Francisco, el Hombre e BRAZA transformam multidão do Circo Voador em maré

Francisco, el Hombre e BRAZA, duas das mais incríveis bandas nacionais em atividade, juntaram forças e gêneros musicais em incrível noite no Circo Voador.

Francisca la Braza no Circo Voador
Foto: Natalia Capeans

Vivemos em um mundo bastante marcado por diferenças. “Homem ou mulher?”, “Negro ou branco?” e “rico ou pobre?” são apenas algumas das frequentes dualidades em nossa sociedade, que tenta nos enquadrar em perfis. Mas, na prática, as coisas não funcionam bem assim.

Se deparar com alguém diferente de você pode ser combustível para pré-julgamentos, e parece que fomos doutrinados a pensar assim. Muitas vezes as semelhanças são colocadas de lado ou simplesmente ignoradas. Isso se aplica a tudo, e na música não é diferente.

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Quantas vezes um artista de heavy metal foi chamado de “satanista” só pelo peso em suas músicas? Quantas vezes um funkeiro foi julgado por suas letras de cunho “promíscuo”? No fundo, esquece-se que todos têm um único objetivo: mostrar a sua arte para o mundo!

“As pessoas precisam se ligar nas interseções. Não apenas nas diferenças” foi parte do discurso que introduziu uma noite de misturas sonoras no Circo Voador, uma das casas de shows mais respeitadas do Rio de Janeiro. Na noite do último dia 15, as bandas BRAZA e Francisco, el Hombre se juntaram para apresentar o seu EP conjunto, Francisca La Braza. Mesmo tocando gêneros completamente diferentes, a amizade que uniu ambas as bandas no Festival Tenho Mais Discos Que Amigos, tal como o amor por música, foi a tal interseção necessária para fazer isso tudo acontecer.

Recentemente entrevistamos Vitor Isensee (BRAZA) e Mateo Piracés-Ugarte (Francisco, el Hombre) sobre o lançamento, e isso nos deixou ansiosos para ver como o EP se sairia ao vivo. Matamos essa ansiedade, e vamos contar para vocês como foi o encontro!

 

BRAZA: “Joga tudo no liquidificador!”

Na divulgação de seu mais recente lançamento, o EP Liquidificador, a BRAZA subiu ao palco para entregar o seu dançante show. A faixa-título do álbum foi a música a abrir a noite. A metáfora da canção, de ignorar as diferenças e bater tudo junto dentro de um liquidificador como se fossem as frutas de uma deliciosa vitamina, deu um gostinho de que a noite seria uma incrível.

A própria BRAZA, em si, não se restringe a um único gênero musical, misturando ao longo de cerca de uma hora de apresentação referências de reggae, música eletrônica e rap. Isso já ficou perceptível com “Segue o Baile” e “Selecta“, a segunda e a terceira do repertório.

Foto: Natalia Capeans

A performance de “Normal” veio com diversas homenagens da banda a grandes artistas da nossa música. Foram banhados pelo instrumental da canção versos consagrados de “Maracatu Atômico” (Chico Science), “Zoio de Lula” (Charlie Brown Jr.) e “Todo Camburão tem um Pouco de Navio Negreiro” (O Rappa). Neste momento, o vocalista e guitarrista Danilo Cutrim ainda tocou um dos riffs mais famosos da nossa música, o da clássica “Brasileirinho“.

Ao longo do repertório, a banda conseguiu mesclar muito bem faixas do primeiro com faixas do segundo álbum cheio. “Além“, “Ande”, “Oxalá“, “Ela Me Chamou Para Dançar um Ragga” e mais impediam o público de ficar parado. No entanto, o recente EP também foi bem contemplado ao longo da apresentação, e suas músicas tiveram resposta positiva do público. “Sob o Céu” e “Fé No Afeto” foram inseridas ao longo de alguns dos maiores sucessos da banda, e isso não fez em momento nenhum que o clima esfriasse no Circo.

Pelo contrário, na verdade! A performance de “Fé No Afeto” teve a participação especial de Juliana Strassacapa, vocalista da Francisco, el Hombre. Ju entrou sem sequer ter sido anunciada, e foi aplaudida pelo público ao emprestar sua bela voz para a canção. Mas fiquem calmos: esse foi apenas o início de uma noite cheia de colaborações!

Foto: Natalia Capeans

 

Que entre a “Batida do Amor”

A apresentação seguiu com “Moldado no Barro” e as críticas “Exército Sem Farda” e “We Are Terceiro Mundo“. Para encerrar, no entanto, o BRAZA escolheu a sua releitura de “Calor da Rua”, da Francisco. Não por acaso, foi o momento de Juliana, Mateo, Sebastián e o resto do grupo aparecer no palco. O público, em êxtase, respondeu muito bem ao momento.

Foto: Natalia Capeans

O encontro pediu uma fala dos integrantes. Ao falarem sobre o Francisca La Braza, comentaram a respeito da experiência de gravar com amigos queridos. Foi a deixa perfeita para a performance de “Batida do Amor“, a música autoral conjunta do EP, além de uma explosiva jam com ambas as bandas no palco.

Na verdade, esse foi o indício de que apenas metade da noite tinha passado até então. Isso porque a Francisco, el Hombre logo mais comandaria o palco.

 

Francisco, el Hombre: “Eu vou sentir o calor da rua!”

Cerca de 20 minutos após a saída da primeira banda, o mix de reggae, rap, ska e música eletrônica do BRAZA deu licença para a mistura entre música latina, rock e MPB proposta pela Francisco. “Como Una Flor“, faixa do aclamado álbum Soltasbruxa (cuja turnê terminou recentemente) abriu o show com direito a uma bela introdução.

Como sempre é com a Francisco, aquele seria o início de uma apresentação divertida, dançante e ao mesmo tempo muito forte e com muita troca de energia. O teor crítico já ficou claro na segunda música do repertório, “Bolso Nada“. Em crítica ao futuro presidente do Brasil, Mateo Piracés-Ugarte usou o microfone para também promover reflexões políticas sobre a atual cisão dos cidadãos brasileiros. Pegando carona nas crítica a Jair Bolsonaro, o grupo tocou logo em seguida a faixa “Dilatada“, em defesa da liberdade para todo indivíduo.

Mateo Piracés-Ugarte. Foto: Natalia Capeans

Depois, foi o momento de Ju Strassacapa brilhar, se destacando nos vocais da bela “Triste, Louca Ou Má“. A vocalista aproveitou o momento para aprofundar o seu discurso feminista, homenageando a força das mulheres e encorajando sua independência. A banda manteve a base instrumental para que Ju homenageasse outros fortes versos em favor da representatividade feminina. Cantou trechos de “Maria da Vila Matilde” (Elza Soares) e de “Preta da Quebrada” (Flora Matos).

Juliana Strassacapa. Foto: Natalia Capeans

A setlist seguiu com a releitura da banda para o single “Liquidificador”, do BRAZA. Com versos inéditos cantados por Mateo, a performance teve seu ápice com a volta dos cariocas ao palco. Como uma grande família em cima do palco, os meninos do BRAZA interagiam com a banda. Vitor Isensee, por exemplo, brincou com os pratos da bateria de Sebastián Piracés-Ugarte.

Como se a apresentação estivesse se caminhando para uma explosiva e épica conclusão, a roda no centro do Circo ficava cada vez maior e mais frequente, com o incentivo, é claro, dos integrantes. Um dos melhores e mais animados shows no Brasil hoje em dia, inclusive, é o da Francisco. O público é como uma parte vital das performances.

Logo no início da apresentação, por exemplo, Sebastián fez com que o público abrisse uma grande fila no meio da casa. Quem estava na direita, cantaria junto com Juliana, enquanto quem estava na esquerda repetiria os dizeres de Mateo. Depois, com a permissão dos vocalistas, o público de um lado avançaria até o lado oposto, gerando uma caótica e bela movimentação.

Mateo e Danilo Cutrim se juntaram e abriram uma roda por conta própria. O objetivo era para preparar um início explosivo para a performance de “Tá Com Dólar, Tá Com Deus“. Durante a música, Vitor Isensee apareceu no palco para recitar um de seus belos poemas, desta vez sobre os injustos valores da nossa sociedade. A performance ainda contou com um trecho inusitado de “O Meu Sangue Ferve Por Você“, de Sidney Magal. Foi uma performance única e mágica, daquelas que só se vê uma vez na vida. Enquanto isso, a roda idealizada por Mateo e Danilo tomava conta da casa até o fim do show.

Foto: Natalia Capeans

Tal como fez a BRAZA, a Francisco não fechou com uma de suas mais famosas faixas, mas sim com uma nova. Apresentada no Rio pela primeira vez, o grupo se despediu com a nova “Chão Teto Parede” (cujo nome ainda é provisório). De fácil memorização e com uma coreografia contagiada, em menos de um minuto o Circo Voador inteiro estava repetindo a coreografia, como se já fossem familiarizados coma música, Por sinal, caso seja do interesse da banda lançar a canção em trabalhos futuros, por favor, façam dela um single!

 

“Pode vir, 2019”

Uma das interpretações plausíveis da noite é a promoção da ideia de que “a união faz a força”. As bandas deixaram isso claro em suas respectivas apresentações.

Se estamos nos aproximando de tempos incertos e complicados, a união nos encoraja a seguir em frente. Mateo deixou isso claro em seus discursos ao longo do show. Aconteça o que acontecer, precisamos seguir em frente e não abaixar a cabeça. “A maior forma de transformação é a nossa voz” e “Pode vir, 2019” foram algumas das frases ditas ao longo da noite que foram ovacionadas. Isensee aproveitou a performance de “We Are Terceiro Mundo” para questionar “Quem matou Marielle Franco?”.

A resistência, pelo menos por parte da música brasileira, vai ser grande e linda! Juntos, venceremos!

Setlist BRAZA no Circo Voador (15/12):
1 – “Liquidificador”
2 – “Segue o Baile”
3 – “Selecta”
4 – “Normal” (com versos de “Maracatu Atômico”, “Zoio de Lula”, “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” e “Brasileirinho”)
5 – “Além”
6 – “Oxalá”
7 – “Sob o Céu”
8 – “Ande”
9 – “Embrasa”
10 – “Ela Me Chamou Para Dançar um Ragga”
11 – “Fé No Afeto” (com participação de Juliana Strassacapa)
12 – “We Are Terceiro Mundo”
13 – “Moldado no Barro” (com versos de “Liquidificador”)
14 – “Exército Sem Farda”
15 – “Calor da Rua” (com Francisco, el Hombre)
16 – “Batida do Amor” (com Francisco, el Hombre)
17 – “Jaya”

Setlist Francisco El Hombre no Circo Voador (15/12):
1 – “Como Una Flor”
2 – “Bolso Nada”
3 – “Dilatada”
4 – “Triste, Louca Ou Má” (com versos de “Preta da Quebrada”, de Flora Matos, “Maria da Vila Matilde”, de Elza Soares, e mais)
5 – “Liquidificador” (com BRAZA)
6 – “Calor da Rua”
7 – “Sincero”
8 – “Tá com Dólar, Tá com Deus” (com trecho de “O Meu Sangue Ferve Por Você”, de Sidney Magal e participação de Vitor Isensee)
9 – “Chão Teto Parede”

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