Depois de 10 anos, o The Mars Volta acaba de lançar seu novo disco autointitulado e encerra um hiato que durava desde a chegada de Noctourniquet em 2012.
O projeto capitaneado por Omar Rodríguez-López e Cedric Bixler-Zavala é um dos mais interessantes há anos, e toda a espera valeu a pena para os fãs. Mas, à primeira ouvida, The Mars Volta é um disco que oferece resistência — e é justamente aí que está a grande graça de tudo.
O álbum foi apresentado aos fãs por meio de três singles antes de chegar na íntegra. Em “Blacklight Shine”, podíamos conferir a essência da banda, com sua pegada latina e ainda cheia de guitarras e experimentalismo, como é perceptível através da inclusão de elementos característicos da cultura porto-riquenha, que permeia todo o conceito da obra.
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A segunda prévia foi “Graveyard Love”, talvez a música do ano: com uma textura totalmente única criada a partir de sintetizadores, guitarras, baixo, bateria e outros detalhes muito bem posicionados — e tudo servindo como uma cama para a voz de Cedric, que é a cereja do bolo —, a faixa é uma daquelas coisas que você só consegue processar depois de ouvir inúmeras vezes e, a cada play, descobre algo novo.
Já o terceiro e último single foi “Vigil”, que pode até ser chamada de balada por sua pegada mais lenta. Ela, aliás, é quem mais dá o tom de como soa todo o disco, que em sua tracklist finalizada se inicia com os dois primeiros singles e depois passa pelas lentas e belas “Shore Story” e “Blank Condolences” antes de chegar no último single.
The Mars Volta e a arte dos detalhes
Veja bem: até agora, falamos apenas de cinco faixas e já mencionamos todos os singles lançados antes do disco. Mergulhar no álbum completo foi uma verdadeira aventura, visto que é como se um novo mundo estivesse se abrindo quando chegamos em “Que Diós Te Maldiga Mi Corazón”, que faz jus a seu nome e é a faixa que mais explora elementos da salsa e de outros ritmos latinos.
Dali, mergulhamos em “Cerulea”, outro ponto alto do trabalho. Se a faixa anterior tem menos de dois minutos de duração, seu papel é cumprido com maestria ao levantar o clima antes da chegada do momento mais belo do registro, onde vemos Cedric explorar belíssimas melodias de voz de uma forma até então praticamente inédita em sua carreira.
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Por conta disso, e de toda a sequência que vem logo depois com faixas como a ótima “Tourmaline”, o fã mais tradicional que colocou o álbum para tocar esperando ouvir “loucuras” como talvez estivesse acostumado vai sair decepcionado. A arte, entretanto, está nos detalhes.
O maior exemplo para isso é a canção que finaliza o disco, “The Requisition”. À primeira ouvida, pode ser percebida como uma das menos interessantes e talvez até um pouco anticlimática. Na décima reprodução, o ouvinte já anseia pela décima primeira, buscando reparar em cada vez mais detalhes, já que eles estão presentes aos montes.
Do experimentalismo às mensagens diretas
10 anos é um longo tempo de espera, e é mais do que natural que expectativas sejam quebradas. Em uma entrevista exclusiva com o TMDQA!, que será disponibilizada em breve, Cedric Bixler-Zavala deixou claro que o tom do disco é resultado de uma conexão profunda entre ele e Omar, baseada nas mensagens que querem passar e na música que sentem que pode ser uma ferramenta para isso neste momento.
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Como te contamos por aqui anteriormente, aliás, a mensagem é algo fundamental para o Mars Volta. Mais do que nunca, Cedric e Omar usam todos os recursos que têm para abordar questões sensíveis; no papo conosco, o vocalista destaca que tinha como objetivo dar voz para pessoas mais vulneráveis da sociedade, que muitas vezes não são ouvidas.
No caso do guitarrista, o recado é mais direto: por meio dos clipes que ele próprio dirigiu, Omar fala, mostra e compõe sobre o imperialismo ianque que afeta a terra de suas raízes, Porto Rico, até hoje. A gente, inclusive, fez um grande especial sobre isso como você pode conferir neste link.
Um retorno triunfal após 10 anos
Na prática, o disco soa diferente de tudo que poderíamos imaginar que o The Mars Volta produziria.
Ainda mais após 10 anos, pensar que a (hoje) dupla sairia tanto de sua zona de conforto em nome de um trabalho que traga mais verdade é algo maluco, no melhor sentido possível, e o resultado vem na forma de faixas que devem virar clássicos no catálogo como “Equus 3”, além de outras já mencionadas.
De quebra, é o primeiro álbum que passa uma sensação quase radiofônica. O experimentalismo ainda está ali, claro, mas para quem estava acostumado com tantas escolhas provocativas, é quase reconfortante poder ouvir essa banda de uma forma que não exija tanto do cérebro.
Não é sempre que podemos dar segundas ou terceiras chances a um álbum, mas se essa resenha servir para algo, que seja para convencê-lo a ouvir The Mars Volta com cuidado e de coração aberto; deixe de lado tudo que você conhece sobre a banda e aprecie essa obra-prima.
Depois de algumas vezes, você vai até perceber os elementos clássicos por ali.