Porão do Rock 2016 acerta em cheio ao misturar bandas clássicas e artistas locais em Brasília

Na 19ª edição do Porão do Rock, bandas como Almirante Shiva, Darshan e Lost In Hate tocaram em horários nobres, dividindo atenções com Planet Hemp e Ira!

Far From Alaska no Porão do Rock 2016

Texto e fotos por Rakky Curvelo, com colaboração de Marcos Andrade

A edição desse ano do Porão do Rock, 19ª do festival brasiliense, trouxe uma renovação interessante ao modelo de festival ao qual estamos acostumados: um palco dedicado a quem curte o metal nacional, com bons nomes do que temos nessa área, um palco principal, com grandes atrações de variados estilos e um palco alternativo, para quem se interessa pelas novidades. Até aí, é Porão, a gente sabe o que esperar!

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Mas a edição desse ano dividiu as 28 bandas que tocaram no Estacionamento do Estádio Mané Garrincha entre brasilienses e não brasilienses em 100% dos horários, dando um espaço especial inclusive a bandas independentes e mais novas.

Foi o caso do Almirante Shiva, que tocou à tarde ano passado e nesse ano ganhou um espaço especial como última atração do Palco Chilli Beans, depois da 1h30 da manhã, de seus colegas do Darshan, que subiram ao palco principal, Budweiser, à 1 da madrugada para seu show, que precedeu o do Planet Hemp e de mais 12 outras bandas locais que tiveram seus momentos de glória durante o evento.

Os Punks

Selecionados na última seletiva do DF para participar do Porão, o My Last Bike abriu os trabalhos do Palco Chilli Beans com muito punk rock e hardcore. A banda misturou no show músicas de seus EPs Ainda não pagamos esse CD Resiliente, além de mostrar a nova “Adolescente”, que foi dedicada pelo inquieto Bruno aos alunos que ocupam mais de mil escolas em todo o país, e que merecem todo o nosso respeito.

Algumas bandas mais tarde, outro nome importante do gênero no país se apresentaria no palco Budweiser: era o papito, Supla, chegando e botando moral com seu “O Charada Brasileiro”. Não faltou nostalgia no setlist do moço, afinal, comemorar 30 anos de carreira não é todo dia. Com canções como “Humanos”“Japa Girl / Green Hair”, “Cenas de Ciúmes” “Garota de Berlin”, o papito segurou o público, que ouvia com a mesma animação músicas de seus trabalhos mais recentes, como “Minha Mão Direita”“Comer Você” e “Amor entre Dois Diferentes”, com a participação especial de Isa Salles.

Chegando ao fim de seu show, Supla incluiu em seu discurso esperado o já esperado apelo político, dessa vez pela união das pessoas, independentemente de partidos políticos e exibiu sua boa forma pulando do palco e indo até a área da grade para o grande público, cumprimentando a galera que fazia volume por ali.

O Palco Pesado

Uma das atrações mais tradicionais do Porão do Rock, o palco Pesado dessa vez trouxe muito mais bandas locais, já que o público brasiliense tem verdadeira paixão pelo estilo. Foi o caso das bandas Peso Morto Quilombo, as primeiras atrações, que fizeram farra para quem chegou cedo, promovendo as inesquecíveis rodas e fazendo o público cantar todas, já que santo da casa faz milagre sim. Um pouco mais tarde, os paulistas do Zumbis do Espaço trouxeram suas canções polêmicas e inspirados pelo cão para agitar os headbangers, que pareciam se acumular apenas nos entornos desse palco.

Além das atrações da casa, apenas outros dois estados brasileiros dividiram as honras locais com o povo do DF: as bandas de São Paulo (como o Oitão, o Worst e o Project 46, que fechou a apresentação) e o Hibria, do Rio Grande do Sul.

Os Psicodélicos 

Os brasilienses do Joe Silhueta subiram ao palco Chilli Beans pontualmente às 16h30 para apresentar as canções de seu primeiro EP, Dylanescas. O projeto, liderado por Guilherme Cobelo, canta o pop, o rock, o sertão, a psicodelia e o folk, numa mistura setentista que dá gosto de se ver. A banda que ganhou a primeira seletiva do Porão deste ano, tem uma mistura de outras bandas brasilienses em sua formação, e deixou o pequeno porém fiel público que já se aproximava do palco feliz da vida com as performances em “Café Amargo”, “Hora Gaga” e “Trilhas do Sol”.

Um show a parte é a presença de palco e atitude da fofíssima Gaivota Naves (que também é parte do grupo Rios Voadores). A moça canta, dança, corre de um lado para o outro do palco e interage com plateia e colegas de banda com a naturalidade de quem de fato nasceu para a coisa. Aprovado!

Boogarins era um dos nomes mais esperados para o festival, mas não empolgou tanto o público. Mergulhados de cabeça no mais recente trabalho, Manual, a banda tocou apenas uma música do disco As Plantas Que Curam, (a ótima “Infinu”, aliás, no início da apresentação)que consagrou o grupo por aqui e no exterior. A escolha do set, perigosa, pode ter sido responsável pelo esvaziamento do público ao redor do palco, no final da curta apresentação, que mais parecia de uma banda instrumental.

As novidades que prometem e a galera que todo mundo ama 

Nafandus, do Ceará, subiu ao palco encapuzada e presa. Na performance, gravações de rádio com depoimentos de Getúlio Vargas, de Lula e a gravação de alguns depoimentos da votação para o impeachment de Dilma Rousseff, como a infeliz homenagem de Jair Bolsonaro à Brilhante Ustra, anunciavam que aquele seria um show para se ver. E foi.

A presença de palco e o vocal impressionantes de Claudine Albuquerque fizeram do show da banda nordestina um marco no finalzinho de tarde do Porão. O grupo está trabalhando para lançar Unbreakableautoral que conta a saga do músico independente em busca do reconhecimento do público e da consagração artística. Enquanto isso, os metaleiros misturam influências do estilo à ritmos do Nordeste, com uma potência que dá gosto!

No palco ao lado, Emicida brilhou sem medo. Mais nervoso do que nunca, mais severo do que nunca, mais feroz do que nunca, o rapper abriu o show questionando seus questionares, logo depois da primeira música do show, “Intro”. “É… o Emicida encheu o bolso com o dinheiro da favela… quando é um preto, tem mil questionamentos nisso… não pode! Eu não tenho problema nenhum em responder essa pergunta. Depois que as empresas dos branco responder, certo? Sabe por quê? O bagulho no Brasil é descarado, é escancarado. Aí você precisa desenhar. Nossa maneira de desenhar quando eles falam ‘Porra… neguinho ganhou dinheiro, agora é acha que é gente! Neguinho vai pra gringa e acha que é alguma coisa!”, atacou o músico, que tem sido alvo de críticas após o sucesso de seu desfile na São Paulo Fashion Week, com a marca própria Laboratório Fantasma.

“Boa Esperança”, “Gueto”“Zica”, com direito a passinho e músicos gingando em frente ao palco, pra galera copiar, “Ubuntu” “Hoje Cedo”, em uma de suas performances mais pesadas nas guitarras e na atitude da sensacional Anna Tréa, porém, mais belas, fizeram o show de Emicida ser o primeiro completamente lotado do festival, e um dos melhores do músico neste ano.

Pouco depois, era a hora do rebolativo Far From Alaska trazer seu bom humor e energia para o palco do Porão. Em sua segunda apresentação no Festival a banda potiguar atravessou o país, ganhou experiência no palco, jogo de cintura e, claro, o reconhecimento de uma sólida base de fãs que se espremia perto do palco minutos antes da apresentação.

Com o ModeHuman ensaiadinho, Emmily e companhia tocaram “Thievery”“Another Round”  “Deadmen” antes de se dirigirem ao público, celebrando aquela apresentação que já eram tão diferente da de dois anos atrás. Emocionada, Emmily agradeceu ao público por diversas vezes, e passou a palavra para uma Cris não menos comovida, que também deu o tom de festa para aquele momento.

Em “Communication”, Emmily e Cris dividiram a responsabilidade de fazer o público se comprometer em dançar com elas “aquela música que a gente dança esquisito”. “Não vai ter problema, daqui a pouco você olha pro lado, vê alguém dançando esquisito e dança também!”, explicou Cris, antes do começo da música.

Já chegando ao fim da apresentação, a banda se apresentou com a música “Monochrome” e já saia do palco após a despedida, quando receberam a notícia de que podiam ficar mais um pouco, afinal o palco do lado, que receberia o Nação Zumbi em alguns instantes, ainda não estava pronto. Belos e animados, o quinteto voltou ao palco para tocar novamente “Thievery”, com direito a uma jam que levou Emmily para a bateria, enquanto a galera ao redor olhava desacreditada.

Revivals: por que não?

O Porão do Rock 2016 também contou com sua porção de nostalgia. Nação Zumbi e Ira! apresentaram na íntegra grandes sucessos de sua carreira, executando ao vivo dois grandes discos. No caso do Nação Zumbi, o selecionado foi o Afrociberdelia, disco de 1996 que revelou o grupo, ainda liderado pelo saudoso Chico Science. As versões ao vivo de “Quilombo Groove”, “Macô”, “Corpo de Lama” e “Baião Ambiental” fizeram sucesso entre as já consagradas “Maracatu Atômico” e “Manguetown”.

Obviamente estando em Brasília, não dá para não falar de política e Du Peixe, emendado pelo grito de “Fora Temer” do meio do público, pediu aos fãs que não se deixem calar pela série de mudanças pelas quais o país está passando.

Para finalizar, a banda foi até o final do disquinho que celebra 20 anos em 2016 com “Amor de Muito”, coisa bela e rara na discografia ao vivo do grupo e “Samidarish”.

Para o Ira!, o retorno foi maior, já que o disco escolhido foi o Vivendo e Não Aprendendo, de 1986, que arrepiou os brasilienses com “Flores em Você”, a própria “Vivendo e Não Aprendendo”, “Casa de Papel”, “Gritos na Multidão” e “Envelheço Na Cidade”, entre outras.

Entre as canções do disco que celebra 30 anos em 2016, Nasi e Scandurra celebraram sucessos de outros grandes momentos da carreira, como “Tarde Vazia”, “Rubro Zorro”, “Flerte Fatal” e voltaram para o bis com “Núcleo Base”, para delírio do público brasiliense.

Mas quem teve a responsabilidade de fechar o Porão foram os caras do Planet Hemp. A banda conseguiu levar o público ao delírio antes mesmo de subir ao palco, com as dicas para curtir o show apresentadas no telão, no estilo de avisos de segurança de companhias aéreas, com direito a aeromoça e tudo o mais.

Foto por Gerdan Wesley

Abrindo o show com “Não Compre, Plante” e “Legalize Já”, o grupo passou por todas as faixas mais conhecidas de sua carreira, desde “Fazendo A Cabeça”, “Futuro do País”, “Dig Dig Dig (Hempa)” até “Queimando Tudo”, “Ex-Quadrilha da Fumaça”,  “Raprockandrollpsicodeliahardcoreragga” e “Quem Tem Seda?”. Nas músicas com pegada mais hardcore, BNegão pediu para que todas as rodas se juntassem numa única celebração punk.

E teve também homenagem a Chico Science, com a execução de “Samba Makossa”. A imagem do artista pernambucano ficou congelada na tela enquanto o Planet Hemp tocava. Marcelo D2 chegou também a oferecer a performance a Chorão, já que a canção fez parte durante muito tempo do repertório do Charlie Brown Jr.

Na derradeiro ato do espetáculo, D2 brincou com o “cheirinho de hepta”, ao notar um fã que abanou uma camiseta do Flamengo durante mais de um hora perto da grade. BNegão ainda invocou a nação rubro-negra presente, e quando percebeu que nem todos tinham gostado, perguntou: “ih, tem vascaíno aqui?” (Flamengo e Vasco são as maiores torcidas de Brasília). Após a recorrente apresentação dos integrantes (que além dos veteranos D2, BNegão e Formigão, conta hoje com Nobru Pederneiras e Pedro Garcia, vindos da banda carioca Cabeça), o grupo encerrou como o faz tradicionalmente, tocando “Mantenha O Respeito”.

A Redação do TMDQA! viajou a convite do evento.

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