Entrevistas

Conversamos com o Mumford & Sons sobre seu novo disco, “Delta”

Batemos um papo com o Mumford & Sons, que está se preparando para lançar seu quarto disco de estúdio no dia 16 de Novembro.

Mumford & Sons
Foto: Divulgação

Por Nathália Pandeló Corrêa

Parece que foi ontem, mas em 2019 o primeiro disco do Mumford & Sons completa 10 anos de lançamento. Sigh No More foi um importante marco na carreira dos músicos, mas também se tornou responsável por trazer ao mainstream um monte de artistas e bandas de inspiração folk — um efeito que se nota até hoje. Já Marcus Mumford e companhia seguiram lançando discos que ora mantinham essa aura banjo e suspensório, ora trocavam o violão por guitarras e um som mais encorpado.

O novo e quarto disco, Delta, combina esses dois aspectos no que parece uma progressão muito natural para a banda. Wilder Mind, o trabalho anterior, já buscava mais peso nos arranjos, ao mesmo tempo que flertava com o desconhecido. As letras, mais subjetivas, faziam menção a lobos, bestas, monstros, uma selvageria interna que, curiosamente, despiu a banda de seus refrões cantados a plenos pulmões dos discos anteriores. Com uma sonoridade mais sóbria, ficou clara a influência do rock e blues que sempre estiveram lá.

Delta vem para construir uma ponte entre a pureza dos arranjos de Sigh No More e o animalesco revelado em Wilder Mind. Balançando nesse encontro de águas, canções como o single “Guiding Light” e a faixa de abertura “42” entregam um lado mais solar, ao mesmo tempo que “Picture You” e o segundo single, “If I Say”, mostram um aspecto melancólico que na verdade permeia todas as letras. Entre elas, “Darkness Visible” se torna uma vinheta ao mesclar uma instrumentação barulhenta que contrasta com a leitura de um trecho de “Paraíso Perdido”, poema épico do século XVII escrito por John Milton. Igualmente diferente é o uso de batidas eletrônicas em “Beloved” e “Woman”, por exemplo – uma contribuição do produtor Paul Epworth (Babyshambles, Bloc Party, Adele, John Legend, Paul McCartney).

Acompanhando o lançamento de Delta, o Mumford & Sons sai em turnê com 60 shows em treze países. O TMDQA! conversou com o baixista Ted Dwane sobre este novo momento da banda.

Confira após o player.

TMDQA!: Oi Ted, como vai? Obrigada por seu tempo e parabéns pelo disco!

Ted Dwane: Obrigado! Você ouviu?

TMDQA!: Sim! Bem, chegou ontem à noite, então eu só ouvi duas vezes por enquanto.

Ted: Legal, fico curioso pra saber o que as pessoas acharam.

TMDQA!: Então vamos lá: eu acho interessante como vocês trilham aquela linha tênue entre algo intimista e explosivo, épico. Sabe do que estou falando? Algumas músicas super delicadas, minimalistas no arranjo, harmonias bonitas… E outras que explodem em tantas camadas que dá pra imaginar na hora que vai ser uma boa de ouvir em festivais, arenas cheias. E sei que chegando em Novembro, vocês vão fazer exatamente isso pelos meses seguintes. Mas eu tive a impressão — e me corrija se eu estiver enganada — que, de certa forma, o Delta é como se o Sigh No More conhecesse o Wilder Mind e eles fizessem um bebê (risos). Parece um retorno ao lar, mas ainda mantendo o lado mais complexo e intenso do último disco.

Ted: Nossa… Acho que é bem isso mesmo! (risos) É encorajador quando ouço alguém descrever o disco dessa forma, porque é muito importante pra gente manter a essência de quem nós somos, e parte disso está nos discos que você citou. Quando a gente embarca nessa jornada de escrever músicas, escolher um produtor, gravar e tudo mais, não há necessariamente um destino em mente, sabe? Éramos quatro pessoas tentando explorar sua sonoridade, levá-la a outros lugares. É uma espécie de aliança, de troca de confiança ali e é importante que isso transpareça. Achei legal essa comparação.

TMDQA!: Ah, que bom! Achei melhor perguntar, porque eu posso ter tido a sensação e vocês estavam mirando em algo completamente diferente (risos).

Ted: Não! (risos) Acho que estamos na mesma página.

TMDQA!: Falando de Sigh No More… Cara, lá se vão 10 anos! Vocês planejaram alguma edição especial do disco pro ano que vem? E agora que vocês já estão mais maduros por estarem na estrada há tanto tempo, há algo que você sabe hoje e que gostaria de ter sabido quando vocês começaram?

Ted: A gente não chegou a conversar particularmente sobre algum tipo de comemoração para o Sigh No More, pelo menos por enquanto. Estamos bem focados no disco novo e normalmente não somos pessoas muito nostálgicas mesmo. Claro que temos orgulho desse álbum, ele foi muito importante pra gente, ainda tocamos as músicas dele nos shows. Imagino até que a gente vá fazer alguma coisa pra comemorar a data, mas por enquanto ainda não está definido. Agora, se eu pudesse voltar no tempo e levar um conhecimento comigo… Olha, acho que não ia fazer nada de diferente. Desde o início, a gente se motiva pelo amor que temos à música, é algo simples e puro. Acho que conseguimos nos manter fiéis a isso, mesmo nesse mundo caótico. Temos um bom relacionamento com a gravadora, bons empresários que nos ajudam a manter esse foco. E temos a oportunidade de fazer o que amamos, e ir ao Brasil e tudo mais. É um grande privilégio!

TMDQA!: Falando nisso, eu tive a oportunidade de falar com você quando vieram ao Rio durante a turnê de Wilder Mind — uma noite que dividiram com Florence + The Machine, lembra? E eu estava tentando buscar o significado das letras, do título do disco e tudo mais. E você basicamente me disse: “significa o que você quiser que signifique”. Então queria dar continuidade a isso, te devolver a pergunta e saber o que Delta significa pra você. Todos sabemos o que a palavra é — da aula de geografia, ou de matemática. É a quarta letra do alfabeto grego, é o quarto disco de vocês, etc. Mas indo um pouco além, queria que você falasse um pouco sobre como chegaram nesse título, e o que esse disco significa pra vocês no ponto que estão agora da carreira.

Ted: Sim, pois é. Na verdade, o Marcus teve essa ideia do título. Ele chegou no estúdio um dia de manhã, falou que tinha uma sugestão para o nome, todos gostaram, e foi isso. Já o disco em si, eu sinto que muitos dos tópicos que discutimos têm a ver com esse momento que estamos. Nos últimos anos, nós tivemos que lidar com morte, divórcio, nascimento… Então tem um pouco a ver com abandonar essa sensação de segurança. Combinando com aquilo que estávamos falando um pouco antes, da parte sonora do disco, sinto que esse trabalho expande o que já vínhamos fazendo. É uma forma de se soltar no que é selvagem e desconhecido, sabe? A atmosfera desse disco tem muito a ver com isso, acho.

TMDQA!: Ao longo dele, vocês trabalham bastante com o conceito de luz e escuridão. O que fez vocês optarem por usar aquele trecho de “Paraíso Perdido” em “Darkness Visible”? Foi algum tipo de referência para comporem o álbum?

Ted: Sim, esse é um ótimo ponto. Legal que você notou, a maioria das pessoas ainda não está notando (risos). Mas é bem isso que você estava falando, de contrastar luz e trevas. Você conhece Stranger Things, a série?

TMDQA!: Conheço sim!

Ted: Então, aquela parte que eles vão para o mundo invertido é uma boa associação com o que estávamos pensando. Porque “Picture You” é uma música sobre a escuridão estar a apenas um passo de distância, sabe? Quando você consegue sentir ela se aproximando e se agarra uma pessoa que tem aquele efeito positivo na sua vida e é uma forma de escape emocional. E o Gill Landry, um músico muito talentoso de New Orleans, gravou pra gente essa passagem de Paraíso Perdido. Tem uma citação que é algo do tipo “a mente é o seu próprio lugar, e dentro de si / Pode fazer um inferno do céu, do céu um inferno”. Acho que “Picture You” tem muito a ver com isso, então fez sentido incluirmos. Acabou sendo muito divertido de gravar, a gente se encontrou no estúdio, trocou uma ideia e fez um som muito louco (risos).

TMDQA!: E completamente diferente de tudo que vocês já fizeram, né?

Ted: Sim, é verdade.

TMDQA!: Curioso você falar que não estava muito claro onde iam chegar com o álbum, porque eu tive a sensação oposta ouvindo. Nesse caso, qual foi o papel do Paul Epworth em garantir que vocês iriam realizar o que tinham em mente?

Ted: Não é que a gente não sabia o que dizer com esse disco, só não tínhamos um destino certeiro em mente. Sabíamos que queríamos explorar nosso som, brincar um pouco a paleta de instrumentos que temos à disposição, ampliar isso tudo. E no fim das contas ficamos com umas 40 músicas, mais ainda do que costumamos fazer para cada álbum. Estávamos nos sentindo meio perdidos nisso, porque bem, eram músicas demais. Então sentamos juntos e o Marcus foi passando música a música, para dar uma nivelada na seleção, vendo o que funcionava e o que podia ser deixado de lado. E aí começamos a falar com o Paul. Fomos ao Church Studio, onde ele grava, e é um lugar com uma energia incrível. Ficou aparente, muito rápido, que ele sabia exatamente o que fazer com a nossa banda. E ele já trabalhou com artistas bem diversos, tipo a Adele, e umas coisas eletrônicas, hip hop… Então ele é bem versátil, é ótimo com beats, é percussionista. E sentimos que havia uma confiança mútua muito forte, era exatamente o que precisávamos. E fiquei feliz com o resultado.

TMDQA!: Exatamente isso que eu ia perguntar, se vocês gostaram o destino onde chegaram.

Ted: Exato, ficamos muito satisfeitos com o resultado. E o processo em si foi muito prazeroso. Acho que se pudéssemos, ficaríamos muito mais tempo fazendo o disco.

TMDQA!: Chega, Ted. Uma hora você tem que deixar as coisas irem. Já são três anos, tem gente esperando (risos).

Ted: Sim, eu sei (risos). Mas ficamos realmente satisfeitos, então está aí.

TMDQA!: Mudando um pouco de assunto: sei que a música é só uma das suas paixões [Ted também é fotógrafo], e eu estava revendo suas coleções de fotografias no site. Retratos são mais a sua onda, mas você já pensou em unir as duas coisas e talvez fazer um registro de bastidores de uma turnê do Mumford & Sons, por exemplo?

Ted: Interessante você falar isso, porque… Bom, é algo que fica ali guardado em algum lugar da minha cabeça já há algum tempo. Eu tenho um estúdio em Londres, onde eu faço mais música mesmo, mas tem uma câmara escura. E quando começamos a fazer as fotos para esse disco, eu comecei a fotografar as pessoas que estavam envolvidas no processo e a fazer retratos delas. Eu tenho sim vontade de fazer algo assim, mas é a mesma coisa: não sei o destino (risos). A parte humana dos shows é algo que eu admiro muito, porque é uma experiência musical compartilhada não só com o público, mas com quem está ali trabalhando, produzindo, iluminando, passando som. Eu quero registrar isso um dia. Aliás, eu estive aí no Brasil, uns seis meses atrás, vi uns lugares lindos, tirei uma fotos…

TMDQA!: Onde no Brasil?

Ted: Nem sei (risos). Não sei os nomes dos lugares, mas reencontrei alguns amigos aí, me levaram a alguns bares, foi bem divertido. Você é do Rio?

TMDQA!: Isso.

Ted: Então, foi no Rio.

https://www.instagram.com/p/8n7H_fpcNr/?taken-by=mrteddwane

TMDQA!: Que mundo pequeno! Então você antecipou a minha pergunta. Porque, veja bem, sessenta datas anunciadas… e nada de América do Sul. Você sabe que eu preciso perguntar: não tem planos de tocar aqui?

Ted: (risos) Sim! Com certeza, nós vamos voltar. Gostamos muito de tocar aí. Nesse momento estamos evoluindo nosso show, mudando algumas coisas. Vamos deixar mais envolvente, para que as pessoas se sintam mais próximas da gente e fiquem mais dentro da experiência, que seja divertido e tudo mais. Mas definitivamente vamos retornar ao Brasil. É que essas datas são só uma primeira parte da turnê. Ainda não tem um dia certo, mas vamos nos ver em breve.

TMDQA!: Tá certo, era só o que precisávamos saber! Nos vemos quando vocês voltarem então.

Ted: Combinado, muito obrigado!