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TMDQA! Entrevista: em novo projeto musical, Romani lança single e clipe de "Forasteiro" — assista

O cantor Romani lançou nos serviços de streaming o single e clipe de "Forasteiro", que tem direção assinada pelo próprio artista. Veja entrevista exclusiva!

Romani
Crédito: divulgação

Texto por Gabriel von Borell e entrevista por Felipe Ernani

O ator e músico Romani disponibilizou nas plataformas digitais o single “Forasteiro”, que chegou acompanhado de um clipe liberado no YouTube.

Gravado no Rio de Janeiro e São Paulo, o vídeo foi dirigido e roteirizado pelo próprio artista, que incorporou diversas referências de época, estilo e autenticidade para celebrar suas raízes e essência.

Filho de cigana, Romani chegou a morar em um caminhão junto com os pais, pulando de cidade em cidade e se adaptando às novas realidades, o que serviu de inspiração para o material.

“A ideia dessa música vem para trazer um sentimento que eu e uma parte dos ciganos temos e compartilhamos, de estar sempre se mudando por conta de trabalho, dia a dia, de vender coisas em estados diferentes e ser forasteiro por onde passamos,” conta o artista, que também está na série da Netflix Maldivas.

O Tenho Mais Discos que Amigos! conversou com Romani para falar sobre o lançamento e o resultado da entrevista – assim como o clipe de “Forasteiro” – você confere a seguir.

TMDQA! Entrevista Romani

TMDQA!: Oi, Romani! Obrigado por tirar um tempinho pra falar conosco. Queria primeiro te perguntar justamente sobre o uso do termo “forasteiro”. Muitas vezes a gente vê ele sendo usado negativamente, com uma sensação de não pertencer a algum lugar, mas aqui você parece ressignificar isso. Como é, pra você, se sentir um forasteiro, se identificar com essa ideia?

Romani: Eu não sei como as pessoas conseguem ver ser um forasteiro como algo negativo. Talvez seja porque Hollywood deixou sempre claro que o forasteiro era alguém que estava lá para causar algum mal na região, mas eu sou forasteiro desde o dia que eu nasci. Com seis meses de idade já estava na cidade com meus pais, sempre éramos forasteiros nas cidades em que passávamos. Foram várias cidades, vários estados do país, sempre no caminhão e vendendo mercadoria. Então é algo que para mim, desde que eu nasci e me conheço por gente, eu sou forasteiro.

Eu já fiquei alguns anos em algumas cidades, mais tempo em uma que em outra, já morei no litoral de SP, em São Paulo capital, morei no sul da Bahia, esses são os lugares que fiquei mais tempo. Hoje, o lugar que estou há mais tempo é o Rio de Janeiro, vai fazer nove anos que estou morando aqui e foi o lugar que mais fiquei na minha vida. Então em qualquer lugar que eu vou eu sou forasteiro, não tenho muita escolha. É algo que eu sou, algo que a maior parte dos meus primos também são.O povo cigano tem essa cultura porque acredita-se que nós viemos migrando lá da Índia desde o século IV e em todos os lugares que passamos sempre fomos forasteiros.

Então, é algo que entendemos muito bem, como não se sentir pertencente e ir vivendo como um camaleão, se adaptando aos lugares, trazendo a nossa cultura para as pessoas e absorvendo da cultura local. Isso é algo presente em todo povo cigano ao redor do mundo. Os ciganos da Romênia têm coisas muito parecidas com os ciganos do Brasil, os do Brasil com os ciganos da Argentina, e ao mesmo tempo temos coisas diferentes, como o nosso dialeto que difere dependendo da região. Resumidamente é isso, para você se sentir parte de um lugar, basta você estar em paz com a sua essência. Quando você está bem com isso, as pessoas e amizades verdadeiras vêm de forma natural.

TMDQA!: Achei bem forte a ideia de uma música que trata de um tema tão pessoal ter o seu envolvimento em todas as esferas, desde a composição até a direção do clipe. Quão importante foi, para você, se inserir em tudo isso?

Romani: Foi muito importante, foi essencial. Isso, basicamente, veio mais de uma necessidade por não ter investimento, ser independente e não ter apoio de nada. Desde o auge da pandemia eu já pensava, “Como eu vou executar tudo isso? Vou pegar as amizades dos trabalhos que eu fiz ao longo do tempo no cinema, vou pedir ajuda, vou juntar dinheiro e me virar”. E foi isso que aconteceu, eu me virei e fiz acontecer. Como é um trabalho de lançamento do Romani, com capítulos que contam uma história da essência do que é um cigano. Já que é algo tão mal compreendido no Brasil e no mundo, eu estou tentando ressignificar a imagem do cigano que ficou do que outros artistas trouxeram, de maneira muito estereotipada.

Isso também no cinema e até algumas religiões brasileiras que trazem isso. Então eu quis trazer uma outra vertente, mostrando como o cigano pode ser moderno, pode ouvir hip hop, trazer a cultura da rua, mostrar que o cigano é rua, é estrada, ele vive isso e não tem fronteiras. A importância disso é também poder dar força aos meus primos que podem participar e participam de todos os clipes, tem ciganos de diversas tribos.

Dentro do povo cigano tem isso de algumas tribos não se misturarem com outras, tem alguns certos preconceitos, mas através da arte eu estou querendo trazer todos para perto e fazer a arte dizer mais do que qualquer passado, problema ou fronteira. Então, para mim é um trabalho de formiguinha para construir essa união, tanto dentro da “roma” quanto fora, nessa relação de como o povo “gadjé” enxerga o povo cigano.

TMDQA!: Aliás, houve um cuidado muito grande com relação ao clipe. Qual a importância de ter um elenco só de atores ciganos e dessa parte visual pra narrativa dessa sua música?

Romaní: Para além do que eu mencionei na anterior, é mostrar possibilidades para todas as crianças e homens mais velhos ciganos que existem outros caminhos além da venda de mercadoria. Eu também vendo, meu pai também vendeu, mesmo meu pai não sendo cigano a gente sempre vendeu mercadorias, cobre, móvel e etc. Eu ainda comercializo algumas coisas, eu sou essa pessoa, eu gosto de fazer negócio. Então, tem esse lado que sempre iremos levar, mas é legal quando ele é uma opção e não a única possibilidade.

Além disso, tem a leitura de mão, tarot, trabalhos espirituais que são caminhos muito tradicionais entre nós, mas a arte também sempre foi uma possibilidade. Tem muitos músicos ciganos, mas atores, produtores, ciganos no meio do hip hop, no Brasil não tem. Eu estou trazendo essa onda. Cigano pode sim fazer trap, pode fazer o que ele quiser, ele não pode se limitar. Ele tem que manter a essência, a tradição, o respeito pela família, os fundamentos do nosso povo, mas, ao mesmo tempo, é possível ditar novos horizontes. 

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