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Resenha: Haim - Days Are Gone

Em disco de estreia, as irmãs do Haim revelam identidade sonora surpreendente que promete voos altos ao trio.

Haim - Days Are Gone

Haim - Days Are Gone

O trecho entre o fim da década de 1970 e a maior parte dos anos 1980 será eternamente injustiçado como o período musicalmente mais cafona do século XX. Grandes cagadas musicais viraram hits e, após abandonar as paradas, parasitaram as chamadas rádios de “pop adulto” de hoje em dia. Mas entre a invasão de batidas, sintetizadores e reverbs da new wave, temperada pela decadência da disco music, o conceito de música pop se consolidou com o sucesso de artistas que ao mesmo tempo foram capazes de criar obras artisticamente relevantes e atingir o sucesso de massa, como Prince ou Michael Jackson, posteriormente eleito por si mesmo o “rei do pop”.

Com a liberdade de revisitar outras décadas proporcionada pela internet, os anos 2000 viram – entre outras releituras – uma enxurrada de recriações e reapropriações da sonoridade e da estética dos 1980. Foi a explosão do electropop, do rock dançante de sintetizadores, um sucesso momentâneo a esta altura fadado à irrelevância. Mas em 2013, finalmente surgiu um grupo capaz de amarrar boas influências pop da “década perdida” com toques próprios de originalidade. E o mais inusitado: a banda é formada por três irmãs tão novas que não nasceram a tempo de lembrar a cultura pop da década polêmica. Obviamente, tal grupo é o Haim.

Composto por Este Haim (nascida em 1986), Danielle Haim (1989) e Alana Haim (1991), o trio californiano é dos mais experientes da música pop atual, apesar de terem lançado apenas agora o álbum de estreia, Days Are Gone. Danielle e Este fizeram parte do conjunto pop The Valli Girls, banda adolescente voltada para o público adolescente cujo único lançamento de destaque foi o single “Always There In You” na trilha sonora do filme Quatro Amigas e um Jeans Viajante (2005).

Com o fim do grupo e a cota de cafonice da juventude cumprida, Este e Danielle se juntaram a Alana para shows ocasionais na região de Los Angeles, mas o Haim só se levou a sério quando Danielle levou um puxão de orelha de Julian Casablancas no período em que integrou a banda solo do frontman do The Strokes: “Parem de tocar ao vivo. Voltem para o estúdio e escrevam boas músicas”. O resultado, nítido em Days Are Gone, é um pop arrojado com óbvias referências históricas, mas com uma atemporalidade que permitiria o sucesso do álbum nesta ou em qualquer outra década recente.

Das onze músicas do disco, quatro foram lançadas desde o ano passado em singles, EPs e remixes: as excelentes “Forever” (uma ode à era Thriller de Michael Jackson), “Don’t Save Me”, “Falling” e “The Wire”, um supreendente hino pop que lembra uma versão atualizada de The Pretenders com guitarras à la Tom Petty. Todas são capazes de te fazer voltar quase trinta anos no tempo, para festas ambientadas em praias californianas ou iates ancorados em Miami. Mesmo que, como as Haim, você não tenha vivido nada disso na pele.

As sete faixas inéditas de Days Are Gone ao mesmo tempo reverberam a identidade muito bem desenvolvida do Haim – apresentada nos singles supracitados – e encapsulam novas e bem-sucedidas referências. A primeira delas, “If I Could Change Your Mind”, é um R&B contagioso com potencial para single, mas não apresenta nada novo em relação aos singles lançados. “Honey & I”, por sua vez, traz a primeira pitada acústica ao som do grupo, com vocais cheios de ar remetentes à canadense Feist, talvez a maior referência contemporânea das irmãs. “Days Are Gone”, faixa-título do disco, peca por ser a música que menos se encaixa à sonoridade oitentista do Haim e, com pequenas alterações no arranjos, poderia ser interpretada por outras cantoras pop da atualidade como Lianne La Havas ou Jessie Ware, não coincidentemente uma das compositoras da faixa.

“My Song 5” e “Go Slow” diminuem o andamento do álbum com levadas mais lentas, mas nem por isso menos impactantes. “Go Slow” quase uma balada com guitarras e sintetizadores etéreos e uma linda levada de baixo de Este, enquanto “My Song 5” beira o hip-hop com direito a wobbles de frequências graves – estranho, mas funciona. “Let Me Go” volta a lembrar Feist, agora em uma versão mais tensa, mas não empolga. E “Running If You Call My Name” encerra o disco muito bem, com tambores grandiosos (alô, Phil Collins!) e as melodias mais bonitas do disco.

Days Are Gone surpreende por revelar um grupo tão coeso e confiante logo no primeiro álbum. Apesar da experiência adquirida nos trabalhos musicais anteriores, as irmãs Haim ainda são jovens demais para demonstrar tanta maturidade e uma habilidade invejável de referenciar os ídolos sem soar como cópias baratas, mas misteriosamente conseguem. As três inclusive mostram disposição de experimentar mais no futuro, com a consciência de que, por mais divertidos que os anos 1980 tenham sido, obviamente não duraram para sempre.

Nota: 8/10