A explosão do Grunge trouxe consigo algumas figuras históricas, e poucos representam mais a alma desse gênero do que Jerry Cantrell. O guitarrista do Alice in Chains é o resultado de uma série de influências diferentes que se somam para criar uma sonoridade única, algo que também serve para descrever o som tão característico do Grunge.
Com décadas de carreira, Jerry acaba de provar mais uma vez que está sempre pronto para buscar novos ares. I Want Blood é o quarto disco solo do músico, lançado no último dia 18 de Outubro e que traz algumas das melhores composições não apenas da fase solo de Cantrell, como de toda sua carreira.
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Mergulhar em I Want Blood é entender que, para Jerry Cantrell, toda música vem do “zero absoluto”. Em entrevista exclusiva com o TMDQA!, que você confere na íntegra logo abaixo, ele explica:
“Você não pode pensar em recriar algo do passado porque as pessoas gostaram daquilo ou foi um grande sucesso. Essa é a maneira invertida de pensar sobre isso. Você tem que começar com o que está na sua frente; tem que ser um quadro em branco, uma folha de papel em branco, o zero absoluto. Tem que começar desse lugar toda vez, não importa o que você tenha feito no passado.“
Para isso, a receita contou também com ingredientes especiais na forma de grandes figuras do Rock e Metal, que se somaram a Cantrell em diversas faixas do álbum. Nomes como Duff McKagan (Guns N’ Roses), Robert Trujillo (Metallica) e Mike Bordin (Faith No More) são só alguns dos exemplos.
Você pode entender mais sobre essa fase de Jerry Cantrell e acompanhar o músico relembrando memórias do passado lendo a entrevista completa a seguir!
Jerry Cantrell no Brasil
Se o Alice in Chains não vem ao Brasil desde 2018 e segue sem previsão para retornar ao país, Jerry está prestes a fazer sua estreia solo por aqui.
Com I Want Blood na bagagem, o músico se apresenta na Audio, em São Paulo, no próximo dia 12 de Novembro. Os ingressos ainda estão disponíveis neste link.
TMDQA! Entrevista Jerry Cantrell
TMDQA!: Oi, Jerry! Como você está? Que prazer falar com você. Sou um fã há muito tempo e sinto que esse é um momento especial pra você, com a carreira solo e tudo mais. Queria começar falando do novo álbum. Eu acabei de escutá-lo e ele está incrível; me pegou muito de surpresa, porque soa bem diferente do anterior. Queria entender como você conseguiu encontrar um som diferente dessa vez, mas que ao mesmo tempo tem essa mesma essência do Jerry Cantrell que já conhecemos tão bem.
Jerry Cantrell: Olha, a esta altura, eu já aprendi que como membro do Alice in Chains, nós meio que soamos do jeito que soamos. Individualmente, a banda é feita de como cada um dos membros soa e você não pode mudar isso. Então, se eu estou fazendo algo, eu vou levar comigo toda a minha contribuição – o que quer que seja que faz o Alice ser o Alice, eu vou carregar isso comigo aonde eu for.
Eu tenho uma sonoridade muito identificável, e como artista esse é meio que o seu objetivo: ser alguém que, tipo… quando eu era pequeno, tinha aquela coisa de você ouvir duas notas e saber que era o Van Halen; você ouvia duas notas e sabia que era o Black Sabbath, sabe? Então, ser um artista que é identificável para as pessoas instantaneamente. Essa é a sua digital musical, essa é a sua forma de ser único, eu diria.
E eu sei que eu sempre vou soar como eu mesmo, então eu não preciso me preocupar com isso. E daí, se você não está preocupado com isso, você não vai se restringir e vai se deixar ir para onde quer que a música te leve, sabe? O que te empolgar está valendo. Por isso eu sempre fico um pouco ansioso quando começo a compor, porque eu estou sempre curioso pra ver onde diabos eu vou parar. [risos] Porque eu não tenho ideia de pra onde vai, eu só sei que eu vou começar e vou chegar a algum lugar. E provavelmente vai ser um lugar legal, provavelmente vai ser um lugar que eu nunca estive antes, mesmo que seja só um pouco diferente, sabe?
E, onde quer que esse lugar um pouco diferente seja, eu ainda vou ser eu e ainda vou soar como eu mesmo. Nesse sentido, é tipo… eu te desafio a pegar um disco do Alice e dizer que ele soa como qualquer um dos outros. Não dá! [risos] E os quatro discos que fiz sozinho também, nenhum deles soa como qualquer outro. Há algumas semelhanças em questão de timbres, algumas questões vocais ou estilos de composição, qualquer coisa assim, mas aí voltamos à questão de que simplesmente sou eu. Essa é a minha identidade musical, mas todos são peças únicas de trabalho.
Como artista, é isso que você espera. Você não quer se repetir. Nem dá pra fazer isso! Se eu começo a pensar tipo, “Ah, beleza, preciso escrever outra ‘Rooster’”, ou outra “No Excuses”, não dá. Você está fodido. Você está fodido desde o primeiro momento. Você não pode pensar em recriar algo do passado porque as pessoas gostaram daquilo ou foi um grande sucesso. Essa é a maneira invertida de pensar sobre isso. Você tem que começar com o que está na sua frente; tem que ser um quadro em branco, uma folha de papel em branco, o zero absoluto. Tem que começar desse lugar toda vez, não importa o que você tenha feito no passado.
A única coisa que você pode pegar do passado é o fato de que você já foi capaz de fazer isso antes. Então, se você tentar de novo, você provavelmente vai conseguir fazer algo legal novamente. É só isso que você carrega consigo e isso, de verdade, é suficiente. É só disso que você precisa para dizer, “Ok, estou pronto pra fazer isso, estou empolgado com isso e com a ideia de ir a algum lugar que nunca fui antes, musicalmente falando”.
TMDQA!: Legal demais, essa resposta foi ótima! Curiosamente, isso tudo que você me falou me leva à minha próxima pergunta, porque essa forma como o seu som é tão identificável faz com que esse disco, se você quisesse, poderia ter sido trabalhado com o Alice in Chains, já que sempre sai algo diferente dali. Mas, ao invés disso, você fez um álbum solo, com participações de nomes gigantes da indústria. Queria entender como foi esse processo de decisão, qual a diferença pra você enquanto músico na forma de trabalhar em um disco solo e com a banda, e como foi trabalhar com esses convidados incríveis.
Jerry: Há um motivo para esse disco soar como ele soa, e é porque é a minha forma de soar, esteja dentro ou fora da banda. E eu sei que consigo fazer ambos – vários artistas fazem isso o tempo todo. Pra citar os exemplos que estiveram no disco, o Robert Trujillo está nessa banda bem legal chamada Metallica e o Duff McKagan tem outra bandinha legal chamada Guns N’ Roses, mas também está em uma turnê solo. Então, sabe, todos somos pessoas criativas.
Você tocou em um ponto que é realmente interessante, no entanto, porque temos pessoas únicas e que têm suas próprias digitais musicais. Tipo, o Duff, o Robert, ou o Mike Bordin ou o Gil Sharone ou o Greg Puciato, são pessoas facilmente identificáveis quando você as ouve. Então, trabalhar com todos eles como uma única unidade… é sempre um momento de humildade pra mim quando consigo trabalhar com caras que não são só meus amigos, mas alguns dos músicos nos quais me inspirei e admirei e ainda admiro, por toda a vida. São inovadores, caras que mandam bem demais na minha área.
Não há nenhuma garantia de que o resultado disso vai chegar perto do que quer que seja que eu tenha projetado, então o que eu faço é tentar trazer uma visão, mas ao mesmo tempo deixar espaço o suficiente para cada um adicionar e elevar. Quero que eles se insiram no material, e eu sei que quando eu estou trabalhando com esses caras nos discos deles, com o Duff em especial, eu estou tentando levar a visão dele comigo; estou tentando entregar o que ele quer entregar, sem me preocupar com o que eu quero. Eu tenho uma ideia ou duas, claro, mas quero levar a visão dele adiante.
E então, quando esses caras e minas estão trabalhando comigo, fazendo músicas, eles estão tentando levar a minha visão adiante. É por isso que acho que soa coeso, como uma banda, mesmo que sejam várias pessoas diferentes, músicos realmente muito únicos. Acho que é um atestado – espero que seja um atestado ao processo de composição, ao que estou tentando entregar, e a fazer o melhor disco que podemos juntos.
TMDQA!: Desde que os singles saíram, “Vilified” e “Afterglow” tem estado no repeat por aqui. Ouvindo o álbum todo, eu consegui perceber que você explora ainda mais direções em cada música. Você já falou sobre isso um pouco, sobre explorar essas direções diferentes, mas queria entender como você, nesse ponto da carreira, ainda encontra inspiração para seguir por tantos caminhos. Dá pra dizer, a essa altura, que é só uma forma de se expressar mesmo?
Jerry: Eu acho que um pouco é que, obviamente, eu tenho um talento pra fazer isso. Você precisa de um pouco disso, sim, um pouco desse dom. Mas, de verdade, só o que é necessário é muito trabalho duro, muito mesmo. Muita repetição. E se você tem essa coisa a mais, esse extra a seu favor, algo que você não consegue realmente descrever, essa é a magia de um artista realmente bom. E é isso que todos nós estamos realmente tentando alcançar, chegar pelo menos perto disso. Tem uma galera bem legal nesse lugar! [risos] Eu gostaria de pensar que também estou ali.
Acho que, talvez, tem um pouco também da experiência. Mas é, muito trabalho duro e um pouco de sorte. Gosto de pensar também que estou melhorando, que até hoje continuo a evoluir como músico, como vocalista, como guitarrista, como produtor, como compositor. Sempre estou tentando elevar todas essas coisas, e acho que consegui fazer isso aqui. Acho que consegui no último disco também.
Eu acho que o último disco tinha sido a melhor coisa que fiz sozinho até aquele ponto, enquanto um trabalho completo. Os anteriores eram ótimos, e tinham suas belezas às suas próprias maneiras. Mas, novamente, o que estou falando é sobre tentar dar um passo à frente e se elevar, chegar ao próximo nível. E eu acho que consegui isso, acho que I Want Blood me deu um ou dois passos à frente.
TMDQA!: Eu não poderia concordar mais. Jerry, estamos quase sem tempo, então queria falar um pouco sobre seu show no Brasil, que vai ser menos de um mês depois do disco ser lançado. Você sabe que é um país que ama muito você e o Alice in Chains, então queria saber se você também tem alguma memória favorita construída por aqui nas suas visitas.
Jerry: Nossa, sim. Eu tenho algumas histórias malucas pra caralho do Brasil, e da América do Sul em geral. [risos] Eu lembro da primeira vez que fomos até aí, acho que foi a primeira, estávamos andando com a porra do Ronnie Biggs. Tipo, cozinhando umas salsichas com a porra do Ronnie Biggs na casa dele! E o filho dele era músico também.
E eu acho que fomos tocar em um festival com o Nirvana e o Red Hot Chili Peppers, e estávamos ficando todos no mesmo hotel. Eu me lembro de ser atacado no caminho de volta e as pessoas estavam arrancando coisas de mim. [risos] Tipo, arrancando minhas roupas, meus óculos, e eu lembro que eu costumava usar a dog tag do meu pai, porque ele foi um soldado do Exército e fez carreira lá. Enfim, eu usava sua dog tag e eu me lembro que, no caminho para o hotel pela primeira vez, eu fui atacado novamente e alguém arrancou ela de mim. Eu achei que tinha perdido pra sempre, mas alguns dias depois umas garotas apareceram em um dos shows e me devolveram!
Nossa, muitas memórias boas, mesmo. Alguns dos shows… Nós tocamos em um festival por aí não faz muito tempo, e acho que estávamos tocando “Rain When I Die” e começou a chover logo nessa hora. E foi uma chuva forte. Foi uma experiência realmente doida, essa bizarre confluência de tocar uma música que está falando exatamente sobre o que está acontecendo, e começar a chover, enfim, foi muito doido.
Mas uma das coisas legais é que eu viajava muito quando era pequeno por causa do meu pai e do serviço, então eu vi um pouco mais dos Estados Unidos e um pouco mais da Europa do que as crianças daquela idade costumavam ver. E talvez eu tenha pego o bichinho da viagem logo cedo, mas sendo músico você tem a oportunidade de viajar o mundo inteiro e ir a muitos países que você provavelmente nunca iria, sabe? Tipo, seu emprego é ir tocar para as pessoas e viajar ao redor do mundo enquanto faz isso. Então, a gente visita muitos lugares legais, vê muitas culturas diferentes, e olha com uma certa distância para o nosso próprio país de onde quer que estejamos para ver como ele se parece, ao invés de só ficar olhando para o resto do mundo do nosso próprio país. Acho que isso é uma coisa muito saudável, é uma visão de mundo muito saudável.
Eu recomendo muito isso para qualquer pessoa que seja capaz de viajar o mundo, o quanto puder, mesmo que seja pouco. Aprendam um pouco um sobre o outro e talvez vocês vejam o quanto somos similares ao invés de o quanto somos diferentes, além de tudo que compartilhamos e que podemos aprender um com o outro – pessoas e lugares diferentes, sabe?
TMDQA!: Não poderia concordar mais. Jerry, muito obrigado pelo seu tempo. Foi um prazer falar com você e espero que você possa voltar mais e mais vezes ao nosso país.
Jerry: Vou tentar!
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