LaBaq é uma cantora paulista que tem ganhado o mercado da música nos últimos anos.
Depois do lançamento de seu disco de estúdio V O A, em 2016, a artista passou boa parte do tempo se apresentando pelo Brasil e pelo mundo — inclusive passando por Portugal para gravar o clipe de “Clara”.
No começo deste ano, LaBaq foi anunciada como uma das atrações do influente festival SXSW, no Texas, que rolou no último mês de Março. A convite do TMDQA!, a cantora cobriu o evento no nosso Instagram Stories e também escreveu um diário de bordo de sua experiência, que você pode conferir abaixo!
Em tempo, no próximo dia 28/04 Labaq estará de volta ao Brasil para fazer um show no Centro Cultural São Paulo (CCSP), e você pode encontrar as informações logo abaixo:
LABAQ NO CCSP
Data: 28 de abril de 2018, sábado
Local: Centro Cultural São Paulo – Sala Adoniran Barbosa
Endereço: Rua Vergueiro, 1000 – Liberdade, São Paulo
Horário: 19h
Ingressos: R$ 10 (preço único, na porta do evento)
Evento oficial: https://www.facebook.com/events/2099717016931027/
Dia 1
Cheguei em Houston às 6 da manhã de um domingo friozinho e cinza, foi tudo muito rápido na alfândega, só pra contrariar todo o medo que me botaram desse controle de passaportes dos caras.
Alívio lindo, café e esperei mais ou menos uma hora até Lois vir me pegar. Lois era amiga de um conhecido que mora em Austin, ele nos colocou em contato justamente porque eu chegaria por lá no domingo e com algum tempo livre até pegar meu ônibus pra Austin. Ela
é uma musicista incrível e muito apaixonada pelo que faz, vive nos EUA há mais de 20 anos, me leva pra um café e em seguida pra bus station.
Já na ida pra Austin, na fila do ônibus, uma moça e sua mãe me abordam, perguntando se
eu tocaria no festival e eu digo que sim. Elas perguntam se era aberto e eu disse que havia dois que sim e dou meu cartão, minutos depois a mais jovem começa a me seguir no
Instagram. O ônibus tem wi-fi mas a estrada é bem mais bonita de se ver. Em Austin vou pra casa da Alysson, outra musicista incrível, que me hospeda até o dia seguinte, com bastante amor e seus dois dogs maravilhosos, mesmo comendo metade do meu sanduíche, sim.
O domingo foi de recolher e respirar fundo pra semana que vinha vindo.
Dia 2
Acordei cedo e friozinho, saí pra correr e sentir essa atmosfera de estar em um bairro mais
residencial de Austin, as casas com jardim grande, varanda com balanço, luz do sol da
manhã começando a esquentar. Volto e ali está a Sabrina, que já me compartilha umas dicas e experiências dos seus últimos dias de festival.
Respondo uns e-mails, checo onde vende chip pro celular, (SIM Card pros gringos!) em
seguida eu pego a bike e vou até essa loja mais próxima. Já com internet, traço o caminho
mais rápido até o centro, vento gelado e sol, aquela sensação que a bike dá de uma liberdade e proximidade tão boa com o meio, sabe?
Chego no centro e boom: muita informação. Mas muita mesmo, com vontade. Muita gente
também.
Vou direto pro Austin Convention Center, o “ACC” — como eles chamam, pra pegar minha
wristband — uma pulseira que indica que sou artista tocando no festival, e com ela consigo
entrar em showcases, palestras relacionadas a música e alguns outros eventos. Uma volta rápida pelo ACC pra se localizar, outra volta no Trade Center (onde ficam os stands com expositores que vão desde lojas de músicas até moda, tecnologia, realidade virtual, etc).
Volta pelas palestras, os temas são incríveis mas não vejo nenhuma, tô um pouco ansiosa
ainda pra ver o que mais tem rolando por aí! Artist lounge, artist village, muita gente afim
de trocar e isso me inspira infinito. Sabe aquela coisa de se olhar por alguns segundos e já
ver receptividade no rosto da outra pessoa? Isso me move muito. Passei o dia entendendo
os ritmos, as ruas, achando amigos, ouvindo histórias.
Inicio da noite, encontro o Fernando e o Jader, me mostram algumas coisas que já tinham
visto (a casa da Sony e umas instalações incríveis com luz e vários rolê) e eu com um plano em mente: ver a Kaki King. Cê sabe quem é a Kaki? Ela tocou no Brasil dias depois que a vi ali, é uma mina incrível, violonista fingerstyle, faz um show bem bonito onde existem umas projeções no violão Ovation branco que ela carrega. Consegui uma foto. Ela começou me seguir no Instagram, eu morri!
Bike pra casa, vou mover minhas coisas de lugar agora, minha malta de Portugal chegou! ♥
Os lindos da Omnichord Records, meu selo português, já estão em Austin: Surma — Debora Umbelinos para os íntimos, Hugo Ferreira — diretor e dono da porra toda e Paulo Pereira — técnico de som com uma sensibilidade sem fim.
Devidamente instalados no hotel que vamos passar a próxima semana, que saudade eu tinha desses amigos do coração! Ps: o hotel é exatamente aqueles motéis de beira de estrada super americanos onde todo mundo morre ou onde o fugitivo da CIA vai ficar. Adoro.
Dia 3
Café da manhã: waffle com syrup, maçã e café com leite e baunilha. Mil cereais, daqueles
que os americanos bem sabem como fazer, mas a máquina de fazer waffle me entreteve
infinito.
Descemos, eles pegam credencias, vamos andar por aí, pra eles reconhecerem o território,
mesma coisa que fiz no dia anterior. Nesse dia eu tenho um show, no fim da tarde, é pro Flatrr, uma startup alemã que fazia seu lançamento durante o festival e me convidou (pelo Twitter, amo) pra ser a atração musical deles. Foi fofo, rendeu matéria linda pra The Drum e amigos novos, yey!
Nesse dia Pussy Riot tocou, mas eu cheguei tarde, nas idas e vindas com instrumentos do
local do show pro hotel. Chego a tempo de ver a Surma tocar, logo depois de Pussy Riot, em um lugar lindo! O show foi emocionante demais, pelo amor da deusa, ouça, se você ainda não ouviu! (E veja ao vivo em dezembro, quando faremos uma mini tour pelo Brasil juntas, mas é segredo).
Conheço na fila do banheiro: um fotógrafo fofo e incrível, uma garçonete de Chicago que
vem há 6 anos pro festival ver todas as bandas possíveis e a mãe de uma menina que toca
guitarra em uma banda de punk de L.A. Quão maravilhoso é isso?
Passo também pelo show do Jose Biggs, do Chile — me conectei com mil artistas de vários
países antes de sair do Brasil, essa vontade de juntar que eu tenho me deixa com esse fogo no rabo de querer ver, ouvir e falar com todo mundo.
Absolutamente felizes e cansados, hotel e cama.
Dia 4
Acordamos com o foco em aproveitar o dia na convenção, as palestras, principalmente.
Me separo deles, que tinham outros focos, e vou pra palestra DIY: o melhor jeito de lançar
sua música por sua conta. Cês sabem que eu amo tudo que é DIY, sai dali inspiradinha de
novo. Blockchain, Bitcoin, mil discussões sobre criptomoedas e o futuro da música, socorro.
Tentei o papo com a Kim Deal (Pixies, The Breeders), mas claro que estava lotado. :/
Nesse dia saiu uma matéria incrível pelo site Remezcla, que escreve sobre artistas indie
latinos, indicaram meu show e me compararam com a Annie Clark (St. Vincent). Eu morri de novo? Morri sim.
Tudo é muito sofrido, porque você quase nunca vai conseguir ver o que você quer, palestra, debate ou show… not gonna happen.
Com os dias se entende que é isso, o lindo é ter alguns focos mas também saber dizer sim
pra momentos que podem te fazer conhecer gente MUITO incrível. Quarta era meu único dia livre da semana, fui intensamente pra shows com amigos, yas! Bandas que não faço ideia do nome e vou pesquisar assim que chegar em casa e respirar, 10 minutos em cada venue, vimos uns 8 assim. Vimos também a Papisa, a querida amiga Rita Oliva, que fez um show lindo no CU29.
Pizza: uma vez na semana e já é o suficiente pra entender como é junkie! Porém bem conveniente e das coisas mais baratas no centro. Hotel, e-mails que não param, vida no Brasil que não para pra te deixar viver aqui, né?
Dia 5
Dia de show, decido correr de manhã pra energizar um pouco mais, ainda faz um
friozinho. É a manhã que amarga o assassinato de Marielle Franco e é tudo muito triste. Me culpo por não estar na rua com todo mundo que tomou ela nesse dia e no dia seguinte e tentei fazer minha parte mesmo à distância.
O dia correu cinza e a sensação de que estão silenciando quem briga por uma vida melhor não só pra si, é isso que dói e o choro é inevitável demais.
Eu tive a linda sorte de, nesse dia, ter agendada uma entrevista pro Owen do canal de
televisão CGTN America, e iríamos falar do #MeToo, o movimento que teve início em Hollywood durante o Golden Globe, e falaríamos também da repercussão disso no Brasil e
eu falando também de outros movimentos feministas que temos nesse momento no nosso
país, como o Festival Sonora SP — que faço com um monte de mina incrível, o grupo As
Mina Tudo e tantos outros mais. Falei de Marielle e Anderson e do que estava acontecendo
nesse momento no Brasil e foi muito importante poder ter essa voz em rede nacional por lá, fui grata ao Owen por esse espaço e tanto respeito com o tema.
Encontro outros brasileiros que estão na mesma sintonia e passo o dia com eles. Foi quase
impossível focar no festival e me deixei levar, foi importante respeitar esse luto e ficar um
pouco mais em silêncio. Meu show oficial dentro do festival foi nesse dia, passei o dia mexida demais e sabia que o show tinha que ser com muita força, então foi preciso coragem. Dedico o show à Marielle Franco e ao Anderson. Tem muita gente sentada e ouvindo.
Voamos.
https://www.youtube.com/watch?v=wwDGCtFfi5o
Dia 6
Faz calor no Texas! Acordo com as notícias das ruas do Brasil tomadas e isso é emocionante demais de ver! ♥
Logo que desço ao ACC, vou a um meeting de produtores e artistas com foco em world music, hosted pelo Ron e pelo Peter, da WOMEX, onde conheço muita gente linda e ativa, incluindo uma moça do Google — que explicou como fazer pra conseguir editar as buscas do seu nome no site e umas artistas incríveis, que já quero ouvir pra deixar na mira do Sonora SP desse ano.
Saindo de lá vou à palestra que se deu pra falar sobre o assassinato de Marielle e Anderson
e as reflexões disso para o Brasil agora, com Fabiana Batistela e Liniker na mesa. Falas extremamente emocionantes, meu coração apertado não segura. Abraços sinceros e demorados em amigos que sentem o mesmo e estão ali, com o mesmo coração. Falar sobre esperança também é importante.
Saio de lá pro hotel e depois de algumas horas vou pra outro show, dessa vez no Whip In,
contando com a ajuda do incrível técnico de som da Ominchord, Pereira. Som impecável, ficar cômoda e segura em palco muda tudo, tudo!
Dediquei a música “Quiçá” à Marielle e assim que acabei de falar eu não consegui de jeito
nenhum segurar o choro, comecei a música chorando e acabei ela chorando, foi forte esse momento. Acho que eu nunca tinha tocado chorando assim em palco. “Quiçá” nasceu no meio de um choro e ela pra mim é uma oração mesmo, desejo de que as coisas sejam mais leves.
Nessa noite Sylvan Esso tocou, não conseguimos ir, lotou rápido demais. Circulamos por um show ou outro ali pelo centro, nesse ritmo vimos o italiano Fabrizio Cammarata — que já é um bom amigo agora –, e o incrível DJ português Holly, além do show da Entropica do Chile.
Hotel — que a essa altura já chamávamos de casa — em seguida uma parada rápida no Star Seeds, um café 24h famoso por ser o fim de linha de todos os shows e festas de Austin nos anos 90.
Dia 7
Clima de último dia de festival, já iniciando aquela arrumação de mala, algum cansaço e alguma obrigação de respirar, porque os dias seguintes ainda serão de movimento e shows por outras cidades, então passo a manhã no hotel.
Divulga show aqui, falo com amigos pra nos despedirmos ali, nisso saio pro meu quarto e último show no festival, dessa vez no Sahara Lounge. Chego e monto rápido meu set, a banda acaba e já ocupo o palco, faço um checkline mega rápido e começo. O bar é exatamente esses bares de estrada que a gente vê em filme americano, aquelas luzes coloridas, o quintal de terra com food truck (não o gourmet que a gente vê por aí, o troo).
Faço um set um pouquinho mais curto que andava fazendo durante a semana e acabando já saio correndo pra próxima banda tocar. O mais bonito desses shows dessa semana? A receptividade linda que as pessoas andam tendo, mesmo não entendendo as vezes o que to dizendo (componho em espanhol e em inglês, mas pra esse show a maioria era em
português mesmo), todo mundo estava ali e muito afim de ouvir o que aconteceria a seguir.
Vendo discos (yay!), troco cartões e saio correndo pro hotel, deixo as coisas e disco pro centro, show da Surma no Hideout, lugar incrível! Jantamos, tento ajudar no que posso e ela começa, destróóóói tudo! Em seguida os mexicanos da banda de post rock De Osos tocam, destruindo também e a seguir uma banda com 12 integrantes ataca.
Felizes, missão cumprida, rumamos pro hotel e pro Star Seeds de novo, a última apple pie
antes de dormir duas horas pra pegar o ônibus pra Nashville.
Aventuras, emoções, shows incríveis, pessoas lindas, pores de sol memoráveis, ideias infinitas, conexões de verdade e abraços sinceros, é o que vou levar do SXSW 2018.
Muito feliz, saio de Austin às 4h30 do domingo. Nashville e New York esperam. ♥