Hodari vai do Jazz ao Funk em disco homônimo de estreia e fala ao TMDQA! sobre ser um "funcionário da música"

Em entrevista exclusiva ao TMDQA!, Hodari fala sobre seu disco homônimo de estreia e explica por que se sente um "funcionário da música". Confira!

Hodari
Divulgação

Desde que surgiu com o hit “Teu Popô” há alguns anos, Hodari é cercado por grandes expectativas em sua carreira. Afinal, é natural que os olhares sejam voltados a alguém que surgiu tão de repente e entregou um hit tão único, com elementos próprios que se destacam do restante do cenário nacional.

Agora, quatro anos depois, o cantor, compositor e músico brasiliense finalmente se sentiu pronto para dar o tão esperado passo em direção a um disco de estreia. HODARI, trabalho que chegou há pouco e carrega o nome do artista em uma intenção de ajudar a criar uma identificação, cumpre o que prometeu.

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Com um currículo que foi ficando cada vez mais recheado no processo de concepção do álbum, incluindo colaborações com artistas gigantes como Luísa Sonza, Marcelo D2 e Di Ferrero, Hodari se mostra em seu álbum de estreia um conhecedor da indústria da música, do funcionamento do Pop, mas ao mesmo tempo exibe a inocência e capacidade exploratória de alguém que acaba de chegar.

O resultado é um dos discos mais legais do ano e não podíamos perder a oportunidade de bater um papo com o cantor sobre tudo isso. Confira nossa entrevista abaixo!

TMDQA! Entrevista Hodari

TMDQA!: E aí, Hodari, como você está? Tudo bem?

Hodari: Eu estou ótimo, estou bem demais.

TMDQA!: Queria começar dizendo que é muito massa você agora ter um disco e eu lembro que a gente conversou um pouco sobre isso da última vez. Qual é a importância de você ter o álbum? Na sua visão, o que isso significa para sua carreira?

Hodari: É difícil falar sobre a minha carreira porque carreira é algo muito extenso, né? Eu estou chegando agora, este é o meu primeiro álbum, então é difícil falar sobre carreira. Eu quero ter uma carreira longínqua igual ao Gilberto Gil, Djavan, esses caras. Eu sou muito fã deles e é para onde eu miro bastante. Para mim, é muito incrível sair do lugar de onde eu saí, da estrutura de onde eu saí, com uma família super humilde, sem ter dinheiro para investir na música e ver tudo acontecer da maneira que aconteceu, e ter me conectado com todas as pessoas da música que eu me conectei. Acho que a música que me chamou para ser um dos funcionários ou representantes dela, sabe?

Várias vezes eu vi que não estava dando certo e eu tentei fazer outras coisas, outras profissões, né? Mergulhei muito na [área da] tatuagem, me formei em design e tal mas a música sempre ficou me puxando para ela. Então, conseguir finalizar esse álbum e botá-lo no mundo, saindo de onde eu saí, eu estou realizando meu sonho de moleque, sabe? Quando eu era moleque eu me enxergava assim, mas era difícil porque era uma imagem muito marginalizada, que era o menino preto com tatuagem e cabelo grande. Isso dez anos atrás era… De nenhuma forma eu ofereço perigo para alguém, mas a sociedade vê a gente como o perigo, mesmo a gente não sendo os grandes vilões do capitalismo dentro da sociedade que a gente vive.

Para mim, é uma realização de sonho gigantesca, inclusive pelo fato de poder também ser referência para esses meninos e meninas. Quando eu era jovem eu não tinha referência, não me enxergava em ninguém. Só me enxergava em gerações muito distantes, como Lenny Kravitz, Jimi Hendrix, não tinha muita referência assim de um jovem negro que estava fazendo uma música legal, que se conectava comigo. Essa é a minha maior realização, poder contar a história da minha vida na música. Eu estou feliz demais.

TMDQA!: Eu achei que esse disco é quase um resumo da sua carreira. “TEU POPÔ” tá ali, tem as músicas novas. Além de tudo, o disco tem o seu nome, valoriza sua carreira, quem você é e como músico…

Hodari: Exatamente, colocando meu nome no álbum eu reforço essa identidade. Eu estou chegando agora, então… A galera poder saber meu nome… Tem gente que erra meu nome! Então, colocando meu nome no álbum, acho que a galera vai entender o contexto geral.

TMDQA!: Eu lembro que, da última vez que a gente conversou, você até falou que teria surpresas nesse disco, algumas coisas bem diferentes e tal. Eu senti isso logo de cara ali em “KAMASUTRA BABY”, que está super doideira. Sua voz está sendo usada de um jeito diferente. Dessa música, e estendendo para o resto do disco, como foi para você experimentar e, como você mesmo falou, finalmente ter os recursos para experimentar com tudo isso, testar essas coisas novas e chegar nos resultados que você chegou?

Hodari: Eu acho que foi muito sobre isso, sim. Foi sobre abrir os caminhos. Nesse meu álbum eu quis mostrar que é possível abrir os caminhos não só para mim mas para quem está me ouvindo, para essas pessoas que eu quero ser referência. Velho, dá para falar de sonoridades de uma forma muito extensa. Você está usando uma camisa preta e eu um casaco verde. Se você usar a camisa preta por um ou dois anos seguidos, uma hora você vai querer usar a minha verde e uma camisa branca. Eu gosto de provar de vários sabores. É meio sobre isso, sobre a gente poder se libertar dentro da música e poder usufruir de todos os sabores dela.

Eu acho que chega a ser um pouco egoísta você querer abordar só um nicho de música e ficar ali para sempre, se prender àquilo. Isso foi uma parada que eu realmente não quis no meu trabalho. Liberdade musical total, justamente nesse intuito de abrir os caminhos não só para mim como para outras pessoas poderem ter até mesmo essa experiência sensorial. Quero colocar minha música em todo tipo de lugar, todo tipo de ambiente.

Por mais que eu fale de algo mais voltado para o sexual, eu estou falando de uma forma muito poética, que às vezes se você estiver ouvindo, até com criança na sala, elas não vão pegar. Não fica desconfortável para ninguém em nenhum momento ouvir o álbum. É isso que eu busquei: ele tem um vasto poder para conseguir conquistar a galera, de ser agradável de se ouvir.

TMDQA!: Você está falando exatamente da temática e vou adiantar um assunto que eu ia puxar depois. É realmente um disco que trata dessa temática sexual, de amor. Por que você sentiu a necessidade de abordar isso nesse trabalho que é tão importante para você? Parece quase um disco conceitual nesse sentido. É um disco sobre amor e sexo, sobre esse lado da vida?

Hodari: Eu não pensei muito nesse intuito. Foram letras que surgiram e eu fui me apaixonando por elas. Sou eu mesmo. Não tem muito uma estratégia atrás disso. Eu fui soltando minha alma mesmo ali, tentando ser verdadeiro não só comigo, mas curtindo bastante o som. Eu tive a chance de fazer com grandes produtores também, como o Douglas Moda, que fez o icônico DOCE22, da Luísa Sonza, e o Nave, que já fez Marcelo D2 e a própria Luísa. Ele ganhou o Grammy com o Emicida.

Eles têm uma carreira muito sólida e a gente quis aproveitar um pouco disso. Eu quis pegar todo esse background de artistas fodas com os quais eu já trabalhei e colocar no meu trampo, misturando com o meu tempero. Essa foi até uma das maiores sacadas assim…

TMDQA!: No meio dessa galera toda, você arranjou espaço para colocar o Mikuym, que já está contigo há muito tempo. A história que vocês têm juntos é muito bonita e gostaria que você falasse pras pessoas o motivo da participação dele nesse disco.

Hodari: A galera vai conhecer o Mikuym a partir de agora, e esse também foi o meu intuito. Eu quis botar o Mikuym porque, de onde a gente veio, não tinha muita oportunidade, até por questão financeira, de não poder chegar junto, por estar fazendo aula e não ter dinheiro para comprar os instrumentos. Tem todo um trabalho para você evoluir, né? Eu colocar o Mikuym nesse álbum também tem muito isso de eu sair de onde eu saí, sendo um jovem negro de Brasília, uma cidade totalmente racista, sacou? O Mikuym era o [único] outro moleque preto em outra banda. Eu o vi pela primeira vez lá no ensino médio e me impressionei com outro moleque preto tocando em uma banda.

Eu pensei que eu também podia fazer aquilo. Então, o Mikuym me inspirou desde o começo e nesse mesmo ano que eu vi ele tocando eu comecei a tocar guitarra, e foi um ano muito louco, de muita evolução e que eu, de fato, cresci muito. Botar o Mikuym nisso é provar pra gente que é possível a gente viver do nosso sonho, mesmo a sociedade falando que esse bagulho não é para a gente. Eu quis botar ele para fortalecer a visão artística e alavancar um irmão que está nessa caminhada comigo desde o começo.

TMDQA!: Nas participações, além do Mikuym, o que eu achei muito massa é que é um disco muito plural. Você tem o BK’ que é do Rap, o Vitão que tem a cara mais do Pop, o Luccas Carlos que traz uma coisa tão única ali. O quão importante foi para você ter essa galera toda no disco?

Hodari: Ter essa galera tão diferente ilustra legal quem eu sou na música. Eu faço parte dessa pluralidade e eu me enxergo assim na música. Eu quis mostrar isso até com as participações no álbum, para enfatizar realmente essa gama de diversidade de estilos sonoros dentro do álbum. Eu acho que, com as participações, eu consegui mostrar com mais solidez isso.

TMDQA!: Como você vê essa galera assinando embaixo do seu trabalho? Como você falou, de onde você veio, ver essa galera chegando junto e acreditando no seu trabalho… Como você vê isso?

Hodari: Cara, é meio louco porque as pessoas que eram minhas referências viraram meus amigos pessoais. A gente anda junto. Outro dia, eu estava na casa da Luísa e a gente ficou por lá até 4 da manhã com a minha irmã sendo DJ da festa. O Luccas também é meu irmão. Eu tatuo o Vitão desde antes dele estourar na música. A gente tem uma relação muito forte que foi construída por meio da tatuagem e eu fiz questão de que ele estivesse no álbum.

Por acaso, “ATMOSFERA” foi a primeira música que eu fiz do álbum e que me deu força para acreditar nessa parada, trabalhar nesse álbum que é um projeto muito grandioso artisticamente falando. A gente sabe o quanto é difícil levantar um álbum com qualidade no Brasil, ainda mais um álbum de qualidade e com grandes participações assim. Então, eu estou muito radiante com o resultado. Espero que a galera absorva da melhor forma possível.

TMDQA!: Para mim, pessoalmente falando, o grande destaque do disco foi “TUDO PRO AR”. Eu gostei de tudo. Interessante que entram vários elementos pontuais, instrumentos de sopro, umas paradinhas meio de Jazz. Isso é muito massa porque mostra musicalmente quem você é: alguém que não se coloca em uma caixa. De onde veio a inspiração para chegar nesse som tão único, nessa coisa tão diferente?

Hodari: Cara, eu sou muito apaixonado por neo soul, estilo que começou ali por volta dos anos 90 e uma galera negra da minha geração também está bem apaixonada e está estudando cada vez mais esse estilo de música que é o neo soul. Esse estilo ficou cada vez mais popular nesses últimos quatro anos e vários artistas pegaram esse estilo para se empoderar. Erykah Badu, por exemplo, voltou muito forte. Ela participou do começo do neo soul. Então, quando eu quis fazer essa música, “TUDO PRO AR”, e eu produzi com o Nave, tive essa honra, a gente foi bem para esse lado de abordar esse estilo.

A gente quis pegar um pouquinho de cada estilo para colocar em cada música. E esse estilo é um estilo que a gente gosta muito em comum e que a gente queria dar um pouco mais de destaque para ele. A gente usou o neo soul tanto em “JOVEM” quanto em “TUDO PRO AR”, mas nessa de uma maneira mais animada, com umas notas maiores. “JOVEM” é uma música mais introspectiva. A gente usou essas duas facetas do neo soul. Foi uma honra. Tem muito tempero bom nessa música.

TMDQA!: E acaba sendo uma coisa única. Você não está só copiando o gênero ou fazendo algo que já foi feito, você está fazendo do seu jeito…

Hodari: Exatamente. Eu tento pegar um pouco do som que eu gosto e que eu já tenho uma afinidade para trazer para o meu universo. Acho que isso é o mais legal. E vira algo novo porque sempre vai ter nosso filtro pessoal para poder digerir esse estilo sonoro.

TMDQA!: E pra gente fechar, eu fiquei curioso porque “EMBARCAÇÃO DO AMOR”, um feat com a Luísa Sonza que está ali mas não está disponível… qual é dessa música? O que você pode falar, ou não pode falar?

Hodari: A gente quis aguardar para soltar esse som porque a gente tem um projeto bem legal para trabalhar dentro do álbum um pouco mais para frente. Agora a gente lançou “SEM MÉNAGE”, é o single do álbum. A gente quis trabalhar ele com um pouco mais de espaço e a gente quis fazer essa brincadeira também porque acho que vai ficar interessante a galera aguardar um pouquinho mais, até para que a gente tenha tempo para apresentá-la da maneira que a gente quer apresentar.

A música está gravada e está incrível. É algo totalmente diferente do que a Luísa Sonza já fez e ao mesmo tempo muito conectado com a raiz dela. Eu quis chamá-la porque é um som que é muito dela, mas que ainda não foi muito abordado nessa nova fase. Quando sair vai valer a pena.

TMDQA!: É uma boa, né? Hoje em dia a gente tem essa questão de efemeridade das coisas. Você lançou um disco agora e daqui a um mês alguém chega e pede por música nova…

Hodari: Até para ter um buzz um pouco mais pra frente também. Esse disco é um pouco diferente de tudo o que está rolando agora no mercado. Então, querendo ou não, acho que vou precisar de um tempo para a galera digerir. Vai ser mais ou menos naquele mesmo flow de “TEU POPÔ”. Eu lancei e a galera foi entendendo aos pouquinhos, e depois todo mundo entendeu a parada de verdade. Fez um barulho legal. Eu espero que esse álbum seja mais ou menos nesse flow de quando eu comecei minha carreira na música solo. É isso. Espero que ele seja abraçado pelo mundo, pelo Brasil, da melhor forma possível.

TMDQA!: Aproveitando, como está o plano de turnê, de shows? Já montou banda?

Hodari: Então, já tem plano de show. Eu fiz um show agora que foi muito importante para mim, para minha carreira. Estou bem feliz. Ele foi no dia 23 de Junho no Sesc Pompeia e teve a participação do Luccas, do BK’. A galera colou lá. Podem aguardar esse álbum ser tocado ao vivo da melhor forma e com novos arranjos. Vai ser bem legal. A gente está fazendo algo bem maneiro.

TMDQA!: Vocês têm que ver o show do Hodari. É foda!

Hodari: Pô, obrigado, de verdade, cara.