Entrevista: a intensidade, a calmaria e o diálogo de Luiza Lian

Luiza Lian, cantora que está trabalhando o ótimo disco "Azul Moderno" (2018), transmitiu um turbilhão de emoções no Lollapalooza Brasil.

(foto: Filipa Aurelio/Reprodução Facebook)
(foto: Filipa Aurelio/Reprodução Facebook)

Uma das jovens artistas mais celebradas do momento, Luiza Lian fez um show marcante no Lollapalooza Brasil 2019. Com um palco sempre muito bem produzido, cheio de luzes e projeções, a cantora conseguiu transmitir o amor e a indignação que marcam suas letras, e o ânimo de suas melodias.

Luiza Lian traduz as angústias dos tempos modernos como poucas. Em Azul Moderno (2018), um dos melhores discos do ano passado, ela explora uma sonoridade mais orgânica, cheia de interlúdios, diferente da agitação contestadora de Oyá Tempo (2017).

No palco do Lolla, ela juntou os pontos altos de todas as suas vertentes, e colocou todo mundo pra dançar. Em entrevista ao TMDQA! no backstage, ela resumiu: “O movimento que eu faço é sempre em direção ao diálogo e à união, mesmo quando ele é mais intenso ou mais delicado”.

Acompanhe abaixo a transcrição completa! O papo também estará, em áudio, no próximo episódio do Podcast Tenho Mais Discos Que Amigos. Siga-nos no Spotify ou Instagram pra acompanhar.

TMDQA! entrevista Luiza Lian no Lollapalooza

(foto: Stephanie Hahne)

TMDQA!: Luiza, obrigado por receber a gente. Primeiro, você consegue traduzir essa sensação de ter acabado de sair do palco? O que você achou do show e como está se sentindo?

Luiza Lian: Nossa, foi muito emocionante. Foi um show que eu fiquei imaginando e me preparando muito para fazer, idealizando. Conseguir ter entregado isso foi lindo. Consegui não chorar durante as músicas! [risos] Mas saí do palco muito emocionada.

TMDQA!: Além do seu disco Azul Moderno, do ano passado, ter sido muito elogiado, o seu show e toda produção que você prepara visual e esteticamente também foram reconhecidos até em premiações. Como você se sentiu em um ambiente tão grande como o do Lollapalooza, com uma plateia às vezes bastante dispersa? Como foi pegar um show que já estava montadinho e adaptar pra cá?

Luiza: Inevitavelmente, tivemos que pensar o show em dois formatos. Um quando levo a instalação toda, aí vai ser num formato louco, uma experiência. Outro é um palco de festival. Começamos a trabalhar com LED, porque costumamos usar projeção. Somos só eu e o Charles [Tixier, músico e produtor] no palco, mas a minha equipe técnica é bem grande. Eu tenho uma ‘banda visual’ que é grande. Hoje não veio o laser, mas veio a luz, por exemplo. Então foi um exercício massa pensar e idealizar esse show para ser nesse formato, com telão. Projeção é uma coisa e telão é outra. Às vezes a galera olha e pensa que é tudo imagem, mas cada um tem uma sensação, um efeito. Cada máquina vai dar um tom pra coisa. Então foi muito especial poder pensar na dinâmica e agregar outros artistas, outras preparações, inclusive de corpo e voz.

TMDQA!: Sua carreira, principalmente se analisarmos sua discografia, é bastante prolífica. Você lançou Luiza Lian em 2015, Oyá Tempo em 2017 e Azul Moderno em 2018. Já tem algo novo planejado pra 2019?

Luiza: O Azul foi lançado no final do ano passado. Eu até tinha pensado em trabalhar para lançar um disco em 2019 também, mas acho que o Azul tem chão ainda. É um disco que tem muitas camadas e tenho vontade de explorar todas elas. Explorar visualmente, fazer de um jeito diferente e experimentar. E, aí sim, trabalhar no restante do ano para lançar um disco cheio em 2020.

TMDQA!: Comparando com o Oyá Tempo, em que você focou bastante em percussão e beats eletrônicos, em Azul Moderno parece que você dá uma acalmada. Tem mais espaço pra prestar atenção nos instrumentos, interlúdios de violão e até mesmo viagens com a sua voz. O que você quis transmitir nessa fase nova na carreira?

Luiza: Eu brinco que não tem muito essa coisa de o que você quer. O trabalho meio que se manifesta por conta própria. As músicas vão acontecendo, e você vai compondo. Eu acho que eu estava num momento com mais delicadeza e mais leveza no Azul Moderno. Ele é um disco que vem de uma fase mais tensa da minha vida. E também é um amadurecimento, até pelo tempo. Os dois aconteceram quase que paralelamente, mas o Oyá Tempo foi uma flecha, um raio de uma vez. E o Azul Moderno teve muito tempo para ser maturado, para ser pensado e repensado, desconstruído. Eu sinto, sim, essa vibração mais da delicadeza. Tem uma melancolia, mas uma alegria ao mesmo tempo.

TMDQA!: E será que essa mudança de desejo e de mentalidade vem das coisas que você tem observado da situação atual do nosso país? Seu grupo tem viajado muito para as turnês, e você é uma pessoa que presta muita atenção em questões sociais, como os direitos das mulheres, por exemplo. Talvez no disco anterior você quis marcar uma posição mais pesada, e agora consegue falar mais poeticamente sobre tudo. É isso?

Luiza: Eu não diria que estou percebendo uma melhoria nessas questões sociais, não. Mas eu percebi que tem muitas maneiras de se posicionar na vida. Essa fase obscura que a gente está vivendo, como país, é algo que vai durar bastante tempo. Ao mesmo tempo, acho que muitas coisas já foram construídas. E a gente não pode se desesperar ao se deparar com essas ‘trevas’ e pensar ‘nossa, fodeu!’, porque o que a gente conquistou está conquistado! Precisamos ter uma paciência e delicadeza para saber quem é nosso aliado e quem é nosso inimigo. Para conseguirmos caminhar mesmo. E caminhar não só em oposição aos outros, sabe? Porque isso é um problema que eu levantava já no Oyá, e penso muito na minha vida. Estamos vivendo esse tempo que é muito dual, mas não dá pra ser assim, porque quando você está na vida real, com os problemas que tem que enfrentar, a cortina não fecha. O computador não desliga. Sabe? As pessoas estão no mundo e a gente precisa dialogar com elas. O movimento que eu faço é sempre em direção a isso, mesmo quando ele é mais intenso ou mais delicado.

TMDQA!: Perfeito. Muito obrigado pela entrevista!

Luiza: Obrigado vocês!