É muito comum a utilização da perda dos pais como ferramenta para estabelecer as bases de uma narrativa de heroísmo. Qualquer fã de cinema consegue lembrar facilmente de pelo menos uma dezena de heróis ou vilões que são órfãos.
E esse recurso já é tão frequente que, às vezes, nós nem percebemos. Mas por que isso é tão utilizado? A fórmula não fica batida?
Existe um punhado de razões para os autores utilizarem protagonistas órfãos. Se esses subtextos forem bem variados entre si, as experiências acabam não se tornando tão repetitivas.
O motivo mais óbvio que podemos identificar é que elos familiares são explorados como fraquezas, o calcanhar de Aquiles dos heróis. O plano mais manjado que existe é ameaçar a família do mocinho para que ele não atue de forma decisiva para combater os vilões – Homem-Aranha que o diga.
Peter Parker, aliás, já falou com todas as letras que sofre por colocar sua família e amigos em perigo toda vez que tenta proteger a cidade:
Não importa o que eu faça, não importa o quanto eu tente… aqueles que eu amo serão sempre os que pagam a conta.
Outra razão é a facilidade de manter uma identidade secreta na ausência das presenças paternas e/ou maternas. É muito mais fácil de acreditar em um Bruce Wayne que constrói um alter ego morando sozinho em uma mansão, por exemplo, do que se ele tivesse que esconder isso dos pais.
Mas nem todo mundo tem uma identidade secreta para esconder. O que todos eles têm, no entanto, é uma jornada de superação ao longo da vida. Para nós, espectadores, fica bem mais fácil criar empatia com jovens que cujos pais acabaram de morrer ou adultos que os perderam em algum momento. Isso, de alguma forma, dá força para que os heróis alcancem seus objetivos.
Colocar-se no lugar do personagem, aliás, é fundamental para entender como essa lógica funciona. Salvo raras exceções, até as crianças sabem o papel que os pais têm na vida de uma pessoa. É fácil reconhecê-los como símbolo de proteção, abrigo, fonte de recursos financeiros e materiais. Sem eles, fatalmente a trajetória de um jovem vai virar uma história de superação.
O legal é perceber como o fato de a pessoa ser órfã pode ser explorado de diversas formas.
Harry Potter, por exemplo, foi criado pelos tios e comeu o pão que o diabo amassou antes de descobrir que tinha um caminho de heroísmo já traçado desde a época em que seus pais eram vivos. Porém, em determinado momento, ele descobriu que o pai não era tão perfeito como ele imaginava. Apesar de ser, de fato, um herói, ele era um baita bully na época de aluno.
A história de Luke Skywalker não é muito diferente em Star Wars. A diferença é que, além de descobrir que o pai estava vivo, ele era “apenas” o maior inimigo da galáxia.
Já na Disney, a morte dos pais de praticamente todos os protagonistas é um pretexto para o amadurecimento precoce deles. Bambi, Simba (Rei Leão), Elsa e Anna (Frozen), Mogli, Branca de Neve, Quasimodo (O Corcunda de Notre-Dame), Tarzan, Koda (Irmão Urso)…
A Disney é mestra em criar essas histórias sem deixar o recurso tedioso. E nem precisa dizer, já separa uns lenços de papel porque aqui o choro é garantido.