A evolução da cena musical mineira tem se dado de maneira incontestável por todos os lados. Seja pela viralização dos chamados funks MTG (sigla para “montagem”) ou pela consolidação de artistas como Djonga, FBC e Marina Sena, este impacto hoje permite a visualização do estado como raiz de fontes para a atual música brasileira.
Em meio a esse cenário, em um sábado de Junho (08/06), Clara Campos, uma jovem com apenas três singles lançados em sua carreira – sendo o primeiro de maneira totalmente despretensiosa – fez o seu segundo show no Estúdio Central, casa nova focada em valorizar artistas independentes e estúdio de gravações/ensaios na região centro-sul de BH. Recentemente, foi a São Paulo a continuar os preparos de seu primeiro EP, e atende pelo nome artístico Clara Bicho.
Artista musical e visual independente, Clara tem chamado a atenção da cena autoral do país desde a disponibilização de “Tarde”, faixa lançada em outubro de 2023. Também lançou este ano duas outras canções: “Luzes da Cidade” e “Eu e a Lua” (em colaboração com Linguini, DJ/rapper/produtor musical de Belo Horizonte).
Tivemos o privilégio de ver a jovem cantar suas músicas e apresentar faixas inéditas (inclusive uma que tem participação de Sophia Chablau na composição) em noite que também contou com apresentação da banda de rock alternativo e MPB formada em Juiz de Fora, Varanda.
Depois dessa oportunidade que só comprovou o talento de Clara, vamos mergulhar a fundo no “bichoverso” e conhecer um pouco mais sobre quem é esta apaixonante artista que vem conquistando merecida atenção através de uma entrevista exclusiva que foi concedida ao TMDQA!.
TMDQA! Entrevista Clara Bicho
TMDQA!: O seu nome artístico surgiu aos seus 15/16 anos de idade, quando fez uma conta no Instagram voltada a seus trabalhos visuais (pinturas), e tinha como intenção ser um pseudônimo que transbordasse dúvidas sobre a artista por trás. Mas, ganhando força em 2020, o pessoal começou a te chamar de “Clara Bicho”. Como foi chegar ao “Bicho” como parte de sua identidade?
Clara Bicho: Olha, eu acho que foi uma coisa muito natural, essa coisa do “Bicho”. Nem sei definir exatamente o que é, talvez seja o meu lado artístico, mas é uma coisa que sempre esteve comigo, desde a infância. Então não acho que teve um “chegar” assim, porque eu acredito que ele sempre esteve ali, sabe? Essa coisa do “Bicho” é como se eu tivesse dado um nome para essa parte do que eu sou assim, como pessoa.
TMDQA!: A música sempre esteve presente em sua vida, seja com a influência de ter o seu irmão por perto ou pelo começo das suas composições aos 16 anos. Como foi e tem sido para você poder visualizar tantas portas se abrindo?
Clara Bicho: Tá sendo bem incrível estar tendo tantas oportunidades de projetos, shows, parcerias… Várias coisas incríveis acontecendo na minha vida e eu me sinto muito grata por isso, por tudo, pelas pessoas que estão me dando moral, me ajudando, acreditando no meu trabalho, me dando oportunidades.
As pessoas, público, né? Eu sou uma pessoa que valoriza muito essas coisas. Valorizo muito quando alguém faz alguma coisa legal por mim, então o sentimento mesmo é de estar muito feliz por estar conseguindo fazer o meu trabalho.
Tô conseguindo lançar músicas, fazer shows, parece uma questão de eu estar fazendo uma coisa que é minha, na qual eu acredito, uma parada pessoal. Música pessoal. Arte pessoal.
É muito doido ver as pessoas gostando de uma coisa que você genuinamente fez ali para você, do seu jeito.
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TMDQA!: As descrições de processo criativo e escolha sobre seus trabalhos se dão como “naturais”. Você diria que as canções de Clara Bicho carregam parte de quem é a “Clara Campos”?
Clara Bicho: Sim, eu acho que essa ideia de Clara Bicho/Clara Campos é uma coisa só, eu não sou um personagem. Eu sou isso aí.
Acho que é um pouco essa ideia de “Clara Bicho” ser quase que um nome para uma parte de quem eu sou, então todas as minhas músicas sou eu que componho (inclusive, essa é uma pergunta que eu recebo muito, e às vezes em um tom de ofensa).
Tudo que eu escrevo é sobre mim, né? Acho que tudo que todo mundo escreve é sobre a própria pessoa. Eu acho que até quando a gente tenta, por exemplo, escrever/compor sobre outra coisa/sobre outras pessoas, a gente está escrevendo sobre a gente mesmo também.
Então eu acredito muito nisso, acho que esse tipo de arte é uma coisa essencialmente pessoal, não tem como fugir.
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TMDQA!: Além de Ana Frango Elétrico, Sophia Chablau, etc, quais outros nomes você diria que são inspirações para realizar sua arte?
Clara Bicho: Nossa, pergunta difícil! Eu tenho muitas inspirações, é igual você citou: Ana, Sophia… Artistas incríveis que eu admiro muito, inspirações diretas para mim.
Claro, a gente tem aquelas referências sagradas, antigas, consagradas. Marcos Valle, que eu amo. Eu gosto muito de city pop (gênero do Japão), inclusive, acho que tem muito a ver com Marcos Valle, os músicos do gênero gostam muito dele e ele é muito respeitado no Japão.
Tem um cara chamado Lewis OfMan, ele é francês, faz um indie pop e é uma referência muito direta assim para mim. E no Brasil, os artistas mais contemporâneos tem vários. Acredito que a gente coexistindo, trocando ideias, conhecendo, a gente acaba influenciando o outro, né? Tem muita coisa por aí, tô tentando pensar em alguns nomes… Gosto muito de viratempo, Geração Perdida de Minas Gerais (Gabriel, meu irmão, integra a Geração), Fábio de Carvalho, muita gente mesmo.
Por fim, Alexandra Savior, acho o trabalho dela muito bonito, sensível. Ela fala muito do feminino e das experiências em “ser mulher”, isso me pega muito.
TMDQA!: E quais nomes da cena independente/autoral mineira e brasileira você sugeria ao público e mídia manterem um olho aberto?
Clara Bicho: Eu até falei alguns na pergunta anterior, mas nossa, tem muitos.
Vou soltar dois que eu gosto muito, tipo Memórias de Ontem (não é nem porque é a banda do meu irmão e das minhas amigas). Eu já escutei as músicas que eles vão lançar e o negócio tá muito bom para quem gosta de rock alternativo.
E também o pessoal do Exclusive Os Cabides, sou muito fã, eu acho eles muito autênticos, o som divertido, me deixa alegre. Acho que não tem ninguém fazendo o que eles fazem.
Tem muita gente boa!
TMDQA!: Sabemos que a produção de seu primeiro EP está a todo vapor, e todas as faixas já publicadas são bem singulares se colocadas lado a lado. Podemos esperar um projeto experimental, explorando diversos gêneros e mostrando ainda mais o potencial de Clara Bicho?
Clara Bicho: Eu acho que o EP vai ser bem experimental, acho que essa é uma ótima palavra. Vão ter diferentes gêneros de música e mostra uma evolução minha como artista dos primeiros singles pra cá; nesse meio tempo eu estive e estou aprendendo muitas coisas em diversos campos que envolvem a música.
As músicas estão bem diferentes umas das outras, tá bem dinâmico. Tem bastante daquela referência do indie pop que vocês já conhecem, mas não tem house/eletrônica tal como apareceu no meu último single com o Linguini (“Eu e a Lua”). Algumas faixas têm mais influência daquele rock alternativo dos anos 2000s, eu também sempre gostei bastante de Arctic Monkeys.
As canções vão variar bastante, tem algumas mais animadas, outras mais reflexivas, e eu espero que o público goste.
*Clara também reitera que uma das músicas do projeto tem produção totalmente autoral. Sempre colaborando e participando da produção de seus materiais com amigos, essa música em específico é um trabalho totalmente solo.
TMDQA!: Por fim, claro que temos muitos outros artistas, bandas, grupos, que assim como você, estão começando a carreira e indo atrás de seu espaço. Algum conselho para dar a estes nomes que tendem a surgir?
Clara Bicho: Olha, eu não sei se me sinto na posição de dar conselhos, mas eu tenho pensamentos e reflexões que acredito serem interessantes de repassar, refletir. Acho que um clichê bem verdadeiro é sobre você procurar ser uma pessoa autêntica, porque sendo honesto consigo mesmo, gostando do que faz, acredito que você vai conseguir produzir algo autêntico e as pessoas também vão perceber isso. Assim, acho que conseguimos perceber quando tem uma verdade ali e quando não tem, né? Isso transparece pelo menos pra mim quando estou em posição de ouvinte/telespectadora, penso muito sobre isso.
Ter o pé no chão, trabalhar.
Por também ser jornalista, eu acredito que a autocrítica é essencial para reconhecermos nossas habilidades, nossos talentos, mas sempre estarmos com um pé atrás para sabermos ouvir críticas sobre nossas pessoas/trabalho. Inclusive, acho que hoje em dia existe um movimento de alguns artistas mainstream em não saberem dar o valor para isso, não aceitarem tão bem isso. Resumindo: estar sempre disposto a aprender, porque você vai evoluindo com seus erros, adquirindo qualidade técnica, acaba sendo honesto consigo.
Acho que com essas virtudes, você consegue seguir qualquer carreira, inclusive na arte, meu pensamento é esse.
Siga Clara Bicho nas redes sociais: @clarabicho