De todas as bandas de rock que já existiram, quantas delas saíram de suas garagens e quintais para vender milhões de discos pelo mundo e durar dez, vinte, trinta anos? A porcentagem, sem dúvida, é inexpressiva. Menor ainda é o número de grupos que têm a capacidade de ir a qualquer lugar, a qualquer hora, com a certeza de que serão recebidos por milhares e faturarão uma grana preta.
O The Used não se encaixa no seletíssimo segundo grupo mencionado acima, mas faz parte do primeiro. A banda, uma das mais tradicionais dentre as que surgiram na ‘onda emo’ da década passada, está comemorando 15 anos de carreira com uma turnê mundial e com o lançamento de Live and Acoustic at the Palace, álbum gravado em um show peculiar, onde o quarteto de post-hardcore trocou as guitarras distorcidas por violões e cordas orquestrais, apresentando versões muito mais leves de suas músicas.
Nós conversamos com Jeph Howard, baixista e fundador do The Used ao lado do vocalista Bert McCracken e dos ex-membros Branden Steineckert e Quinn Allman. Bastante à vontade, Jeph nos contou sobre o processo de criação das versões acústicas que integram o novo álbum, explicou como os membros lidam com a convivência prolongada causada por turnês e gravações, comentou um recente episódio de agressão envolvendo o cantor de uma banda e uma fã, e avisou: para ver o The Used novamente, os fãs brasileiros têm de ficar no pé dos promotores locais.
Leia abaixo!
TMDQA!: Primeiro de tudo, parabéns pelo lançamento do disco ao vivo, Live and Acoustic at the Palace. É incrível ver uma banda com a qual muitos de nós crescemos durar todo esse tempo e ainda manter tantos fãs. Quando começaram o The Used, você imaginava que chegariam tão longe?
Jeph: Quando começamos a banda nós não traçamos objetivos tão longos assim. O nosso maior objetivo era tocar na Warped Tour! Chegamos mais longe do que qualquer um de nós sonhava e temos muita sorte por isso.
TMDQA!: Sendo uma banda com músicas em sua maioria enérgicas e shows bastante animados, como foi essa experiência de transformá-las em versões acústicas, mais íntimas e recatadas, e ainda contar com um quarteto de cordas? Essa transformação aconteceu naturalmente?
Jeph: Muito naturalmente, mesmo com tantos músicos ao redor. Além do quarteto de cordas, ainda tivemos três vocalistas de apoio, percussionista, harpista, pianista… parecia uma orquestra inteira, foi insano! E a melhor parte é que tudo se encaixou, todas as decisões foram acertadas. Os músicos são talentosos, verdadeiros prodígios, e foi muito bom contar com eles.
TMDQA: Vamos falar sobre você. Como acha que amadureceu como músico ao longo dos anos?
Jeph: A maior lição que aprendi é que existe o momento de aprender a tocar e existe o momento de aprender a NÃO tocar! Hoje eu me sinto bem com o baixista que me tornei, porque aprendi que errar é importante. Erros são essenciais para crescermos. Quando você assiste a uma banda ao vivo, vê um dos músicos errar e ouve o erro dele, é meio desconfortável, mas pelo menos você sabe que ele está tocando de verdade e dando o seu melhor.
Eu sou esse músico que erra ao vivo, e quando consigo sair dessas situações sem ser muito óbvio nem comprometer a banda, é a melhor coisa do mundo. Você sabe que é um músico maduro quando, ao invés de parar o show e recomeçar a música, consegue improvisar e se dar bem.
TMDQA!: Na sua atual turnê comemorativa, o The Used está tocando seus dois primeiros discos inteiros. Tendo gravado os álbuns quando ainda eram garotos, como vocês enxergam esses trabalhos hoje?
Jeph: Sabe, falamos bastante sobre isso. Os anos nos mudaram, a nossa música mudou, mas mesmo aquelas nossas primeiras canções não são mais as mesmas. Quando as tocávamos há 15 anos, era diferente do que é hoje: elas eram sobre nós e tocávamos para nosso próprio prazer ou necessidade. Hoje, tendo afetado várias pessoas, essas músicas se transformaram em coisas muito maiores, com significados que não mais dizem respeito apenas a nós. É muito bom ver sua obra tomando outras formas ao longo do tempo.
TMDQA!: Depois de tanto tempo juntos, como ainda fazem isso funcionar? Todos vocês têm famílias e amigos fora da banda, mas o The Used ainda faz muitas turnês e lança material novo regularmente. Vocês já olharam na cara um do outro durante uma turnê ou uma gravação e pensaram “Meu Deus, eu não quero fazer isso agora, eu quero estar em outro lugar”?
Jeph: (risos) Já aconteceu, claro. Mas isso é do ser humano, é um instinto. Nós vivemos em um ônibus com dez pessoas, e ao longo dos anos aprendemos a viver juntos e a lidar uns com os outros. E pessoas vêm e vão, nossa formação não é a mesma do início e nossa equipe também não. Nós tentamos uma pessoa nova, e se não der certo, tudo bem. Mas se der certo, essa pessoa vira ‘da casa’, porque nós somos muito unidos e nos amamos muito. De verdade, nos amamos pra caralho!
TMDQA!: Vocês já estão juntando ideias para um novo álbum? Podemos esperar que ele saia neste ano ou acha que pode demorar um pouco mais?
Jeph: Nós já temos mais de 20 ideias para músicas e continuamos escrevendo enquanto estamos em turnê, e vamos voltar ao estúdio ainda esse ano, mas acredito que só teremos um álbum pronto no ano que vem.
TMDQA!: Você ficou sabendo do episódio envolvendo o vocalista do The Story So Far e uma fã em um show deles? O cara deu uma voadora nela só por ela ter subido no palco pra fazer uma selfie. Como você faz parte dessa cena há muito tempo, gostaríamos de saber o que acha dessa situação. É uma pergunta ‘por fora’, não vamos publicá-la. É que estamos curiosos para saber como membros de outras bandas enxergam esse tipo de atitude.
Jeph: Não fiquei sabendo não, ele chutou a menina pra fora do palco??? Uau… antes de tudo, esse cara é um otário. Tipo, um grande otário. Pode publicar aí, não me importo! Esse tipo de coisa não se faz, ainda mais com uma menina. Mas vou te dizer uma coisa: ela também tinha que ter consciência do que poderia acontecer.
Não estou defendendo ele, mas se ela sobe no palco e atrapalha o show pra banda e pros fãs, tudo por um breve momento de prazer egoísta, ela pode ter certeza de que pouca gente vai gostar disso. Acho que muita gente está assistindo a shows pelo celular e esquecendo de viver a experiência. O cara é um otário, mas essa fã não devia ter feito isso pra começar.
TMDQA!: A última vez que o The Used veio ao Brasil foi em 2012, abrindo shows para o Evanescence. Acredita que voltarão em breve? Existem planos para uma visita no futuro próximo?
Jeph: Te digo que tenho tentado muito, de verdade. Tenho falado para o nosso empresário, “Cara, por favor! Precisamos voltar!” (risos). O problema é que é muito caro, temos que ter promotores aí do Brasil interessados em nos levar até vocês.
TMDQA!: Parece mesmo ser financeiramente difícil. Em outra entrevista que fizemos, nos sugeriram que os voos caros podem ser um motivo para não recebermos tantas bandas quanto gostaríamos, mesmo tendo público para elas.
Jeph: Exatamente, só para pagar o custo de transportar banda, equipe, instrumentos e equipamentos de som já precisamos que os shows sejam um sucesso de público em lugares não muito pequenos. Dependendo da banda ou da cidade, isso não é viável.
TMDQA!: Você tem mais discos que amigos?
Jeph: Bem, eu tenho mais discos, mas é porque meu lado social é bem triste. Tirando as pessoas envolvidas com a banda, eu só tenho três amigos em minha cidade, e um deles é a minha esposa!
Live and Acoustic at the Palace
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