Entrevista: Milky Chance fala sobre novo disco, "Mind The Moon"

Conversamos com Clemens Rehbein, do Milky Chance, sobre o novo disco "Mind The Moon", lançado na última sexta-feira (15). Leia agora!

Milky Chance Camila Cara
Foto: Camila Cara/Lollapalooza

Por Nathália Pandeló Corrêa

Philipp Dausch e Clemens Rehbein são como outros tantos amigos que se conheceram na escola e compartilharam gostos musicais. No seu caso, uma mescla aparentemente improvável de Red Hot Chili Peppers, Jimi Hendrix e Bob Marley. Passaram a integrar um quinteto de jazz, que logo se desfez. Dessa experiência e desse balaio de influências, surgiu Milky Chance. Um projeto despretensioso, iniciado ali mesmo na pequena cidade alemã de Kassel e que ganhou o mundo, o duo viu sua popularidade crescer quase que da noite para o dia — de vídeos caseiros lançados no YouTube para casas de shows cheias por todo o mundo.

Foi “Stolen Dance” a música que fez o jogo virar. Divulgada no canal do projeto há cerca de seis anos, a faixa logo se tornou uma das mais procuradas no Shazam em todos os tempos. Daí veio o álbum Sadnecessary, sucesso multi platinado em diversos países e que levou Milky Chance aos talk shows dos EUA, como Jimmy Fallon, Jimmy Kimmel e Conan O’Brien. Em 2017 viria o segundo disco, Blossom, com os singles “Cocoon” e “Doing Good”. O trabalho se distanciou um pouco do clima artesanal da primeira gravação para incorporar mais elementos que Clemens e Philipp aprenderam na estrada. Para a segunda turnê, foram mais de 200 shows em mais de 40 países — um deles, o Brasil.

Quando esteve por aqui no Lollapalooza, Milky Chance pode conhecer de perto o calor dos fãs que comentavam em seus vídeos no YouTube desde que começaram o projeto. Durante a cobertura do Tenho Mais Discos Que Amigos! do festival, a banda conversou com a gente sobre seus dois trabalhos até o momento e marcou presença no nosso podcast. Agora, Clemens e Philipp dão o próximo passo na carreira com o terceiro disco, Mind The Moon.

São 12 faixas que exploram suas múltiplas conexões musicais, do rock ao chillout, do reggae à eletrônica. O single “The Game” é um bom exemplo dessas fusões. “Fallen” conta com uma colaboração com o artista britânico Elderbrook, enquanto “Eden’s House” traz um pop-gospel com participação especial do coral sul-africano Ladysmith Black Mambazo. A maltesa-australiana Tash Sultana aparece na já revelada “Daydreaming”, enquanto o artista belga-congolês Témé Tan surge em “Rush”.

Dausch e Rehbein dividiram a gravação entre seu próprio estúdio — que eles construíram e em Kassel, para que pudessem se concentrar na música, longe de todo o hype — e estúdios em todo o mundo. As sessões de gravação ocorreram em locais que variam da Austrália à Noruega. Este último estava próximo à costa, a poucos metros do fiorde mais próximo. O oceano sempre presente é um tema constante que atravessa o novo álbum, refletido em letras como “Pensamentos continuam se afogando em minha mente azul” (Rush) e “O mar está na maré baixa / problemas por dentro” (Oh Mama), e mesmo no título do próprio álbum, que venera a lua e seu incrível poder de controlar a maré.

O TMDQA! teve a oportunidade de ouvir o disco com antecedência e conversar com Clemens pelo telefone sobre esse novo momento do Milky Chance.

Confira após o player.

TMDQA!: Oi Clemens, obrigada por conversar com a gente! Quero falar do disco novo, mas voltando um pouco no tempo, quando vocês começaram na música, faziam parte de um quinteto de jazz. Claro que desde então vocês se dedicaram a outros gêneros musicais, mas você diria que ainda carregam um pouco do estilo do jazz quando compõem ou tocam? Aquela liberdade, o improviso, sabe?

Clemens: Sim. Eu não diria que dá pra ouvir jazz nas músicas que fazemos atualmente. Mas a forma como sentimos a música é nos deixando levar pelo ritmo, nos permitindo ser guiados pelo clima do momento. Ainda é assim que a gente escreve, o jeito que produzimos todas as nossas faixas. Isso não parte necessariamente de um conceito ou visão. Em geral, a gente tem um começo de alguma coisa – uma frase, uma melodia, um refrão, um arranjo, uma batida. E aí a gente em geral só pega esse fio e vai seguindo para ver onde ele nos leva. Acho que o que o jazz trouxe pra gente foi essa noção de “confie na sua intuição”, sabe?

TMDQA!: Sim. Aliás, falando do começo, vocês não estavam necessariamente tentando construir uma carreira quando iniciaram o projeto. Mas agora estão nessa já faz um tempo, então acho que podemos considerar como a profissão de vocês! Tem algo que aprenderam nos últimos anos e que gostariam de ter sabido lá no início? Tipo, algo que antes deixava vocês inseguros ou ansiosos e que se pudessem, voltariam no tempo pra dizer pra si mesmos “calma, vai dar tudo certo”!

Clemens: Nós temos momentos assim o tempo todo! (risos) Basicamente tudo que aconteceu nos últimos sete anos, de termos nos tornado uma banda bem-sucedida, foi meio inacreditável. No começo, tudo aconteceu bem rápido pra gente, e foi muita coisa ao mesmo tempo. No meio daquilo tudo, nos sentíamos meio sobrecarregados por aquela situação toda. Claro que a gente tentou dar o nosso melhor sempre, mas eu consigo lembrar como se fosse ontem a gente descobrindo que ia fazer a primeira turnê nos EUA. E eu pensando “caramba, é muito longe de casa” (risos).

TMDQA!: E vocês começaram a ir em vários talk shows, né?

Clemens: Sim! E muitas vezes a gente sentia que estava perdendo o controle da situação, que não sabíamos o que esperar. E se eu pudesse voltar naquele momento, ia dizer pra mim mesmo: “relaxa, vai dar tudo certo” (risos).

TMDQA!: Bom, essa é a primeira vez que a gente se fala, mas você conversou com o nosso outro colaborador, Rafael, no Lollapalooza Brasil do ano passado. Você falou um pouco sobre as diferenças entre o Sadnecessary e o Blossom, em termos de produção. Um era mais minimalista, quase artesanal, e o outro foi maior, tinha mais coisas acontecendo. Eu acabei de receber o disco novo, então ainda estou digerindo, mas à primeira ouvida me pareceu algo mais voltado para o beat. Tem algo a ver com o caminho de produção que vocês seguiram pra esse álbum?

Clemens: Não havia necessariamente um conceito, mas o único plano que tínhamos quando começamos a trabalhar nesse disco era voltar ao estilo de produção minimalista que tivemos no primeiro disco. Queríamos voltar a ter um forte elemento eletrônico, porque é algo que faz parte de quem somos. Era uma vontade nossa dedicar mais tempo aos arranjos e a cada som no disco, e acho que conseguimos fazer isso bem, é algo que melhoramos nesse novo álbum. Parece que a gente tinha mais cores pra pintar a nossa tela, sabe? Ao mesmo tempo a gente foi usando de tudo um pouco, porque às vezes menos é mais.

TMDQA!: Acho que o título Mind The Moon passa algo mais grandioso que Blossom, apesar de vocês estarem falando de coisas com uma perspectiva mundana. Meio que desabrocharam, agora estão mirando para o infinito e além (risos). Essa visão faz sentido, agora que vocês estão com a bagagem mais cheia com o terceiro disco, ou não?

Clemens: Nós não tínhamos esse pensamento em mente (risos). A história por trás do título é que passamos as duas últimas semanas de gravação na Noruega. Era muito ao norte, perto da costa, e víamos o oceano e um horizonte lindo todos os dias. Era junho, verão, com dias muito longos e havia a sensação de estarmos cercados por algo mágico. Acabamos pensando muito nas marés, altas e baixas, e no poder da lua, que nem sempre dá pra explicar a forma como ela age sobre nós. É um mistério. Notamos que citamos a lua em algumas canções, meio que inconscientemente, então ficou claro depois que ela estava exercendo algum poder sobre nós. Não sabemos qual exatamente (risos), mas achamos justo colocar isso no título.

TMDQA!: Digamos que um quarto do álbum tem vocais convidados. E nós estamos na era do feat, o que acaba se tornando uma forma de atingir novos públicos. Queria saber como você vê o uso dessas colaborações no mercado e como surgiram as parcerias com a Tash Sultana, o coral e o Témé Tan.

Clemens: Acho que não há uma época melhor para colaborar com outro artista do que hoje em dia. Mesmo dois artistas que não se conhecem podem encontrar um caminho online e construir uma conexão a partir disso. E trocam emails, se falam pelas redes sociais, gravam à distância… Sei que não é a forma mais romântica de fazer as coisas, mas acontece e facilita muito porque é possível construir uma conexão, mesmo que não pessoalmente. Nós viajamos pelo mundo nos últimos seis anos, e isso nos deu a oportunidade de conhecer alguns artistas. A Tash nós encontramos pela primeira vez na Austrália, em 2016, depois acabamos fazendo turnê juntos – inclusive fomos pra América do Sul juntos, fizemos o Lollapalooza e foi a primeira vez que falamos de colaborar em uma música. O Témé nós conhecemos há um bom tempo, já fizemos shows juntos e mantivemos o contato ao longo dos anos. Sempre quisemos fazer algo em conjunto e dessa vez deu certo. E o Ladysmith Black Mambazo nós conhecemos ainda no colégio. Cantávamos no coral e nossa professora trouxe o Ladysmith para a gente estudar, porque íamos fazer algo com arranjos africanos, não me lembro bem. E quando estávamos gravando o disco, pensamos que incluir um coral seria muito legal. Então pensamos neles, enviamos uma demo, conversamos por telefone sobre a música e logo eles nos mandaram algumas frases gravadas. Ainda não nos conhecemos, mas esperamos que isso aconteça nessa próxima turnê de alguma forma.

TMDQA!: Então vocês eram basicamente fãs deles, né?

Clemens: Sim! Ainda não acreditamos, realizamos um sonho de adolescência.

TMDQA!: Vocês provavelmente leem “come to Brazil” todos os dias nas redes sociais, mas já que vocês estão cheio de datas na nova turnê, parece o momento perfeito pra perguntar: estão planejando voltar aqui em breve?

Clemens: Sim, com certeza! Estamos planejando voltar, ainda estamos acertando os detalhes. Queremos muito fazer um giro pela América do Sul. Imagino que na próxima semana já tenha algo saindo por aí, não deve demorar muito…

TMDQA!: Já devem ter passado isso pra vocês, mas a gravadora nos informou que o Brasil é o sexto país que mais ouve Milky Chance no mundo. Eu lembro de ouvir falar de vocês há uns seis anos e isso é basicamente o tempo que têm de banda (risos). Nossos países parecem tão diferentes à primeira vista. O que você acha que nos conecta como pessoas?

Clemens: Eu lembro quando a gente começou a colocar as primeiras músicas no YouTube e começaram a surgir os primeiros comentários de fora do país. O Brasil já marcava presença naquela época (risos). Inclusive, em qualquer coisa que a gente posta na internet, tem alguém comentando “come to Brazil”. E não é nem a mesma pessoa (risos). A gente se diverte com isso.

TMDQA!: Nós somos mais de 200 milhões, Clemens. Dá pra ter muito “come to Brazil”, e é assim que a gente realiza os sonhos por aqui (risos).

Clemens: Com certeza, e a gente ouve! Mas sobre essa conexão, eu não tenho uma explicação pra ela a não ser de que é um milagre que tanta gente responda à nossa música. É algo que nunca sonhamos, e é empolgante. Nos sentimos muito privilegiados por isso.

TMDQA!: Tá certo! Obrigada por seu tempo, sucesso com o novo disco e nos vemos em breve.

Clemens: Com certeza, obrigado!