Tiago Picado é um nome bem conhecido dentro do cinema brasileiro por sua produção de áudio para o formato, mas agora o cara está mostrando que sua musicalidade vai muito além disso com seu primeiro disco autoral Íris dos Teus Olhos.
Previsto ainda para esse ano, o trabalho já tem três singles. Os primeiros passos foram com “Senta e Chora”, um Soul Funk que vem acompanhado de uma letra irônica sobre boletos e contas a pagar; em seguida, foi a vez de “Eu Quero É Mais”, que aposta no Reggae, e o trio fecha com “Relaxo”, que faz jus ao nome.
Agora, o artista expande ainda mais sua sonoridade com a chegada de “Estrela Vega” — a primeira canção a ganhar um clipe, enquanto as outras se limitaram aos lyric videos.
Com a ajuda de Ricardo Rito (acordeon e teclados) e seu professor de música e multi-instrumentista Alexandre Thai (guitarra, bateria e percussão), Tiago finalmente mostra ao mundo tudo que estava guardado há tempos; suas raízes musicais, aliás, vêm desde os 15 anos quando formou sua primeira banda Oddin, de Punk Rock.
Muito mudou desde então e o fato de ter trabalhado em grandes obras do cinema brasileiro, como Bacurau, Os Farofeiros e Cabrito, definitivamente colaborou ainda mais para a formação da identidade musical única de Tiago, que conversou conosco em uma entrevista exclusiva que você lê na íntegra abaixo!
Entrevista com Tiago Picado
TMDQA!: Oi, Tiago! Tudo bem por aí? Espero que sim. Queria começar elogiando as músicas que você já lançou e, em especial, a versatilidade que você exibe em cada uma delas. Elas são tão diferentes entre si! Como foi pra você se desprender de qualquer rótulo de gênero musical?
Tiago Picado: Olá Felipe e toda a galera que lê o TMDQA! Tudo ótimo e você? Um prazer poder falar com vocês! Realmente essas músicas e o álbum demonstram essa versatilidade em relação aos gêneros musicais. E esse processo foi bem natural, orgânico mesmo. Produzi esse projeto em parceria com Alexandre Thai que, além de produtor, foi meu mentor. Fomos descobrindo o que cada música pedia ou o que eu achava que ela representava em termos de arranjo e produção. Nós não tivemos muitas referências nem nos espelhamos em outros artistas para achar a sonoridade. Acredito que isso aconteceu por sermos profissionais de estúdio.
TMDQA!: Por aqui tudo certo também! Ainda sobre essa questão, como é o processo de decidir a sonoridade de cada uma delas? Por onde você começa?
Tiago: Não tivemos uma pré-produção detalhada para esse projeto. Eu apresentava a música e discutíamos um caminho a seguir, se deveria ter uma pegada mais Reggae ou Samba Rock, por exemplo. Logo após, começávamos a gravar e a experimentar. Geralmente começávamos com a percussão. A ideia era estar aberto ao que surgia e improvisar. Depois, víamos se era esse o caminho ou se precisávamos começar de novo. Só depois de já ter as bases musicais prontas é que chamávamos outros músicos para colaborar. Foi um processo muito prazeroso e muitas músicas tomaram caminhos que nunca pude imaginar.
TMDQA!: Ouvi dizer que você tem mais de 100 composições guardadas. O que te levou a selecionar essas para serem lançadas por agora? Tem alguma outra surpresa nesse sentido de explorar sonoridades diferentes no álbum?
Tiago: É verdade! E já estou louco pra começar a gravar as próximas! (risos) Selecionei as músicas que melhor representavam meu início como compositor. Queria que esse primeiro trabalho trouxesse as músicas mais antigas. E tem músicas que estavam guardadas em mim há mais de dez anos! Já estava acumulando poeira demais. Certamente o próximo projeto quero planejar melhor o processo, realmente estudar a estrutura da música e suas timbragens. Mas não tenho o desejo de me repetir e acho que a versatilidade vai ser uma característica das minhas músicas. Então podem esperar algo diferente.
Música, clipes e cinema
TMDQA!: Outra coisa bem legal do seu projeto é a parte visual. Os clipes até agora têm sido feitos em animação e no formato de lyric video, algo que realmente tem sido cada vez mais consumido. Foi uma forma de se adaptar à pandemia trabalhar assim ou era algo já planejado?
Tiago: Já era algo planejado. Tenho muitos parceiros na indústria audiovisual e realmente a Inhamis fez um trabalho incrível nesses lyric videos. A capa do álbum está muito legal também, feita pela Nina Vieira. Os deixei bem à vontade para me entregar algo que os representasse e o resultado foi muito positivo.
TMDQA!: Agora, “Estrela Vega” é a primeira faixa a ter outra produção além da animação. Por que essa decisão e, aproveitando, pode nos contar um pouco mais sobre ela já que se trata do single mais recente e que mostra mais uma direção do seu viés musical?
Tiago: Acho que era necessário me mostrar como artista e para as pessoas me conhecerem. Também quis explorar esse lado artístico de diretor. Engraçado que é a música mais antiga do álbum, meu primeiro Reggae. Mesmo assim acho muito atual, ainda mais nessa quarentena que pessoas estão demonstrando esse desejo do
encontro. Além disso, ela fala de se encontrar numa sexta-feira e não tem nada melhor que um começo de fim de semana.
TMDQA!: Sei que não é bem o ponto da entrevista, mas não podemos deixar de falar sobre seu trabalho no cinema. Como ele te ajudou na carreira musical em si? São coisas muito ligadas na prática ou nem tanto?
Tiago: Eu tenho meu próprio estúdio e trabalho na parte sonora do cinema. Na verdade eu trabalho com todas as etapas de áudio menos a parte musical. Mas certamente está ligado sim, até porque a música também faz parte de uma obra cinematográfica. Na prática os processos são muito parecidos e certamente me ajudou muito no meu crescimento como artista.
TMDQA!: Curiosamente, essa questão do cinema ficou em alta no Twitter nos últimos dias por conta de uma discussão sobre, supostamente, os filmes brasileiros terem o áudio “tão sofrível”, como dizia a publicação. Você acha que isso é verdade? Se sim ou se não, pode explicar por quê?
Tiago: Tenho certeza que tem muitos profissionais de som qualificados no mercado e não é um problema de mão-de-obra. Mas acho que carrega essa fama porque já foi muito ruim apesar de ter melhorado significativamente. Mas no final a razão para um filme ter um áudio ruim é sempre uma, o diretor. Quando o diretor quer e tem o mínimo de noção é difícil o resultado não ficar aceitável. Mas acho que tem poucos diretores brasileiros que se interessem pelo assunto e que tenham um mínimo de conhecimento sobre.
TMDQA!: Por fim, queria aproveitar a oportunidade pra dizer que também comecei na Economia e eventualmente larguei o curso para (de uma forma um pouco diferente) trabalhar com música. Sei que isso é uma dúvida e um caminho que muita gente tem receio de seguir. Que recado você tem a deixar para quem se vê nesse dilema de carreira?
Tiago: Que legal! Realmente cálculo não é pra qualquer um! [risos] Eu acho muito difícil escolher profissão nessa idade, conheço muitas pessoas que mudaram de
curso. Também acho que faz total diferença vivenciar o meio profissional. Só botando a mão na massa que a pessoa irá descobrir se aquilo é realmente o que deseja fazer. Não é uma escolha fácil. É importante para as pessoas que estão nessa fase pesquisar o máximo possível sobre o assunto, conhecer pessoas que trabalham e se inteirar de como é o meio profissional. Não tenha medo de tentar e de descobrir sua vocação.