Texto por Stephanie Hahne e Tony Aiex
Mesmo estando apenas na sua quinta edição, o Oxigênio Festival já virou um evento tradicionalíssimo para os fãs do hardcore em São Paulo.
Neste ano, pela primeira vez com três dias de duração, o festival só reforçou sua importância e, também, provou por que merece o apelido de “Warped Tour” brasileira. Com apoio também da VANS, o evento dividido em dois palcos — e com um ritmo frenético de shows — levou milhares ao Via Matarazzo, na Barra Funda, e ofereceu uma experiência completa para quem é fã de punk rock, hardcore e estilos que estão bem próximos a eles.
Pista de skate, barracas com camisetas de banda, merch acessível e um cardápio com opções vegetarianas foram apenas algumas das atrações que divertiram a galera de 07 a 09 de Setembro, com público de 2 mil pessoas em cada dia.
No line-up, entre bandas nacionais e internacionais, antigas e novas, estavam nomes como Dead Fish, CPM 22, Fresno, Deb and the Mentals, Pense, Chuva Negra, Inocentes, Zander, Menores Atos, Far From Alaska, Flicts e muitas (mas muitas mesmo) outras atrações que fizeram o público cantar, pular, suar, moshar, chorar, entre várias outras emoções que tomaram conta do evento.
Em tempos de “o rock morreu” é sempre interessante visitar eventos como esse para entender as cenas, tanto regionais quanto de estilos musicais, e perceber que na prática os realizadores, aqueles que realmente querem ver acontecer, não estão nem aí para o senso comum ou o que os que não têm o mínimo interesse de construir dizem por aí.
Estar no Oxigênio foi como uma viagem no tempo para o final dos anos 90 e início dos anos 2000, onde Punk Rock e Hardcore ditavam a regra da música alternativa brasileira e eram extremamente populares, mas também foi, desculpem o trocadilho, uma injeção de ar e uma bela tomada de fôlego para sacar que tem muita gente saudosista, sim, mas também tem toda uma nova geração tanto de público quanto de bandas com sangue nos olhos para fazer acontecer, aprendendo com o passado, não se importando com as dificuldades do presente e mirando o futuro. O legado da “velha” cena, aliado à nova geração, é revigorante.
Abaixo, descrevemos pra você um pouco do que foram todos os dias de Oxigênio Festival. Ao final de cada tópico há uma galeria de fotos inéditas do evento.
Divirta-se!
Primeiro Dia
A sexta-feira de Independência do Brasil começou animada no Oxigênio.
Quem deu o pontapé inicial aos trabalhos foi o Depois da Tempestade — banda escolhida através de uma votação no evento oficial do festival — no palco Side Stripe, enquanto no Off The Wall o Álamo começava a esquentar o palco principal.
Ao longo do dia, bandas como Camarones Orquestra Guitarrística, Ravel, 2 Step Flow, Black Days (com um show intenso), Hateen (com uma plateia que cantava tudo), Esteban (acompanhado de perto por muita gente que cantou e se emocionou do início ao fim) e mais se revezaram entre os dois ambientes do local, fazendo com que os fãs transitassem incessantemente por entre as portas “vai-e-vem” da casa — um perigo para os mais desavisados, devo acrescentar aqui.
Alguns dos destaques do dia ficaram com os shows do Bullet Bane, que após a saída do vocalista Victor Franciscon contou com a ajuda de nomes como Cyro Sampaio (menores atos) e Bruno Figueiredo (Black Days) para cantar as canções do grupo; e o Dinamite Club, que infelizmente perdeu seu guitarrista Leon Martinez para um câncer neste ano — durante a apresentação, a banda manteve a guitarra do músico no palco, e ainda dedicou o show à família de Leon, que estava na primeira fila da plateia. Emocionou até os mais durões dos punks por ali.
Quem também fez um showzão foi o Far From Alaska, apresentando seu disco Unlikely (2017) para uma plateia animada e que cantou todas as músicas, bem como Glória e o Hateen, que tocaram quase ao mesmo tempo nos dois palcos. Antes do headliner tomar conta do Off The Wall, a banda americana The Movielife apresentou seu som a um público receptivo. A todo momento, o frontman agradecia pela oportunidade de estar ali, e ainda tomou um tempo para zoar a cerveja “brasileira”.
A responsável por fechar a sexta-feira foi a Fresno, ao som de gritos ensandecidos de seus fãs mais fieis que esperaram ali quase o dia todo pela banda. Com um setlist abrangendo toda a carreira, mas com um destaque especial para A Sinfonia de Tudo Que Há (2016), o grupo liderado por Lucas Silveira fechou com maestria a primeira noite do Oxigênio.
Segundo Dia
O segundo dia de Oxigênio começou com uma pedrada feminina — as quatro primeiras bandas a tocarem tinham mulheres, e quem abriu foi a Cosmogonia, que levantou a galera que ainda estava um pouco tímida. O Manger Cadavre e o Mar Morto, ambos comandados por vocalistas mulheres, também atraíram os aplausos da galera e nos impressionaram. Uma presença interessantíssima que mostra que o festival absorveu críticas construtivas do passado sobre a falta de mulheres no line-up.
A festa continuou com o Water Rats fazendo uma apresentação caótica (no melhor sentido da palavra) no palco secundário, apenas para dar espaço depois a uma série de bandas históricas na cena do hardcore. A batelada veio com shows seguidos do Agrotóxico, Statues on Fire, Excluídos e Carbona, do RJ, que teve Fred Castro (de nomes como Raimundos e Autoramas) na bateria e participação especial de Tor, do Zumbis Do Espaço, em um dos shows mais animados do evento.
O dia ainda contou shows d’Os Thompsons, Menores Atos — que tocou em um palco lotado e foi acompanhado pelo público tanto nas músicas já clássicas do seu repertório quanto nas mais novas –, a aula que sempre é um show do Zander e, lá no palco principal, o Garotos Podres. E, aliás, nós precisamos falar do show do Garotos Podres.
Sem medo algum de expressar sua opinião, a banda comandada pelo icônico Mao fez uma série de discursos políticos — todos contra o fascismo e alguns exaltando o comunismo — e, para a surpresa de muitos, foram celebrados pela grande maioria da plateia ali. Isso é uma resposta, talvez, à “teoria” de que o rock esteja cada mais conservador, algo que não é ao todo mentira. Mas no Oxigênio, em quase todos os shows, o discurso seguia este mesmo caminho — alguns não tão explícitos quanto os do Garotos Podres, outros quase lá. Nos mostrou que a essência do punk e do hardcore continua ali, até politicamente falando.
O evento seguiu com shows do Gameface, mais uma banda gringa extremamente grata por estar ali, e terminou com a bagunça maravilhosa do Dead Fish.
A banda já havia sido headliner do evento no ano passado, mas é difícil se opor à decisão de repeti-los sempre que possível. A apresentação do grupo liderado por Rodrigo Lima resume com folga o que é o Oxigênio, o que a galera que está ali espera e o que é o hardcore na sua mais pura forma.
A roda não parou em nenhum momento do show, assim como os stage dives — mais contidos por conta do pit de foto — e, novamente, os discursos políticos apareceram. Em determinado momento, Rodrigo chegou a citar a facada no candidato à presidência Jair Bolsonaro, citando a “campanha de ódio” do político, e foi seguido de vários aplausos da plateia.
Pode repetir o Dead Fish sempre, Oxigênio, que a gente aceita!
Terceiro Dia
O último respiro da edição 2018 do festival veio com força. O domingo foi o dia mais animado e mais visceral do evento. Apesar de começar mais morno, as bandas 88 Não, Rebotte, Corona Kings e BRVNKS esquentarem a plateia que chegava no Via Matarazzo para passar o dia.
No palco secundário, o Deb and the Mentals levou toda sua energia para o público que já fazia volume. A frontwoman Deborah Babilônia, inclusive, chamou atenção para um garoto que estava em absolutamente todos os shows do festival, sempre no meio das rodas. Esse é o espírito!
No palco principal, porém, o Bayside Kings instaurava o caos. Logo no começo do show, o vocalista Milton Aguiar foi pra galera e ficou cantando lá de baixo mesmo, entrando nas rodas e deixando os fãs tomarem conta do microfone. Até quem estava mais de canto quis entrar, e esse definitivamente foi um dos shows mais animados (e caóticos) do Oxigênio.
A festa seguiu dançante com o ska maravilhoso do Skamoondongos no palco secundário e com o lendário Flicts no principal. Neste último dia, praticamente todos os shows tiveram pelo menos uma roda, e o público estava mais energizado do que nunca.
Enquanto o também lendário Inocentes incendiava o Off The Wall, o excêntrico Supla tomou o Side Stripe e até entrou na roda em determinado momento, para deleite dos fãs que estavam ali cantando todas. Encerrando os trabalhos no palco secundário, vieram o All The Hats e o sempre incrível Garage Fuzz, provando que dá pra fazer um show com ares gigantescos mesmo em um palco menor.
O evento ia chegando ao fim com o Chuva Negra, que além do showzaço cheio de canções cantadas a plenos pulmões pela galera — e alguns músicos que assistiam nas laterais dos palcos também –, levou as minas dos Cosmogonia e mais várias da plateia pro palco pra cantar junto, reafirmando mais uma vez o espaço merecido (e cada vez maior) das mulheres no hardcore. Showzaço!
O Oxigênio acabou com um repeteco do Pense, banda incrível que já se apresentou na edição passada e mais uma vez arrastou uma legião de fãs. Vale destacar aqui que a banda é uma das mais interessantes da atualidade e vê seu público crescendo por conta disso. Os responsáveis por fechar as portas foram os caras do CPM 22, com um set que misturava os maiores hits do grupo com músicas mais recentes.
A consideração final que fica é que o evento está se consolidando cada vez mais a cada ano. Tanto na organização do evento quanto aos shows em si, o público paulistano tem se entregado cada vez mais ao bom hardcore que temos de sobra por aqui — prova disso são os vários shows nacionais e internacionais pipocando neste segundo semestre.
Vida longa ao Oxigênio!