No último dia 6, a cantora Tiê lançou o primeiro disco ao vivo da carreira, DiX.
O registro vem acompanhado de um DVD, gravado em dois shows realizados no YouTube Space, no Rio de Janeiro. Na mesma data, a cantora convidou fãs e imprensa para um pocket show no MIRA!, antigo Mirante 9 de julho, em São Paulo. O Tenho Mais Discos Que Amigos! esteve lá e conversou com a cantora sobre esse momento de “contemplação” de sua trajetória.
Isso porque “dix” significa “dez” em francês, e faz alusão aos 10 anos de carreira que Tiê está completando. Nesse período, ela emplacou hits em novelas, fez turnês internacionais, gravou com nomes como Guilherme Arantes e David Byrne, se viu muito próxima dos fãs e observou uma transformação na participação feminina na música. Aliás, a escolha do MIRA! não foi por acaso, já que a casa acabou de ser reformada e passou para a gestão de uma equipe 100% feminina, assim como foi a produção do disco DiX.
O álbum ao vivo, que teve produção de Paul Ralphes, direção de Clara Cavour, arte de Rita Wainer, cenário de Nina Becker, figurino de Carol Roquete e beleza de Brenno Melo, conta com 17 faixas, incluindo três inéditas. Também há as participações especiais de Cynthia Luz e Rael. Confira abaixo nosso papo com Tiê, fotos do dia do lançamento e o player do disco DiX no final do texto.
TMDQA! entrevista Tiê
TMDQA!: Parabéns pelo lançamento de DiX! Depois de quatro discos de estúdio, como foi o processo de realizar um álbum ao vivo? Eu imagino que o rigor técnico fique um pouco de lado, e entre mais a entrega e a emoção da artista, com todas as imperfeições. Quais foram as especificidades desse trabalho?
Tiê: Foi difícil, na verdade. Eu achei que cantei super bem na hora, aí quando a gente escuta, nunca é perfeito, porque ao vivo não tem jeito. Eu inclusive chorei algumas vezes durante os show. Existe a opção, hoje em dia, de afinar tudo em estúdio, mas aí não é real. Eu queria que soasse como um show mesmo, senão não ficaria parecendo um trabalho em estúdio, que leva 15 meses pra gravar, e não faria sentido. Mas esse desapego realmente é um desafio.
TMDQA!: E tem um ingrediente a mais, que é a participação direta dos fãs. Em “Chá Verde”, por exemplo, eles fazem junto com você o coro do final, e fica muito emocionante. Na entrevista que fizemos com você no Lollapalooza, falamos muito da sua relação de proximidade com os fãs.
Tiê: Pois é, inclusive eu levei eles de São Paulo para o Rio pra essa gravação, e vários também estão aqui hoje. Então é uma relação muito direta, sim. Sem eles, não faria sentido. Realmente o registro ao vivo é diferente, não é todo mundo que gosta de ouvir música com a plateia batendo palmas no meio. Mas eu tirei várias coisas boas desse processo todo. Por exemplo a parte de vídeo, que foi toda uma surpresa. Eu não conhecia a Clara [Cavour, diretora do DVD]. Eu pedi e ela conseguiu formar uma equipe só de mulheres, com 15 profissionais femininas. O cenário da Nina Becker eu não sabia o que ia ser. A gente conversou sobre o que eu queria, mas foi muito em cima da hora, então ela acabou fazendo da cabeça dela, e eu só vi na hora. Achei maravilhoso!
Essa parte de delegar e confiar foi muito satisfatória. Muita gente me achou elegante pela primeira vez (risos). Eu tô sempre mais descabelada, dizem que ninguém consegue me ver com o cabelo na cara. Então, apesar de ser o meu estilo, dessa vez eu deixei as pessoas verem mais do meu rosto. Foram várias coisas boas. É um momento mais de celebração do que de músicas inéditas, mas foi bom me revisitar, lembrar a situação em que eu compus aquelas músicas lá atrás, e agora comparar com esses dez anos de carreira e de boletos pagos.
TMDQA!: Nesses dez anos, você pôde observar uma grande transformação no cenário da música brasileira com relação às mulheres, que estão ganhando cada vez mais espaço. A Pitty, por exemplo, acabou de lançar um disco incrível, sempre falamos muito no site de artistas novas como o pessoal da Tuyo, também tem as meninas do sertanejo, etc. Como é pra você se colocar como mulher na música brasileira atualmente?
Tiê: Quando eu comecei, havia mesmo um buraco musical de artistas mulheres. Eu lembro que a Céu lançou disco, depois eu lancei, aí a Tulipa Ruiz, a Karina Buhr… e as novidades acabaram vindo ao mesmo tempo. A gente inclusive participava reportagens todas juntas na época. Realmente um caminho foi aberto nesses dez anos. Hoje, temos mulheres ‘cantautoras’, escrevendo as próprias composições, se bancando, cantando do jeito que querem. E mesmo assim o movimento ainda é pequeno, e vai levar anos pra que as coisas mudem de fato.
Em qualquer conversa, precisamos inserir esse assunto pra incentivar a mudança. Também tem o lado ruim, que são as pessoas e marcas que se apropriam do discurso, e acaba virando um negócio meio bobo, um “empoderamento” que enfraquece o movimento. Mas eu faço o que posso. Eu botei filhas no mundo e todos os dias falo pra elas sobre feminismo, compro livros, explico situações cotidianas pra que elas entendam o que a gente pode fazer. A sororidade na prática faz diferença, e não só no Instagram.
TMDQA!: Pra fechar, vamos falar sobre você, que já tem cinco discos lançados, turnês internacionais, colaborações com nomes como Guilherme Arantes e David Byrne e uma grande parceria com a televisão. Alguns anos atrás, a música “A Noite” fez muito sucesso em uma novela da TV Globo. E mesmo hoje, você está com “Deixa Queimar” e “Longe de Mim” em produções na televisão. Na hora de compor suas músicas, você pensa em contar histórias que podem se conectar com esses produtos audiovisuais? E como isso ajudou a formar sua carreira nesses dez anos?
Tiê: Quando minha primeira música entrou em novela, que foi “Piscar o Olho”, eu não gostava muito dela, a música quase não entrou no disco. Então eu pensei ‘não entendo nada disso’. Mas na verdade não existe uma receita pra entrar em novela. Eu funciono bem fazendo canções por encomenda, como foi “Deixa Queimar”, que fiz especialmente pra personagem de “Carcereiros” (série da Globo). Consegui trazer meus sentimentos, já que sou uma pessoa intensa demais, e emprestei praquela história. “Longe de Mim” também me pediram. Eu gosto de fazer, e acho que faz diferença pra carreira sim. Não como antes, porque hoje as trilhas sonoras são diferentes. É difícil que uma novela mantenha a mesma música pra uma personagem até o final. Mas eu gosto de ir em lugares em que não chegaria normalmente.
Uma vez tinha um caminhoneiro na porta de casa cantando “A Noite”, e achei isso maravilhoso. E minha avó (a atriz Vida Alves) era da TV, então eu tenho essa proximidade. Não sou noveleira porque não consigo assistir todos os dias, mas eu gosto. Tem algumas marcas que eu penso bem se deveria me associar ou não. Hoje em dia tá tudo tão difícil que até pra fazer um dueto com alguém é preciso pensar bem, investigar o passado da pessoa e contar que ela não vá falar nenhuma besteira no futuro, porque até isso é prejudicial. Mas não dá pra controlar tudo. Eu faço as coisas na melhor das intenções e sigo frente, um dia após o outro.