Texto, fotos e video: Nathália Pandeló
Pixinguinha é uma entidade. O tipo de presença marcante no chorinho, gênero que ajudou a dar forma, com ramificações por toda a música popular brasileira. Não por acaso, o Dia Nacional do Choro é comemorado em 23 de abril, seu aniversário. Como se, com seu nascimento, nascesse também aquela música que, de triste, tem muito pouco.
Por isso, quem o homenageia deve fazê-lo com o mesmo cuidado com que o próprio Mestre dos Chorões compunha suas hoje imortais músicas. Foi com essa reverência que Hamilton de Holanda montou seu show “Tributo a Pixinguinha”, fruto de um CD lançado esse ano com participações de músicos de diversos países em releituras à base de seu poderoso bandolim de 10 cordas.
No repertório, “Um a zero”, “Os cinco companheiros”, “Lamentos”, “Rosa, “Cochichando” e “Carinhoso”. Fazem parte do show ainda “Luiza”, de Tom Jobim, “Capricho de Raphael”, do próprio Hamilton em homenagem ao violonista Raphael Rabello, e “Um chorinho em cochabamba”, de seu flautista Eduardo Neves. Completam o time o contrabaixista André Vasconcellos, o violonista Rafael dos Anjos e o percussionista Thiago da Serrinha.
Em arranjos ora reflexivos, ora dançantes – assim como na obra do próprio Pixinga -, a banda passeia com desenvoltura pela sonoridade que remete às suas composições. Com uma bateria pontual e elegante e o contrabaixo acústico fazendo a cama para essa sonoridade, Hamilton propôs uma uma formação pouco tradicional no choro. Mais que reapresentar para o público as frases já tão conhecidas, o quinteto surpreendeu com interpretações que iam da delicadeza de “Rosa” à explosão rítimica que é “Cochabamba” em um delicioso clima de jam session.
Mas foi em seus momentos solo, no início e no final do show, que o bandolinista brilhou. Não apenas porque estivesse apenas ele no centro do Teatro de Arena do Caixa Cultural, no Rio de Janeiro. Foram o seu virtuosismo e, principalmente, a sensibilidade para dar sentido a cada uma das notas naquele turbilhão que pareciam prender a respiração da plateia durante uma das mais belas versões de “Carinhoso”. Ninguém tentou cantar a letra de João de Barro, um dos hinos da nossa música. Eles estavam ali para ouvir.
Com ingressos esgotados e uma fila que parecia interminável para levar o “Mundo de Pixinguinha” para casa, é difícil acreditar que o choro esteja morrendo. Ao mesmo tempo em que é triste ver essa forma de expressão musical tão rica perder espaço nas praças (onde é o seu lugar!), é um alívio ver um público jovem entre os tantos idosos que lotaram o teatro para ouvir música instrumental. Muitos deles vinham visivelmente do trabalho após enfrentar o trânsito ferrenho carioca em horário de pico. O próprio Hamilton, em um dos momentos de descontração, contou como precisou largar o carro em algum ponto da Barra da Tijuca para pegar um metrô e conseguir chegar a tempo. Mas não parecia importar. Era um encontro de “chorões” – e todos saíram dali com sorrisos estampados no rosto. Viva Pixinguinha.