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Segredos do cinema: o que é um bom jump scare?

O jump scare é uma ferramenta utilizada em quase todos os filmes de terror e é amada e odiada quase na mesma medida. Mas como saber se ela é boa ou não?

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Invocação do Mal (Foto: Reprodução/YouTube)

Sabe aqueles sustos que tiram você da cadeira e deixam seu coração batendo em velocidades que você nem sabia que eram possíveis? Pois é, eles são os jump scares.

Elemento presente em praticamente todos os filmes de terror, esta ferramenta passou por uma evolução ao longo das décadas e hoje desperta sentimentos mistos nos fãs do gênero.

Quando utilizado em excesso e sem capricho, o jump scare soa preguiçoso, já que é uma técnica fácil de fazer. Porém, quando bem aplicado, dá à produção uma cara totalmente diferente, aumentando a apreensão e contribuindo para a imersão na trama.

Rebekah McKendry, professora na USC School of Cinematic Arts e PhD em terror, explica em uma entrevista ao Insider que não há uma fórmula perfeita: “Jump scares são baseados em uma espécie de teoria sobre o que é o medo”.

Medo é o acúmulo, o desenvolvimento. É o tempo entre você pensar que algo pode acontecer e aquilo, de fato, acontecer.

É fácil dizer quando um jump scare vai acontecer. A luz diminui, as cenas passam a ter menos cortes e a trilha se torna assustadora. Essas são as dicas óbvias, mas o que realmente ajuda a criar um susto bem feito?

Construção da atmosfera

McKendry chama o processo de desenvolver gradativamente o clima de terror de “migalhas de pão”. Você indica que algo assustador pode acontecer por meio desses aspectos mencionados: iluminação, edição, trilha sonora etc. Mas o negócio fica bom mesmo quando é feito de forma sutil.

Isso acontece quase o tempo todo em Invocação do Mal, filme dirigido por James Wan, de 2015. O Insider destacou uma cena específica do filme que mostra exatamente isso.

A cena acontece em um quarto. Há um som de batidas lá no fundo, bem baixinho, acompanhado de uma garota sonâmbula andando durante o sono > Há pouco movimento de câmera; o guarda-roupa, que é onde vai acontecer o jump scare, está até aparecendo no take > Os sons de batidas aumentam, mas a garota já está deitada na cama, então ela não é mais a responsável por eles > A trilha vai se intensificando.

Esses detalhes são as migalhas citada por McKendry. A ansiedade é crescente e não há pressa na construção desse sentimento — a cena tem quase dois minutos de duração. Só então vem o jump scare, com a trilha ensurdecedora, a criatura sendo revelada e a garota fugindo.

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Invocação do Mal (Foto: Reprodução/YouTube)

O filme de terror tem que fazer o espectador esperar.

A precipitação leva a um susto forçado ruim — por exemplo, quando a trilha sonora crescente entra quando já sabemos o que está aguardando o protagonista. Não há efeito surpresa e a explosão sonora vem quando já estamos esperando. É uma oportunidade desperdiçada.

Como Alfred Hitchcock, um dos primeiros a utilizar o jump scare (em Psicose, 1960), já dizia:

Não há terror no ‘bang’, mas na antecipação dele.

O truque da distração

Também existe a possibilidade de usar uma distração enquanto a tensão se desenvolve. É como um truque de mágica: enquanto o filme atrai a sua atenção para um lado, prepara o susto pelo outro. Na cena já citada de Invocação do Mal, todo mundo acha que vai sair algo de dentro do guarda-roupa quando, na verdade, a ameaça está em cima dele.

Outra forma de utilizar esse recurso é com espelhos, quando o personagem abre o armário do banheiro para pegar um remédio e, ao fechar, algo aparece atrás dele. Quem criou essa técnica dos espelhos foi Roman Polanski, em Repulsa ao Sexo (1965). O uso deste recurso se esgotou há algum tempo, mas, de fato, esse é um contexto muito propício para que ele seja trabalhado.

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Um Lobisomem Americano em Londres (1981) (Foto: Reprodução)

Limite a visão do personagem

Quadros muito fechados são perfeitos para criar uma sensação de ansiedade. São duas formas possíveis de conseguir isso: por meio da câmera ou por meio da luz.

Ambientes escuros que são iluminados parcialmente por flashes, por exemplo, são perfeitos para criar um ambiente hostil. Um flash, vazio. Outro flash, o fantasma. O susto é previsível, mas não há como fugir do pulo na poltrona.

Aparelhos de visão noturna com as bordas limitadas também são muito utilizados para prejudicar a visão dos personagens e, consequentemente, a do público.

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REC 1 (Foto: Reprodução)

“Ah, mas então só dá para ter jump scares em cenas à noite?”. Negativo. A diferença é que, em cenas durante o dia, a construção da tensão tem que ser muito mais caprichada. Vide Midsommar, de Ari Aster (2019). Quase tudo acontece durante o dia e, ainda assim, o clima é super tenso.

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Midsommar (Foto: Reprodução/A24)

A limitação da visão dos personagens por meio da câmera pode se dar de diferentes formas. A primeira, mais óbvia, é quando o enquadramento se dá muito próximo das pessoas em cena. Takes muito fechados delimitam o que os espectadores podem ver para além da tela, dando muito espaço para as ameaças surgirem.

Há também a possibilidade de o público ver o que o personagem está vendo, por meio de fechaduras ou frestas em cercas, armários e etc. — isso acontece, inclusive, no já citado Midsommar.

A câmera também pode se movimentar para nos levar a lugares que a gente não gostaria de ir. Uma porta semiaberta, por exemplo, é sinal de alerta. Mesmo sabendo disso, a câmera anda diretamente para ela e nós sabemos muito bem que algo pode acontecer ali.

Ou o contrário: a câmera fica paradinha ali, nos obrigando a olhar para o local onde claramente existe um risco iminente. A ansiedade de estar cara a cara com o perigo dispara em situações como esta.

O sting

O som alto que acompanha os jump scares é chamado de “sting”. Para ser bem usado, ele tem que vir no momento do auge da ansiedade e tensão criadas anteriormente.

Quando o “sting” vem sem qualquer desenvolvimento prévio, o filme se torna apenas barulhento.

O som é um elemento tão importante na construção do susto que os primeiros filmes de terror, hoje, não têm qualquer impacto. Em A Mansão do Diabo (1985), o elemento surpresa era apenas o surgimento de coisas que não estavam na cena. O Fantasma da Ópera (1925) é outro que utiliza um corte rápido para criar um momento assustador, mas sem o elemento sonoro o efeito não é o mesmo.

Lembramos, claro, que esses filmes eram assustadores na época em que foram feitos, sim! Considerando os recursos que estavam disponíveis e que não havia nada anterior a eles no qual poderiam se basear, estas obras são importantíssimas para a história do cinema de terror.

A ameaça pós-susto

Aqui temos duas possibilidades: 1) o jump scare nos coloca frente a frente com a ameaça; 2) o jump scare é apenas uma ilusão de perigo e algo inofensivo acontece.

Um dos melhores exemplos é Alien, o Oitavo Passageiro (1979). Um baita susto é causado por um gato, que não representa nenhum risco real aos protagonistas. A partir daí, inclusive, os bichanos passaram a ser usados muitas vezes para fazer essa pegadinha.

O susto do gato é uma evolução daquele que é conhecido como o primeiro jump scare da história. Em Sangue de Pantera (curiosamente o título original é Cat People, 1942), a clássica sequência acompanha uma mulher caminhando na rua por mais de um minuto e termina com um susto causado pelo barulho alto de um ônibus, nada relacionado à ameaça principal do filme.

A cena é um marco na história do cinema e até ganhou o nome de “Lewton bus technique” — “técnica do ônibus de Lewton”, em homenagem ao produtor Val Lewton.

O problema desses sustos “fake” é que eles não contribuem para a história em si e raramente acrescentam algo à narrativa. Se o filme recorre a ele muitas vezes, é receita garantida para gerar irritação e não medo.

Moral da história

É necessária uma alternância no clima ao longo do filme para que os jump scares sejam efetivos. Se você deixa a tensão o tempo todo no alto, não há impacto algum ao assustar o espectador. A graça dos filmes de terror é justamente acostumar o público à suposta normalidade e, quando ele menos esperar, tirá-lo dessa zona.

Muitos filmes recentes têm abdicado de sustos repentinos ou usado eles com parcimônia, como Corrente do Mal (2014), A Bruxa (2015) e Hereditário (2018). Isso levou a uma onda de críticas a esse “novo estilo” de filmes de terror, mas, no fim das contas, é apenas mais uma forma de contar histórias assustadoras.

Assim, pode-se concluir que a melhor forma de usar jump scares é não exagerar. Não é necessário cortá-los definitivamente das produções, mas também não é preciso assustar o pessoal a cada cinco minutos. Equilíbrio é o segredo!