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TMDQA! Entrevista: BK', "Cidade do Pecado" e um retrato íntimo do verdadeiro Abebe Bikila

Em seu novo EP "Cidade do Pecado", o rapper BK' mostra seu retrato mais íntimo. Veja mais detalhes nesse papo exclusivo com o TMDQA!

BK'
Foto por Wallace Domingues

Já tem algum tempo que BK’ se estabeleceu como um dos maiores nomes do Rap nacional. Ainda assim, o rapper surpreendeu — e muito — com o lançamento de Cidade do Pecado, seu novo EP que traz um retrato mais íntimo do que nunca da vida de Abebe Bikila Costa Santos.

Usando batidas mais próximas do Funk e do Samba mas sem perder o seu flow característico, BK’ encontra espaço em sua nova sonoridade para abordar alguns dos temas mais pessoais de sua carreira. As cinco canções que compõem o trabalho trazem um grande tom de desabafo, além de serem resultado de um período de reflexão interna.

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Em um papo pra lá de descontraído, BK’ falou com o TMDQA! sobre temas que vão desde as inspirações para a obra até as origens do rapper e sua relação com jogos de videogame.

Você pode conferir essa entrevista na íntegra logo abaixo. Prepare-se para mergulhar na Cidade do Pecado!

TMDQA! Entrevista BK’

TMDQA!: BK, primeiramente, que prazer falar com você sobre um projeto tão especial. E a última vez que você apareceu aqui foi justamente como Artista do Mês, né.

BK: Foi irado demais! Irado demais.

TMDQA!: Nosso primeiro Artista do Mês, e isso foi lá em Janeiro de 2021. E desde então são vários lançamentos — singles, feats, e mais recentemente o EP. Por que você sentiu que esse era o momento de investir nessa direção, dos singles e agora do EP?

BK: Bom, vamos lá. Eu dei uma entrevista pro RAP TV no ano passado e falei que eu tinha vontade de estar lançando mais coisa. Porque eu quero estar contribuindo mais, eu quero estar mais próxima, e a cena é uma cena que está sempre se renovando, e eu acho que é legal você estar ali sempre acompanhando e estar lançando coisa.

E, cara, eu ficava pensando. Eu sempre levo dois anos pra fazer álbum e álbum é legal pra amadurecer, é legal pra lapidar melhor o trabalho, mas cara… é isso, nem sempre o trabalho vai ter que ser o melhor trabalho, tá ligado? Nem sempre. Às vezes você tá pensando em uma sonoridade, você pensou em um flow que você achou legal, grava e lança. Não precisa esperar. Porque pra mim, se eu demorar muito pra lançar as coisas, elas acabam meio que perdendo o sentido.

Então, tipo assim, de três discos que eu lancei eu devo ter mais três discos só que eu enjoei nesse processo, tá ligado? E comecei a fazer outras coisas. Então, eu quero é isso: eu quero estar mais presente, eu quero estar lançando coisas que vêm na minha cabeça. Independente de, “Ah, melhor trampo do ano, melhor trampo do BK”, independente disso. Eu quero estar soltando coisas que eu tô fazendo no momento, quero apresentar mais esse mundo meu pro meu público.

TMDQA!: E justamente na entrevista do Artista do Mês você falava que tava pensando em fazer um disco e tal. Isso foi o que virou o EP?

BK: Virou o EP. Aí eu já fui pensando também que a gente quer lançar mais coisa, mas tem que ter aquele cuidado também de não acabar saturando. Então eu tive essa noção: cara, a gente lançou bastante feat, fiz participação em várias músicas. O disco tinha 13 faixas, e aí eu pensei, “Cara, acho que não é a boa também”. Eu quero participar mais mas tem que ter um cuidado.

Então a princípio eu ia lançar 8 faixas. Eu falei, “Vamos tirar essas daqui, vamos deixar 8 faixas e vai ser um álbum de 8 faixas”. Aí no meio disso, o JXNV$, que é o produtor, ele tava lá na gringa, voltou agora de LA e falou, “Cara, o que eu mostrei aqui, o que o pessoal mais gostou foram essas cinco”. E aí eu falei, “Cara, são exatamente as que eu mais tava curtindo também”. Então o universo tá conspirando, vamos deixar essas 5 e vamos no EP. Porque é isso, é um projeto. Acho que agora álbum, disco, EP… são projetos.

TMDQA!: De fato são cinco músicas que… sabe, às vezes realmente quando a gente ouve um álbum, falando de forma geral, tem aquele sentimento de, “Será que essa música precisava estar aqui?”…

BK: Exatamente!

TMDQA!: E essas você vai ouvindo e todas você pensa que tinham que estar ali mesmo, são todas muito boas.

BK: Exatamente. E a parada ficou assim, tipo, 16 minutos. Tu ouviu, fala, “Caraca!”, aí tu vai poder ouvir de novo. Mano, tipo assim, tu vai entregar um álbum de, sei lá, aproximadamente uma hora. O cara ouviu aquilo ali, se o cara não gostar — o cara, a mina, galera não vai voltar pra ouvir tudo de novo, vai esperar uma outra oportunidade pra ouvir.

Eu falo muito: tem cinco faixas aqui. Se a galera quiser entender, em uma escutada ali, duas, ela gastou meia hora ouvindo. Rapidinho. Vai descer aqui pra ir na padaria comprar o pão com o fone de ouvido, já ouviu o EP. Então…

TMDQA!: Exato. Falando musicalmente, a principal surpresa pra mim nesse EP foi ver você usando umas batidas do Funk, do Samba, que acho que foi algo que sempre esteve presente pra você mas agora foi abraçado completamente. De onde veio isso?

BK: Sim! Cara, duas coisas. Uma é que eu sempre tive muita influência do Funk, mas eu nunca joguei isso de fato. Tipo assim, eu sempre falo que no começo eu queria ser MC de Funk, eu sempre trago muita coisa do Funk, desde o beat até o flow, mas eu nunca de fato abracei isso. Então eu falei, “Mano, vou abraçar isso. Vamos mostrar mais as coisas, vamos além”.

E cara, uma discussão que eu tenho sempre com os meus amigos assim em conversas é que, no mundo todo, todos os outros países arrumaram seu próprio jeito de fazer Rap. Eles têm seu próprio Rap. Tem a referência máxima que é a norte-americana e não tem como fugir daquilo porque os caras são os caras, mas cada lugar tem o seu jeito de fazer. Tu vai na Inglaterra, tem o jeito deles de fazer a parada. E eu acho que o nosso jeito, e essa é a minha opinião, é aproximando realmente das nossas coisas! Que é o Funk, o Samba.

Eu uso muito como referência o Marcelo D2 nesse trampo, porque o D2 foi o cara que fez isso. Ele fez um “Rap BR”, o Rap brasileiro. E aí eu falei, “Cara, então, acho legal tentar essas paradas também. Vamos tentar”. Tipo assim, até pensando em mercado fora do Brasil, tá ligado? É isso, a barreira da língua, mas o que os caras vão curtir? Os caras vão curtir a sonoridade, e não vão querer curtir a sonoridade que eles já têm lá. Eles vão querer ver como que é o som feito no Brasil, tá ligado? É pensando nesse mercado também.

Então a gente vai juntando um pouco das coisas, um pouco de cada vontade, de cada análise, e monta.

Cidade do Pecado

TMDQA!: Muito legal você falar isso de fazer do próprio jeito, porque me lembro de uma vez que fui pra Portugal e acabei esbarrando em muito Rap dos outros países de língua portuguesa e é muito diferente, né? E você trouxe um pouco disso agora com a Mayra Andrade, que é de Cabo Verde. Como foi esse intercâmbio? A ideia é realmente aproximar os países de língua portuguesa?

BK: Também, também! É uma vontade nossa sim. Você falou de Portugal e a gente foi pra lá em 2019, fizemos dois showzões lá, deu sold out, foram muito maneiros os dois. Então é isso, cara! Vamos conversar com esses outros lugares que tem a língua próxima da nossa, vamos estar mais próximos.

Porque é isso, a gente abre um leque não só de shows, não só de mercado, mas de arte mesmo. De estar trocando. Tipo assim, mano, o trampo dela é um trampo sensacional! Quando eu vi que tinha a chance de rolar eu falei, “Mano, por favor, alguém me arruma o contato dela. Se é possível, vamos fazer!”. Porque é isso, eu quero estar trocando.

Até as outras participações, o niLL já é mais conhecido — mesmo no underground, o niLL já é conhecido. O Nochica é um moleque que é muito sujão aqui do Rio de Janeiro, e eu falei pra gente trazer essas paradas, e a gente já fez essa parada da sujeira mas acabou seguindo pra outros caminhos. Mas vamos trazer isso, vamos conversar com os lugares!

Tipo assim, a MC Marcelly, eu queria muito uma mina brabona do Funk dando os papos ali. Eu falei, “Tem que ter uma mina”, e quem é? É a Marcelly. Então vamos juntar os mundos todos, tá ligado?

TMDQA!: Eu ia até perguntar da Marcelly, porque é uma pessoa realmente 100% do Funk, né.

BK: Exatamente. Uma mina do Funk mesmo. E a faixa é isso. O EP mesmo, ele soa bonito mas as rimas e tal… ele é sujo. Ele é das ruas mesmo, tipo assim, os acontecimentos ali são sujos. Então eu falei, “Mano, vamos entregar a parada bonita e suja ao mesmo tempo”. E acho que graças a Deus escolhi as pessoas certas.

TMDQA!: Você falou das letras e eu senti que esse EP é realmente muito profundo, né? É um disco muito de reflexão. Você acha que foi a pandemia que te colocou nesse processo de reflexão? Porque tem uma batida de Funk rolando mas você tá ali falando sobre se sentir sozinho e tudo mais. Isso me pegou bastante! Não é um Funk feliz, é pesadão, de fazer refletir.

BK: Exatamente. Foi isso que a gente quis passar também. A gente teve até um cuidado na capa. Porque a gente tinha outra capa antes que parecia ser outra coisa, parecia ser uma parada talvez muito dark, e eu falei, “Cara, não é”. Porque o beat, ele dá essa sensação de que tá tudo legal ali, mas a letra não.

Acho que a pandemia… Cara, eu escrevi tudo isso durante aquela fase ali durona mesmo da pandemia, sem expectativa de vacina, sem expectativa de volta. E eu acho que talvez no meu subconsciente a gente tenha sentido falta de estar nos lugares, falta de estar vivendo, tá ligado? Cidade do Pecado é experiência de vida. São experiências não tão boas, mas são experiências de vida. Então eu acho que um ponto foi esse, a gente não tava podendo viver, sentir a rua acontecendo igual a gente sentia.

Porque o que inspira a gente é a rua, tá ligado? Independente da quantidade de show que eu faço, do lugar que eu vou, eu tô sempre frequentando a rua porque é o que me inspira, é o que eu gosto. Acho que a falta disso me fez relembrar esses momentos de Cidade do Pecado e passar isso pro papel.

Isso de estar sozinho, vazio, é real isso da pandemia ali, mano. Tem uma festa clandestina rolando aqui do lado, tem uns contatinhos aqui no número, mas tu tá ali, mano. Sem saber pra onde tu vai, sem saber o que tu vai fazer. E aí? Eu tenho isso tudo, eu tenho a festa ali, eu tenho uns contatos aqui, mas e aí? Eu não tô sentindo a vida acontecendo.

TMDQA!: Justamente achei isso muito foda, de você falar da Cidade do Pecado não pra glamurizar a situação mas sim de um ponto de vista de alguém que tá preocupado com a situação, com as pessoas que são engolidas pela metrópole todo dia, que são até impedidas de lutar contra o capitalismo por conta disso. Qual a sua experiência com isso e como foi trazer isso pro disco?

BK: Caraca, essa pergunta é boa. [risos] Então, vou amadurecer até chegar nessa resposta. Cidade do Pecado, o EP, é exatamente isso: é o capitalismo. São pessoas que de certa forma se renderam àquilo, que eu acho que é a nossa sociedade hoje. É aquele desejo desenfreado, são coisas que você nem sabe se você realmente quer ter ou se você quer fazer, mas por você estar nessa metrópole, nessa cidade, nessa sociedade louca, você acaba se envolvendo com aquilo. Acho que o tema de Cidade do Pecado é esse. É essa cidade caótica, é o capitalismo e não é a revolução, não é lutando contra isso, tá ligado? É realmente do ponto de vista dali de dentro, de quem tá sofrendo com aquilo.

São os medos, são as angústias, as preocupações, os exageros. Essa faixa com o Nochica e a Marcelly é o último baile antes da guerra, tá ligado? É exatamente o exagero, é bebida, é “se os inimigos quer vir manda eles vir também, mas tamo aqui curtindo com as minas”, tá ligado? Acho que é essa vivência toda.

E como o capitalismo atingiu diretamente o BK? Como posso dizer… Cara, eu me vejo também como uma pessoa afetada diretamente por isso. Mas graças a Deus eu sou uma pessoa que consegue observar as coisas. Isso desde a minha mãe, a minha vó, eu sempre soube observar. Então, em alguns momentos, eu consigo ver o meu comportamento e consigo, “Pô, isso aqui é hora de frear. Isso aqui tá errado, isso aqui não tá certo”. E levar isso pro EP também.

Tipo assim, algumas coisas dali são vivências minhas também. Eu falei, “Mano, isso aqui eu tô exagerando. O que é isso, cara, a gente precisa frear isso”. E passa isso pro papel. Mas eu entendo que eu sou também uma pessoa que vive nessa Cidade do Pecado, por isso que foi mais fácil de falar sobre isso dessa forma. Mas eu sou uma pessoa que tenta sempre estar fugindo dessa Cidade do Pecado, porque a gente não tem como falar que a gente não é envolvido por isso.

A gente vem de lugares — eu gosto sempre de puxar pro povo preto, pra galera da favela, e é isso, a gente veio de outros lugares, a gente começa a acessar outros lugares e não tem como falar que você nunca vai ficar deslumbrado com aquilo. Porque aí é você ser perfeito demais, mano. Achar que em nenhum momento a pessoa vai se deslumbrar com aquilo? Ainda mais no Rio de Janeiro, uma cidade em que todo mundo é artista. O cara não é artista mas o cara é artista. Todo mundo quer ser. A cidade faz isso contigo. Tu tem que ser alguém. Isso é bizarro, mano. São todas essas coisas aí que eu tentei passar pro EP.

TMDQA!: Deu muito certo e a sensação que dá é que você realmente está falando em nome dessas pessoas que não têm forças pra lutar contra isso.

BK: Exatamente.

Os desafios e dilemas da indústria musical

TMDQA!: Bom, mudando um pouco de assunto e indo pra uma pergunta mais aleatória… Eu tava assistindo à live do Casimiro outro dia [risos] e você apareceu por lá com um áudio que eu achei muito bom, de você falando que não faz música pro TikTok e tudo mais. Ouvindo esse EP, isso fica realmente bem claro; é um trabalho com um conceito, não é um trabalho preocupado em viralizar. Primeiramente, como você definiria o objetivo de Cidade do Pecado se não é fazer sucesso, “hitar”?

BK: Irado, irado! [risos] Vamos lá, deixa eu tentar me explicar. [risos] Não é que a gente não queira que o trabalho faça sucesso ou viralize. Isso, mano, aí eu vou estar sendo contra o que eu sou, contra os meus princípios; é óbvio que eu quero que a música chegue em todos os lugares possíveis, mas eu também não acho que eu tenha que fazer tudo de qualquer jeito só pra música funcionar. Eu tenho meus princípios, então tem coisa que eu não vou fazer.

Tipo assim, a questão do TikTok, a gente até tem uma conta no TikTok agora. Mas você não vai ver o BK dançando ali, obviamente. [risos] Não que eu não goste de dançar! Pô, se tu tiver numa festa aí, eu vou estar aqui bebendo uma cervejinha, eu vou aqui, balançar o ombrinho, a gente é do Funk, a gente ia pro baile e mandava os passinhos todos. Mas não é só o TikTok, tá ligado? Eu sou o tipo de pessoa que… eu tenho os meus princípios, eu não vou fazer qualquer coisa só pro trabalho viralizar. “Ah, tem que fazer isso e isso”… se eu achar que não faz sentido pra mim, eu não vou fazer.

Óbvio que eu quero que o trabalho chegue no máximo de lugares que for possível, mas se você vem e fala, “Ah, BK, você tem que fazer tal coisa” e eu não achar tal coisa legal, eu não vou fazer e ponto. E isso inclui, sei lá, fazer algumas palhaçadas. Tipo, até fazer música pro TikTok. Eu não sei como que faz música pro TikTok! Eu não sou o cara que consome TikTok todo dia, então eu não sei como a parada funcione. Tenho que me atualizar com isso, eu tenho essa noção, mas uma coisa é eu me atualizar e outra coisa é isso, é Cidade do Pecado, tu acaba virando parte da máquina.

É aí que Cidade do Pecado entra, se ligou? [risos] Eu tenho que tentar fugir um pouquinho da Cidade do Pecado.

TMDQA!: [risos] Pode crer! Mas a gente vê às vezes exemplos de coisas que viralizam sem querer, né? Acho que um exemplo recente é o FBC, com o “Se Tá Solteira”. Como você enxerga uma situação como essa, onde você tem uma música que faz parte de um trabalho maior, que tem um propósito, e acaba viralizando e perdendo esse propósito de certa forma? Porque virou uma trend, uma dança. É um problema ou tudo bem?

BK: Eu acho que talvez o single de todo trampo, o famoso hit, tem aquela função — além de bombar muito — de trazer pessoas pra conhecerem mais do teu trabalho. Então eu acho que tipo, mano, a gente fez uma música no EP e lançou e alguma viralizou no TikTok… se a partir daquilo as pessoas conhecerem o resto do meu trabalho, acho maneirão. Acho bonito demais e acho que a intenção do single bombar é essa, é trazer pessoas.

Tipo, muita gente conheceu o meu trabalho ouvindo “Planos”. E gostou do que eu tinha pra mostrar no meu trabalho a partir de “Planos”. Algumas pessoas não ouviam tanto Rap, ouviram “Planos”, começaram a ouvir meu som e começaram a ouvir outras coisas de Rap.

TMDQA!: O próprio Poesia Acústica, né.

BK: O Poesia Acústica! Muita gente me conheceu a partir do Poesia Acústica, a partir da música que eu fiz com o Filipe Ret há muitos anos.

Então, eu acho que isso é legal. Mas é não deixar aquilo moldar a sua carreira, tipo assim: fiz “Planos”, “Planos” bombou. Eu vou fazer só “Planos”? Não, tá ligado. Eu acho que é isso. Dando um exemplo: alguma música que eu lancei viralizou no TikTok, eu não posso fazer todas as minhas músicas pensando no TikTok. Acho que é esse discernimento que tem que ter.

É muito bom, recebi, sou grato pelo que chegou através dali, mas gente, eu tenho um outro trabalho aqui, olha. Eu faço isso, faço isso, isso, isso… e eu vou continuar fazendo meu trabalho, não mirando só o TikTok.

TMDQA!: Bom, e agora que você já lançou o EP, o projeto do disco ficou de lado, então?

BK: Cara, olha só, eu tenho muitos projetos ainda pra 2022. Agora como eu tô agilizando, voltei a andar com as coisas do selo, do Gigantes… tem a mixtape do Gigantes que eu quero lançar, eu tenho uma ideia — é até um segredo que eu vou contar, mas vou contar porque o papo tá rolando — de que talvez Cidade do Pecado possa virar uma trilogia. Talvez possa fazer mais dois EPs, eu tenho bastante música. É uma sonoridade na qual eu vou investir agora.

Tipo assim, não é uma coisa que eu vou só entregar e ah, rolou muito bem, já vou pra outra coisa ou ah, não rolou tão bem, já vou pra outra coisa. É uma sonoridade que eu quero investir, essa da Cidade do Pecado. Talvez amadurecer mais, não sei se é essa a palavra, não sei se sujar mais, não sei.

Então é isso, eu tenho uma série de projetos.

TMDQA!: Não precisa necessariamente ser um disco, né.

BK: Exatamente. Porque é isso, cara, eu acho que hoje em dia são projetos, tá ligado? A arte é feita e consumida de várias formas, acho que eu não preciso mais focar só no disco. Ah, tenho que fazer um disco de 10, 13 faixas. Não sei se tenho que fazer só isso, eu posso entregar minhas coisas de outra forma.

TMDQA!: Sim, eu acho que a gente vai começar a ter que fazer listas de EP e coisas do tipo aqui nos finais de ano também. Porque tem muita gente seguindo por esses lados!

BK: É! Eu consegui fazer uma parada bem fechadinha e eu gostei muito. É o tempo curto, acho que as músicas têm o tempo de duração bem legal, acho que conseguiu passar bem a ideia, então beleza.

Foi o que a gente falou no começo. Talvez eu pare pra fazer um disco com 13 faixas e aí você fala, “Pô, essa aqui não precisava estar aqui”. Tipo assim, até um outro segredo aqui: a minha única coisa no [disco] Gigantes é que talvez eu tiraria duas faixas ali do álbum.

TMDQA!: Quais?

BK: Aí eu não vou falar, porque aí é foda. [risos] Aí já é demais. Porque teve faixa que inverteu a ordem, tá ligado? Tipo assim, terminou com “Correria (Remix)”, mas não era pra terminar com “Correria (Remix)”. Foi realmente na correria que aquela teve que ser a última faixa.

Eu não posso falar aqui porque fica feio, tá ligado, mas tem duas faixas aí… não é “Correria (Remix)” não, hein? Pelo amor de Deus. Ela sempre ia estar, mas ela ia estar mais pro meio do álbum. Eu queria terminar o álbum com a “Vivos”, com o Baco Exu do Blues. E tem duas faixas ali que eu acho que se eu tirasse, o álbum ia estar perfeito. Pra mim ia estar perfeito.

Selo Gigantes e origens de BK’

TMDQA!: E falando em Gigantes, eu tenho uma última pergunta pra você…

BK: Pode continuar fazendo, cara! Sem pressa!

TMDQA!: Beleza, então! Mas enfim, agora você tá lançando seus trabalhos pelo seu próprio selo. Me conta um pouco da importância disso pra você?

BK: Cara, primeiro, artisticamente falando, é não ter influência mais de outras pessoas ou de outros lugares. É tudo meu. Eu acho que se eu estivesse em outros lugares eu não conseguiria soltar esse trampo dessa forma que eu quero, tá ligado? Porque é isso, você sempre tem influências internas, alguém que vai falar.

Eu acho que o artista consegue chegar — não quero falar no auge, nem no ápice — mas ele consegue atingir ótimos momentos quando se liberta das coisas. Acho que eu me libertei de algumas coisas ali, de técnicas de escrita que eu já não estava mais tão feliz em fazer. Mas é isso, é uma parada que as pessoas gostavam e eu era conhecido por isso, então quando eu ia gravar as pessoas falavam, “Não, BK, mas tá faltando isso, isso e isso”. Isso não tem mais. Eu me libertei disso.

Acho que consegui chegar nesse bom momento, creio que é um ótimo momento no EP por eu conseguir me libertar de algumas coisas. Essa é a maior importância da parada pra mim, cara, de estar fazendo a parada do meu jeito, do jeito que eu gosto; eu que sei, tá ligado? Se der certo, deu, se der errado também tá na minha responsa. E assumir isso, assumir a “empresa BK” de fato. “Agora eu que vou ditar isso aqui certinho”, tá ligado?

E claro, tem pessoas trampando comigo, mas agora eu quero deixar a parada fluir da minha forma. Se eu não tivesse fazendo o lance do Gigantes, eu talvez não ia poder estar lançando tantos projetos em 2022 como eu quero. Quero lançar a mixtape, quero lançar um EP, quero lançar disco do JXNV$. A gente quer fazer coisas, então, tá ligado? Se não fosse isso, talvez não ia dar pra fazer. E eu tenho agora a liberdade de fazer o que eu quiser e o que tá ao meu alcance.

TMDQA!: Faz sentido. E agora eu já estou entrando no improviso aqui, porque as perguntas acabaram mas o papo realmente tá bom. [risos]

BK: É isso! Tava pensando aqui, “Pô, já vai encerrar? Papo tá mó maneiro!”. [risos]

TMDQA!: Outro dia eu falei com o Ret sobre o projeto Tributo ao TTK, e acho que seria legal você falar mais um pouco disso, porque você também tá muito envolvido nisso, né? E ainda tem essa influência do D2, tem o KTT e tudo…

BK: Cara, eu morava em Jacarepaguá. Morei até meus 20 anos de idade lá. Sempre gostei muito de Rap, mas na época não era tão forte igual é agora. Tinha as coisas de Rap acontecendo em Jacarepaguá, mas na minha bolha, vamos falar assim, era só eu que consumia Rap. Então era difícil — difícil assim, não de sofrido, mas eu não tinha com quem trocar tanto, porque realmente era eu que curtia.

Quando eu vim morar pra cá, pro Catete, é outra parada. Comecei a ter rolé mais próximo com a galera do skate; tipo, na Lapa sempre rolou muita coisa de Rap muito forte, desde as batalhas, então quando eu vim pra cá foi outro mundo que eu vi. Aquilo ali abriu minha mente de outra forma.

Eu e o Bril, do Nectar [Gang], a gente se conheceu assim. Por causa de roupa. Tipo assim, eu com as peças maneiras, o moleque com as peças maneiras, e os dois se encarando assim! “Qual foi, o moleque tá ligado nas paradas novas, mané”. Aí, se ligou? Já era o mundo que eu queria estar. E o Catete, Lapa, esse pedaço aqui, é um lugar sempre muito próximo dessa cultura urbana. Do skate, do graffiti, do Rap.

Quando eu cheguei aqui, mano, parecia que… eu fiquei, “Mano, que é isso? Existia isso aqui a vida toda? Onde que eu tava, mano? Isso aqui tava do meu lado e eu não sabia!”. Eu vinha pra Lapa todo fim de semana, pegava o 268 lá na CDD e descia aqui nos Arcos, ficava doidão e voltava pra casa. A gente não vivenciava aquilo ali, não sabia o que acontecia além da sexta-feira e do sábado.

Porque rola muita coisa na Lapa. É realmente um polo de cultura. Só que a gente não sabia, então quando eu vim pra cá… Por isso o meu amor por essa área. Eu gosto sempre de estar falando da área nas músicas. Não daquela forma de, “Ah, meu bairro é mais perigoso”, porque isso rola muito no Rap mas não é o lugar mais perigoso. Mas é um lugar muito maneiro e que fez a minha mente expandir por conta desse encontro de culturas.

Tinha aqui o Ademar Luquinhas com a Ademáfia, que é uma galera muito forte do skate, o CHS também, do Nectar, quando a gente tinha o grupo. O CHS é antigo, do Conexão Penetra, os caras organizavam a batalha e na batalha você ia conhecendo muita gente. Galera do teatro, galera de não sei o que lá, então realmente você tinha um encontro ali com culturas diversas — e na rua, bebendo latão de cerveja a 3 reais. Perfeito.

TMDQA!: E é muito doido porque é uma parada diferente, né? Imagino que seu primeiro contato ali com o Rap foi com o Racionais, mas eventualmente o Rap carioca realmente tomou uma forma diferente. Não entrando no mérito de ser melhor, pior, enfim, mas é diferente.

BK: Exatamente, sem dúvidas! Eu acho que a nossa geração, que veio fazendo Rap, e a que tá vindo agora que é mais nova do que eu, a gente sempre teve muito contato com o Funk. Eu sempre gosto de falar isso. O Funk proibidão… antes de eu começar a ouvir Racionais, eu ouvia Cidinho e Doca. Eu ouvia Gil do Andaraí, falecido MC G3, Mr. Catra, MC Mascote do Vidigal, o Galo da Rocinha… sempre foi muito próximo da gente.

A gente começou a trazer essa linguagem que sempre foi muito próxima da gente, do Funk, do proibidão, e começou a trazer pro Rap que é a nossa vivência também, tá ligado? Acho que por isso que o Rap do Rio de Janeiro tem esse modo diferente de ser feito, porque é uma cultura que é normal daqui. O proibidão do Funk é muito normal. Acho que isso que deu o tempero diferenciado do Rap do Rio de Janeiro.

Porque todo mundo do Rap do Rio de Janeiro dos últimos tempos pra cá vai ter um flowzinho ali de baile, vai ter uma rimazinha ali que é referência a algum Funk do baile. E de certa forma foi expandindo pro Brasil. Se você for ver, outros lugares também tão trazendo isso do Funk, de misturar o proibidão no Rap, os flows, os papos.

TMDQA!: Sim, faz sentido. Aproveitando que o papo tá legal, vou usar a oportunidade pra voltar lá no Líder em Movimento pra fazer uma pergunta que eu sempre quis fazer. Na “Megazord”, tem um sample de Chrono Trigger [jogo de Super Nintendo], né? Foi coisa sua ou do JXNV$ isso? [risos]

BK: Sim! O JXNV$ sampleou o Chrono Trigger, mas ele nunca jogou. Quem zerou Chrono Trigger várias vezes e viu vários finais fui eu! Eu que vi vários finais. Final que todo mundo vira sapo, final que o Lavos acaba com tudo, uma porrada de final quem fez fui eu. O JXNV$ sampleou mas ele nunca jogou Chrono Trigger. [risos] Quem jogou fui eu.

TMDQA!: Pô, aí sim! E tem mais coisa do tipo que você curte? Me fala aí, sei lá, seu top 5 de jogos.

BK: Top 5 jogos? Putz, tem tempo que eu não jogo alguma coisa assim que me pega muito. O último foi o Horizon: Zero Dawn, acho que é assim que fala? O da garotinha lá. Bom demais! Foi o último que eu parei, nesse estilo mais RPG, que eu fiquei até o final jogando.

Cara, o Breath of Fire IV, se não me engano. É o que tem o Ryu e o Fou-Lu, se não me engano é o IV.

TMDQA!: Nossa, maravilhoso. Eu tenho até hoje a fitinha do Breath of Fire II aqui.

BK: A fitinha, aí sim! Esse eu era viciadasso mesmo, eu lembro que eu zerei, voltava a jogar, zerei, voltava a jogar…

Cara, eu gosto muito também de GTA. É um jogo que quase todo mundo gosta, mas eu jogo bastante. The King of Fighters de Neo Geo, eu tenho um fliper aqui! É que ele tá quebrado, eu tenho que consertar. Mas é aquilo né, ficar pegando as moedas na bolsa da mãe pra ir jogar no fliper, chegar em casa e apanhar? Tá ligado, né? [risos]

TMDQA!: É o 97?

BK: Eu gosto do 98! Mas são os que eu mais jogo, 97 e 98. Mas o 98 eu dou trabalho. Me ganhar no 98 é difícil. Teve uma vez que eu fui pra São Paulo, ganhei do Febem, ganhei de um montão. Pode perguntar pro Febem. Eu zerei o rolê aí. Eu sei jogar.

TMDQA!: Eu era viciado em Marvel vs. Capcom, na real.

BK: Bom demais também! Um jogo que eu queria ser melhor do que eu sou é o FIFA. Eu jogo FIFA quase todo dia pra passar o tempo, mas eu não sou tão bom quanto eu queria ser.

TMDQA!: Pode crer! FIFA eu também não manjo tanto não. [risos] BK, muito obrigado pelo seu tempo, foi um prazer enorme bater esse papo contigo. Conte com a gente sempre e até a próxima!

BK: Tamo juntão! Sempre bom falar com vocês. Valeu, valeu!