Entrevistas

"Todo mundo quer uma boa melodia pra assobiar" - entrevistamos Nando Reis

Aproveitamos o lançamento de 'Jardim-Pomar' e conversamos com um dos maiores nomes da música popular brasileira, o carismático Nando Reis.

Nando Reis

Poucos viveram e sentiram mais do que Nando Reis. 

De integrante de sucesso nos Titãs a uma carreira solo tão aclamada quanto, o paulistano de 53 anos já rodou o mundo e se mantém na elite da música nacional, requisitado de norte a sul do Brasil.

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Ao longo de sua trajetória, foram canções e mais canções dedicadas a entes queridos e parceiras românticas. Sai ano, entra ano, e Nando segue fazendo questão de celebrar o amor, a família e a vida, e seu novo disco – Jardim-Pomar, lançado no mês passado – traz tudo isso em grandes doses.

Como em “Inimitável”, a terceira faixa, onde canta que “Se vamos todos morrer / Então vamos tratar de viver”. Ou em “4 de Março”, dedicada à esposa Vânia. “Azul de Presunto”, então, faz questão de reunir alguns de seus melhores amigos – estão, entre eles, simplesmente Paulo Miklos, seus filhos.

Certo é que Nando tem a fórmula do sucesso: música acessível, feita com o coração. Mas qual foi o ponto de partida de Jardim-Pomar? Como foi produzi-lo com seus lendários parceiros Jack Endino (Nirvana, Soundgarden, Mudhoney) e Barrett Martin (ex-Screaming Trees), e qual sua significância dentro da vasta discografia de um dos maiores artistas brasileiros?

Batemos um papo com seu autor e você confere as respostas logo abaixo!

TMDQA!: Como surgiu o conceito, ou a reunião de conceitos, que se tornariam o álbum Jardim-Pomar?

Nando Reis:
Ele não é um disco conceitual ao pé da letra, o único conceito por trás dele é o de que faço e lanço discos. O resto vem como forma, ou seja: concluído o ciclo da gestação e realização da obra, vem a própria absorção dele por vocês. Essa gestação começou por volta de quatro anos atrás, quando terminei e lancei o Sei (2012). Desde que me tornei independente – algo que acho ótimo – passei a estar envolvido na comercialização e entrega do disco, que é uma etapa fundamental. E de certa maneira eu me prezo muito de me encarregar dessa parte, ainda mais em um mercado tão dinâmico.

Isso me pôs num cenário muito incerto. A gestação desse disco também está relacionada às experimentações que fiz com o Sei, que só existia como objeto físico na loja do site ou nos shows, e com os dois discos ao vivo que vieram depois. Essas experimentações me levaram a fazer a distribuição do Jardim-Pomar no meu site, em lojas, e em plataformas de streaming. Esse planejamento acabou influenciando na própria parte musical. Fiz com muita calma, considerando o espaço de tempo e oportunidade, obedecendo a um cronograma mais devagar.

Comecei ele lá em Seattle, em 2015, e concluí a parte de gravação aqui em São Paulo, em fevereiro desse ano. Isso foi determinante para termos dois produtores, já que o Jack não pode vir pra cá e veio o Barrett. Depois, fomos para a parte final, que são a concepção e fabricação gráfica. Voltando à sua pergunta: o conceito é esse processo de fabricação do próprio disco atrelado à parte musical, o repertório, e juntam-se essas partes da melhor forma.

Quando escolhi o nome ‘Jardim-Pomar’ vi que ele era belo, e as duas palavras independentes casualmente combinavam com as duas etapas de produção. O sentido da palavra ‘jardim-pomar’, muito usada pelo autor Murilo Mendes, tem relação com a forma que trabalho e com o conteúdo das músicas. O disco é um jardim onde brotam plantas, árvores; delas crescem flores, e depois vêm os frutos.

TMDQA!: Dessa vez o processo de gravação foi diferente de todos os outros. Por que resolveu gravar em São Paulo, com Barrett Martin, e em Seattle, com Jack Endino? E como surgiu a ideia de fazer versões alternativas da música “Só Posso Dizer”?

Nando Reis: Tudo foi um misto de indecisão e casualidade. Fui contratado pra tocar num navio no Alasca e ele saía de Seattle, e o show seria eu, o Alex (Veley, tecladista) e o Felipe (Cambraia, baixista). Jack foi sensacional. Em fevereiro ele não pode vir, mas Barrett veio e é distinta a forma como eles trabalham. Foi bem determinante na maneira como fizemos arranjos de cada música. Minha forma de gravar era: pegar o estúdio, convocar a banda, fazer arranjos, gravar e editar. Com esse intervalo de tempo pude ouvir e decidi que não queria que o disco fosse lento como estava se tornando.

TMDQA!: E as parcerias? Samuel Rosa, seus filhos, os Titãs…

Nando Reis: Com o Samuel gravei uma música que fizemos juntos na ‘safra’ do disco Velocia (2014), do Skank. Eles não gravaram ela e eu achei ótimo. As outras parcerias são pessoas com quem gosto de trabalhar. O Seba e o Theo tem o 2 Reis, que vai lançar um trabalho próprio magnífico no ano que vem. Queria que a canção “Azul de Presunto” fosse cantada por muita gente, e me ocorreu chamar os Titãs que são meus amigos de longa data.

Nos demos conta de que fazia 25 anos que não cantávamos juntos! A música em si me remete a eles, e cantá-la coletivamente seria representativo da pluralidade que essa música tem. Nada melhor que ter meus amigos responsáveis pela minha história e formação musical, meus filhos que são meu círculo afetivo, artistas femininas que admiro…

TMDQA!: Dá para dizer que Jardim-Pomar é a melhor versão do Nando Reis? É o disco com o qual ele se sente mais confortável, mais confiante?

Nando Reis: Se não a melhor ideia, pelo menos é a mais atual. Gravei esse álbum num momento em que quis expandir minha sonoridade, mas musicalmente ele possui ideias que remontam às minhas características habituais.

TMDQA!: Esse é o seu 14º álbum no total – o oitavo de estúdio, com material original. Antes disso você teve toda sua carreira nos Titãs. Quais foram as maiores lições que aprendeu ao longo desse tempo?

Nando Reis: Hoje canto melhor, sou um músico melhor, tenho mais calma, atento mais à originalidade, sei melhor quem sou. Por outro lado, não seria nada disso se não tivesse passado por essas outras etapas da minha carreira, de quando era um garoto inexperiente e aventureiro.

TMDQA!: Ainda em relação à sua longa carreira, você começou a fazer sucesso na época do disco de vinil e, mesmo presenciando e sofrendo as mudanças no mercado fonográfico, continua em alta na era digital. Existe uma fórmula para o sucesso que independe das variações da indústria? Como é ser músico hoje em comparação aos seus primeiros anos?

Nando Reis: Cada época tem sua característica,  mas todo mundo quer uma boa melodia para assobiar. Acho meio falso você dizer que é fácil ou difícil agora ou antigamente. A era digital tem a vantagem de dar a chance do artista gravar em casa, porque era uma fortuna gravar antes. A maior dificuldade é ter o que gravar, ter material de qualidade. E quem tem ambições e zelo pelo próprio trabalho já tem meio caminho andado.

TMDQA!: Como está sua agenda pra esse finzinho de ano?

Nando Reis: Vou seguir com a turnê ‘Voz e Violão’ até dezembro. No fim de dezembro tenho alguns shows com a banda, shows de lançamento do disco. Em janeiro, sei lá. E em fevereiro vamos ensaiar para a turnê desse disco, que vai durar o ano todo.

TMDQA!: Você tem mais discos que amigos?

Nando Reis: Sempre tive mais discos que amigos, até porque é muito bom ter disco, né? Passo horas com a minha coleção.

https://www.youtube.com/watch?v=X1NMhdcAevU

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