Entrevistas

Conversamos com o produtor do box do Belchior que inclui faixa inédita

No primeiro aniversário de sua morte, a obra do lendário artista ganha tratamento de luxo no box Tudo Outra Vez que inclui uma faixa inédita e discos relançados.

Belchior em 1977
Foto: Divulgação

Poucas vezes a obra de Belchior ecoou tão forte e se renovou quanto nos tempos atuais. Visto agora como um profeta visionário e a voz de uma geração, o artista e sua música ainda guardam segredos. Um bom modo de começar o mergulho na obra do cearense é o recém-lançado box Tudo Outra Vez.

Com produção de Renato Vieira, o projeto traz seis discos do Belchior gravados entre 1974 e 1982, entre eles os clássicos e obrigatórios Alucinação e Coração Selvagem. O projeto tem como destaques uma versão inédita da faixa “Como se fosse pecado”, que ficou arquivada por 40 anos, e dois discos que só agora serão disponibilizados nas plataformas digitais: Belchior (1974) e Paraíso (1982).

Trocamos uma ideia com Renato sobre a obra do Belchior e como foi para ele descobrir essa faixa inédita.

Confira abaixo o box e a nossa conversa.

Em tempo, há um ano recebíamos a triste notícia sobre a morte de Belchior.

TMDQA: Como foi seu primeiro contato com a obra do Belchior?

Renato Vieira: Olha, foi com os discos do meu pai. Ele tinha alguns dos álbuns que estão nessa caixa. Eu ouvia muito na infância sem nem saber. Era uma época que o Belchior estava fora da mídia, mas meu pai realmente gostava muito dos álbuns. Lembro muito das capas, das músicas na casa. Quando peguei esse projeto do box, me senti bem à vontade porque sabia bem o que tinha em cada álbum.

 

TMQDA: O que você acha que faz a obra dele se manter tão atual?

Renato Vieira: Eu acho que sempre se manteve, pois o que ele diz ainda acontece. O mundo está muito instável, como estava na época que ele canções foram escritas. Sem saber muito bem o que vai acontecer. Mas acho que essa redescoberta deve muito ao sumiço dele, sabe? Ele se tornou uma figura cult porque sempre valorizamos as coisas quando elas somem. Ele se tornou essa figura atraente, alguém que chuta tudo nessa atual engrenagem de compromissos.

Ele sempre foi um outsider e acho que essa imagem atrai. Até mesmo na música brasileira era era algo particular, sem uma turma.

Fazendo aqui um exercício de futorologia, creio que se ele não tivesse sumido, estaria como um (Jards) Macalé. Eu adoraria ver o Belchior dialogando com uma nova geração, como o Macalé faz. Fazendo uma temporada numa casa como a Audio Rebel, no Rio.

 

TMDQA: Qual foi o critério para a criação do box?

Renato Vieira: Fiz uma caixa especial com a Universal Music em 2016. Ele ainda estava vivo e adoraria ter falado com ele para fazermos esse material juntos. Como não conseguimos, recorri a artigos de jornal da época do lançamento. Acho que os critérios foram os que estão liberados por cada gravadora. (Risos)

O som foi remasterizado pelo Ricardo Garcia e trabalhamos bastante na parte visual do projeto. O Belchior tinha muito trabalho com as artes dos discos, então a obra não era só musical. Queríamos trazer os discos como foram concebidos.

Sei que o mercado de material físico, em CD, está em decadência, mas tem seus fãs fiéis. E a obra disponível do Belchior tinha essa lacuna. Estou bem satisfeito com o resultado.

https://www.youtube.com/watch?v=1Umg6CiwGew

TMDQA: Vamos falar sobre “Como se fosse pecado”. Como foi descobrir essa preciosidade?

Renato Vieira: Rapaz, eu já tava no processo de confecção da caixa quando eu descobri. O Coração Selvagem foi mixado em Los Angeles e eu achei um vinil prensado, com uma capa genérica e no rótulo só um “Belchior” escrito com as faixas do Coração Selvagem, e tinha essa música. Quando ouvi, eu caí para trás. Na minha pesquisa, descobri que ele queria colocar essa música no disco mas a censura não deixou. Eu sabia que ela tinha sido proibida, mas não que tinha sido gravada.

 

TMDQA: Qual seu álbum favorito do Belchior?

Renato Vieira: Nossa, essa é difícil de responder pois eu sempre mudo de opinião! (Risos) O Paraíso eu sempre achei muito estranho no vinil. Quando ouvi ele remasterizado, achei o disco muito bom. É um disco muito diferente, novo. Gosto de pensar que as pessoas irão redescobri-lo. Tem faixas que dá até para tocar em festas.

Eu sinto que todos os discos do Belchior são quase uma coisa só. O Alucinação é o que melhor sintetiza, mas parece que tem gente que acha que ele só fez esse. A obra dele tem uma grande continuidade e é ótimo descobrirmos algo como o Paraíso de novo.