Entrevistas

No melhor momento de sua carreira, Suricato encara o formato "one man band" em novas apresentações

Com uma nova proposta de apresentação ao vivo, Suricato lança seu terceiro e mais novo disco de estúdio, "Na Mão As Flores".

Rodrigo Suricato
Foto: Renan Oliveira

Precisamos falar sobre Rodrigo Suricato!

O cantor, guitarrista e compositor carioca começou sua carreira musical em 2012, mas alcançou projeção nacional em 2014, quando participou do programa Superstar, da Rede Globo. No mesmo ano, lançou o disco Sol-Te, que teve repercussão bastante positiva e rendeu à sua banda passagens por festivais como Rock in Rio e Lollapalooza.

Passados cinco anos, algumas coisas mudaram (para melhor). Rodrigo assumiu o posto de vocalista do Barão Vermelho, uma das mais importantes bandas da história do nosso rock. Nesse momento, além de passagens em grandes festivais, visibilidade nacional e hits de sucesso, ele tinha até um Grammy Latino. Não é para qualquer um!

 

Homem-banda

Suricato disponibilizou recentemente o terceiro disco do projeto. Intitulado Na Mão As Flores, o álbum traz uma peculiaridade: foi quase todo gravado por Rodrigo. E isso vai se estender nos shows da nova turnê, em que ele incorporará o formato “one man band”, se responsabilizando por todas as camadas da música (e não, não estamos falando de voz-e-violão).

Um exemplo disso está na faixa “Tatua“, cujo clipe saiu hoje (16) com exclusividade pelo TMDQA!. Com uma atmosfera mais pop, a música, que começa com uma base de violão, logo incorpora beats eletrônicos.

Ficou curioso para ver como Suricato vai administrar todos os elementos da música sozinho? Ele se apresentará na próxima terça (20) no Theatro NET Rio, no Rio de Janeiro. Também passará no Theatro NET de São Paulo no dia 29 e na A Autêntica, em BH, no dia 20 de Setembro. Os ingressos estão disponíveis!

 

“Faz parte natural da minha interpretação”

Conversamos recentemente com Rodrigo sobre o momento que está vivendo, conciliando sua carreira solo com o posto de vocalista de uma das bandas de rock mais respeitadas do Brasil.

Ele nos contou detalhes sobre o show, sobre suas influências e sobre o contexto do novo álbum em sua carreira musical. Confira abaixo:

Capa de "Na Mão As Flores" (Suricato)

TMDQA!: O formato “one man band” é algo inédito na sua carreira. Como foi desenvolver isso? Como as músicas foram compostas pensando nesse esquema ao vivo?

Rodrigo Suricato: Na verdade, eu estou desenvolvendo este formado desde antes da minha participação no programa Superstar. Mas é a primeira vez em que eu decidi ser a banda e tocar 85 ou 90% dos instrumentos do disco novo. Eu já estava tão imerso no trabalho que acabei produzindo ele também, com um auxílio luxuoso do meu amigo Marco Vasconcellos. São, mais uma vez, composições minhas. É um momento muito verdadeiro. Estou assumindo o meu projeto em primeira pessoa, como sempre fiz, mas agora sem o auxílio de uma banda.

Esta honestidade me levou para o palco, para um show que eu estava doido para fazer há muito tempo, neste formato de homem-banda. Só que agora tem uma pegada bem diferente. Eu estou misturando bastante o folk que eu já fazia com uma pitada ou outra de música eletrônica. Eu não vejo mais o meu folk com aquela pegada rural, aquela paisagem bucólica com vaquinhas passando (risos). Eu não vivo isso mais. Mas, ao mesmo tempo, trago a questão do cantor que canta seu próprio texto. Está sendo uma delícia! É a primeira vez que eu consigo ter o Rodrigo produtor, o Rodrigo multi instrumentista e o Rodrigo cantor presentes no mesmo trabalho.

TMDQA!: O mesmo vai ser aplicado para os clássicos? Como foi adaptar os sucessos para o novo formato?

Suricato: Há muito tempo que as minhas canções nascem não só do violão-e-voz, mas do bumbo e do pandeiro, tocando instrumentos de percussão com os pés. Elas não foram fabricadas em um outro formato, então eu consigo defender muito bem esse repertório ao vivo, tocando todos os instrumentos. Normalmente, quando tem alguém sozinho no palco, ou é DJ ou é violão-e-voz (risos). O meu show tem muita dinâmica. Ele tem momentos muito diferentes. Tem o momento “guitarra”, o momento “violão multi instrumentista”, tem o momento da bateria eletrônica… Está sendo bem interessante construir isso, levar para a estrada e conseguir tocar o meu próprio repertório, sem auxílio de outros músicos. Eu consigo me defender sozinho.

TMDQA!: Acaba também sendo algo muito orgânico, em que você mesmo vai produzindo os sons. Deve ser algo bem empolgante.

Suricato: Exatamente! E não é para aparecer nem nada assim. A minha expressão artística virou essa. Tocar tudo isso, para mim, faz parte natural da minha interpretação. Não é um espetáculo de circo ou alguma coisa diferente disso. É a minha vida. É como eu sou.

 

“O que eu tinha como falha é, na verdade, uma assinatura”

TMDQA!: Para você, como foi o seu processo de evolução enquanto artista desde o primeiro disco até hoje? Considerando que Sol-Te foi lançado em 2014, acredito que você deve ter aprendido muita coisa nesse tempo. O resultado é um disco muito maduro.

Suricato: Eu acho que esse é o meu disco mais potente. Não só por seu o meu último, mas porque ele é mais bem resolvido em toda a questão de arranjos, composições, enredo… Durante esse processo, eu descobri que o lugar mais longe que eu já cheguei na minha vida foi chegar a mim mesmo (risos). Chegar até nós mesmos e ser fiel ao que a gente é nessa vida foi um negócio que demorou muito para mim. Hoje em dia, eu vejo que comecei a entender o meu lugar de compositor. Eu entendi que o que eu tinha como falha é, na verdade, uma assinatura. É um processo de entendimento mesmo, sabe? Neste momento, quero cantar o que vem de dentro de mim. Este disco é quase autobiográfico.

TMDQA!: Como você acabou de dizer, Na Mão As Flores é um disco autobiográfico, mas eu sinto que ele também fala sobre todos nós. Como é fazer com que as pessoas se sintam reconhecidas no seu discurso?

Suricato: Eu não falo de nenhum partido político, de nenhuma situação ou pessoa determinada. Eu falo sobre a humanidade mesmo. No final das contas, somos feitos das mesmas coisas. A terra já girou muito, e a humanidade mudou pouco. A gente tem medos muito parecidos, então essa crise toda que está acontecendo no mundo agora é um enorme medo da liberdade. A gente nunca foi tão livre quanto é hoje. A gente tem acesso a absolutamente tudo a todo tempo. Em contrapartida, existe esse retrocesso, essa tentativa de prender a evolução da humanidade com as mãos. Não é bem assim que acontece.

Eu fico muito feliz de poder ter o meu papel no mundo, minha maneira de fazer política. Nem todo soldado é um soldado de trincheira, afeito à violência. A minha maneira de fazer música é essa. Falar de amor, não de maneira isenta, mas sim da maneira direta sobre o que nós somos. Quer coisa mais honesta do que falar que o pior de mim está na mesma mão que eu trago flores para você? Eu estou desnudo nesse disco, mas fico muito feliz de poder dar a minha melhor versão para as pessoas.

 

“Eu escuto muita música pop”

TMDQA!: A única faixa não autoral do disco é uma cover de “Como Nossos Pais”, do Belchior. Você chegou a comentar que revisitou essa música a partir do atual contexto social. Como foi esse processo?

Suricato: Tecnicamente, ela traz o Rodrigo guitarrista, que eu senti que estava faltando no disco. Algo mais blues, mais distorcido que estava faltando. Ao mesmo tempo, é uma canção que é muito atual, considerando o contexto político. Ela tem uma das frases que eu mais gosto, que é “Qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa”. Então, não importa quantos diamantes você tem, quantos likes, quantos milhões de seguidores neste mundo louco. A vida humana é maior do que isso.

TMDQA!: Você colocou a sua personalidade na releitura. Isso é ótimo! Existe toda uma questão do artista colocar o olhar dele na música.

Suricato: Eu tenho muita facilidade para fazer isso. Eu vim do bar. Eu comecei tocando em bares. Para o desespero das pessoas, eu tocava da minha maneira (risos). É importante falar que existe uma diferença grande entre cover e intérprete. Cover é quando você faz uma coisa igual a outra. Já interpretar é algo que a Maria Bethânia, por exemplo, faz muito bem. Ninguém falaria que ela só canta cover. O mesmo vale para a Cássia Eller. É algo como trazer a música para si, para o seu universo.

TMDQA!: Essa nova fase do projeto remete a um som mais pop, que lembra figuras internacionais como Ed Sheeran e John Mayer. Quais foram suas principais referências?

Suricato: Eu escuto muita música pop. Eu adoro e, como te falei, eu queria tirar o folk da roça, dessa coisa meio “floridinha”. Eu não me identificava mais com esse tipo de coisa. Eu queria que o folk fosse identificado como algo contemporâneo, que possa ser consumido pelas massas. Eu quero cantar para muita gente sem abrir mão do meu discurso e do meu zelo por quem me ouve. Mas eu quero ser o mais pop possível. Eu adoro essa linguagem. Quanto mais gente gostar da minha música, mais feliz eu ficaria. Mas, se for para citar nomes, eu escuto muito Bon Iver. Ele é meu predileto de muitos anos para cá!

“O melhor dos dois mundos”

TMDQA!: Como está sendo conciliar a carreira solo com o posto de vocalista do Barão Vermelho?

Suricato: Para mim, é maravilhoso, porque consegui o melhor dos dois mundos. Tem um mundo mais solitário, mais silencioso, e tem um mundo mais discutido, mais democrático. Tal como a vida, né? Às vezes queremos ficar sozinhos e outras vezes queremos estar com muita gente. O Barão Vermelho é a minha banda predileta de todos os tempos. É o melhor processo coletivo que já encontrei na vida. Eu estava um pouco de bode em trabalhar em conjunto. Nem sempre você se dá bem com as pessoas. A convivência fica difícil, e você acaba se sentindo obrigado a estar com as pessoas. Não servia para mim, e passei a achar que o problema era eu.

Depois que eu entrei para o Barão, no entanto, a coisa ficou muito bacana, porque todo mundo lá é muito maduro. Eles já passaram pelas piores coisas do mundo. A maturidade da relação deles está em outro lugar. Todos sabem que eu entrei Suricato no Barão Vermelho. Na época, já tinha feito Rock in Rio, Lollapalooza e já tinha um Grammy Latino. Isso tirou de mim a obrigação de tentar imitar o Cazuza ou o Frejat. Entrei com a minha personalidade para poder interpretar as canções e, principalmente, para compor canções novas. Eu entrei para suceder o Frejat e não substituí-lo. Eu só tenho a agradecer por estar perto deles, aprendendo e representando este repertório.

TMDQA!: O que podemos esperar dos novos shows além, é claro, do formato inédito? Pode nos adiantar alguma coisa?

Suricato: Eu quero percorrer o Brasil todo com a turnê do Na Mão As Flores. Está super diferente e super viável. Eu estou viajando com pouca gente, com uma estrutura muito enxuta, mas é uma entrega muito complexa para um artista sozinho no palco. Eu quero mostrar isso para as pessoas. Quero tocar nos lugares pequenos. Quando eu saí do Superstar, já fui fazendo show para muita gente. Não fiz em lugares de pouca gente. Eu quero estar perto desse lugar, com as pessoas cantando perto de mim. É o que eu desejo agora nesse momento.