Titãs Trio Acústico: conversamos com Sérgio Britto sobre shows, nova geração, likes e mais

Conversamos com Sérgio Britto sobre a comemoração dos 20 anos do aclamado Acústico MTV do Titãs. O grupo se apresenta hoje em São Paulo.

Titãs
Foto: Silmara Ciuffa

Os Anos 80 tiveram, sem dúvidas, uma das melhores e mais populares fases do Rock no Brasil. Na época, o gênero era constante nas rádios e chegava, de fato, às multidões.

É claro que as décadas seguintes (incluindo a atual) também nos presentearam com ótimos grupos, mas faz tempo que o gênero saiu do mainstream. A força dos anos 80, no entanto, continua refletindo até hoje. Muitos novos artistas apontam influências em bandas como Os Paralamas do Sucesso, Legião Urbana, Barão Vermelho e, é claro, Titãs.

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Mesmo que bandas ótimas como Charlie Brown Jr., Raimundos e Skank tenham ganhado espaço na década seguinte, elas ainda precisavam dividir espaço com os “mestres”. Não à toa, o melhor Acústico MTV nacional da história foi justamente o do Titãs.

Em comemoração aos 20 anos do épico episódio, a banda (hoje um trio, após várias mudanças na formação) está fazendo uma turnê em formato acústico. Na verdade, o Acústico MTV foi lançado em 1997, mas a comemoração foi uma ideia dos próprios fãs.

 

Titãs Trio Acústico

Em um formato bem distinto daquilo que o Titãs está acostumado a fazer, os integrantes Sérgio Britto, Branco Mello e Tony Bellotto se juntaram para apresentar o repertório do Acústico com algumas novidades. O “Trio de Ferro” (como ficaram conhecidos pelos fãs) está oferecendo uma experiência única ao contar com um reduzido grupo de músicos.

No palco, eles têm o apoio de Mário Fabre (bateria) e Beto Lee (guitarra e vocal de apoio), mas não têm toda a instrumentação que marcou o evento de 1997. Após shows lotados e bem recebidos por público e crítica, eles se apresentam hoje (09) no Credicard Hall, em São Paulo. Os ingressos estão à venda, e garantimos que é uma oportunidade única!

Tivemos a oportunidade de conversar com Britto sobre a efeméride e as novidades dos novos shows. O tecladista também nos contou sua interessante visão acerca da atual cena, dos benefícios e malefícios da internet e sobre a vida longa dos Titãs.

Confira abaixo:

Sérgio Britto, Branco Mello e Tony Bellotto. Foto: Silmara Ciuffa

TMDQA!: O Acústico MTV do Titãs é para muitos (inclusive pra gente) o melhor de todos. O que esse momento significou para vocês, em termos de carreira e público? O que vocês sentiram de repercussão na época?

Sérgio Britto: Eu acho que aquilo foi uma surpresa para nós, na verdade. Muita gente apostava nessa ideia de que as nossas canções iam render, enquanto outras achavam que não ia combinar. A gente mesmo tinha uma certa dúvida. Mas, depois de abraçarmos a ideia, a gente se dedicou de corpo e alma para fazer daquilo o melhor possível. Músicas inéditas, participações que a gente queria, um arranjador que a gente queria, um produtor que a gente queria… Criamos as condições ideais para fazer o nosso melhor ali.

Mesmo assim, sinto que quando o disco saiu a gente se surpreendeu com a rapidez e com o alcance que ele teve em termos de popularidade. Nosso público deu uma renovada radical. A gente começou a tocar para gente muito nova e para um número maior de mulheres. Talvez fôssemos o grupo mais popular daquele ano, levando em conta todos os gêneros. Isso a gente não esperava de jeito nenhum. É claro que a gente fazia sucesso antes, mas nem mesmo entre as bandas de rock a gente era a mais popular. Sequer tínhamos esse pretensão. Legião fazia muito sucesso. Paralamas tocava mais nas rádios. Foi uma surpresa, uma boa surpresa.

TMDQA!: Queria que você comentasse um pouco sobre as suas expectativas para o show. Soube que esses shows contam com uma ambientação mais intimista, que permite mais trocas com o público.

Britto: A gente queria fazer algo que comemorasse o disco, mas que não fosse uma réplica. Optamos por essa maneira mais crua, mais despojada de abordar aquele repertório, com outras coisas que lançamos com o passar dos anos. Também tem essa questão da conversa com o público, que é uma coisa que fazemos pouco. A gente resolveu comentar um pouco sobre cada música, sobre o que estava acontecendo na época. Tem sido surpreendente. É claro que é um formato menor, tanto que começamos tocando esse show em teatros pequenos, mas eles estão quase sempre lotados. Temos uma resposta muito boa dos fãs.

É uma maneira de revisitarmos o nosso repertório. Uma coisa que eu também acho bacana é que tocamos músicas do repertório, nesse formato menor, tentando manter os arranjos, frases e harmonias com essa questão orquestral. É o caso de “Go Back” e “Flores”. E isso é bom, porque ficamos mais leves, sem aparatos gigantescos. Aquela turnê, se me lembro bem, fazíamos com seis cordas, quatro metais, dois percussionistas… A gente viajava em dois ônibus. Era uma coisa gigantesca. Tudo bem que o sucesso que fazia comportava isso, mas agora não é bem esse o caso. Acho que conseguimos um formato bacana para viabilizar isso. Além disso, tem uma dose de surpresa nessa receptividade.

TMDQA!: A setlist do show provavelmente vai valorizar o que foi eternizado pelo Acústico em 1997, mas, para os Titãs em 2019, como é montar um repertório de show? São 15 álbuns, muitos sucessos e muita estrada.

Britto: É complexo. A gente procura um equilíbrio entre os sucessos. Por exemplo, nessa turnê tem “Epitáfio”, “Enquanto Houver Sol”, mas tem também coisas que a gente acha interessante ter. Tem um trecho do show que cada um canta duas músicas sozinho. O Tony canta “Polícia”, o que é uma coisa totalmente inédita porque, além de ele cantar pouco, ele é autor da música. Ele canta também “Querem Meu Sangue”. O Branco toca “Cabeça Dinossauro” só com violão e voz . Eu toco “Nem Cinco Minutos” e faço todas as frases no piano, sendo que ela foi feita no violão. Nunca tocamos essas músicas da maneira que tocamos nesse show.

 

“Esse negócio de views e likes ilude”

TMDQA!: Você tem feito participações em discos de bandas de uma nova cena de rock, como Supercombo e Roks. Como você enxerga esse novo momento?

Britto: Eu vejo muita coisa legal e com potencial de sucesso. O que eu acho é que a maneira como as coisas estão montadas favorece muito pouco o pop rock. Existem poucos canais de entrada para chegar nas pessoas. A internet é uma coisa bacana, é claro, mas também cria uma ilusão que submete a pessoa a um nicho. Eu acho que é um momento complicado, mas, por outro lado, eu sinto que existe um leve cansaço desses gêneros que lideram há tantos anos. Começa a ficar muito repetitivo, e eu entendo que as pessoas queiram ouvir novidades.

O pop rock sempre experimentou muito. Vejo muito espaço para essas bandas ocuparem um lugar. Agora mesmo, eu convidei a Érika Martins para gravar uma música do meu disco solo. Os Autoramas e o Vanguart, por exemplo, são bandas que poderiam ter muito mais projeção. Essa geração poderia estar hoje em um outro patamar já, porque eles são muito bons. Eu vejo muitas bandas nessa situação, e acredito que um pouco disso é por causa desse quadro. Fora a quantidade de bandas pequenas querendo mostrar seu trabalho e não conseguem. Mas pode ser que nos próximos anos tenhamos algumas boas surpresas.

TMDQA!: Isso que você falou é verdade. Com esses avanços proporcionados pelas ferramentas da internet, as pessoas acabam ficando dentro da zona de conforto. As próprias playlists dos serviços de streaming comprovam isso.

Britto: Eu acho que sim. Fazendo uma crítica construtiva, também acho que exista esse lado por parte das bandas. Esse negócio de views e likes ilude, porque não significa que a pessoa goste de você ao ponto de comprar um ingresso para te ver. Tem um certo comodismo que, a princípio, não era para existir. A internet é bacana, mas, para a música funcionar, também precisa ter show, aparições na TV, rádio, apoio da imprensa… Aí o quadro poderia mudar.

TMDQA!: Existe algum artista ou grupo desse novo movimento com quem você gostaria de fazer uma colaboração?

Britto: Eu tenho feito com as pessoas que me procuram. No caso da Érika, eu convidei ela. Eu fiz com a Roks, com a Supercombo… Acabei de gravar uma participação no disco dessa banda nova do Egypcio, Cali. Eu me disponho a isso e estou disposto a fazer com outras pessoas. Acho que depende de se identificar com a música e com a banda.

 

“O rock perdeu força, mas (…)”

TMDQA!: Gostaria de fazer uma pergunta técnica para quem tem experiência no assunto. Ao seu ver, considerando a atual cena musical brasileira e até internacional, você acredita na ideia de que o rock morreu?

Britto: Eu não sei porque as pessoas gostam dessas frases de efeito. O samba também “estava morto” para alguns. Na cultura, as coisas vão se movimentando e se transformando. Eu não acho que o rock morreu como um gênero. Tem muita coisa que a gente diz com esse gênero. Tem coisas que são expressadas melhor nessa linguagem. Essas coisas não morrem, até porque é um gênero muito contemporâneo. Tem essa coisa toda da mistura, da urgência, da liberdade e dos temas que são abordados.

TMDQA!: É tudo passível da adaptação. Existem bandas que incorporam elementos de diversas fontes no rock, e o resultado ficam bastante nutritivo.

Britto: Não é nenhuma novidade. Nós mesmos fizemos isso com o Õ Blésq Blom, no auge dessa cena do rock brasileiro. Não deixa de ser rock. Beatles também já tiveram isso. São conceitos que estão aí. Se você olhar em termos mercadológicos, o rock perdeu força, mas, ao mesmo tempo, temos que considerar a quantidade de público que festivais de rock atraem. Isso vai abrindo portas e pode gerar boa coisa. Acho que, como você falou, isso de que as coisas vão se misturando. É normal. Estranho seria se ficasse igual.

 

Planos futuros e carreira solo

TMDQA!: Qual é o segredo para manter uma banda ativa durante tanto tempo e se manter concisa mesmo com tanta troca de membros?

Britto: Acho que teve duas coisas. Uma foi a sorte de ter na banda vários compositores. Isso faz uma diferença. Se tivéssemos um cara só compondo todas as músicas e ele saísse, talvez fosse muitíssimo mais difícil manter uma carreira, apesar da vontade. A segunda coisa foi que nós, com alguns desvios, sempre procuramos manter o foco no nosso prazer artístico, em fazer algo que realmente nos represente e em que cada um se sinta satisfeito com o que faz. Isso te mantém dentro do trabalho.

Em algumas bandas, vejo um cara que quer dominar a banda, fazendo com que aquilo vire quase um projeto solo. Assim, você perde a liga com os outros caras e isso vai enfraquecendo a banda. Essa coisa de colaboração precisa ser levada a sério porque faz a diferença. Eu acho que basicamente são essas duas coisas que nos ajudaram, se é que existe alguma regra.

TMDQA!: No ano passado, vocês lançaram Doze Flores Amarelas. Quais são os planos futuros da banda?

Britto: Ainda não estamos pensando em um novo disco do Titãs, porque acabamos de sair de um mergulho muito grande, que foi fazer a ópera. Fazer aquelas 25 músicas foi algo trabalhoso, como um parto de trigêmeos (risos). O que a gente tem pensado recentemente, levando em conta a receptividade que esse projeto anda recebendo, foi fazermos um registro dele. Os Titãs, como grupo, ainda tem vontade de fazer uma turnê do Doze Flores Amarelas, mas ficou difícil de levar para a estrada, justamente por causa do tamanho e do formato. Uma ópera rock não pode ser meia boca. Precisa de um cenário, projeção… Uma ópera rock intimista seria algo esquisito (risos).

Já no meu lado pessoal, tem alguns projetos. Eu tenho um disco pronto de músicas inéditas que tem a ver com o Purabossanova, uma mistura de bossa nova com pop. Estou esperando um momento propício para colocar isso “na roda”.

TMDQA!: Como é, para você, conciliar carreira solo e a banda?

Britto: A princípio, não foi fácil. Mas acho que fui me convencendo de que, para mim, as duas coisas fazem sentido. Não tenho nenhuma fantasia de sair da banda e viver da carreira solo longo dos outros Titãs. Ao mesmo tempo, eu sempre tive a inquietação de fazer coisas mais diferentes, como a bossa nova, e sempre soube que isso não é o registro da banda. Então, eu vou conciliando as duas coisas. É claro que a minha carreira solo tem muito menos espaço por “n” motivos. Estou me adaptando e vendo uma maneira de fazê-la crescer por um outro caminho. Acho que isso não incomoda o funcionamento da banda. Acho até que é bom, porque tira pressão, torna as coisas mais fáceis. Assim, podemos nos dedicar, enquanto grupo, ao que temos em comum, sem forçar a barra.

Mas tenho muita dificuldade em conciliar. Claro que preciso desenvolver melhor ainda o meu caminho solo e descobrir como fazer isso aparecer mais. Quando me propus a começar isso, pensei “Não vou fazer algo com ‘sobras’ dos Titãs”. Acho que isso me ajudou a definir muita coisa. É um tipo de liberdade que você só consegue ter sozinho.

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