TMDQA! entrevista Titãs: ópera rock mostra versatilidade e energia dos integrantes remanescentes

“Doze Flores Amarelas” é um capítulo ambicioso para os Titãs, uma banda que não descansa; saiba como ganhar um DVD autografado!

(foto: Divulgação)
(foto: Divulgação)

Após 36 anos de carreira, 14 discos lançados e mais de sete milhões de álbuns vendidos, qualquer banda poderia se dar por satisfeita, excursionar apenas com seus hits e arrecadar dinheiro fácil. Principalmente uma que perdeu cinco (!) dos seus principais integrantes ao longo dos anos.

Sentado diante de Branco Mello, Tony Bellotto e Sérgio Britto, conheci o conceito de “febre criativa” e entendi o que os difere de “qualquer banda”. Os Titãs remanescentes receberam o TMDQA! para falar sobre o disco e o espetáculo Doze Flores Amarelas, uma ópera-rock que foi encenada ao vivo, misturando música, atuação e projeções, e virou um belo DVD.

A história acompanha três mulheres chamadas Maria que usam um aplicativo para encontrar uma festa, mas noite acaba muito mal quando as garotas são violentadas por cinco homens. Depois de vários conflitos morais, atritos familiares e julgamentos da sociedade elas se unem para conseguir vingança através do feitiço das “Doze Flores Amarelas”.

No palco, o projeto envolve ainda o baterista Mario Fabre, o guitarrista Beto Lee e as três vocalistas, Corina Sabbas, Cyntia Mendes e Yas Werneck, que interpretam as Marias. Os escritores e dramaturgos Hugo Possolo e Marcelo Rubens Paiva colaboraram para o argumento. Para fechar, Jaques Morelenbaum foi convidado para fazer arranjos de cordas nos vários interlúdios do disco, alguns narrados por Rita Lee.

Ao longo da entrevista exclusiva, Branco, Tony e Sérgio nos falaram sobre os desafios dessa nova formação dos Titãs, a presença de uma temática feminina no disco e as inspirações para músicas e letras pesadas, com forte teor político. Leia abaixo!

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O papo se alongou para além do Doze Flores Amarelas, e nós conversamos com os caras sobre os primeiros discos dos Titãs, a evolução das bandas de rock e o momento da música no Brasil. Tudo isso estará num episódio especial do podcast “A Melhor Banda do Mundo, Segundo Eu Mesmo”, que sai nesta quinta-feira (25/10).

Nós conseguimos um DVD autografado para os ouvintes, e vamos sortear junto com alguns itens da loja do TMDQA! Ouça o programa para saber como participar!

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Entrevista com os Titãs

TMDQA!: O disco Doze Flores Amarelas já é desafiador apenas por ser uma ópera rock, mas vocês ainda decidiram fazer dele um espetáculo encenado. A banda teve o auxílio de dois autores que têm experiência com teatro e cinema, e também conta com atrizes junto com vocês no palco. Ainda assim, qual o tamanho do desafio para os Titãs?

Sérgio Britto: Da nossa parte, como banda, a gente teve que se adequar. Essa ideia de ser um musical com a banda tocando, não tem muito modelo pra seguir. O Tommy, por exemplo. Tem o filme, mas nos shows o The Who apenas toca as músicas, não encenam nada e não contracenam com ninguém. Com o Green Day a mesma coisa. Então os diretores nos deixaram à vontade, nos deram algumas marcações, mas estamos basicamente tocando e só uma vez ou outra interpretamos personagens. O mais difícil pra mim foi me conter ao longo do show, saber que tenho que obedecer certas marcações.

Tony Bellotto: Foi estimulante, nesse sentido, porque o projeto não foi planejado pra ser assim. No começo, a gente se encontrava com o Hugo e o Marcelo pra bolar o argumento, e a partir daí fomos compondo as músicas. Mas a ideia era só gravar um disco de estúdio, como o do The Who. Ao longo do processo, com a chegada do Otávio Juliano (cineasta), que começou a dar ideias de cenário, projeção… aí pensamos em fazer a encenação, e o produto final acabou sendo o DVD. E o fato de tudo isso ser diferente e inédito realmente motivou a gente. Entramos numa “febre criativa”.

Branco Mello: O projeto foi se redesenhando a cada movimento. Quando o Hugo entrou pra direção, com a experiência de dramaturgia, ator, palhaço… o Marcelo é um cara de cinema, que fez o documentário do Sepultura e outros filmes, e a gente com nossa bagagem de shows. A mistura disso foi a grande descoberta. Tanto que o processo foi longo, foram quase três anos desde a concepção inicial.

TMDQA!: E mostra que é um projeto rico, que pode se desdobrar de várias formas. Nesse sentido, eu queria perguntar sobre o papel de vocês como integrantes da banda. De uns cinco ou seis anos pra cá, vocês têm usado músicos de apoio no palco, algo que era difícil de ver em um grupo que nasceu com nove integrantes. Também é o primeiro trabalho com o Beto Lee na guitarra base. O Sérgio está podendo demonstrar cada vez mais seu talento no piano, tocando os interlúdios do disco. O Tony faz vocais principais em uma faixa pela primeira vez. Como é pra vocês subirem pro show com essa formação?

Sérgio: Por causa das circunstâncias, a gente sempre teve que se reinventar. E temos gosto por isso. Esse negócio do piano, eu nunca toquei de fato nos Titãs porque nunca teve necessidade. Mas é muito bacana ter o espaço pra isso, ainda mais porque encaixou bem nesse momento. O Beto e o Mário (Fabre, baterista) encaixaram como uma luva, e eles também são membros da banda, mas não estão há tanto tempo quanto a gente, então a relação é um pouco diferente. Mas eles dão palpites nos arranjos, interferem e trabalham normalmente. Nós sempre estamos abertos a novidades, porque isso dá um frescor pro nosso trabalho.

Tony: A gente realmente começou com uma quantidade inusitada de integrantes, e agora existe um espaço maior pra cada um atuar. Essa coisa de eu cantar começou como uma necessidade quando o Paulo saiu, e se tornou um desafio novo. Dizem que “a necessidade é a mãe da invenção”. Acabou virando um novo elemento criativo e prazeroso. Chegou um momento em que a gente estava curtindo todas as funções novas.

Sérgio: Até porque óperas rock precisam ter um quê de musical. Desde o início pensamos em usar o piano mesmo pra dar uma sonoridade que remetesse a isso. Usamos um piano de meia cauda, um piano de armário… eu até toquei um cravo, que aparece escondido em alguns momentos do disco (risos).

Branco: E tudo isso acabou abrindo um novo leque pra gente, porque depois de 36 ou 35 anos de carreira…

Tony: É 36 mesmo, não adianta roubar um ano não (risos).

Sérgio: Você pode falar que é mais de 35… (risos)

Branco: Eu tô escondendo a idade, po! (risos) Mas a gente sempre teve essa vontade de não se repetir, achar uma sonoridade diferente, um pensamento diferente dentro do álbum. O Doze Flores Amarelas tem muitos “tentáculos” de novidade. E isso pra uma banda de 36 anos é muito estimulante.

TMDQA!: A história que vocês contam no disco acaba se desenrolando pra vários lados, mas a temática principal eu diria que é o abuso sexual, que é um problema que afeta principalmente as mulheres. Vocês têm no projeto várias mulheres envolvidas, como as atrizes Corina Sabbas, Cyntia Mendes e Yas Werneck, a Rita Lee fazendo narrações…

Branco: E tem na equipe toda, a produtora Ângela Figueiredo, a coreógrafa Olivia Branco, a co-diretora Luciana Ferraz… Quanto às atrizes, quando a coisa foi se desenhando, foi importante colocá-las cada vez mais em cena. Como elas estão interpretando as Marias, elas acabaram interferindo positivamente no desenho da história. Como eu disse, todo mundo que participou do processo acabou tendo uma importância grande no final.

TMDQA!: Mas vocês, como “a cara” dos Titãs, estão suscetíveis a críticas. E existem vertentes do movimento feminista que não aceitam que homens falem sobre esses temas. Como vocês lidaram com essa área que ainda é muito nebulosa no Brasil e no mundo inteiro?

Sérgio: A gente sempre procurou tratar desse tema com muito cuidado, porque ele é delicado e todas as posições merecem respeito. Por outro lado, seria impossível contar uma história sem falar através de personagens, que representam o nosso ponto de vista. E isso não é nada diferente do que se faz há séculos na literatura, no cinema… Então a gente se sentiu seguro porque estamos tratando do tema com verdade. E ele diz respeito aos homens também, porque são problemas do ser humano. É legítimo que as pessoas reivindiquem o que quiserem, mas nós não estamos tentando tomar o lugar de ninguém.

Tony: E o problema das mulheres é também um problema dos homens, porque você não consegue resolver as coisas sem olhar para o opressor, porque na maior parte dos casos o homem é o causador da violência. Então essa reflexão da nossa parte é interessante e também deve ser levada em conta.

Branco: E muitas mulheres se sentiram tocadas pela maneira como a gente compôs essas músicas. Antes da gente gravar o disco, tocamos três músicas no Rock In Rio. “Me Estuprem”, que foi uma das primeiras composições, teve um retorno super positivo do público. Existe uma delicadeza na música.

TMDQA!: De uns 5 anos pra cá, existe uma efervescência da discussão política no Brasil, e vocês desde o disco Nheengatu (2014) têm se posicionado mais agressivamente sobre isso. No disco novo, vocês também se mostram ligados à tecnologia, já que existe um aplicativo no centro da confusão toda da história. E agora nós chegamos ao ápice dessa instabilidade, com um segundo turno de eleições presidenciáveis bastante radical e com forte influência do digital. Um dos candidatos, inclusive, já fez apologia ao estupro em pleno Congresso Nacional, que é justamente o tema de Doze Flores Amarelas. Como vocês se posicionam nesse momento que pode ser determinante pro futuro do país?

Tony: Nós somos a favor das liberdades individuais. Além do estupro, a gente fala de religião na música “O Bom Pastor”, e o uso doutrinário e exploratório de muitas religiões, inclusive na questão da liberdade da mulher para o aborto. E desde o Cabeça Dinossauro (1986), com a canção “Igreja”, a gente já se mostra atento a isso. O próprio Haddad (candidato do PT à presidência) precisou ir à igreja durante a campanha.

Sérgio: Pra falar o óbvio, o Brasil está polarizado. E parece que quem não faz parte de um dos lados está órfão, ou está agindo de má fé, ou é ignorante. Acho que existe um terreno que dá margem a muita dúvida, e algumas coisas deveriam ser certas, como a luta contra qualquer tipo de preconceito.

Branco: Nós somos democratas, progressistas. Inclusive pregamos o respeito à opinião contrária. Muitos dos problemas nascem dessa intolerância que independe de partido, inclusive essa guerra que tomou conta das redes sociais, com famílias se desentendendo… eu procuro ficar muito longe disso.

Conversa completa no podcast

Quer ouvir tudo isso e mais 10 minutos de entrevista exclusiva? Aguarde o podcast “A Melhor Banda do Mundo, Segundo Eu Mesmo”, que vai ao ar nesta quinta-feira (25/10). Você pode ganhar um DVD autografado e itens da loja TMDQA!