“Não é fusion. Eu odeio fusion. É mais próximo de fission [fissão] que de fusion [fusão]”. Assim, mais próximo da física que da literatura musical, o saxofonista John Lurie descreveu em diversas entrevistas o som do The Lounge Lizards, grupo fundado por ele no início dos anos 80 e que surge hoje aqui no Faixa Título com o espetacular Voice of Chunk (1988), terceiro disco do grupo.
O The Lounge Lizards aliou os timbres elétricos e o virtuosismo do fusion – desculpa, Lurie – à subversão do movimento no wave, uma crítica niilista à contravenção moldada do punk, que contestava através de fórmulas e maneirismos reutilizados do rock padrão. Bem mais próximo do free jazz e do noise que, digamos, o Weather Report, o The Lounge Lizards despontou em 1981 com o disco homônimo de estreia, comandado criativamente por Lurie em parceria com o guitarrista Arto Lindsay, famoso pelas conexões viscerais com a música brasileira. Já (infelizmente) sem Lindsay, os Lizards seguiram em frente com No Pain For Cakes (1987) e, finalmente, Voice of Chunk.
Voice For Chunk é diferente dos anteriores e de clássicos do jazz livre, como Ascension (1965), de John Coltrane, pois mesmo sem limites ou estruturas próximas ao convencional, Lurie é capaz de orquestrar canções atraentes e acessíveis, entrelaçadas com melodias nunca simples e quase sempre memoráveis. É complexo sem ser difícil, denso porém ágil. Os passeios rítmicos – do bebop ao pós-punk e ao dub – respeitam a única regra clara do som de Lurie: o da reflexão espontânea dos inventos criativos do saxofonista. Um disco ímpar em todos os sentidos, para ouvir a qualquer hora, sob qualquer circunstância.
Faixas preferidas: “Bob The Bob”/”Bob The Bob Home”, “Voice of Chunk”, “A Paper Bag and the Sun”.