Conversamos com Ladytron sobre seu primeiro disco em oito anos

Os britânicos do Ladytron lançaram seu disco homônimo, o sexto da carreira, em Fevereiro deste ano. Conversamos com a banda sobre o trabalho!

Ladytron

Por Nathália Pandeló Corrêa

Depois de Gravity The Seducer, lançado em 2011, os membros do Ladytron tiraram um tempo para se dedicar a outros projetos. Quase oito anos após, eles retornam com um disco autointitulado que mergulha fundo na sensação de apocalipse iminente atual.

Sem soar especificamente político, Ladytron opta por seguir um caminho sensorial. Ao construir uma sonoridade embebida em desorientação e claustrofobia, a banda embarca pelo lado mais obscuro do synthpop, sem medo de abraçar seu aspecto mais pesado e melancólico.

No entanto, Ladytron não se esconde nas ambiências. Um pouco mais diverso que o trabalho anterior — que foi propositalmente mais etéreo –, neste a atmosfera das canções exige urgência. Aí que entra Iggor Cavalera, participação especial na bateria. Também construíram essa sonoridade Daniel Hunt (músico, produtor e compositor do grupo) com o produtor Jim Abbiss (Arctic Monkeys, Adele).

O lançamento é oportuno: em 2019, o Ladytron atinge a marca de 20 anos da primeira formação. Sempre guiada pela experimentação dos limites do pop eletrônico, a banda vem nesse sexto disco levada por sintetizadores analógicos e um ritmo pulsante e visceral. Como sempre, Ladytron é um produto de seu tempo, refletindo uma visão plural dos seus membros, que seguiram compondo como antes: espalhados pelo mundo. Daniel Hunt mora em São Paulo; Reuben Wu construiu uma carreira como fotógrafo em Chicago; a escocesa Helen Marnie lançou 2 álbuns solo em meio às indecisões pós-referendo do Brexit. Mira Aroyo também passou os últimos anos colaborando com outros artistas. Nesse meio tempo, compartilhavam canções entre si, compondo com um oceano de distância, e se encontraram no ano passado na Inglaterra para finalmente dar forma ao disco.

Conversamos com a banda sobre esse processo e como as mudanças dos últimos anos influenciaram seu sexto trabalho.

Confira abaixo!

TMDQA!: Vocês descreveram esse novo disco como mais pesado, e acho que isso fica bem claro na capa. Vocês estavam em um ponto diferente como banda — se comparado com quando lançaram Gravity The Seducer?

Helen: O novo é diferente por são ser parte de um ciclo, ou de uma trajetória, como foram os primeiros cinco discos. Nos sentimos livres para começar como se fosse nosso primeiro ano nesse disco, apertar o botão de reset.

Daniel: Em termos musicais, na época do Gravity, nós queríamos fazer um álbum mais sedado. Em termos de temática, acho que esse disco não é completamente diferente do que já exploramos antes, mas talvez ele seja mais articulado para falar desses temas. Isso não foi planejado, apenas quando demos um passo atrás e olhamos para o álbum que fazíamos, vimos essas linhas narrativas costuradas nele. Nesse sentido, ele é bem mais influenciado pela inquietude dos nossos tempos do que os discos anteriores, ou talvez só haja mais pessoas se sentindo assim agora, ou ambos.

TMDQA!: Nos últimos sete anos, vocês se envolveram em múltiplos projetos, só não como Ladytron. Vocês moram em países diferentes, e escrevem música coletivamente, apenas não no mesmo local — e isso funciona pra vocês há anos. Dessa vez, como foi a sensação de pisar no estúdio por algumas semanas e produzir o disco? Foi um desafio reativar a magia ou foi tipo andar de bicicleta?

Helen: Foi como andar de bicicleta. Sério. Eu pensei que ia ser mais difícil lembrar como tudo funcionava, mas foi instintivo, de memória muscular mesmo.

Daniel: Além disso, pra gente o hiato foi apenas de quatro anos, na verdade. Demos uma pausa no início de 2012 e começamos a trabalhar em 2016. Dessa forma não fica tão dramático.

TMDQA!: Bom, 2019 marca 20 anos de Ladytron, certo? Vocês planejaram algo especial pra comemorar?

Helen: Nós lançamos um disco!

Daniel: Eu não tenho certeza de quando é o nosso aniversário. Acho que lançamos o primeiro single em 1999, mas era uma formação diferente. Fizemos nossas primeiras gravações juntos em 1999, acho, apesar de que sinto que 2000 foi nosso verdadeiro ponto de incepção como grupo, com nós quatro. De certa forma, acho que um grupo é definido pelo lançamento do primeiro disco, então 2001… Assim, podemos continuar fazendo aniversários todo ano.

TMDQA!: Claro que vocês se mantiveram ocupados nos últimos anos, com vida pessoal a discos solo, fotografia, trilhas sonoras, etc. Agora voltando a trabalhar como grupo, vocês trouxeram algumas de suas experiências mais recentes para a composição do álbum? Como esses últimos anos mudaram sua perspectiva?

Helen: Perspectivas mudam, claro. É difícil avaliar o que trabalhar em outros projetos pode causar, mas acho que o agente é a experiência em si. Todos nós passamos por muita coisa nos últimos oito anos, não tinha como aparecermos exatamente iguais enquanto pessoas.

TMDQA!: Vocês parecem ter uma ligação especial com o Brasil – além de terem feito shows aqui, o Daniel mora em São Paulo e o Iggor Cavalera aparece no disco como baterista convidado. Como vocês descreveriam essa relação com o Brasil, nossa música e seus fãs aqui?

Daniel: Alguns dos meus amigos em São Paulo me acusam de ser mais brasileiro que eles. Antes do grupo existir, alguns amigos japoneses me apresentaram músicas brasileiras dos anos 60 — antes da internet, o Japão era onde eu encontrava minhas músicas. Em particular, eu recebi um disco dos Mutantes como presente — meu amigo Hiroki queria muito que eu o tivesse. Essa foi genuinamente uma das muitas viradas do destino que me levaram a estar aqui 20 anos depois. Iggor é um velho amigo, já havíamos colaborado musicalmente antes.

TMDQA!: Ainda nesse tópico, o vídeo para The Animals foi gravado em São Paulo e Guarulhos, e eu li uma entrevista na Paper Mag onde a Helen fala de The Island ser uma metáfora pessoal, mas também envolvendo a Escócia e seu lugar no Reino Unido agora. Quanto da sua localização geográfica entrou pro disco? Estar em lugares tão diferentes entre si influenciou o processo de escrever e gravar?

Daniel: A geografia com certeza tem um efeito. Não necessariamente no processo, porque até certo ponto sempre trabalhamos remotamente; eu morei na Itália durante a feitura dos últimos dois discos, por exemplo. Mas acho que estar no Brasil me afetou muito mais do que a Itália jamais conseguiu. É impossível viver tudo o que aconteceu nesses últimos anos e não ser afetado por isso, mesmo que não se manifeste diretamente nas músicas. O vídeo de “The Animals”, dirigido pelo Fernando Nogari, foi uma forma de comunicar o que eu vejo e sinto aqui de uma forma que se comunica ao mesmo tempo com a canção em si. Também vejo como parte do universo visual em torno do disco. Nossa abordagem de clipes migrou na direção de curtas que trazem algo a mais criativamente, o que é bem mais recompensador.

TMDQA!: Claro que os fãs vão querer saber: algum plano de tocar o novo disco aqui no Brasil?

Helen: Esperamos que sim!

Daniel: Vamos ver.

TMDQA!: Por último mas não menos importante, o nome do nosso site tem a ver com o quanto a música significa pra gente e como é presente nos bons e maus momentos. Poderiam compartilhar com a gente alguns discos que foram seus “amigos” enquanto escreviam e gravavam o novo álbum, que serviram de inspiração ou só foram boas formas de relaxar?

  • Harmonia – Deluxe
  • The Associates – Sulk
  • Seefeel – Quique
  • Don Henley – Building the Perfect Beast