Uma lenda da música latino-americana está de malas prontas para voltar para ao Brasil. Fito Páez chega ao país com a turnê do ótimo La Ciudad Liberada para shows em Porto Alegre (02 de dezembro, no Auditório Araújo Vianna), São Paulo (03 de dezembro, no Teatro Bradesco) e Rio de Janeiro (05 de dezembro, no Teatro Bradesco Rio).
Antes disso, tivemos uma conversa com Fito por telefone. O que era para ser um papo sobre a turnê, se tornou um debate bem interessante sobre liberdades e uma história bem legal sobre a relação dele com o Brasil.
Confira abaixo, depois do álbum.
TMDQA: Olá, Fito! Antes de tudo, queria te parabenizar pelo show no Carnegie Hall. É sempre bacana ver a música latina ocupando os espaços clássicos da música mundial. Então queria começar com um clássico: o que os fãs brasileiros podem esperar dessa turnê?
Fito Páez: Faz muito tempo que não tocamos no Brasil. Vou para turismo e eventos promocionais, mas shows assim… com banda… faz tempo. Vai ser um show elétrico, temos uma banda com cinco instrumentistas e uma cantora e vamos fazer boa parte do disco novo com período só de clássicos. Estamos montando algumas surpresas com músicas do Paralamas do Sucesso. Eu conheço bastante as músicas daí, a música brasileira é algo muito importante na minha formação e sempre que vou aí gosto de improvisar com música brasileira.
TMDQA: Eu ouvi falar desse seu show no Carnegie Hall com um tweet do jornal Clarín. Aí eu cometi esse erro que é ler os comentários. Os comentários eram todos sobre você ser comunista, ter que ir pra Venezuela ou para Cuba e outras loucuras. Essa é uma coisa que tem rolado muito, inclusive aqui no Brasil. Como você lida com isso?
Fito Páez: (risos) Isso é uma insanidade inacreditável. Eles falaram isso?
TMDQA: Sim! (risos)
Fito Páez: Eu vou procurar isso. Sabe o que é mais curioso? Eu já toquei tanto em Havana como em Caracas. Assim como toquei em Nova York e Paris. Você não toca para o governo. Eu sou músico e toco para as pessoas, sabe? Essa reação é de uma burrice sem limites e sinto que estamos vivendo numa época de estupidez.
TMDQA: O La Ciudad Liberada foi um dos seus álbuns recentes que mais gostei, principalmente pelo fato como ele era muito atual para as situações políticas da Argentina. Reouvi ele hoje mais cedo e me espantei como ele dialoga com as questões brasileiras atuais. Música em geral tem esse poder, de mudar o sentido de acordo com o ouvinte. Você, como compositor, gosta de ver suas músicas ganhando novas conotações a cada pessoa?
Fito Páez: Eu gosto, mas o modo como eu faço música é diferente e acho isso curioso no fim. Eu não faço música de acordo com a conjuntura, com o discurso vigente ou com as notícias nos jornais. Mas algo acaba entrando. Se você tem uma antena ligada, afinada, você acaba captando as realidades do mundo ao redor. E acho que é isso que dá essa sensação que você falou. O olhar do brasileiro, do chileno sobre o mundo acabam entrando aí. Sinto que os problemas do mundo estão muito parecidos, isso facilita.
TMDQA: Nós nos falamos cinco anos atrás, durante uma passagem pelo Rio para divulgar o “Yo Te Amo”. Na época, falamos sobre o fato de um assunto claro na sua obra ser o amor e esse novo álbum traz um amor diferente, que é acima de todo o respeito por todos. Você acha que é o amor que vai liberar as cidades, como no nome do disco?
Fito Páez: Creio que é uma das forças, mas não a única. Isso seria algo utópico. Tem um poeta que gosto muito chamado Nestor Perlongher, ele morou um tempo aí no Brasil, que escreveu uma frase que me inspirou muito: “quero viver e amar em uma cidade livre”. Isso me fez pensar no que seriam essas cidades e suas revoluções, esperanças e anarquias. É um período sem saber muito por onde iremos, mas vive um pequeno momento de plenitude incrível. Quando a democracia voltou aqui na Argentina, em 1983, nos sentimos assim. Que aquele momento era só o começo, que era hora de liberar as almas. E nesses momentos de crise sinto que é hora de nos liberarmos, internamente.
TMDQA: Quando comentei que ia entrevistar você com o pessoal do site, vários dividiram a mesma lembrança. Que conheceram seu trabalho através do Acústico MTV dos Titãs. Foi como eu te conheci também! Você sabia dessa leva de fãs que você roubou dos Titãs? E você tem alguma lembrança dessa época? O álbum fez 20 anos no ano passado.
Fito Páez: Tanto tempo assim? Nossa! Eu me lembro que o André Midani me ligou e queria me convencer a gravar. Eu não conhecia a banda e nem a música, mas se o Midani disse que seria bom, quem sou eu para duvidar? (risos) Quando cheguei ao Rio, fomos num restaurante e conheci a banda. Eles me encheram de siri, como se fosse para me anestesiar e me levaram uma tradução da música. E eu adorei. Lembro que uns 2 dias depois já era a gravação, numa noite bem bonita num teatro antigo no centro do Rio. Na época, um dos meus poucos contatos que tinha no Brasil era o Paralamas e sinto que abrimos uma nova gama de caminhos. O Brasil é um lugar que estou permanentemente descobrindo. É um mistério delicioso para mim.