Entrevistas

Festivais, carreira e "lacração": conversamos com Benke Ferraz, do Boogarins

Conversamos com Benke Ferraz, guitarrista do Boogarins, que falou desde Raimundos até carreira da banda em um papo divertido.

Boogarins
Foto: Banda / Facebook

No próximo final de semana, dia 25/08, irá acontecer a primeira edição do Queremos! Festival.

Uma das atrações do evento será a banda goiana Boogarins, que levará todo seu rock psicodélico repleto de influências brasileiras à Marina da Glória.

Antes do evento, nós conversamos com o guitarrista Benke Ferraz a respeito da carreira, dos shows e das influências da banda, e você pode ler o resultado logo abaixo.

Entrevista por Nathália Pandeló Corrêa

TMDQA!: O Lá Vem A Morte tem um lado filosófico muito difícil de dissociar dessa sensação de caos instaurado e generalizado da atualidade. Apesar de tocar em alguns demônios pessoais e coletivos, as músicas não são necessariamente pesadas ou melancólicas. Como vocês encontraram esse equilíbrio no tom do álbum?

Benke: Acho que é parte natural do modo como vivemos e fazemos nossas músicas. As melodias chegam naturalmente com as palavras e fonemas, então tanto uma coisa quanto a outra vão soar de certo modo meio misturado, e independente do que está sendo dito, o seu ouvido te leva a apreciar o conjunto antes de realmente se ligar na temática.

Musicalmente falando, as ideias que usamos e desenvolvemos geralmente têm espaço para repetições infinitas e construções de camadas. A coisa naturalmente vai para um lado onde as melodias e a levada te tiram essa sensação de tempo e espaço… para além das texturas e efeitos malucos. São músicas que podem te colocar em certo modo de transe: introspectivo ou efusivo.

TMDQA!: Vocês definiram o Lá Vem A Morte como um curto LP e um longo EP, o que faz total sentido. Pensando nem tanto na forma como se consome música hoje em dia – senão todos os lançamentos seriam singles! – e mais no próprio processo criativo de uma banda, vocês consideram outros formatos para lançar os próximos trabalhos, talvez fugindo um pouco do disco mais tradicional?

Benke: Não consigo pensar tanto em outros formatos pra além disso que você mencionou já… discos, EPs, singles. Adoraria fazer coisas para experiências em realidade virtual, porém mais do que o formato de lançamento, o que importa mais pra gente é a circunstância em que cada trabalho é produzido.

Ano passado produzimos um filme com a VOID e toda trilha sonora é composta por músicas praticamente todas feitas na hora, já à frente das câmeras, sendo gravadas durante quatro dias em fita cassete pelo Lê Almeida. Então o produto final virou uma mistura desses temas e tocamos nesse modo meio de loop no qual improvisamos e foi lançado no nosso bandcamp somente, sem disseminar em todas plataformas.

Meio parecido com essa proposta de se juntar em um ambiente novo e compor e gravar coisas totalmente novas com limitações específicas, temos feito algumas “oficinas” abertas ao público, falando um pouco sobre nosso processo e depois criando canções usando só o gravador do celular.

TMDQA!: Esse disco mais recente passa a sensação de vocês estarem desconstruindo a sonoridade da banda, sem seguir regras ou padrões – ao mesmo tempo que constroem também, somando as várias camadas de samples, vozes, ruídos, etc. Mais do que as provocações na parte lírica do trabalho, o que vocês buscavam em termos de som pra esse novo passo do Boogarins?

Benke: Depois de gravar o Manual praticamente todo ao vivo e analógico, onde os resultados soaram mais como uma versão ao vivo mais cristalina do que fazíamos na época, acho que só buscávamos fazer algo que fosse mais moderno – o corpo e a estética que vieram aliadas a essa procura foram “acidentes” de percurso. Nos instalamos numa casa em Austin por um mês e alugamos equipamentos suficientes para gravar tudo em boa qualidade e também poder experimentar equipamentos que nunca havíamos usado antes. Então ao mesmo tempo em que estávamos usando o material e o espaço para o bem, também tivemos tempo de sobra pra alguns coisas e exageramos experimentando e virando botões. Daí os sons finais variam entre resultados semi-cristalinos ou totalmente sujos, mas com uma qualidade diferente que só equipamentos de alto padrão te dão.

TMDQA!: E vocês já desenvolvem material novo para um próximo lançamento?

Benke: Já sim, claro!

 

TMDQA!: Num episódio recente do nosso podcast, chegamos a citar o Boogarins como um exemplo de banda brasileira que frequenta o lineup de festivais fora do pais, de certa forma representando uma nova onda de artistas daqui que vão além dos ritmos mais associados ao Brasil – samba e bossa nova, por exemplo. Com essa experiência, como vocês enxergam o lugar da nossa música para além das fronteiras? E como é conviver nesses dois mercados simultaneamente, o gringo e o nacional?

Benke: Nossa música e língua provavelmente são uma das mais apreciadas no mundo, depois do inglês e francês – tem muito espaço e oportunidades, só trabalhar mesmo e ter algo que convença, tenha personalidade (às vezes nem precisa disso também). Sobre conviver com os dois mercados, é complicado. Nessa nossa caminhada natural fora do país, acabou que nosso foco nunca ficou no Brasil e fora do Brasil, se você tem disciplina e boa música você consegue fazer um trabalho conciso de pequeno/médio porte a longo prazo, sem se preocupar necessariamente com um hype. Apesar de só cantarmos em Português, nunca pegamos pesado em divulgar nosso material aqui – com assessoria, posts patrocinados, anúncios, etc – e deixamos a coisa responder naturalmente ao que investimos de tempo e energia lá fora. O resultado após esses 5 anos de estrada é bem gratificante e nos deixa numa posição confortável pra seguir tanto um caminho quanto o outro… de lançamentos pretensiosos com divulgações mais massivas ou um simples post com a música, como fizemos com o Lá Vem a Morte.

 

TMDQA!: Mas voltando pro foco no Brasil: vocês vão tocar no Queremos Festival no fim de agosto, um evento que traz um certo fôlego a mais pra cena e público do Rio. Apesar de ser uma capital, não é incomum notar que a cidade acaba sendo preterida em várias turnês internacionais, por exemplo. Vocês são de um lugar que tem um dos festivais que mais fomentam a cena independente – o Bananada – e passaram (e continuam passando) por palcos assim até chegar no Coachella. Pela sua vivência no cenário, vocês sentem que há um mercado de festivais em expansão no Brasil? Essa é uma iniciativa importante pra formação de público?

Benke: O mercado de festivais está em expansão há décadas já, os produtores batalham pra se manter e manter seus festivais vivos na verdade. Acho que a batalha é conseguir se manter relevante e vivo. A formação de público hoje, pra mim, se dá de várias formas – não simplesmente trazendo artistas pra tocar na cidade. O festival tem que realmente falar com a cidade e tentar se inserir no dia a dia do jovem, estar presente e promovendo discussões pra fortalecer uma consciência geral. Hoje em dia, com a divulgação e feedback sendo praticamente todo online, é muito fácil comentários negativos e posts mal articulados (porém “lacradores”) gerarem mais barulho do que o próprio esforço do festival de trazer artista X pela primeira vez para a cidade. Hoje, todo mundo que cria corre esse risco: ver seu trabalho virar coadjuvante ou palco para polêmicas baratas em meio a uma lógica burra de se consumir entretenimento.

 

TMDQA!: Por fim, perguntamos aos artistas com quem conversamos sobre os álbuns que sempre ouviram ou ouvem no momento. Como falamos bastante do Lá Vem A Morte, poderiam contar pra gente quais discos vocês mais ouviram durante a composição e gravação e que mais influenciaram o resultado final?

Benke: Na casa rolava de tudo. Fazíamos longas pausas pra jogar truco e ouvir música nostálgica e saía muita pérola: de Raimundos ao vivo em Curitiba até coletânea do Gigi D’agostino. Eu forço a barra bastante e sempre fico empurrando os discos que to gostando, na época o Life of Pablo [Kanye West] tava bombando, mas também rolava muito os trabalhos dos irmãos do The Garden, Puzzle e Enjoy.

 

Queremos! Festival

Queremos! Festival 2018

A edição de 2018 do Queremos! Festival terá dois palcos e 12 horas de shows com Animal Collective, BaianaSystem, Cut Copy, Father John Misty, Ionnalee/Iamamiwhoami, Letrux, Nepal, Rincon Sapiência, Selvagem, Rubel e Xênia França, além, é claro, do Boogarins.

Os ingressos estão no segundo lote com meia entrada a R$ 160,00, mesmo valor do ingresso solidário comercializado para quem levar 1kg de alimento no dia do evento.

Você pode comprar seu ingresso por aqui.