Entrevistas

"É agora ou nunca": conversamos com Donita Sparks sobre a volta do L7, disco novo e rock de protesto

O L7 chega ao Brasil neste sábado (01) para cinco shows. Batemos um papo com a icônica Donita Sparks sobre a nova fase da banda.

L7
Foto: Divulgação

O L7 foi fundamental para o rock.

A banda fundada por Donita Sparks e Suzi Gardner redefiniu a presença da mulher na música e imprimiu sua marca em um movimento majoritariamente masculino, o grunge. Com letras afiadas, humor ácido e uma pitada de revolta, o grupo agia como um furacão por onde passava, já que chegava sempre com o pé na porta e dando a cara a tapa.

Entre 1985 e 2001, o L7 jogou no mundo discos que não necessariamente foram um sucesso absoluto de vendas, mas com toda certeza pavimentaram o caminho para toda uma geração de bandas que viria pela frente. Bricks Are Heavy, terceiro trabalho da discografia lançado em 1992, se destaca no repertório com o single “Pretend We’re Dead”, até hoje considerado um dos hinos de sua época.

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Mas chega de relembrar o passado.

Depois de ficar fora do radar por longos 14 anos, o grupo voltou em 2015 para uma série de shows com sua formação original, contando também com Jennifer FinchDemetra Plakas, e não parou desde então. O L7 tem rodado o mundo com suas apresentações enérgicas e agressivas, mostrando que a vontade de fazer rock ‘n roll “com força” nunca morreu.

A banda se prepara para lançar no primeiro semestre de 2019 seu primeiro disco em 20 anos e chega ao Brasil neste sábado (01) — saiba tudo clicando aqui — depois de passar por aqui uma única vez em 1993, no infame Hollywood Rock.

Para entender melhor a nova fase da banda e saber o que esperar dos shows, batemos um papo por telefone com a frontwoman Donita Sparks. Leia abaixo após o player!

TMDQA!: Primeiro de tudo, gostaria de agradecê-las por voltarem ao Brasil depois de tanto tempo! Eu achei que nunca as veria por aqui. O que vocês estão esperando dessa turnê e da sua reconexão com seus fãs brasileiros?

Donita Sparks: Eu realmente não sei o que esperar. Eu sei que nós temos muitos fãs brasileiros porque sabemos disso pela nossa página no Facebook. Na verdade, o Brasil é o país com mais fãs depois dos Estados Unidos, o que é ótimo, porque só estivemos aí uma vez. Eu toquei com minha banda solo em 2008, mas o L7 não toca aí desde 1993. Então não tenho certeza do que esperar!

TMDQA!: Tenho certeza que vai ser ótimo! Os fãs estão realmente esperando há anos. Então, vocês voltaram a fazer turnês em 2015, mas apenas no ano passado começaram a tocar e anunciaram a gravação de um novo álbum. Como foi voltar ao estúdio com a banda depois de todo esse tempo?

Donita: Bem, tem sido ótimo! Começamos a gravar e estamos gravando em alguns estúdios diferentes em Los Angeles, e agora está realmente legal. Acho que somos musicistas melhores do que éramos lá atrás e a química é muito boa. E todas nós nos entendemos musicalmente, então foi muito legal sentir isso de novo, sabe?

TMDQA!: Estamos vivendo um momento muito tenso, especialmente quando falamos de política. A música sentiu falta de uma banda que é tão direta ao ponto quanto o L7. Embora haja muitos artistas que estão usando suas vozes para expressar suas opiniões, o que é ótimo, ainda não tivemos um grande retorno do que chamamos de “rock de protesto”. Você disseram que estão ‘de volta para reclamar’ (referência à canção “I Came Back to Bitch”), que é ótima, e há também “Dispatch From Mar-a-lago”, que é sobre Donald Trump. Foi esse o objetivo com a reunião? Voltar e trazer a discussão de volta?

Donita: Não, não é por isso que nos reunimos. Nós nos reunimos porque sentimos que é agora ou nunca, pois houveram alguns problemas pessoais com alguns dos membros da banda, e este foi o momento mais oportuno. Acontece que coincidiu com o fato de Trump ter sido eleito e essa onda muito estranha que está passando pelo mundo, você sabe. Nós nunca fomos uma banda política, é apenas parte do nosso repertório lírico. Nós fizemos “Dispatch From Mar-a-lago” porque escrevemos essa música e queríamos lançá-la rapidamente, afinal achamos que Trump sofreria impeachment imediatamente, e isso não aconteceu. Então, aqui estamos nós neste mundo muito estranho, onde as coisas ficam cada vez mais bizarras a cada dia, pelo menos nos EUA — e eu sei que o Brasil está passando por um momento estranho também.

TMDQA!: Sim.

Donita: Mas não vamos fazer um álbum político, estamos fazendo um álbum do L7. Vai ter humor, músicas de raiva e esquisitas, e talvez alguns comentários sociais. Mas nunca nos propusemos a fazer algo político, é apenas como somos.

TMDQA!: Estamos tendo um momento muito estranho porque o “Trump brasileiro” foi eleito por aqui, e há uma discussão por aí que diz que os artistas não deveriam expressar suas opiniões através de seus trabalhos. É por isso que eu te pergunto: você acha que é importante que os artistas e músicos expressem seus ideais políticos através da música nos dias de hoje?

Donita: Bem, acho que depende do tipo de artista que você é. Alguns artistas são realmente bons em expressar seus pensamentos ou emoções internas ou seu amor por alguém, sabe? O L7 faz qualquer coisa que tenha vontade de fazer. Mas eu acho que o L7, pelo menos acidentalmente, foi mais político do que os nossos colegas anos atrás, eu acho que nós provavelmente tínhamos mais letras políticas do que os nossos contemporâneos do grunge, e realmente não nos propusemos a isso, era assim que escrevemos e é assim que escrevemos ainda. Acho que os artistas devem dizer algo com suas músicas ou em uma entrevista, dizer como estão se sentindo em suas mídias sociais, algo assim. Eles devem dizer alguma coisa e não ficar em silêncio! Faça alguma coisa, coloque em suas letras ou fale algo na internet ou em uma entrevista sobre resistir a essa onda. Então sim, eu acho que é realmente importante.

TMDQA!: Você falou sobre resistência e nós estávamos falando sobre o Trump, então eu preciso perguntar isso. Ainda há muito sexismo na indústria da música hoje em dia? Vocês estão na ativa desde os anos 80 e eu tenho certeza que isso mudou muito, mas como está sendo ter uma banda completamente feminina nos dias de hoje?

Donita: Sabe, eu achei que não tinha muito problema, mas não estamos sendo convidadas para muitos festivais. Os festivais para os quais somos convidadas são festivais de heavy metal, o que é ótimo, mas alguns dos outros festivais que são meio alternativos não estão nos chamando e achamos isso muito estranho. Nós somos umas das arquitetas do rock alternativo. Então, não ser incluídas em alguns destes line-ups é estranho. Ainda estamos tentando descobrir o que está por trás disso, mas realmente não sei. Eu tenho minhas suspeitas, mas você sabe, vamos seguindo em frente.

TMDQA!: Já que estamos falando sobre pioneirismo no rock alternativo, a mídia muitas vezes conecta vocês com o movimento riot grrrl. Você vê o L7 neste movimento ao lado de bandas como Hole e Babes in Toyland, que também são citadas ao falar sobre o assunto?

Donita: Hole e Babes in Toyland não eram bandas do riot grrrl. As bandas do riot grrrl começaram nas faculdades e usavam o rock como uma plataforma política, além de serem muito específicas sobre qual era a sua motivação. Hole, Babes in Toyland e L7, nós viemos todas antes disso e éramos bandas de rock ‘n roll. Acho que fomos uma inspiração para o movimento, mas elas eram garotas da faculdade e nós éramos punks que viviam na cidade. Há uma grande diferença e as pessoas cometem muito esse erro. Não é que eu tenha algo contra o riot grrrl, eu acho que elas eram ótimas, mas nós simplesmente não estávamos nisso. Elas segregavam muito e nós incluíamos. Queríamos todos na nossa audiência, queríamos mulheres, homens, gays, heterossexuais, todos eram bem-vindos. O riot grrrl só queria muitas mulheres.

TMDQA!: Faz sentido! Como eu disse, vocês abriram caminho para muitas bandas, muitos grupos femininos que ainda estão surgindo na indústria até hoje. Então, há novas bandas que você gosta e que você se vê como uma influência? O que você recomenda ouvir?

Donita: Eu acho que não consigo nomear nenhuma que seja atual. Você provavelmente saberia mais do que eu, na verdade. Você ficaria surpresa ao saber que eu não gosto tanto de rock. Eu preciso de mais do que isso, sabe? Eu gosto de originalidade, eu não quero um novo L7. Nós já cobrimos essa parte, você sabe o que quero dizer?

TMDQA!: Sim, vocês ainda estão na estrada.

Donita: Um promotor coloca uma banda só de garotas como nosso ato de abertura e nós ficamos tipo, “bem, o que mais você tem?”. Isso não é o suficiente para mim. Eu gosto de algo que é novo e tenha uma abordagem única ou algo único. Eu não gosto apenas de rock que soa como L7.

TMDQA!: Falando sobre o seu álbum novamente, você nos disse que tem letras divertidas, raivosas e mais, mas o que mais podemos esperar do novo álbum? O que os fãs podem esperar deste novo álbum?

Donita: Bem, o que mais você quer? (risos) É um álbum do L7, não somos uma coisa só, sabe? Há algumas músicas lentas, algumas músicas rápidas, algumas músicas zangadas, músicas felizes e músicas estranhas. Nós não tocamos apenas um estilo. Nós tocamos muitas coisas diferentes, mas deixamos com a nossa cara. Então você pode esperar um álbum do L7.

TMDQA!: Incrível, mas… quando que será lançado? Quero dizer, eu sei que vocês ainda estão gravando e tudo mais, mas já temos uma previsão?

Donita: Chegará em março ou abril. Porque prometemos fazer vinil, agora temos que entrar em uma fila. Uma vez que o álbum esteja finalizado, então temos que esperar que a fábrica de vinil o produza e há uma longa espera, porque muitas fábricas de vinil fecharam. Agora há apenas algumas delas nos EUA, então se você quer fazer vinil, você tem que esperar. Gostaríamos de lançar nosso disco no dia seguinte após finalizá-lo, no iTunes ou algo assim. Mas tivemos uma campanha e as pessoas querem vinil, elas terão que esperar. Esperamos que seja em março ou abril.

TMDQA!: E como você descreveria o L7 para uma multidão de jovens que nunca ouviram falar da banda para que eles conheçam vocês?

Donita: Eu diria que é um rock ‘n roll pesado, cativante e subversivo… com um senso de humor.

TMDQA!: Essa é uma ótima definição. (risos) Agora eu tenho uma última pergunta para você. O nosso site se chama Tenho Mais Discos que Amigos, o que eu acho que é o caso da maioria de nós, amantes de música. Então, qual álbum você considera ser seu melhor amigo hoje em dia?

Donita: Hoje em dia?

TMDQA!: … ou sempre!

Donita: Bem, eu vou te dizer… mas quantos anos você tem, Stephanie?

TMDQA!: Tenho 22.

Donita: Quando você é jovem, a música é o seu mundo inteiro. Mas eu sou mais velha, então é tipo… eu tenho um disco que é meu melhor amigo agora? Vou voltar para quando eu tinha 16 anos. Meu melhor amigo era o Rocket to Russia, dos Ramones. Ele mudou minha vida e ouvir esse disco abriu meu mundo, e foi com ele que comecei a tocar guitarra também. Então esse é provavelmente o meu álbum favorito de todos os tempos.

TMDQA!: Escolha incrível, também adoro esse disco. Muito obrigada pelo seu tempo, Donita, adorei nossa conversa!

Donita: Obrigada também, nos vemos no Brasil. Vamos nos divertir muito!

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