Do cenário underground de Brasília para as maiores playlists do Brasil. Essa é a trajetória traçada por Hodari, músico que tem suas origens ligadas ao Emo mas que encontrou em um estilo único de Pop o hit “Teu Popô”, que o lançou à fama em 2018.
Desde então, ele havia lançado apenas mais uma canção solo, “Netflix”. Isso mudou no final de 2021, quando o cantor, instrumentista e compositor que já trabalhou com nomes como Luísa Sonza, Vitão e Urias finalmente nos mostrou mais um pouco do seu poderoso arsenal de ferramentas de escrita no EP PRAYA E SOL.
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Ao mesmo tempo em que voltou a explorar a estética calorosa que lhe colocou no radar nacional, Hodari também vem se reconectando com suas origens e recentemente passou a integrar a banda da carreira solo de Di Ferrero (ex-NX Zero), tocando guitarra nos singles mais recentes, ”
O resultado de toda essa mistura musical começa a florescer com esse EP mais recente, mas esse é apenas o primeiro passo. Em um papo exclusivo com o TMDQA!, Hodari contou mais do que vem por aí, relembrou suas origens e a trajetória tão única que o levou ao lugar em que está hoje.
Confira na íntegra a seguir!
TMDQA! Entrevista Hodari
TMDQA!: Oi, Hodari! Primeiramente, que prazer falar com você. Fiquei muito feliz primeiramente porque você está voltando a lançar músicas suas, e esse EP tem várias sonoridades, né? Tem a coisa do afrobeat, mas também tem uma coisa que é quase um Axé ou uma música de Carnaval. De onde surgiram essas inspirações?
Hodari: Acho que esse trabalho foi bem experimental, sim. Eu fui trazendo todas as referências que eu tenho da música, desde o Samba, do Jazz, do Blues, até sei lá, as nossas referências eletrônicas também, do Pop mundial, sei lá, do Afrobeat também. Eu quis pegar um pouquinho de tudo assim, sabe, um pouquinho de cada tempero.
Eu enxergo as músicas muito… eu gosto muito de viajar, sabe então a cada música eu gosto de tentar desenhar um ambiente, um sentimento diferente. Então, eu também busquei bastante isso nesse trabalho, poder propor vários cenários diferentes, para não ficar na mesmice.
Eu acho que tem vários artistas que eu curto muito mas às vezes você vai escutar um álbum e tem mais ou menos a mesma cronologia ali. Então eu quis poder explorar um pouco de cada estilo musical, para também ter um panorama do que que a galera vai curtir mais, do Hodari também.
É o meu primeiro EP, ano que vem tudo dando certo tem álbum também. E depois desse tempo todo que eu fiquei nesse hiato, sem lançar nada, só trabalhando com outros artistas, eu estou bem feliz de estar chegando com esse trabalho no cenário da música, da MPB brasileira.
TMDQA!: Cada música meio que é seu próprio universo, né? Queria falar primeiramente de “PRAYA E SOL”, que também dá título ao EP e ganhou clipe. Por que essa escolha?
Hodari: Eu acho que “PRAYA E SOL” consegue englobar essa estética geral, dessa vibe bem feliz, dessas músicas que a gente estava tocando agora, com uma estética bem do verão mesmo, pra resgatar esse nosso sentimento de esperança também pós-COVID. Tipo, a gente tá dois anos aí enclausurado dentro das nossas próprias casas.
E acho que esse EP “PRAYA E SOL”, esse nome, eu acho que ele vem como uma esperança mesmo de poder estar habitando as praias, um lugar que eu amo muito. Praia, o mar… E o popular, né? Praia você vê rico, você vê pobre, todo mundo no mesmo lugar. Não tem que pagar ingresso pra entrar.
Eu acho que “PRAYA E SOL” consegue englobar essa estética que eu quero trazer que é bem do popular mesmo, do acessível, sabe? Fácil de entender — rebuscado, mas fácil de entender, fácil de absorver. E eu gosto muito dessa estética também do vendedor ambulante, da galera fazer aquelas musiquinhas pra estar vendendo os produtos. Eu acho que “PRAYA E SOL” conversa em comum com todas as outras músicas que tão dentro do EP, e por isso escolhemos ela pra sair como single e como clipe também.
TMDQA!: Eu sinto que no EP todo há muita atenção ao detalhe. Se não me engano é em “SOL RAYO” que tem uns detalhes de produção bem interessantes. Sei que não é necessariamente você que assina a produção, mas quão envolvido você está nesse processo de buscar esse “rebuscado” que você falou ao mesmo tempo em que tem um som radiofônico, pronto pra chegar em todo mundo?
Hodari: Eu acho que o fato de eu tocar vários instrumentos possibilitou colocar toda a minha carga detalhista. E eu tenho o lance da tatuagem também, e na minha tatuagem — como eu trabalho com linha fina, que requer um detalhe muito precioso, eu levei isso pra minha música. Estar entendendo cada momento, tratando cada segundo com uma delicadeza harmônica, de ter os efeitinhos e uma coisa linkada com a outra, realmente pra ter essa fluidez e ter até uma longevidade maior.
Porque a gente vê muitos artistas, muitas músicas até boas no mercado, mas que têm um prazo de validade muito rápido. Os hits duram, sei lá, dá duas semanas e já tem outro muito mais foda que tá “estourado”, igual a galera fala. Então eu tentei trazer bastante detalhe das músicas pra, ao meu ver, trazer uma data de validade maior.
E como eu toco os instrumentos também eu comecei a fazer umas pesquisas, tipo, “Por que eu escutava músicas dos anos 80, 70, até hoje?”. Tipo, Djavan pra caramba, Gilberto Gil bastante, Luiz Melodia pra caramba, Alcione e tal, outros artistas internacionais tipo Michael Jackson, o Prince que eu amo muito, Red Hot Chili Peppers… mas são músicas antigas e eu percebi esse poder do instrumento, de algo quando é tocado ter um sentimento ali que eu acho que fala um pouquinho mais do que o beat.
Então, tentei mesclar um pouquinho dos detalhes de produção eletrônica com o sentimento mesmo do orgânico, de estar tocando ali o instrumento, pra trazer essa estética pra todas as músicas. É isso, acho que me perdi um pouquinho. [risos]
Relação com a guitarra e origens no cenário underground
TMDQA!: Não, tá ótimo! [risos] Era uma pergunta isso também, porque você sempre foi da guitarra, de tocar as coisas. E sinto que uma das diferenças desse EP pro resto do que a gente ouve é justamente essa pegada orgânica. É uma coisa muito importante pra você, né? Zero chance de você abandonar isso.
Hodari: Sim, total! Eu acho que sou eu, né. Eu cresci no cenário Emocore de Brasília — a gente cresceu junto, né? Você viveu isso também. A gente partilhava o mesmo baterista nas bandas. [risos]
Eu acho que o orgânico faz parte da gente, velho. Eu comecei a minha vida na música tocando guitarra no cenário Emocore, e aí depois fui tocando pra outros artistas depois de sair das bandas de Brasília. Fui tocar pro Marcelo D2, depois pro Edi Rock dos Racionais, agora pro Di Ferrero do NX Zero — que pô, tá sendo uma honra — e o instrumento sempre foi o que me abriu portas.
Então, acho que faz parte de mim. É uma extensão do meu corpo. É a minha forma de falar também, então ele estando presente na música é algo que faz parte também — é uma outra forma de cantar. Sei lá, eu tô com 30 anos agora, e eu toco guitarra desde os 15, desde aquela época que a gente se conheceu. Metade da minha vida, mano. Eu tenho uma guitarra que está comigo até hoje. Não tem como não botar.
E acho que também, sei lá, por ser negro a galera já me taxa muito, [me coloca] no Rap. Já me vê e pensa assim, “Ah, pô, o moleque canta Rap, moleque canta Trap”. E isso é uma parada que eu quero muito poder estar mostrando no meu trabalho também, que é esse ponto forte do negro como instrumentista. Até porque muito de toda a música que é consumida no mundo vem da gente, das nossas culturas, de África. Muito vem de África; as células, as harmonias, tudo.
Enfim, é isso. Não tinha como não botar os instrumentos, faz parte de mim. Até pra trazer essa estética do jovem negro músico, a gente tem pouco. Temos pouquíssimos negros na MPB hoje, na nossa jovem MPB do Brasil. No sertanejo, nem se vê, entendeu?
Então eu acho que trazer o instrumento pra esse trabalho é… Eu quero muito que as pessoas possam ver. Quando eu era criança não tinha nenhuma referência de algum outro jovem negro dentro do Emocore, que foi onde eu comecei a tocar. Então, eu estar tocando com o Di Ferrero, também é meio que uma realização do sonho do Hodari criança, tá ligado? Que vivia uma parada mas não se enxergava muito.
Acho que tudo que eu estou vivendo, parece que eu tô realizando meus sonhos de criança e sendo uma referência de quem eu queria ver, tá ligado? Eu tô meio que vivendo todos os sonhos que eu almejava quando era criança em Brasília, tocando guitarra no meu quarto com a [banda] Skarto, estar lado a lado com os caras. Isso é muito gratificante e foi o instrumento que minha abriu essa porta, então não teria como deixar a guitarra de lado.
Eu durmo com as minhas guitarras, tá ligado? Tipo, na cama. [risos]
TMDQA!: Eu ia falar disso um pouco depois, mas já que você já trouxe à tona, é uma parada que a gente tem visto aumentar né? A diversidade. Eu lembro que antigamente, aqui no rolê de Brasília, você era basicamente o único negro.
Hodari: É, era eu e o Mikuym!
TMDQA!: Isso, era basicamente só vocês dois. E hoje a gente tem visto o cenário mundial abraçando isso muito mais, né. Lá na gringa tem a WILLOW…
Hodari: Vindo com o Pop Punk né!
TMDQA!: Exato. E até no Metal, tem uma banda muito foda britânica que chama Loathe. Tá mudando a cara, né? O que você acha disso, como você tem visto isso?
Hodari: Eu acho foda! Porque é isso, no final das contas todo mundo escuta música. Eu também tenho muita vontade de ver a galera indígena, por exemplo, fazendo um som. E sempre surge essa pergunta de, “Pô, por que não tem tantos de nós”, sabe? Então eu também quero pegar o meu trabalho e ser referência pra essa molecada que tá vindo.
Tipo, velho, é possível a gente chegar lá também. A gente é foda e vamos nessa. [risos] Acho que só de ter alguém ali fazendo o trampo já é uma referência pra uma criança que tá começando a fazer um som ver que é possível. E é muito mais difícil, né? Você tentar enxergar um bagulho que você não vê, tá ligado? Que mais ou menos era isso que eu fazia.
E é muito louco porque eu tenho vários desenhos da época que eu era moleque, eu com a mesma guitarra — eu me desenhava sempre sem rosto, mas já com o corpo que eu tenho hoje, que antigamente eu era molequinho, magrinho, e hoje eu tô com um pouco mais de corpo, mas com a guitarra, tocando. Eu desenhava isso porque eu não me via, tá ligado? Eu não via ninguém em nenhuma banda.
TMDQA!: E era uma coisa com a qual ninguém se preocupava na época, né.
Hodari: É, a gente nem trocava esses assuntos, nem trocava essas ideias. E isso é massa também, né? A gente vai evoluindo e vai entendendo as paradas da vida. E que bom também que as coisas vão se renovando e que estamos ocupando esses espaços também.
Porque na verdade não é uma competição. É só, tipo, partilhar o bolo. Imagina que você vai pra uma festa de aniversário: você vai dar bolo só pra metade dos seus amigos? A outra metade vai ficar sem comer? Vamos repartir o bolo, todo mundo fica feliz. Eu acho que tem espaço pra todo mundo, ninguém compete com ninguém. Música é algo muito individual.
Tipo, Gilberto Gil não compete com Caetano Veloso. Os dois caras são fodas. Um é preto e o outro é branco, mas os dois são fodas, lado a lado. Não é sobre um ser melhor e o outro ser pior, acho que é sobre partilhar o espaço mesmo, estar ocupando esses locais também.
A música é muito mais plural. Se a gente for pegar da raiz, de onde saíram as coisas, até as bandas famosas mesmo que não são protagonizadas por pessoas negras, às vezes você vai pegar as referências todas e [tem muitos negros]. Eu fiquei sabendo — eu não sabia, eu não curto muito Beatles — mas eu fiquei sabendo que o nome Beatles foi de uma música que é um blues, de um pretão coroa assim e tal. Eu não sabia disso, achei super legal e super interessante.
Então, é isso. Eu tô bem feliz com esse trabalho e espero que encha os olhos de muitas pessoas. Mas tô fazendo pra geral! É um trabalho bem plural, bem popular, pra todo mundo escutar, mas também querendo mostrar pra galera que é possível a gente chegar lá. Ter um pretinho tocando guitarra, sendo maneirinho, uma bandinha legal. [risos]
TMDQA!: Sim, lógico! [risos]
Hodari: Você foi no show do Festival CoMA? Tu achou legal?
TMDQA!: Fui! Tava lá. Eu achei massa, claro! Mas inclusive é uma outra coisa que eu ia te perguntar: na época você tava bombado com “Teu Popô”, e claramente as pessoas estavam lá pra ver o hit, por mais que tenham curtido todo o show. Como foi isso pra você?
Hodari: Mano, o mais legal de tocar com banda é que a gente cresceu junto. Eu toco com o Mikuym tem mais de metade da minha vida — era dentro do cenário Emocore na época em que a gente estava em Brasília — e só de estar no palco, com a galera da minha banda… São meus amigos de infância, sabe? É muito gratificante. A gente só queria tocar e se divertir.
Acho que a gente tava se divertindo até mais ou tanto quanto a galera que tava no público. [risos] Porque a gente trabalhou muito os arranjos, a gente trabalha muito as partes harmônicas. Pô, tem sopro, tem saxofone, tem sintetizador pra caramba, tem bateria, tem baixo, tem synth bass… A gente tenta fazer um show bem rico harmonicamente pra que, por mais que as pessoas não conheçam as músicas, elas vão curtir aquele groove e se interessar também.
Tanto que 80% das músicas que eu toquei no show nem vão sair por agora também. São músicas minhas que eu tenho guardadas há muito tempo; pra esse álbum a gente fez praticamente só música nova, 90% dele é totalmente autoral e novo, feito na quarentena. Então, mano, foi muito foda.
Acho que eu nem liguei muito pra isso. Acho que quando chegou “Teu Popô” foi mais foda ainda porque a galera também cantou junto, mas acho que o show em geral foi bem maneiro. E lá também nasceu meu merch, então foi muito especial. Eu consegui desenvolver o personagem naquele era e foi bem mágico.
Foi meu primeiro festival também, né. A gente tava abrindo o palco pro Ney Matogrosso, sabe? Só coisa boa aconteceu naquele dia. Acho que deu pra curtir a música, o show em geral, e “Teu Popô” foi um plus ali porque a galera já conhecia. Então agora que a gente vai lançar o álbum vai ficar mais maneiro ainda, porque a galera vai conhecer as outras músicas e vai dar pra cantar tudo.
Do underground ao topo do Pop nacional
TMDQA!: Pouco depois desse show, você acabou indo trabalhar com muita gente diferente e acabou ficando um tempo sem lançar seu próprio material. Por que não trazer essa galera — Luísa Sonza, o próprio Edi Rock — como feat no EP e chamar só o Luccas Carlos? A ideia é separar as coisas mesmo?
Hodari: Na verdade a gente lançou esse EP agora, mas as músicas que estão nele vão estar compiladas no álbum. Aí pro álbum a gente tem muita surpresa ainda, ainda não fechamos todos os nomes. Vai entrar uma galera legal.
Mas pra esse trabalho, até então eu fechei só com o Luccas Carlos porque o Luccas é uma pessoa muito importante pra mim. Eu já era muito fã antes de conhecer pessoalmente, e eu conheci o Luccas de um jeito bem especial. Eu o conheci em um estúdio clássico no Rio de Janeiro chamado Cia. dos Técnicos, e eu tava tocando um piano de cauda e ele chegou na sala e começou a cantar uma música dele.
E foi muito mágico pra mim esse dia. Eu fui pra fazer redes sociais de um primo meu que tava gravando lá nesse dia, mas acabou que acabou o trabalho e falaram, “Ah, Hodari, tem um piano ali”, e aí eu sei tocar um pouquinho, sentei lá e comecei a tocar. E aí o Luccas entrou lá e começou a cantar, só que a gente não se conhecia muito bem ainda, então ali meio que a gente selou essa amizade.
E aí todas as vezes que eu vim pra São Paulo antes de eu morar e antes de eu fazer o Poesia Acústica também, o Luccas Carlos sempre me deu muito apoio. Tipo, amigo, tá ligado? Irmão. Aí quando eu vim pra cá, pra São Paulo, pra começar esse meu processo de gravação, de música, sem saber se seria um single ou o que seria — vim pra gravar uns sons — a gente acabou fazendo esse som “SOL RAYO” que ficou muito foda.
E foi uma das músicas mais solares que a gente fez pro álbum também. A gente tá apresentando primeiro as músicas mais solares pra depois apresentar as obras de arte megalomaníacas. [risos] As coisas mais gigantonas, que são mais “canções” assim. A gente veio com algo mais Pop agora, até pro verão também, trazer alegria pra galera. Nessa mesma vibe, mesma energia de “Teu Popô”.
TMDQA!: Quando você tá escrevendo as coisas, como diferenciar se você tá escrevendo pra si mesmo ou pra outra pessoa?
Hodari: Olha, as maiores artistas pra quem eu trampo como compositor são a Urias e a Luísa Sonza. Já rolou pra outros, mas até então são essas duas. O nosso processo é muito na hora; aqui a gente tem feito muitos camps, que a gente junta vários artistas pra trabalhar pra um artista só.
Então, no DOCE 22 [da Luísa], acho que foi um time de uns 10 compositores, vamos supor. E aí a gente vai compondo no dia, de repente pega uma semana e fica todo mundo nessa imersão, compondo e fazendo beat e com produtores também. Então, a gente tem os dias separados pra fazer esses encontros de compositores e pra fazer as músicas mesmo.
A gente também tem acesso ao artista mesmo; o artista sempre costuma estar nesses camps, e a gente vai trocando ideia pra saber qual energia que a pessoa quer na música. A gente acredita muito que música é energia, então a gente tenta passar esses sentimentos através da música, mas sempre linkando bem com a pessoa. Então a gente sempre pergunta se o jogo de palavras condiz com o que ela quer depois defender.
Porque a gente tá fazendo música pra outra pessoa, né? Então às vezes você vai querer falar uns palavrões e a pessoa pode não querer falar, lógico. É um processo feito bem em conjunto mesmo, como se fosse meio que uma terapia musical. A gente vai perguntando o que a pessoa se sente à vontade, quais vibes, e a gente vai soltando a caneta e soltando ali vários caminhos.
Porque às vezes a gente tá numa sala e tem três compositores compondo com um produtor e cada um vai rodando ideia, um vai complementando o outro. Ou às vezes um vem com uma ideia mais formada e a gente vai trocando as palavras, porque cada compositor também tem a sua… Como se fosse a sua index Pokémon de palavras. [risos] Tipo, eu tenho meu jogo de palavras, você vai ter o seu, cada um tem o seu. Então, quando isso se mistura, fica muito rico porque são pessoas que tem vocabulários bem legais, musicalmente falando, e a gente consegue formular essa bomba atômica musical.
Esses processos envolvem bastante conversa. Conversa, sentimento, energia e vibe de estúdio mesmo. Porque a maioria das coisas a gente faz no dia mesmo que a gente está lá.
TMDQA!: É bem diferente de compor pra si mesmo, né?
Hodari: É, meu processo é bem diferente. O jeito que eu componho pra mim, velho, eu fico cozinhando uma música meses. Meses, meses, meses… Até a divindade vir na minha cabeça e falar “é isso”. Algumas vezes vem de uma vez só, mas a maioria das vezes eu fico cozinhando a música, renderizando ela muito tempo.
Pra esse álbum tem algumas músicas que eu fiz quando eu nem cantava ainda. “AMOR DE CARNAVAL” quando eu fiz eu nem cantava; eu dei pra banda que eu tinha na época que era a Conversa e a gente tocava no repertório. Só que sempre foi uma música muito foda, e acho que agora eu consegui traduzir ela da maneira que eu queria mesmo, da maneira que eu imaginava ela dentro da minha caixola. [risos]
E fecha o EP também com a minha vó ali no áudio, pra trazer todo esse axé, toda essa energia positiva.
TMDQA!: Sim! Bom, em contraste à ideia de trazer os instrumentos, a sua carreira solo realmente não tem muitos dos elementos do Emocore que são presentes nas suas influências. Agora você tá tocando com o Di e tudo mais, mas por que você não quis trazer isso até o momento nas músicas autorais?
Hodari: Eu acho que é algo bem novo, né? [risos] Esse convite do Di ele veio depois de eu já ter gravado as coisas. Eu terminei de gravar no começo de 2021, tipo Março, e aí o Di me chamou pra tocar com ele em Outubro. Tá sendo meio recente essa minha volta pro Rock.
A gente ficou esse tempo todo… O Brasil perdeu essa cultura das bandas. Há 15 anos isso era muito forte, com CPM 22, NX Zero, Charlie Brown Jr., várias, a gente escutava várias bandas. A gente foi crescendo e acabou que a indústria musical foi indo muito pros artistas solo e Pop, muito disso, e as bandas foram morrendo. Acho que até por conta da logística; trazer pessoas requer muito mais dinheiro, então artista solo e DJ fica sempre mais em conta pra todo mundo, tem mais facilidade pra rodar.
Mas acho que nesse momento eu não englobei tanto as coisas com Rock porque eu tava vivendo numa vibe mais limpa mesmo assim, sabe? Tipo, eu cresci meio que no Rock e acho que depois disso a gente começou a ouvir coisas mais tranquilas também, né. Acho que eu também era muito novo, então eu ouvia muito Screamo, muita gritaria. Fui ficando mais velho e foi cansando um pouco. [risos]
Quis ouvir umas paradas mais soft assim, um R&B e MPB, música brasileira pra caramba. E agora que eu tô voltando mais pro Rock, então eu meio que tô resgatando esse Hodari lá de trás. Talvez pros próximos trabalhos, 2023, 2024, com certeza vem alguma parada. Mas por agora vai ser mais brasilidades e africanidades mesmo, foi bem o que eu explorei nesse álbum.
TMDQA!: O que é ótimo também! Queria falar um pouco também sobre essa experiência de tocar com o Di, porque te conhecendo eu sei que é realmente um sonho realizado pra você. Como que surgiu o convite e como tem sido?
Hodari: O Di tá começando a vir com esse novo trabalho, vai lançar o álbum dele — primeiro álbum dele também — e mano, eu fiquei muito lisonjeado porque o cara era muito meu fã. Em Brasília, mano, peguei chuva pra ir no primeiro show do NX Zero lá na AABB, era NX Zero e Fresno. Na época, abriram duas bandas locais, Ilustria e Cardia.
E mano, eu amava muito. Eu amava os caras. Show do NX Zero em Brasília, o primeiro, não tinha nem Uber na época — eu lembro que a gente desceu ali na L2 na época, eu e o Flip [membro da banda de Hodari na época], e a gente andou muito na chuva pra chegar no show. Andamos sei lá, 40 minutos, 1 hora na chuva pra chegar nesse clube porque o transporte em Brasília é horrível.
Quando a gente entrou no show foi muito mágico, muito mágico mesmo. E hoje poder estar lado a lado com os caras é muito louco, porque é a realização de um sonho nosso, sabe? Eu meio que tô vivendo todos os sonhos da minha adolescência. Não tem muita explicação, é muita gratidão, e dá mais vontade de você continuar.
Porque você acredita tanto em um sonho e a galera vai abraçando, você vai aprendendo. O mais especial pra mim de tocar com essas pessoas é poder conviver e estar levando um conhecimento que elas tão me passando, que é pro resto da vida. Eu acho que eu meio que tô fazendo um “doutorado da música” tocando com meus ídolos, tá ligado? Sei lá, tocar com Marcelo D2, com Di Ferrero, os caras que eu sempre escutei, que meus primos escutavam, que minha irmã escutava, meus amigos na escola — a gente dividia fone escutando os caras.
E hoje poder estar tocando com eles assim é, tipo, eu não tenho palavras mesmo. É tipo sonhar acordado. Às vezes eu tô trocando ideia com o Di e fico olhando no olho dele, tipo, “Caralho, mano, tô aqui de frente pro cara”. [risos] É meio louco, não dá pra acreditar!
TMDQA!: Entendo completamente! Sinto isso às vezes fazendo entrevista, imagina convivendo diariamente com os caras. [risos]
Hodari: É meio louco, você ri de nervoso. Não dá pra entender. Acho que é agradecer, curtir o momento e viver o agora, ser eternamente grato todos os dias. É isso que eu faço, eu sempre agradeço. Porque não dá pra você entender. Isso é tudo energia, velho. Essas conexões todas são energias.
Que bom que a gente tá ficando cercado de pessoas cada vez mais especiais e que essas pessoas especiais também têm me abraçado e confiado no meu trabalho, estão me chamando pra trabalhar lado a lado. É algo que não tem preço mesmo. São todos os sentimentos, dá vontade de rir e de chorar ao mesmo tempo. [risos]
TMDQA!: Entendo demais. Hodari, muito obrigado pelo seu tempo! Foi um prazer bater esse papo, fiquei feliz demais com esse reencontro desse jeito. Espero que a gente possa se falar de novo em breve!
Hodari: Ah, muito bom trocar esse papo com você! Obrigado e até a próxima!