Este ano, vimos o fim do grupo carioca O Rappa, uma das mais importantes bandas brasileiras dos últimos 20 anos.
Apesar de um término não muito harmonioso, nada é capaz de apagar o legado que a música do grupo deixou para a cultura brasileira. Foram anos de hits que contagiavam a população nacional em massa, dominando as rádios e várias playlists por aí.
Se foi a voz de Falcão, as composições feitas por ele e pelo ex-integrante Marcelo Yuka ou a estética do grupo, não sabemos. Mas não são apenas os sucessos autorais, como “Me Deixa“, “Lado A Lado B” ou “Anjos (Pra Quem Tem Fé)” que merecem destaque. Ao longo da carreira, O Rappa homenageou grandes nomes da nossa música através de versões com a sua sonoridade. O que o grupo fez foi apresentar uma roupagem diferenciada, em arranjos animados e dançantes, para sucessos do samba e da MPB.
É claro que o grupo já fez outras covers sensacionais, como a “versão brasileira” de “Hey Joe“, de Jimi Hendrix (que contou com a participação do grande Marcelo D2), mas aqui falaremos apenas dos tributos prestados à música nacional.
E vamos lá!
“Ilê Ayê” (Paulinho Camafeu)
Em 1975, surgia na Bahia um dos blocos carnavalescos mais importantes para a história social do país: o Ilê Aiyê. Foi o primeiro bloco afro do carnaval de Salvador. A expressão, que em iorubá significa “pátria para sempre” não tardou para logo entrar na pauta das discussões raciais no Brasil. Hoje, é considerado patrimônio da cultura baiana.
O ano de nascimento do Ilê Aiyê foi também o ano de nascimento de uma conhecidíssima canção carnavalesca, “Que Bloco É Esse“, de Paulinho Camafeu. Dois anos depois, a canção foi gravada por Gilberto Gil para o álbum Refavela, com o nome “Ilê Ayê“, homenageando a luta dos negros. A canção já ganhou também uma versão feita por Criolo.
O Rappa regravou a canção, dando a ela uma interpretação reggae/rock/rapcore. A gravação faz parte do álbum Rappa Mundi, responsável pela definitiva explosão da banda nas rádios.
“Vapor Barato” (Gal Costa)
Também lançada na década de 70, “Vapor Barato“, canção composta por Jards Macalé e Waly Salomão, ganhou o coração de muitos na voz da intérprete original, Gal Costa. Aparentemente, também contagiou O Rappa.
Uma das melhores releituras da música brasileira, a homenagem entrou também para o icônico Rappa Mundi. A animada versão revitalizou a música, que voltou às rádios no ano da releitura.
Muita gente por aí ainda acha que a música é de autoria da banda.
“Deus Lhe Pague” (Chico Buarque)
Agora o sentimento é político. Carregada de severas críticas ao regime militar, “Deus Lhe Pague” é uma das músicas que Chico Buarque compôs durante seu exílio na Itália. A faixa integrou originalmente o álbum Construção, de 1971, momento marcado pela consolidação de sua vertente crítica.
A pesada roupagem que O Rappa atribuiu a esta canção nasceu em 2003, com o lançamento de O Silêncio Q Precede O Esporro. O álbum foi o quinto do grupo, e o primeiro sem as composições de Yuka. A regravação se saiu como um dos maiores frutos do álbum, junto às autorais “Reza Vela“, “Rodo Cotidiano” e “Mar de Gente“.
“Take It Easy My Brother Charles” (Jorge Ben)
O cantor Jorge Ben foi um dos precursores do movimento que concretizou o que conheceríamos a partir de então como MPB. E ele também foi alvo das belas homenagens d’O Rappa.
No homônimo álbum de estreia da banda, a canção “Take It Easy My Brother Charles“, originalmente lançada em 1969 no álbum Jorge Ben, se fez presente como uma das duas únicas canções que não são de autoria do grupo. A regravação fez questão de manter as características frases de metais da versão original, apesar de uma roupagem reggae.
https://www.youtube.com/watch?v=ioC4-X9EyJ0
“Candidato Caô Caô” (Bezerra da Silva)
A outra homenagem feita pelo O Rappa em seu álbum de estreia também merece espaço na lista. Trata-se de uma cover de “Candidato Caô Caô“, composição de Walter Meninão e Pedro Butina que ficou marcada na voz do cantor pernambucano Bezerra da Silva.
A música possui a atemporal temática da insatisfação política. Incluir essa releitura no primeiro álbum de estúdio serviu como uma forma de deixar claro que estava nascendo ali um grupo critico, tanto política quanto socialmente. E isso só ficou cada vez mais evidente a cada trabalho lançado.
A gravação, inclusive, tem a participação do próprio Bezerra, que introduz a faixa e reveza versos com Falcão. A regravação deu um novo olhar à música. Do samba, a nova versão passou para uma roupagem reggae.
Bezerra voltou a ser saudado pelo O Rappa em 1999, quando o grupo lançou seu terceiro álbum de estúdio, Lado A Lado B. A música a ser homenageada, dessa vez, foi “Se Não Avisar O Bicho Pega“. O samba da versão original foi transformado em rock experimental.
Vale a comparação:
https://www.youtube.com/watch?v=XIX80f5NT9w