Sensível e pesado, "Jaime" eleva Brittany Howard a um novo patamar artístico

A frontwoman do Alabama Shakes, Brittany Howard, faz estreia solo com o incrível "Jaime", um dos discos mais sinceros e belos de 2019. Leia nossa resenha!

Brittany Howard - Jaime
Brittany Howard, do Alabama Shakes, anuncia disco solo

Brittany Howard é, cada vez mais, uma das grandes mulheres e artistas deste século. Famosa por seu trabalho com o Alabama Shakes, que inclui múltiplas vitórias no Grammy Awards, a cantora resolveu criar um novo capítulo muito mais pessoal e visceral com seu primeiro disco solo, lançado nesta sexta-feira (20).

Jaime traz a sensibilidade e o diálogo de Brittany sob uma perspectiva diferente; cansada de ser a porta-voz de grupos e bandas, a americana assume seu novo posto com maestria. Nas composições e nas execuções, a sinceridade de Howard está presente no disco inteiro, transmitida em cada uma das canções.

A entrada de “History Repeats”, faixa que abre o incrível trabalho, já demonstra o que será o álbum: um soco na cara. Com um excelente trabalho de mixagem que se soma à carga emocional dos vocais e se contrapõe às belas melodias soul/blues das cordas, a bateria não faz nenhuma questão de se esconder e dita o peso de Jaime.

Além disso, é impressionante a capacidade do disco de soar cru e, simultaneamente, extremamente produzido. O detalhismo que se traduz na exploração de pequenos barulhos de estática dos amplificadores e das diferentes técnicas de vocalização/uso de samples é um dos maiores charmes da obra.

Influências e diálogos sociais

A influência da música sulista dos EUA é notável, até pelas raízes da cantora — que nasceu filha de um pai negro e uma mãe branca em uma cidade conhecidamente racista. Inclusive, o diálogo com o preconceito e com as possibilidades de sua luta é constante no álbum.

Em “13th Century Metal”, uma mistura de jam com palavra falada que se transforma em um dos pontos altos do trabalho, Brittany diz: “Eu estou dedicada a opor aqueles cujo desejo é nos dividir e que estão determinados a nos manter na idade das trevas do medo”.

Essa determinação é um sentimento presente de cabo a rabo no disco, mesmo quando ela se propõe a fazer canções de amor. Isso porque a vocalista, além das questões de raça, explora também as suas próprias dificuldades em tópicos como sexualidade e gênero.

Em “Georgia”, por exemplo, Brittany canta sob a perspectiva de uma paixão platônica e quase inocente por alguém do mesmo sexo; já a incrivelmente bela “Short and Sweet” nos desafia a conter as lágrimas enquanto versa sobre a finitude do amor.

Peso e emoção

O contraste entre peso e emoção e, ao mesmo tempo, a soma ocasional deles é o que tira o disco do lugar comum e o impulsiona a uma sinceridade pouco explorada atualmente.

Brittany se mostra sem uma grande preocupação com coesão estética, transitando entre batidas quase-boombap na poderosa “Goat Head” e a exploração de instrumentos mais eletrônicos e modernos em “Run to Me”.

E é justamente essa ausência de preocupação que torna o disco tão especial. Ao invés de soar desconexo, soa como uma obra que faz questão de não esconder nada — e, principalmente, não se esconder atrás de uma proposta intencional.

Jaime é um respiro de sinceridade que expõe o melhor e o pior de Brittany Howard. A mensagem mais clara vem justamente em “13th Century Metal”, com a repetição constante da frase “Somos todos irmãos e irmãs”. Obrigado por isso, Brittany.

Logo abaixo, você pode ouvir o álbum na íntegra e se emocionar com um dos melhores discos de 2019.