Uma banda que nunca se extingue. A gente pode pensar no DeFalla, atualmente com a formação clássica de Edu K (vocal), Biba Meira (bateria), Carlo Pianta (baixista) e Castor Daudt (guitarra) desse jeito. Depois de grandes discos nos anos 80 e 90, grandes mudanças de formação e um grande hiato, o DeFalla só poderia voltar grande. O lançamento de Monstro, 9º álbum da carreira do grupo, é esta continuidade. E para falar sobre essa direção, o processo de composição do disco, o cenário político nacional e outros temas, conversamos com o Edu K por telefone. Acompanhe abaixo um pouco do bate papo!
TMDQA!: Algumas mudanças de integrantes, de estilo e algumas idas e vindas marcam a vida e a obra do DeFalla nesses 31 anos de carreira. Como foi a ideia de lançar um novo trabalho a essa altura?
Edu K: Foi uma longa trajetória inclusive do disco, que demorou quase quatro anos pra ser feito. Falando de disco, eu pessoalmente sempre fui rato de encarte de vinil, sempre ficava me perguntando e até zoando a galera, querendo saber como é que uma banda demoraria um ano para lançar um disco, e aí eu acabei participando de um disco que demorou quase quatro anos para ser finalizado, é muito engraçado isso.
É engraçado também perceber que muita gente pergunta por que houve toda essa demora. De fato, o DeFalla nunca acabou, cada um foi pra um lado para fazer suas coisas, eu me transformei em DJ e toquei no mundo inteiro, os outros fizeram outras coisas, mas a gente sempre falava, porque todo mundo sempre quis fazer uma reunião. Até que em maio de 2011 a gente foi convidado pra participar de um disco, do projeto Discografia do Rock Gaúcho, onde as bandas apresentam na íntegra algum de seus álbuns. Nós tocamos o primeiro disco da DeFalla e já no primeiro ensaio percebemos que a mágica estava toda ali e decidimos fazer um novo disco.
eu considero o DeFalla uma banda atemporal
Logo depois desse show a gente se juntou num estúdio e fomos pegando algumas ideias, com gravador gravando tudo o que a gente fazia 24 horas por dia, foram saindo algumas coisas. Depois de um ano a gente foi pra um estúdio de gravação um pouco mais organizados, um ano depois, já fomos para um outro estúdio para gravar voz, alguns outros detalhes e mixar e um ano depois saiu o disco, um processo que a gente não imaginava que seria tão longo. Porém, uma coisa muito interessante do DeFalla é que é uma banda muito orgânica, então a gente grava um disco e aí nos shows já começa a fazer as músicas soarem um pouco diferentes, o que faz com que essas músicas evoluam no processo. Também tem a minha maneira de produzir, em que o estúdio é muito usado para o interesse da banda, então as músicas mudaram durante a mixagem, a gente foi construindo elas. Não são músicas datadas de quatro anos atrás, elas foram evoluindo, até porque eu considero o DeFalla uma banda atemporal.
TMDQA!: Como você explicaria o estilo da banda, essas construções musicais em estúdio, tanto aos fãs já tradicionais da banda como para as novas gerações que entrarão em contato com vocês a partir do disco Monstro?
Edu K: Na verdade, o estilo do DeFalla sempre foi não ter estilo definido, mas eu considero o DeFalla também uma banda de pop. Principalmente hoje em que pop se alimenta de tanta coisa, sempre muito faminto assim, não é? Eu acho que podemos sim ser enquadrados num pop que vai de Bieber (Justin) a Pantera, é uma coisa totalmente abrangente. A gente gosta muito de prog, tem falado muito de prog nesse processo, também gostamos muito de jazz rock, todos da banda gostam muito de prog, desde quando a gente comprava vinil. Mas antes de mais nada, esse é um disco pop, em que a gente explora bem esse lado experimental da banda e esse lado mais pop, acho que foi uma química boa.
Eu acho que podemos ser enquadrados num pop que vai de Bieber a Pantera, é uma coisa totalmente abrangente
TMDQA!: E em tantos anos desse processo de gravação, de onde vieram as inspirações para o trabalho?
Edu K: O DeFalla tem um processo bem psicodélico de lidar com a música e com a criatividade. Para a gente, tudo influencia. Meu relacionamento pessoal, que existia durante a gravação e acabou no meio do processo, tem até letra que eu fiz com a minha ex que trata um pouco disso, todos os livros, discos, quadrinhos, a história do nosso país, o que está acontecendo com os nossos amigos, tudo é captado e transformado em som. E se for ver é mais sensorial, é o que de fato influencia. Por exemplo, o Mário Bortolotto, que é um diretor incrível, ator e que tem banda também, eu pedi pra ele escrever uma letra e ele me mandou “Monstro” que foi uma música que acabou inspirando todo o conceito do álbum. Então, tudo influencia a gente, todas as coisas que acontecem são captadas e acabam se transformando em música para o DeFalla.
TMDQA!: Aproveitando que você citou política, como vocês estão vendo a situação do país?
Edu K: Eu não posso falar pelo DeFalla, mas eu posso falar por mim. Eu acho tudo isso uma grande palhaçada, mas não pelos motivos que talvez sejam mais vistos. Eu sempre falo que vejo as pessoas protestando contra os políticos mas não vejo muita gente falando contra o sistema político. Acho que botar outro político no lugar não vai resolver o problema. A gente já passou por isso várias vezes, já tivemos pessoas diferentes, partidos, políticos diferentes representando o país e tudo acabou na mesma coisa, tudo acabou em corrupção, em roubalheira. É o sistema político que beneficia esse tipo de coisa. Então as pessoas precisam começar a pensar em como mudar o sistema político. É claro que é uma coisa que envolve poderes e que é maior do que o cidadão, mas é preciso começar a ver quais são as alternativas. Uma das alternativas na minha opinião é sair do sistema. É viver fora do grid. É plantar sua própria comida, gerar sua própria energia, é uma coisa radical para o cidadão viver hoje em dia? É! Mas é uma saída. Se você não pode mudar o sistema, então saia dele.
Se você não pode mudar o sistema, então saia dele.
TMDQA!: Como vocês escolheram as participações especiais desse disco? (Pitty, Humberto Gessinger e Beto Bruno)
Edu K: Como todo o processo que envolva qualquer coisa que o DeFalla faça, foi algo que foi crescendo ao longo do período em que gente foi gravando as coisas. Em certo momento essa música chamou a fonte “tal”. Por exemplo, “Timothy Leary” foi uma música em que eu estava trabalhando quando eu estava fazendo o disco novo do Cachorro Grande, o Costa do Marfim, e a música tinha muito a ver com o som da Cachorro Grande, com o que a gente criou juntos, que era uma revitalização à psicodelia dos anos 90 que por sua vez é referente à psicodelia dos anos 70, só que uma da galera que já começou a ir nas raves, então Stone Roses, uma coisa bem Madchester era o que estava acontecendo pra mim e para o Beto (Bruno), naquele momento. E o pessoal também foi influenciado por isso. E aí eu pensei que o Beto tinha que estar na música, porque ela tinha muito a cara dele.
Com a Pitty, nesse disco do DeFalla, surpreendentemente a gente teve um momento mais stoner, grunge, que a gente nunca tinha se aprofundado apesar de ter vivido toda a época do grunge, ter tocado com o Nirvana e tal, a gente sempre passou direto do thrash metal pro crossover, enfim… na verdade eu tô ficando louco e o crossover veio antes, mas a gente nunca foi para esse lado do grunge. Aí quando a gente estava gravando a música “Delírios de um Anormal”, eu pensei que aquilo ficaria perfeito com a voz da Pitty. Aí eu mostrei para ela e ela pirou, ficou perfeito com ela, foi uma experiência animal. E finalmente com o Humberto (Gessinger), a gente é muito fã dele e das letras dele, e para a música “Dez Mil Vezes” a gente achou super interessante juntar esse rock Guitar Hero do Castor (guitarra da DeFalla) com o meu lado soul meio Tim Maia e esse lado pop do Gessinger.
(Música) é a única coisa que está fora de você mesmo e que está presente na nossa vida o tempo todo, comentando, curando…
TMDQA!: Para encerrar a nossa entrevista, eu queria saber se você tem mais discos que amigos…
Edu K: Assim, o Morrison já dissia, “No fim, a música é seu melhor amigo”. Eu não tenho a menor dúvida disso. É a única coisa que está fora de você mesmo e que está presente na nossa vida o tempo todo, comentando, curando. Para mim a música começou no vinil, eu já vim de uma época mais “dinossauro” e tal, hoje em dia o vinil está em voga de novo, mas houve uma época em que ele quase desapareceu. Mas acho que a gente perdeu uma coisa sagrada do vinil que é um certo ritual. Eu me lembro que quando eu comprava discos, às vezes a loja era longe da minha casa, eu pegava ônibus para chegar lá e voltava no ônibus olhando a capa do disco, decorando cada detalhe até chegar em casa e poder botar ele na vitrola. Existia uma reverência em ouvir um lado, depois ouvir o outro, eu acho que tudo isso se perdeu. A gente vive uma época em que as pessoas tem ouvido as músicas meio espalhadas… Existe é claro uma volta do vinil, mas quase como um hobby, não como era antes. Tem que ter um resgate disso.
Eu lembro que morava em Foz do Iguaçu nos anos 80 e eu ia para Porto Alegre e pedia de presente de Natal não brinquedos, mas discos, os discos que eu não conseguia comprar em Foz. O meu primo, que é baterista, foi uma grande influência para mim, porque ele tinha um quarto cheio de vinil e a gente ficava ouvindo e ele brigava comigo para eu ouvir as bandas que ele recomendava. O vinil para mim foi a força por traz da paixão por música, era um objeto mágico. Eu voltava para Foz do Iguaçu depois do Natal lotado de discos.
Hoje em dia eu não tenho mais nem CD, nem vinil, nem nada, eu escuto música pela Internet mesmo, mas não perdi a mania de escutar o álbum inteiro ao invés de ouvir só uma música ou outra, eu tenho um gosto, um relacionamento forte com álbuns, acho que o DeFalla também tem isso de sempre querer fazer um grande álbum.
Ouça Monstro:
A banda fará um show na Chopperia do Sesc Pompéia no próximo dia 6 de Maio, às 21h30,
em que rola também o lançamento do disco novo. Dá uma passadinha por lá! 😉