“Eu tento escrever histórias que qualquer um pudesse gostar. Tento deixá-las entendíveis e empolgantes, ou intrigantes e interessantes o suficiente para que jovens prendam sua atenção. E tentei deixá-las inteligentes o suficiente para pessoas mais velhas,” disse Stan Lee certa vez, em entrevista ao The Hollywood Reporter. “Sou orgulhoso do fato de algumas das coisas que criei entreterem as pessoas”.
De fato, ele foi uma figura histórica na formação de muita gente. Criador de quase todos os grandes super-heróis da Marvel, Stan faleceu aos 95 anos e deixou um legado admirável, após uma trajetória de sucesso que começou lá atrás, nos anos 40!
O início
Já na infância, Stanley Martin Liebe desenvolveu o gosto pelas artes. Incentivado pela mãe, ele teve contato com várias obras literárias clássicas como livros de Mark Twain, Sir Arthur Conan Doyle e H.G. Wells. Além disso, quando garoto, ele também gostava dos filmes de Errol Flynn, ator australiano reconhecido por seus papéis em várias produções de ação e aventura.
Quando fez 17 anos, ele começou a trabalhar na Timely Comics, empresa que se tornaria a Marvel Comics duas décadas mais tarde. Foi em 1941, aos 19 anos, que ele escreveu sua primeira história em quadrinhos: uma edição de Capitão América que deixou os chefes da editora tão impressionados que lhe rendeu uma promoção. Stan agora seria editor interino. Depois disso, o selo mudaria ainda para Atlas Comics antes de virar a famosíssima Marvel Comics.
A criação da Marvel, inclusive, se deu em um momento delicado para os quadrinhos. A rival DC Comics estava começando a lançar os primeiros números de Liga da Justiça, no começo dos anos 60. Alguns editores insistiam que as HQs deveriam ser super simples, pois eram um produto infantil. Stan Lee discordava e quando surgiu o pedido para a criação de uma equipe própria de super-heróis para concorrer com a Liga, ele mostrou novamente sua visão inovadora.
Ao invés de apresentar heróis superficiais, ele criou o Quarteto Fantástico, grupo formado por super-humanos com vários conflitos internos. Essa, na verdade, foi a principal revolução na forma como se via as histórias em quadrinhos. Os heróis não eram perfeitos, tinham dilemas éticos, desvios de comportamento, crises de consciência e dúvidas quanto ao próprio papel na sociedade. Isso foi inserido em praticamente tudo o que se criou depois, como nos principais arcos de X-Men e Os Vingadores.
Também foi Stan Lee quem inaugurou o “Método Marvel”, ou plot script. Os quadrinistas trabalhavam a partir de uma sinopse criada pelo roteirista, adicionando detalhes próprios às histórias, e devolviam para que o roteirista incluísse os diálogos.
Influência além das páginas
A produção de Stan Lee foi tão impressionante que criou-se um problema: a Marvel dedicava muito do sucesso dos seus personagens a ele, deixando de lado importantes nomes como os cocriadores Jack Kirby, Steve Ditko e Bill Everett, fundamentais para a existência do tal “Método Marvel”.
Dá para entender, no entanto, o motivo de Lee concentrar tanto os holofotes. Além de ser o rosto da empresa em eventos pelo mundo, ele foi um ícone não apenas da Marvel em si, mas da indústria do entretenimento em quadrinhos e sua evolução ao longo das décadas.
O formato das graphic novels, por exemplo, não era nada comum até os anos 70. Stan e Jack Kirby, então, foram demandados por um produtor que queria fazer um filme do Surfista Prateado, mas precisava de uma história fechada. Isso resultou em um antepassado das graphic novels como conhecemos. Acabou que o filme nem saiu do papel, mas o formato agradou e está aí até hoje.
Também foi por influência de Stan Lee que a Marvel assumiu um estilo mais próximo dos fãs do que o mundo dos quadrinhos estava habituado . Além de receber cartas dos leitores e responder nas próprias HQs, ele virou uma espécie de embaixador da chamada Casa das Ideias. Tanto que ele participou como produtor de todos os filmes da Marvel nos cinemas, fez participações especiais em todos eles e virou um easter egg esperado pelo público em todas as produções de Hollywood com seus super-heróis.
Nos últimos anos, Stan Lee acabou sendo vítima de golpes financeiros de pessoas envolvidas com a sua carreira. Em 2017, ele foi à polícia após US$ 300 mil terem sido retirados de sua conta sem seu consentimento. Já em 2018, cerca de US$ 1,4 milhão também foram roubados. O principal suspeito é um ex-sócio de Lee, que coordenava a ONG Hands of Respect. Vários funcionários da família foram demitidos por suspeita de envolvimento.
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“As contribuições de Stan Lee para a Marvel, uma companhia cujo nome ele ajudou a forjar, vão viver para sempre, e nós vamos continuar a celebrar os personagens que ele ajudou a criar e o universo que ele ajudou a construir. Meus pensamentos e orações estão com a sua filha e seu irmão neste momento,” disse Ike Perlmutter, presidente da Marvel Entertainment.
Agora, o mundo do entretenimento fica um pouco menos colorido. “Stan Lee era tão extraordinário quanto os personagens que criou. Um super-herói para os fãs da Marvel pelo mundo, Stan tinha o poder de inspirar, entreter e conectar. A escala da imaginação dele só era superada pelo tamanho do seu coração”, também falou Bob Iger, presidente e CEO da Walt Disney Company.
Em declarações emocionadas de músicos a respeito de Stan Lee, que podem ser lidas logo abaixo, ficou evidente que a Marvel fez parte da infância e da adolescência de uma parte imensa dos norte-americanos, e os mundos criados pelo cara permitiram que questões das mais humanas fossem abordadas através de personagens que ao mesmo tempo em que eram super-heróis e pareciam inalcançáveis, estavam ali ao lado de nós como pessoas normais que têm seus defeitos e virtudes.
Que descanse em paz.
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