Conversamos com a Deezer sobre transparência no pagamento do streaming

O TMDQA! conversou com Alexander Holland, representante da Deezer, para entender melhor o sistema de pagamento de streaming e seus próximos passos.

Deezer
Foto por freestocks-photos via Pixabay

Nos últimos anos, sem dúvida alguma um dos temas mais recorrentes dentro da indústria da música é o pagamento nos serviços de streaming.

O assunto é polêmico, em especial porque expõe dois lados bem diferentes da mesma moeda: um deles mostra as empresas e plataformas, que oferecem um alcance nunca antes visto para artistas — independentes ou gigantes — e o outro mostra os próprios músicos, que consideram a remuneração muito baixa, apontando para a necessidade de milhões e milhões de reproduções para ter uma renda aceitável.

O debate está longe de chegar ao fim, mas recentemente conversamos com Alexander Holland, chefe de conteúdo e produto na Deezer, um dos maiores nomes do mundo no ramo de streaming, para tentar ter algumas respostas sobre o que vai acontecer daqui pra frente com esse serviço que parece ser, de fato, o presente e futuro da indústria da música.

Adeus às velhas práticas

Praticamente todo mundo sabe qual era a receita antiga para o sucesso na música: assinar com uma gravadora e nadar em rios de dinheiro. Para quem conseguia chegar nesse ponto, era excelente; ser independente, no entanto, era um sacrifício diário. Bom, continua sendo, mas hoje temos mais produção destes artistas do que nunca, como conta uma reportagem da Rolling Stone dos EUA em 2020.

Ainda assim, o streaming pode ser uma solução interessante a esses artistas. A Deezer tem sido pioneira em aplicar uma nova tecnologia chamada UCPS (User-Centric Payment System, ou Sistema de Pagamento Centrado no Usuário), que busca distribuir a renda igualmente de acordo com as preferências de cada usuário. Holland explica:

O UCPS foi pensado para ser uma maneira justa e transparente de pagar artistas pelo streaming de suas músicas. Com um sistema centrado no usuário, os royalties [equivalentes ao valor] da assinatura de cada fã são distribuídos apenas entre os artistas que essa pessoa escutou. Não é assim que funciona hoje, uma vez que os royalties são calculados como uma porcentagem das reproduções totais gerais na plataforma. Esse sistema também elimina certos tipos de fraudes que podem ser perpetuadas por redes de bots nas plataformas de streaming hoje.

Com esse novo sistema, a Deezer busca justamente dizer adeus às “velhas práticas” da indústria musical. Ele cita o foco desta em fazer o usuário investir em assinaturas premium para realizar o consumo de música sem interrupções, e também aponta para como o streaming — que existe há menos de 10 anos no Brasil — já é a maior fonte de renda da música por aqui, inclusive acima da média mundial.

Ainda assim, há muito espaço para crescimento. Holland frisa que “para cada pessoa que paga pelo streaming no Brasil, há duas pessoas que ouvem música de outras formas”. É isso que a empresa enxerga como uma “enorme oportunidade de mudar a forma como as pessoas pensam e valorizam a música”, principalmente em comparação com o passado.

Um dos primeiros passos, para Holland, é mudar o “sistema injusto de hoje” quanto ao pagamento de royalties. Com um sistema mais transparente, no qual fãs apoiam diretamente os artistas que ouvem ao invés de serem apenas uma parcela do todo, ele acredita que haverá uma maior proximidade entre fãs e músicos.

Apoio das gravadoras e melhorias nos pagamentos de artistas

A má notícia é que a solução que muitas vezes é oferecida por aqueles que olham de fora — aumentar os pagamentos aos artistas — parece ser bem fora da realidade. Alexander deixa claro que cerca de 70% do valor que recebe vai direto para os detentores dos direitos musicais e, ainda assim, as empresas do ramo não têm tido lucro.

Mesmo recebendo US$21,6 bilhões no total mundial, Holland explica que essas companhias estão focadas em “crescer a indústria, fazer mais pessoas se tornarem assinantes, desenvolver novidades para os nossos ouvintes e apoiar o crescimento de artistas ao redor do mundo, além de pagar os salários da equipe”. O prognóstico não é bom para os músicos, mas o executivo afirma que há uma discussão sobre aumento de tarifas para tentar solucionar isso:

É difícil pensar em como podemos espremer ainda mais essa margem de faturamento já estreita e ainda ser capaz de operar um bom serviço para os fãs de música e artistas. Ao mesmo tempo, os preços de assinatura de streaming têm se mantido os mesmos por dez anos, e é algo que a indústria está discutindo.

Se engana, também, quem pensa que as gravadoras não têm mais um papel importante só porque não estão mais sustentando tão diretamente os artistas. A Deezer se considera a empresa mais preparada para testar o sistema centrado no usuário, mas destaca a participação fundamental dos grandes selos por aí:

Nós temos tudo no lugar para fazer testes e estamos prontos para lançá-los assim que possível. Mas precisamos que todas as gravadoras nos deem o sinal verde. Você não pode lançar um teste com apenas algumas gravadoras a bordo. Nós providenciamos às gravadoras uma enorme quantidade de dados para ajudá-las a entender o impacto, mas está levando tempo para ter todos a bordo.

As expectativas, apesar de tudo, são positivas. Afinal de contas, com as distribuidoras digitais ganhando cada vez mais espaço e os artistas independentes percebendo que não vão mais ganhar acordos multimilionários das gravadoras, é preciso se adaptar.

Investimento em artistas independentes

Falando nos independentes, uma de nossas perguntas foi relacionada justamente a eles. O objetivo mais cobiçado no mundo do streaming é provavelmente estar em alguma das grandes playlists das plataformas, que são seguidas por milhões de usuários dispostos a ouvir novas músicas selecionadas de acordo com suas preferências.

Ainda assim, não é muito claro como é o processo de seleção das músicas que as integram, mas Holland garante que o processo da Deezer tem “aquele toque humano que algoritmos não conseguem entregar”, o que favorece os menores nomes. Mais ainda, ele explica as iniciativas que aproximam os independentes do sucesso:

Fazemos muitas coisas para promover a diversidade entre artistas e temos uma abordagem do ‘Herói Local’ na qual trabalhamos de maneira próxima para apoiar artistas locais e gêneros ao redor do mundo. Nós também temos um time de editores ao redor do mundo que garantem que nossas playlists tenham aquele toque humano que os algoritmos realmente não conseguem entregar.

Nossos editores são especialistas em gêneros locais de todo o mundo — Pop, Funk, Sertanejo, Forró e Gospel, entre outros. Nós também trabalhamos de maneira próxima com artistas locais de todo o mundo para ajudá-los a crescer seus streams e alcançar novos fãs.

Com isso, a empresa ajuda os artistas com menos expressão a se beneficiarem também do UCPS. Afinal de contas, mesmo com as mudanças, o sistema de pagamento ainda favorece aqueles artistas que possuem mais ouvintes — e as playlists, somadas a esses programas de investimento, podem certamente ser fatores decisivos para inúmeras carreiras por aí.

Como o próprio Alexander comentou, a indústria de streaming ainda é muito nova. É impossível esperar que todas as respostas, tanto por parte da empresa quanto dos artistas, já tenham sido encontradas, mas é importante entender qual o caminho que estamos trilhando e fazer as reivindicações certas.

O sistema UCPS certamente parece um passo no caminho correto, mas só vamos saber com certeza mais à frente. Por enquanto, se quiser conhecer mais sobre o sistema da Deezer, acesse o site oficial por aqui.

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