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Reality shows: por que somos tão obcecados por eles?

A popularidade dos reality shows pode ser explicada tanto pela empatia pelos participantes quanto pela super exposição a situações de vulnerabilidade

Foto: Divulgação/Globo
Foto: Divulgação/Globo

The Real World, o clássico reality show lançado pela MTV nos anos 90, fez aniversário recentemente: 28 anos! É isso mesmo. O programa que abriu as portas da MTV para os reality shows está batendo na porta dos trinta e, como todos sentimos, seu legado ainda é muito influente até hoje.

Para quem não sabe, The Real World ainda está sendo produzido. Já são 33 temporadas realizadas desde 1992, mas foi necessária uma mudança de casa para manter a máquina ativa. Hoje, quem quer conferir o conteúdo inédito tem que recorrer ao Facebook Watch.

Mas o que faz com que a gente goste tanto dos realities? Há quem diga que The Real World foi o pontapé inicial para a “desvirtuação” da MTV americana, que viria a abandonar quase que totalmente a música para se dedicar a esse gênero de programas. E mesmo assim eles sempre tiveram uma audiência gigantesca.

O Business Insider fez uma análise pra lá de interessante sobre isso em 2016, mas que se mostra muito atual, especialmente se levarmos em consideração a quantidade de programas com estes consumidos durante o período de isolamento social em 2020.

A partir de um estudo realizado pelos pesquisadores Michal Hershman Shitrit e Jonathan Cohen, da Universidade de Haifa, em Israel, o veículo tentou descobrir o real motivo que leva o público a apreciar os programas sobre o dia a dia de completos desconhecidos.

The Real World (Foto: Divulgação/MTV)

A pesquisa, publicada no Journal of Media Psychology, entrevistou um grupo de 183 pessoas sobre cerca de 12 reality shows diferentes. As perguntas tinham a ver com a frequência que assistiam a eles, o quanto eles gostavam, o quanto eles gostariam de participar de um deles ou ver entes queridos participando. Os programas eram variados, como versões originais e locais de Big Brother, American Idol, So You Think You Can Dance, MasterChef e Super Nanny, entre outros.

A intenção dos pesquisadores era medir qual o nível de envolvimento dos entrevistados com os programas e se uma relativa proximidade com os participantes influenciava o julgamento deles. Além disso, as questões mais importantes consideravam a auto-divulgação, ou seja, a disposição de revelar a estranhos vários tipos de informação, como hábitos pessoais e experiências passadas negativas, além de sentimentos como vergonha e constrangimento.

A conclusão foi que, em geral, não existia um grande interesse daquelas pessoas em participar, mas, como esperado, o interesse aumentava quando se tratava de um reality show que eles mesmos assistiam – seja para eles próprios ou para pessoas próximas.

Com isso, a raiz do gosto pelos reality shows estaria na empatia que conseguimos sentir por pessoas “normais” colocadas em situações de exposição extrema. Colocar-se no lugar dos participantes (especialmente dos vencedores), em um contexto que envolve gostos familiares e resultados felizes era algo que servia como impulso para continuar acompanhando. Por outro lado, ver os participantes de qualquer programa passarem por situações embaraçosas tinha um efeito negativo e afastava o público das obras.

BBB20 (Foto: Divulgação/Globo)

Mas…

O Business Insider questionou esse resultado com uma indagação muito pertinente: e se as perguntas mudassem para “você gostaria de ver pessoas que você não gosta sendo humilhadas em reality shows?” ou “você se sentiria mal caso um desafeto passasse por uma situação embaraçosa em rede nacional?”.

Certamente o caminho seria outro. E essas críticas aos formatos super expositivos dos reality shows existem desde que o primeiro deles, Candid Camera, foi ao ar no ano de 1984. As queixas mais comuns sempre foram voltadas ao prazer quase sádico de apreciar a humilhação alheia e a forma como as próprias produções utilizam essa ferramenta.

Há quem defenda o resultado da pesquisa de Shitrit e Cohen, dizendo que os programas são apenas uma extensão da ficção e a motivação vem, na verdade, da compaixão e da admiração. Mas, como tudo na vida, o segredo é o equilíbrio.

MasterChef (Foto: Carlos Reinis/Band)

O HelloGiggles, comunidade criada por Zooey Deschanel, Molly McAleer e Sophia Rossi, em 2011, também entrou na psicologia por trás da obsessão pelos reality shows. Em um artigo de 2018, vários especialistas em psicologia clínica e terapia comportamental foram chamados para esclarecer o fenômeno.

Nas entrevistas, foi constatado que, apesar de simbolizar uma certa desconexão com a vida real, o consumo de reality shows só passa a preocupar quando começa a substituir vínculos com as pessoas do nosso círculo social. E nem sempre esse é o objetivo ou o efeito colateral observado.

Pessoas que já são solitárias podem não se sentir bem ao imergir no mundo dos realities, principalmente os que exageram nos personagens bonitos, ricos e preocupados apenas com festas e outras futilidades. O efeito pode ser o oposto, na verdade, e os espectadores acabem ficando ainda pior.

Mas vem daí um outro fator que pode influenciar o público. Aquelas relações são tão artificiais que sabemos, no fundo, que nada de verdade está em jogo. Não importa se aquelas pessoas vão vencer, perder, prosperar ou passar vergonha. A nossa vida está bem longe de ser influenciada por qualquer uma daquelas situações. O espectador, nesse caso, sabe que a realidade dos realities não é tão real assim.

Foto: DivulgaçãoNo fim das contas, o voyerismo que é proporcionado pela imensa variedade de reality shows atinge o público de formas diferentes. O que se deve fazer é, ao analisar as influências comportamentais desses programas, colocar em perspectiva tanto as condições com as quais eles foram produzidos como as individualidades de cada pessoa que está assistindo.

E você? É dos que assistem reality shows para torcer pelos participantes ou gosta de ver o circo pegar fogo? Ou os dois, por que não?