A história da música brasileira é riquíssima, vasta e diversa.
Como não poderia deixar de ser, além dos ritmos tipicamente nacionais e do caldeirão de influências que foram explorados por aqui, tivemos eras bastante produtivas para o bom e velho Rock And Roll, e como ficou provado nesse final de semana, uma banda leva a medalha de ouro claramente, e ela é o Titãs.
Nos últimos três dias, a banda fez três apresentações com ingressos esgotados no imenso Allianz Parque, estádio em São Paulo que tem dividido sua ocupação entre o futebol e as turnês de bandas nacionais e internacionais.
Foram 50 mil ingressos vendidos por noite em um total de 150 mil entradas comercializadas para a turnê que promoveu o encontro de todos os integrantes vivos da formação clássica do grupo e ganhou o slogan de “Todos Ao Mesmo Tempo Agora”.
Se os números impressionam, eles ficam ainda expansivos em outras áreas, como o fato de que cada show teve quase três horas de duração, o setlist percorreu quase 10 álbuns e o clássico Cabeça Dinossauro foi quase tocado na íntegra.
Para mim, há muito tempo já não havia dúvidas de que o Titãs é a maior e melhor banda de Rock da história do Brasil, mas esses shows deixaram isso bem claro para quem quisesse ver.
Reunião dos Titãs
É importantíssimo ressaltar que esses shows não foram o primeiro da turnê. Pelo contrário, eles vieram na parte final de um giro que começou no Rio de Janeiro e já passou por cidades como Curitiba, Belo Horizonte, Brasília, Salvador e mais.
Nesses shows, Branco Mello, Arnaldo Antunes, Paulo Miklos, Sérgio Britto, Charles Gavin, Tony Bellotto e Nando Reis foram acompanhados pelo produtor Liminha, e honraram a rica discografia do grupo com apresentações impecáveis.
Não há outra banda no Brasil que tenha viajado por assuntos tão diferentes e complexos, entoando que “odeia religião”, como em “Igreja”, passando por hinos sociais como “Homem Primata” e chegando até baladas ao piano sobre aproveitar melhor a vida, como em “Epitáfio”.
Isso sem contar nos gêneros musicais: a extensa fileira de álbuns da banda passou pelo Pós-Punk, New Wave, Punk Rock, Pop Rock e mais, tudo feito de forma primorosa e seguindo os seus moldes, sem querer embarcar em modas passageiras ou fazer daquele momento algo lucrativo.
Em pleno mainstream, os Titãs gritaram contra as injustiças sociais ao mesmo tempo em que celebraram relações pessoais, e cada letra de autores talentosíssimos como Arnaldo Antunes, Paulo Miklos, Nando Reis, Branco Mello e Sérgio Britto acabou eternizada na cultura popular brasileira.
Prova maior é que as quase três horas de show passaram voando na sexta, sábado e domingo, e mesmo canções mais difíceis de digerir como “Porrada” e “32 Dentes” contaram com milhares de pessoas cantando junto.
Em “Polícia” houve até Roda Punk, e cada um os integrantes comandava a plateia ao seu estilo.
Paulo Miklos parecia estar enamorado com as câmeras, sabendo muito bem que o que ele mostrava para elas aparecia para o público em telões de altíssima definição no estádio. Não à toa, houve até brincadeiras na plateia com gente chamando o músico e ator de “Rosalío”, fazendo referência às performances ao vivo da artista pop Rosalía.
Sérgio Britto optou por deixar a plateia cantar boa parte das suas letras, enquanto Arnaldo Antunes não parava de dançar, mesmo quando a música não tinha seus vocais. No set Acústico, que relembrou uma fase onde ele já havia saído da banda, ele não ficou no palco.
Por fim, é importante falar sobre Branco Mello, que se emocionou por estar ali no palco ao lado de seus amigos.
O músico acabou de passar por uma cirurgia delicada de remoção de tumor na garganta, mas se recuperou a tempo de, como ele mesmo disse “até gritar pra vocês”. Com a voz rouca mas visivelmente feliz, ele fez bonito e emocionou quem estava na plateia.
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De arrepiar essa performance do Branco Mello em “Cabeça Dinossauro” depois de retirar um tumor da garganta. Ícone demais!!! ❤️🔥 pic.twitter.com/WXGpiPPawh
— Tenho Mais Discos Que Amigos! 🎶 (@tmdqa) June 17, 2023
Marcelo Fromer eterno e Homenagem a Rita Lee
Outro belo ponto do show foi o momento em que a banda recebeu Alice Fromer, filha do saudoso guitarrista Marcelo Fromer, morto em um acidente nas ruas de São Paulo há 22 anos.
Ao lado de Arnaldo Antunes, ela cantou “Toda Cor”, escrita por seu pai ao lado de Ciro Pessoa e Carlos Barmak. No show de sábado, ela fez questão de ressaltar que o último estava ali presente, o que tornava a apresentação ainda mais especial.
Alice também cantou a belíssima “Não Vou Me Adaptar”, de autoria de Arnaldo Antunes, e participou de uma homenagem à eterna Rita Lee com uma versão de “Ovelha Negra” cantada a plenos pulmões por 50 mil pessoas.
Essas pessoas, aliás, não se importariam se o show tivesse 4 ou 5 horas, já que verdadeiros clássicos como “Enquanto Houver Sol”, “Isso”, “Hereditário”, “A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana”, “O Mundo é Bão, Sebastião”, “Será Que é Isso Que eu Necessito?”, “Vossa Excelência” e mais ficaram de fora.
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Titãs tocando “Ovelha Negra”, da lendária Rita Lee, com Alice Fromer no segundo show sold out em São Paulo.
Alice é filha do saudoso Marcelo Fromer, guitarrista da banda, e tem cantado duas canções com o grupo nos shows da turnê “Titãs Encontro”. ❤️🔥 pic.twitter.com/aKAyDlbwMy
— Tenho Mais Discos Que Amigos! 🎶 (@tmdqa) June 18, 2023
Legado e Influência Renovada por décadas
Nos últimos dias nós falamos por aqui sobre como os jovens já estão chamando bandas do início dos Anos 2000 de “banda de pai”.
Para os Titãs, que começaram a carreira nos inícios dos Anos 80, o rótulo já se fazia presente há muito tempo, e foi incrível ver muita molecada acompanhada dos pais, inclusive cantando diversas das canções, no Allianz Parque.
Eu nunca vou me esquecer de quando vi transmissões clássicas de shows do The Rolling Stones na televisão e decidi que gostaria de celebrar e trabalhar com música de uma forma ou de outra.
Tenho certeza de que nesse final de semana, com direito à transmissão pelo Multishow no domingo, muita gente viu no palco uma aula de musicalidade, posicionamento político, social e presença de palco. E viu dos melhores.
Desde Paulo Miklos interagindo com a câmera o tempo todo até Charles Gavin e Nando Reis fazendo questão de vestir a bandeira do Orgulho LGBTQIA+ todas as noites, o Titãs mostrou que segue visceral, destemido e pronto para bater de frente com o establishment, assim como sempre fez nas décadas de 80, 90, 00, 10 e, inclusive, vinha fazendo recentemente com a formação que segue na ativa com Tony Bellotto, Sérgio Britto e Branco Mello.
Os Titãs seguem vivos e estão colhendo frutos de sementes plantadas lá atrás por jovens que não tiveram medo de misturar gêneros musicais, teclados com guitarras, gritos de guerra com palavras de amor e mais.
Nos últimos anos, temos visto isso com frequência no novo rock e, bem, quem sabe agora não tenhamos mais gente se inspirando nessas lendas para seguir adiante. Combustível não falta.
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Quem disse que não tem roda punk no show do Titãs? ❤️🔥 pic.twitter.com/6q5SXYX2Zj
— Tenho Mais Discos Que Amigos! 🎶 (@tmdqa) June 17, 2023
Setlist dos Shows
- Diversão
- Lugar nenhum
- Desordem
- Tô cansado
- Igreja
- Homem primata
- Estado violência
- O pulso
- Comida
- Jesus não tem dentes no país dos banguelas
- Nome aos bois
- Eu não sei fazer música
- Cabeça dinossauro
Set Acústico - Epitáfio
- Os cegos do castelo
- Pra dizer adeus
- Toda cor (Alice Fromer no vocal principal)
- Não vou me adaptar (com Alice Fromer)
- Ovelha negra (cover de Rita Lee) (com Alice Fromer no vocal)
Set 2 - Família
- Go Back
- É preciso saber viver (cover de Roberto Carlos)
- 32 dentes
- Flores
- Televisão
- Porrada
- Polícia
- AA UU
- Bichos escrotos
Bis:
Introdução por Mauro e Quitéria - Miséria
Vinheta final por Mauro e Quitéria - Marvin
- Sonífera ilha
Assim, ao som de “Sonífera Ilha”, o Titãs encerra a passagem da turnê Encontro por São Paulo. 😭
Que sorte foi poder ver esses sete juntos no palco em pleno 2023! Histórico, sem dúvida alguma. ❤️ pic.twitter.com/PWSac2DF2j
— Tenho Mais Discos Que Amigos! 🎶 (@tmdqa) June 19, 2023