No cenário da música internacional, uma nova medida está gerando ondas de preocupação e incerteza: o aumento das taxas de visto para artistas internacionais que desejam fazer turnê nos Estados Unidos. Com um aumento abrupto de 250%, essa mudança está sendo sentida por músicos de todo o mundo, incluindo os brasileiros.
Os novos valores aplicados pelo United States Citizenship and Immigration Services a partir de 1º de abril são consideráveis. A inscrição de cada músico, que antes custava US$460, agora pode custar até US$1.655. Multiplique esse valor por R$5,28, a cotação atual do dólar, para chegar ao preço de R$8.743,20 por músico.
Isso para quem pode aguardar por meses o agendamento. Caso haja urgência na expedição, há uma cobrança extra de US$2.805 (R$14.818,81) por pessoa. Ah, e as taxas se referem à entrevista para o visto – não garantem a aprovação, claro. Quem é reprovado no processo não recebe nenhum centavo de volta.
Achou pesado? É porque é. Parece pegadinha de 1º de abril? Infelizmente, não foi.
Por que as taxas aumentaram tanto?
O aumento significativo nas taxas de visto para músicos que desejam se apresentar nos Estados Unidos levanta a questão fundamental: por que esse aumento ocorreu e por que agora? Segundo especialistas, há duas razões principais por trás desse aumento substancial.
Primeiramente, as taxas de visto para músicos não haviam sido ajustadas há bastante tempo. O último aumento significativo ocorreu em 2016, quando as taxas cresceram de US$325 para os US$460 aplicados até o final de março. Desde então, o custo de processamento e os requisitos burocráticos para vistos de artistas internacionais aumentaram consideravelmente, mas as taxas permaneceram inalteradas até este ano.
Além disso, as autoridades de imigração dos Estados Unidos têm intensificado as exigências sobre o processo de emissão de vistos para músicos estrangeiros. Isso se encaixa em um contexto mais amplo de políticas de imigração mais restritivas, que foram uma característica proeminente da administração anterior nos EUA. Essas práticas resultaram em processos mais longos e complexos para obtenção de vistos, exigindo mais recursos e, portanto, justificando um aumento nas taxas.
Como isso impacta os artistas?
O impacto do aumento das taxas de visto é sentido em várias frentes pelos artistas internacionais que desejam se apresentar nos Estados Unidos. Em primeiro lugar, o aumento nas taxas representa um ônus financeiro significativo para os músicos e bandas, especialmente aqueles que estão apenas começando suas carreiras ou que operam com orçamentos limitados. Encaixam-se aí todos os que não recebem em dólar em seus países de origem e precisam arcar com muitos outros custos, para além do visto.
Carlo Bruno Montalvão, da Brain Production Bookings e tour manager que acompanha artistas brasileiros e estrangeiros em turnê pelo mundo, compartilha suas preocupações sobre o impacto dessa medida ao falar com o TMDQA!:
Essa política de aumento dos vistos para tocar nos Estados Unidos vai prejudicar bastante o trabalho que os artistas independentes do Brasil têm feito de maneira totalmente independente, sem apoio nenhum de governo, de nenhuma marca, de nada. Apenas correndo atrás por conta do interesse artístico de tocar e abrir território em outro país, como a gente tem feito já há alguns anos.
Montalvão destaca que o aumento de 250% nas taxas de visto torna o processo praticamente inviável para muitos artistas independentes. Ele ressalta os altos custos envolvidos, incluindo não apenas as taxas de visto, mas também os honorários advocatícios para lidar com o processo burocrático nos Estados Unidos, que podem variar entre US$8.000 e US$10.000. Para artistas iniciantes, esses custos são inviáveis e dificultam o acesso ao mercado musical dos EUA:
Acho que essa política vai inviabilizar muito o rolê dos independentes e o rolê dos artistas em geral. Se você não tiver um bom contrato, de agora em diante a perspectiva para ir para os Estados Unidos fica cada vez pior. Porque se antes você pagava para tocar, agora você paga 20 vezes mais para tocar.
A fala de Carlo Bruno faz referência aos vários outros custos associados à realização de uma turnê nos EUA, como passagens aéreas, hospedagem, alimentação e despesas de transporte, precisando alugar até equipamentos locais não disponíveis em muitas casas de shows, o que muitas vezes resulta em um prejuízo financeiro para os artistas em troca da exposição internacional.
Por que fazer turnê nos EUA?
Se é tão custoso fazer shows nos Estados Unidos, por que, então, artistas brasileiros continuam indo? A resposta inclui inúmeros fatores, passando por um cenário musical diverso, oportunidades em múltiplas cenas, networking com pessoas importantes do mercado da música, acesso a estúdios icônicos e muitos outros.
Com a abertura ainda maior do mercado internacional à música brasileira, inclusive a independente, cada vez mais artistas de variados nichos têm se aventurado a tocar na terra do Tio Sam – mesmo que isso signifique ganhar pouco ou nenhum dinheiro.
Festivais diversos, com destaque para o SxSW, abrem espaço para novas experiências, levando bandas e artistas a se inscreverem para seus showcases. Muitos deles não incluem cachê ou mesmo ajuda de custo, o que explica atrações do mundo todo recorrendo a bolsas, editais e campanhas de financiamento coletivo para arcar com as despesas.
Vale ressaltar que os altos custos de uma turnê vêm sendo expostos por muitos artistas, inclusive de grande porte. O cenário, que já era desafiador antes da pandemia, agora vem se agravando por questões diversas, de guerras pelo mundo aos custos dos equipamentos.
Quais são os custos reais?
O impacto dessas mudanças vai além dos aspectos financeiros. Carlo Bruno Montalvão expressa preocupação com a diversidade cultural e musical que poderia ser perdida se artistas internacionais enfrentarem dificuldades cada vez maiores para fazer turnê nos Estados Unidos.
Essas preocupações destacam os desafios dos músicos brasileiros e internacionais diante das mudanças nas políticas de imigração dos EUA e ressaltam a necessidade de buscar soluções para garantir o acesso justo ao mercado musical global.