Resenha: The Rolling Stones mostra paixão pela música e celebra o próprio legado no divertido "Hackney Diamonds"

Resgatando sua essência sem soar repetitivo e adicionando novos elementos pontuais, os Rolling Stones acertaram em cheio no novo disco "Hackney Diamonds".

The Rolling Stones - Hackney Diamonds
The Rolling Stones – Hackney Diamonds

Sem lançar um disco completo de inéditas desde A Bigger Bang (2005), os Rolling Stones vão quebrar esse hiato na próxima sexta-feira (20) com a chegada de Hackney Diamonds, sucessor do álbum de covers Blue & Lonesome (2016) e que conta com 12 músicas e diversas participações especiais.

Com as prévias já divulgadas, os Stone deram uma amostra do que vem por aí no álbum: o primeiro single, “Angry”, tem uma agressividade que marca presença ao mesmo tempo em que transporta o ouvinte para um cenário de diversão, representado muito bem pelo ótimo clipe estrelado por Sydney Sweeney.

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O excelente refrão de “Angry” dá o tom para boa parte do disco, que, acima de tudo, nos faz sentir que os Rolling Stones estão se divertindo. Mick Jagger está mais em forma do que nunca e, mesmo com todas as necessidades de adaptação por causa da artrite, Keith Richards continua um mestre dos riffs, com a sintonia totalmente em dia ao lado de Ronnie Wood.

Isso ficou ainda mais claro no segundo single do álbum, “Sweet Sounds of Heaven”, que uniu o que há de melhor da fase clássica dos Stones com uma nova abordagem que tem toda a assinatura de Andrew Watt.

Andrew Watt, o “salvador” da velha geração?

Produtor que trabalhou recentemente com nomes como Ozzy OsbournePost Malone, Andrew Watt vem se tornando fundamental para a velha geração do Rock and Roll. Não à toa, foi recomendado pelo próprio Paul McCartney para “salvar” os Stones, que estavam tentando produzir um disco de inéditas há alguns anos e sempre esbarravam em obstáculos.

Hackney Diamonds, claro, é um disco dos Rolling Stones muito mais do que qualquer outra coisa. Mas faixas como “Sweet Sounds of Heaven” mostram o exímio trabalho do produtor em extrair a essência dos grupos que moldaram a sua própria carreira, resgatando a influência jam do Blues e ressignificando-a com a presença de convidados — no caso, simplesmente Lady Gaga Stevie Wonder.

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O álbum traz outros grandes convidades e, de forma geral, soa como uma grande festa em que os Stones celebram o próprio legado ao lado de figuras como Elton John Paul McCartney. O primeiro aparece em “Get Close”, que segue a mesma pegada de “Angry” e é uma das canções mais divertidas do álbum, e também em “Live by the Sword”, faixa histórica pela presença de Elton ao lado do ex-baixista Bill Wyman e do saudoso baterista Charlie Watts.

Parceria dos Rolling Stones com Paul McCartney

Macca, por sua vez, aparece em “Bite My Head Off” e ajuda a criar uma das músicas mais curiosas do disco. As escolhas de timbre remetem bastante ao Punk e dão um tom mais moderno ao som, provavelmente por influência de Watt; a composição, no entanto, é essencialmente uma versão mais intensa de algo que os Beatles teriam feito no passado, com o DNA dos Stones presente principalmente através da voz inconfundível de Jagger.

“Bite My Head Off” ainda conta com uma espécie de solo de baixo de Paul McCartney, e até traz uma interação bem crua de Mick e Paul: Come on, Paul, let’s hear something — vamos lá, Paul, deixa eu ouvir algo — diz o vocalista enquanto o distorcidíssimo timbre de baixo de Macca chama atenção.

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Do Pop Rock ao Blues, álbum traz os diversos DNAs dos Stones

Acima de tudo, Hackney Diamonds soa como um disco que os Rolling Stones fizeram porque quiseram, e não porque foram obrigados. Pode parecer bobo mas, depois de tantos anos de carreira, não seria de se estranhar se a banda estivesse apenas preocupada em cumprir contratos ou aumentar um pouco o pé de meia.

Não é o caso aqui. Em canções como “Whole Wide World”, a banda flerta com uma sonoridade mais Pop Rock, enquanto em outras como “Mess It Up” (a outra contribuição de Charlie Watts para o álbum) é possível identificar cada detalhe que transforma os Stones nos Stones. Esta, aliás, é uma das músicas que poderia tranquilamente estar em outro álbum do passado, especialmente da fase dos Anos 80 em diante.

A força do Blues também está bastante presente, com canções como “Driving Me Too Hard” soando perfeitas para colocar enquanto pega a estrada no carro. Ainda assim, a parte inicial do álbum é a que realmente aumenta a intensidade, com a sequência intensa de “Angry” e “Get Close” levando para a bela balada “Depending on You”, que parece ter saído de um filme clássico, e finalizando com a sensacional “Bite My Head Off”.

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Hackney Diamonds mostra paixão dos Rolling Stones pela música

The Rolling Stones em 2023
Foto por Dave Hogan

A colaboração com Paul McCartney é um sonho realizado pra muita gente e, no fim das contas, pode muito bem ser a melhor música de Hackney Diamonds, talvez dividindo o posto com outras para aqueles que preferem uma sonoridade mais tradicional. No entanto, a faixa captura perfeitamente a essência do trabalho: celebrar o legado dos Stones (e, nesse caso, dos Beatles) sem depender exclusivamente do passado.

Hackney Diamonds traz algumas inovações pontuais, muito provavelmente por conta da assinatura de Andrew Watt. O disco acerta em cheio ao equilibrar esses aspectos com a força motriz de tudo que os Stones fizeram até hoje: o bom e velho Rock and Roll. No fim, o resultado é uma grande festa que parece ter tudo para encerrar a carreira dessas lendas em grande estilo.

O discurso é melancólico, sabemos, mas é impossível ouvir a última faixa — a crua “Rolling Stone Blues”, que evoca aquele sentimento do Blues do Delta, apenas com voz, violão e gaita — sem pensar que essa é a despedida perfeita, resgatando as origens mais cruas possíveis da banda logo depois de provar toda sua grandeza nas faixas anteriores.

Não há dúvidas de que os Rolling Stones não precisavam lançar Hackney Diamonds. O disco serve, então, como uma prova de que eles ainda são apaixonados pela música — e, ao mesmo tempo, são tão bons no que fazem que conseguem se adaptar ao presente sem renunciar às próprias essências, abraçando contribuições de Watt e Lady Gaga para isso.

Assim, se daqui pra frente a banda escolher simplesmente viver dos frutos que plantou ao longo de tantos anos, só resta aos fãs agradecê-los por mais um lembrete da velha máxima: quem é rei nunca perde a majestade.

Hackney Diamonds será lançado em 20 de Outubro nas plataformas digitais.