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“O vilão é o vício”: elenco e equipe de "Back to Black" falam ao TMDQA! sobre legado de Amy Winehouse

"Back to Black", nova cinebiografia dirigida por Sam Taylor-Johnson, foca na vida pessoal de Amy Winehouse a partir da perspectiva da própria cantora.

Back to Black - Marisa Abela como Amy Whinehouse
Crédito: Divulgação

Back to Black é um filme que narra a vida e a música de Amy Winehouse, desde sua adolescência até a fase adulta, focando especialmente na criação de um dos álbuns mais vendidos da atualidade.

O longa está chegando aos cinemas brasileiros em 16 de maio – e por isso o TMDQA! teve a oportunidade de conversar com a atriz Marisa Abela, o ator Eddie Marsan, o roteirista Matt Greenhalgh, a produtora Alison Owen e a diretora Sam Taylor-Joy.

A história segue Amy em sua jornada para o estrelato global, destacando seus desafios pessoais e profissionais, bem como seus relacionamentos tumultuados, especialmente com Blake Fielder-Civil. Narrado do ponto de vista da própria Amy, o filme retrata sua ascensão do subúrbio de Londres para o sucesso internacional, enquanto enfrenta questões como vício em drogas, problemas familiares e transtornos alimentares.

Back to Black propõe uma celebração da vida e do talento de Amy Winehouse, destacando sua arte, sagacidade e honestidade, ao mesmo tempo em que critica a máquina de celebridades moderna. Ele aborda temas como amor, perda, vício e redenção, oferecendo uma visão íntima e comovente da complexidade da artista. A narrativa também explora o papel fundamental da música na vida de Amy, recriando performances icônicas e destacando a influência de sua avó e de sua família em sua jornada.

Produção de Back to Black

A produção do filme foi guiada por uma abordagem empática e respeitosa, contando com a colaboração de membros da banda de Amy, amigos e familiares. O roteiro, baseado em material escrito pela própria Amy e em suas letras de música e entrevistas, busca capturar sua verdadeira essência e emoções. Nada do que foi escrito na imprensa ou por terceiros em biografias entrou para a narrativa.

A música desempenha um papel central no filme, com recriações das performances ao vivo de Amy e uma sensível trilha sonora composta por Nick Cave e Warren Ellis. A colaboração com a Universal Music e a Sony garantiram a autenticidade das músicas e o respeito ao legado de Amy.

Back to Black busca ser mais do que uma cinebiografia convencional. O filme se propõe a ser uma homenagem a uma das artistas mais talentosas e icônicas do século 21, contada com sensibilidade, respeito e paixão pela música e pela vida de Amy Winehouse.

Elenco fala de novo filme sobre Amy Winehouse

Marisa Abela sabia do tamanho do desafio em interpretar um ícone da estatura cultural de Amy – e levou a sério a tarefa:

O maior desafio era fazer um bom trabalho neste papel com integridade e honestidade e tentar chegar ao centro de quem Amy era como pessoa, como mulher. Acho que às vezes é difícil quando alguém se transforma em um ícone voltar a quem são e o que os faz funcionar, o que realmente querem da vida e o que os impulsiona, quando estão felizes e quando estão tristes. E foram nesses momentos que sinto que minha interpretação se transformaria em uma expressão humana da experiência de Amy. [Precisamos] entrelaçar isso em coisas que seriam reconhecíveis como Amy para uma plateia que a conhece e ama, então [foi necessária] uma espécie de transformação física e vocal. Acho que isso é realmente tudo o que importa, sentir as pessoas saindo do filme sentindo que entendem algo sobre sua experiência e sua alma que não sabiam antes.

Amy, é claro, é a protagonista de sua própria história, mas é cercada de coadjuvantes que não têm o mesmo apreço do público. É o caso de seu ex-marido, Blake Fielder-Civil, e do pai de Amy, Mitch Winehouse. O ator Eddie Marsan, que interpreta Mitch, só se interessou pelo personagem porque não havia uma abordagem maquiavélica – que o via como mocinho ou bandido:

Não interpreto vilões e não interpreto vítimas. Apenas interpreto pessoas infelizes em busca da felicidade. E eu sabia que não queria interpretar o Mitch se fosse uma versão sanitizada ou demonizada dele. Eu só queria interpretá-lo como um pai que estava fazendo o melhor em uma situação muito, muito difícil e que cometia erros. Eu cometo erros como pai o tempo todo. E isso faz parte de ser… um pai. Quer dizer, você deveria ter visto o café da manhã que fiz para meus filhos hoje de manhã. Foi praticamente abuso infantil [risos]. É isso que é ser humano. Não compro essa narrativa binária. Se você torna o Mitch ou o Blake um vilão, torna a Amy uma vítima, e se torna a Amy uma vítima, não se pode fazer um filme feito do ponto de vista dela. Não se pode celebrá-la se lhe roubar a autonomia.

Independente disso, a opinião pública é implacável, e muitos têm visões fortes sobre a própria Amy e as pessoas que habitavam sua vida. Como, então, se remover dessas conclusões? Talvez seja uma questão tão simples quanto se colocar no lugar do personagem. Essa é a abordagem de Marisa Abela:

Achei muito fácil me identificar com ela, para ser sincera, em termos de entender que essa era uma pessoa com uma intensa quantidade de sinceridade e, além disso, de uma abertura para se envolver com o mundo e necessidade de que o mundo se envolvesse com ela. Não havia dúvida em minha mente de que Amy era corajosa e forte porque vemos isso, e também não havia dúvida em minha mente de que Amy estava sentindo dor e vulnerável porque vemos isso. Então era sobre experimentar essas coisas através dela e depois fazer tudo o que eu pudesse, tecnicamente, para apenas torná-las reconhecíveis.

Eddie Marsan complementa:

Eu acredito que atuar é um exercício de empatia. Então, é nosso trabalho empatizar com as pessoas. E quando você empatiza com as pessoas, Stanislavski disse que quando você interpreta um homem velho, você encontra sua juventude. E quando você interpreta um jovem, você encontra sua idade, você tem que abraçar o paradoxo. A maneira como o mundo está no momento, a discussão social, especialmente nas mídias sociais, é muito binária e muito autojustificada. Mas, até onde sei, as mídias sociais nunca escreveram um roteiro de filme. Porque não funciona. Não, não funciona, as pessoas têm opiniões e opiniões não são a realidade.

“Havia um vilão chamado vício”

A produtora Alison Owen, da Monumental Pictures, comentou que não tratar os personagens com uma visão binária foi uma escolha mais do que consciente:

Embora seja uma produtora de cinema, eu vim para o filme como uma fã de Amy Winehouse e também como feminista. Eu senti que a cultura – e incluo os documentários nisso, mas não especificamente, porque a cultura é composta por muitas coisas – estava em perigo de transformar sua morte em seu legado. Seu legado estava se tornando uma morte precoce trágica e seus problemas com vício e álcool estavam ofuscando o que eu sentia como um talento extraordinário encontrado em Amy Winehouse, para se tornar um dos maiores talentos musicais do século 21. Uma pessoa vibrante, além de ser extraordinariamente talentosa. Claro que houve tragédia e não pudemos fugir disso, mas era nisso que queríamos focar e por isso senti que havia um trabalho a ser feito e queria fazê-lo logo antes que o legado de morte dela estivesse firmemente enraizado na cultura.  

Alison Owen também lembrou que essa espetacularização do vício tem um ângulo diferenciado quando se trata de mulheres:

Como feminista, senti que isso acontece com muita frequência com as mulheres em particular. Se você olhar para Judy Garland e Janis Joplin, há uma fetichização e uma objetificação disso e eu não queria que isso acontecesse com Amy. E uma obsessão por procurar quem era o culpado, sabe? Amy era uma mulher de 27 anos, com independência, e ela tomou suas próprias decisões. E as pessoas não assistem a documentários sobre Jim Morrison ou Jimi Hendrix e dizem, ‘Ah, foi culpa da mãe do Jimi Hendrix?’ Sabe, essas são pessoas crescidas fazendo suas próprias escolhas. Só porque ela era uma mulher não significa que ela era uma criança de oito anos de idade. Havia um vilão em nosso filme. Chama-se vício. Então eu acho que foi por isso que senti que era necessário fazer o filme e por que me propus a fazê-lo. 

Para conseguir contar essa história, a produção teve na família de Amy uma fonte de informações sobre a cantora no início da vida e juventude. Porém, essa “bênção” poderia vir acompanhada de certas limitações na história. A produtora garantiu que este não foi o caso:

Não houve absolutamente nenhuma limitação porque eles não tinham direitos legais ou contratuais sobre a propriedade [intelectual]. Por outro lado, nós realmente queríamos a confiança e a bênção deles, mas não iríamos alterar nada no filme para conseguir isso. Nos encontramos com eles, conversamos com eles e conseguimos o máximo de anedotas e histórias incríveis que pudemos. Algumas coisas interessantes surgiram disso. Não houve manipulação da narrativa ou qualquer pressão para fazer qualquer coisa que não quiséssemos fazer e que não achássemos verdadeira. 

Um dos únicos caminhos possíveis para contar a história de Amy era através de sua música. Não apenas suas canções aparecem aqui e ali no filme, como o longa tem a trilha sonora assinada por Nick Cave e Warren Ellis, além de contar com a produção musical de Giles Martin. Para a diretora Sam Taylor-Johnson, uma assumida fã de música, foi a oportunidade de criar com pessoas que ela admira há tempos:

Foi a música de Amy que me atraiu para fazer isso. Então ela vai fazer parte do começo ao fim, e que presente isso é! Mas também poder mergulhar nas influências e na música que ela amava foi incrível. Por exemplo, Billie Holiday e The Specials, todas essas coisas estavam na playlist dela, e Lauryn Hill. Mas também poder se divertir com isso, por exemplo, com Minnie Riperton quando eles se reuniram pela primeira vez e parecia bem operático e grandioso. Tudo isso foi incrível de trabalhar, e é uma das muitas coisas que eu amo fazer na criação de filmes.

Mas poder trabalhar com Nick Cave e Warren Ellis na trilha sonora foi apenas… foi como um presente. Foi como um sonho realizado, porque sou uma grande fã das trilhas deles e as ouço muito, mas também me conectei muito com a música do Nick por muito tempo e sou uma grande fã. Então, poder estar em uma sala apenas com os dois e um engenheiro, só nós quatro criando música ao longo de algumas semanas, foi realmente inacreditável, mas assistir a esse processo foi como alquimia, sabe? Você está no lugar onde esses dois músicos incrivelmente criativos e brilhantes começam a criar ouro. E imagino que tenha sido assim para Mark Ronson trabalhando com Amy, sabe, onde você está na sala e não consegue entender bem o que está ouvindo e embarca nesta espécie de jornada.

E então a cereja no topo do bolo foi que Nick, espontaneamente, no último dia, escreveu uma música. Na verdade, não apenas escreveu a música, levantou-se, foi ao piano e cantou essa música que ele quase canalizou, que agora é a música final do filme. E é tão pertinente a tudo que vimos que eu sinto que vai… deixar as pessoas em um silêncio um pouco atordoado. E espero que as pessoas fiquem até o final dos créditos e apenas absorvam essa voz também após ouvir a voz de Amy, porque os dois se parecem muito, são muito parecidos na sensibilidade e na maneira como criam música.

Back to Black foi liderado por mulheres em diferentes departamentos

Para além de Cave, Ellis e Martin, o TMDQA! não poderia deixar de notar que o filme é protagonizado, dirigido, produzido e liderado por muitas mulheres em diferentes departamentos.

Back to Black conta ainda com Polly Morgan na Direção de Fotografia, Sarah Greenwood no Design de Produção, PC Williams nos Figurinos, Peta Dunstall no Cabelo e Maquiagem, Katie Spencer em Decoração de Cenários, Sara Green e Anne-Marie Speed como coaches de Movimento e Canto, respectivamente, e ainda Nina Gold na Direção de Elenco.

Isso foi planejado ou só aconteceu porque as mulheres são incríveis? Alison resolveu a charada:

A segunda opção, as mulheres são incríveis! [risos] Não foi uma declaração de missão, sabe, que só vamos empregar mulheres. Foi o processo usual de disponibilidade e quem está por perto e quem é a melhor pessoa para o trabalho. E simplesmente aconteceu que na maioria dos casos, era uma mulher, e ficamos realmente felizes que isso aconteceu porque criou uma certa energia e um verdadeiro espírito de união de que todos estávamos fazendo isso por Amy e tentando dar a ela o que lhe era devido, dar o legado que ela merecia. Eu diria que é provavelmente o set em que estive que teve menos egos. Sabe, ninguém sentia que estava pisando em ovos ao redor dos outros. Era como se estivéssemos todos puxando na mesma direção, todos remando o barco para tentar obter o resultado que queríamos. 

Esta não é, porém, a única tentativa de contar a história de Winehouse. É fácil lembrar do documentário Amy, lançado em 2015 e que acabou levando o Oscar no ano seguinte. Treze anos após sua morte, de que forma Back to Black pode contribuir para o legado de Amy Winehouse? O roteirista Matt Greenhalgh nos conta a sua visão:

Quando você pensa na Amy, eu não quero que aquelas nuvens escuras estejam lá. Eu quero que elas sejam também um sorriso. Eu realmente sinto o sorriso e a essência de sua música, acho que nós apenas chegamos àquela posição onde era como se Amy e todo o resto do mundo tivessem a Amy dos tabloides na cabeça ou esses problemas enormes com acusações e isso simplesmente não podia parar porque era parte disso. Mas acho que outra história tinha que ser contada apenas para que não estivéssemos todos deprimidos pensando sobre isso. Então na verdade estamos mostrando que, sim, obviamente é uma tragédia, mas você sabe que há um sorriso lá também e que pudemos ter ela nesta terra e sua música.

No fim desse processo, o que a vida de Amy pode nos ensinar? Amy Owen complementa:

Eu diria que a maior lição é viver sua vida de forma autêntica e deixar sua criatividade brilhar. Acho que o mais importante sobre Amy era sua busca pela excelência. E as cantoras que ela reverenciava, Billie Holiday, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughn, ela queria ser como elas. Claro, ela queria o amor de seus fãs, mas não necessariamente queria fama. Você sabe, às vezes você conversa com crianças e pergunta, ‘o que você quer ser quando crescer?’ e elas dizem ‘Eu quero ser famoso’. Isso não passava pela cabeça de Amy. Ela queria ser excelente no que fazia, que era cantar e compor músicas. A lição que podemos tirar hoje em nosso mundo obcecado pela fama, obcecado por marcas, obcecado por construir sua própria imagem, é voltar à autenticidade e à criatividade, o que é uma enorme lição para todos nós, porque isso é o que está no coração do ser humano e isso é o que Amy nos ensinou.

Os brasileiros poderão conferir Back to Black apenas nos cinemas a partir de 16 de maio e lembrar do legado musical de Amy Winehouse – presente até hoje na nova geração de cantoras britânicas e do mundo todo.