No final do ano passado, ganhou força uma suspeita de que o renomado autor Paulo Coelho de Souza, torturado durante a ditadura militar, havia sido delatado pelo parceiro Raul Seixas, grande nome da música brasileira dos anos 70 e 80. A teoria vem da biografia “Não Diga Que A Canção Está Perdida“, escrita por Jotabê Medeiros.
No entanto, a aparição de um novo personagem na história pode revelar uma nova e até então inédita versão dos fatos. Ao que novos documentos indicam, o autor foi preso e torturado no lugar de um militante de esquerda que, por coincidência, tinha um nome muito parecido: Paulo Coelho Pinheiro.
Essa teoria já havia sido levantada em uma tese sobre Seixas defendida na USP em 2016 pelo pesquisador Lucas Marcelo Tomaz. No entanto, um recente depoimento do único filho de Paulo Pinheiro pode ser um elemento favorável à confirmação dessa teoria.
Uma infeliz coincidência
Os documentos apresentados na tese apontam que os militares acabaram fazendo confusão entre os Paulos. A ficha policial que justificava a ação das autoridades teria, na verdade, a imagem e o nome de Paulo Pinheiro. Segundo Lucas Marcelo, o fato de que o documento era antigo o fez pensar que, na ilustração, poderia ser de fato a imagem de um Raul Seixas mais jovem.
A atribuição da ficha ao militante foi confirmada por seu filho, Diogo Pinheiro, que hoje, aos 34 anos, atua como engenheiro ambiental. Em depoimento à Folha, Diogo esclareceu o paradeiro de seu pai, que estava foragido na época que tudo aconteceu:
É o nome do meu pai, o partido em que ele atuava. Ele já estava foragido. Em 1970, ele conseguiu fugir para a França e escapou de ser preso e torturado. Voltou ao Brasil depois da Anistia e teve uma vida normal até morrer, em 2011. (…) Lamento, porém, que a repressão tenha confundido a identidade dele com a do Paulo escritor e que, por isso, ele tenha sofrido tanto. Sinto muita dor por isso.
Argumentos favoráveis para a teoria
Além da confirmação do próprio filho de Pinheiro, alguns argumentos se mostram a favor da confusão. Até então, era um mistério o fato de que a amizade entre os artistas continuou após a prisão de Paulo Coelho.
Além disso, a prisão do autor intrigou muitas pessoas, especialmente os mais próximos. Coelho não tinha relação com movimentos de oposição à ditadura. Além disso, o fato de ter uma vida pública já era uma prova de que não conseguiria se envolver com a militância de maneira secreta.
A suspeita de que Raul teria contribuído com a prisão de Paulo Coelho tem origem em um documento de autoria do Centro de Inteligência do Exército, publicado no livro de Medeiros. Na noite em que Paulo Coelho foi preso e torturado por duas semanas pelos agentes do Dops (Departamento de Ordem Pública e Social), Raul Seixas teria sido interrogado antes, junto ao ex-parceiro musical.
O autor Jotabê Medeiros foi procurado pela Folha de S.Paulo, e admitiu não ter pesquisado sobre a coincidência entre os nomes. Paulo Coelho (o autor) também foi procurado pelo jornal, mas optou por não dar depoimento.
Em compensação, há poucos minutos ele publicou a foto acima no Twitter com a mensagem “Viva a Sociedade Alternativa”, como você pode ver na sequência:
Viva a Sociedade Alternativa! pic.twitter.com/Z9teZLubM0
— Paulo Coelho (@paulocoelho) May 29, 2020