minha vida é sentar numa bateria e tentar acompanhar os 15 minutos de “Chameleon”, é melhor que qualquer droga, todo mundo devia tentar um dia. Cheguei nele após ler em algum lugar que foi uma das maiores referências da fase racional do Tim Maia, numa época eu que eu só ouvia aquele Volume 1. Eu tava sendo doutrinado, e Herbie e os Head Hunters me salvaram. Eternamente grato, Herbie.

 

Elliott Smith – Figure 8 (2000)

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O disco mais “pop” de Elliott Smith não tinha a pureza brutalmente honesta dos anteriores, mas sempre me encantei pelos contrastes desse álbum. Pela morbidez sutil, subliminar pouco antes dele se enfiar de vez nos vícios e morrer numa situação absurda, incompreensível. Sinto uma culpa em gostar tanto de Elliott Smith, como se o acalento de ouvi-lo tivesse um preço alto demais pra ele mesmo. E isso é muito claro nesse disco. Um disco visceral, profundo, intenso, o último que ele finalizou em vida, e que termina com uma instrumental chamada “Bye” que é maravilhosa. Doído.

 

Banda Black Rio – Maria Fumaça (1977)

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Cresci envolto pelo rock e seus semelhantes, em casa e na rua. Mas um dia meu pai me mostrou esse disco enquanto discorria sobre a juventude dele no Rio de Janeiro, cidade natal dele, e sobre as idas corriqueiras à extinta Modern Sound, em Copacabana, atrás de discos e discos e discos e mais discos. Tudo mudou: descobri a brasilidade, uma mistura deliciosa de funk, samba, baião e tudo em volta, um som único, sem igual em lugar nenhum do universo. Uns anos depois achei uma cópia da primeira prensagem do Maria Fumaça em vinil, em perfeito estado, e comprei pra dar de presente a meu pai. Mas como ele não tinha mais vitrola nem nada, guardei pra mim. Foi o primeiro disco da minha coleção de LPs, o símbolo da convicção de que os amigos são importantes e tal, mas os discos não te abandonam nunca. Não à toa vim parar neste site.

https://www.youtube.com/watch?v=O6RQnyDS9xg

 

Menção honrosa

Raimundos – Só no Forévis e Charlie Brown Jr. – Preço Curto, Prazo Longo (1999)

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A primeira vez que me lembro de juntar dinheiro pra qualquer coisa foi aos 12 anos, quando economizei as migalhas da mesada e gastei bem uns 30 reais (chupa, inflação) nessa dobradinha de lançamentos. Hoje acho até engraçado lembrar do quanto eu gostava desses discos, do quanto que eu ouvia os dois e o Americana, do Offspring, que ganhei de presente um pouco antes. Eu mal acertava um flip, mas sonhava em ser skatista enquanto tentava decifrar o que o Chorão cantava. Quando entendi, perdeu a graça. Mas foi louco.

https://www.youtube.com/watch?v=VLTePjx-2i4

https://www.youtube.com/watch?v=k7RLN8rU55I